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A POLÍTICA EDUCACIONAL NO PERÍODO 1998-2002 – NO RASTRO DA REFORMA DO ESTADO BRASILEIRO

3.3 – A POLÍTICA EDUCACIONAL DO GOVERNO FHC

Em sua proposta de governo, “Mãos à Obra Brasil”, o Presidente Fernando Henrique Cardoso inclui a educação dentre as cinco prioridades nacionais, afirmando

61 Aguiar (2002) concordando com as teses de que o reformismo desencadeado pelo Governo Federal

atingiu fortemente a educação, ressalta que os programas por ele acionados foram de impactos diferenciados, nos diversos campos da ação educacional.

que caberá à União a responsabilidade direta pela Educação Básica, competindo-lhe “fornecer estímulos e instrumentos aos estados e municípios para que eles possam desempenhar a tarefa que lhes cabe”, conforme preceito constitucional. (CARDOSO, 1994, p. 111).

Fazendo alusão ao fato de que, numa economia globalizada como ocorre no mundo hodierno, as conquistas científico-tecnológicas constituem condição de competitividade. Daí a urgente necessidade de se promover uma reforma na educação, tendo em vista “forjar um novo modelo de desenvolvimento econômico”, sendo preciso “criar parcerias entre o setor privado e o governo, entre universidade e indústria, tanto na gestão quanto no financiamento do sistema brasileiro de desenvolvimento científico e tecnológico”62 (p. 15). Pois a competência científico- tecnológica constituirá elemento imprescindível para se garantir a qualidade do ensino básico e técnico, no sentido de possibilitar a qualificação geral da população (p. 78). Nessa perspectiva, o papel que deverá ser assumido pela educação brasileira é o de instrumentalizar o indivíduo para o exercício de sua cidadania e para o seu engajamento nas atividades produtivas, devendo ser considerada como condição para a consolidação de uma sociedade “justa, solidária e integrada”. Para tanto a “alta qualidade da educação, em todos os níveis, deverá ser objetivo central da ação governamental” (p. 108). Destaque é concedido ao papel econômico da educação, enquanto “base do novo estilo de desenvolvimento”, ao estilo da contemporaneidade. Retratando a situação caótica e ineficiente da educação brasileira, face aos seus graves e persistentes problemas, como repetência, analfabetismo, má qualidade de ensino, desperdício financeiro, a Proposta de Governo de FHC coloca como prioridade

62 “No longo prazo, será necessário consolidar um modelo de desenvolvimento fundado numa sociedade

educada e movido por uma economia altamente competitiva, em que o motor do progresso sejam os modos mais avançados de produzir” (CARDOSO, 1995, p. 15).

básica a universalização do acesso ao Ensino Fundamental, melhorando a qualidade do atendimento escolar.

Para viabilização dessas prioridades, a Proposta afirma que caberá à União fornecer estímulos aos Estados e municípios para que eles tenham condições de assumir sua tarefa, ofertando um sistema que atenda a todas as crianças em escolas de boa qualidade.

Ressalta, ainda, que para a execução da política educacional, a União conta com a quota federal do salário-educação, a ser distribuída entre as instâncias subnacionais, apontando a necessidade do estabelecimento de critérios objetivos e transparentes para o repasse e aplicação dos recursos, tendo em vista moralizar o sistema de financiamento e atacar os crônicos problemas do centralismo, da excessiva burocratização e do clientelismo.

Referindo-se ao financiamento da Educação Básica, a Proposta afirma que não falta escola nem também dinheiro para o Ensino Fundamental, lembrando que o Brasil está bem perto da universalização do acesso à escola. O que tem acontecido, historicamente, é desperdício de verbas, pois, se estas são suficientes, o problema em nosso país é que elas são mal aplicadas (p. 110), pois cerca de 30% a 50% seriam destinados às atividades-meio, além da ocorrência de desvios de função do pessoal que camufla os reais dispêndios com a educação.

Para tanto, propõe que a transferência das verbas seja proporcional ao número de alunos em idade escolar e “inversamente proporcional à renda per capita dos municípios. Quanto maior e quanto mais pobre o município, maiores as verbas que deve receber, desde que as aplique corretamente para melhorar a educação” (p. 111). Afirmando que a função do Governo Federal não deve ser restrita à função redistributiva dos recursos, abre a possibilidade de a União disponibilizar mais

recursos para estados e municípios mediante a apresentação de plano que contemple ações de melhoria do sistema educacional, atualização dos docentes e melhoria salarial. Em contrapartida, a União deverá exigir dos entes subnacionais a efetiva melhoria de seus sistemas de ensino.

É importante destacar que a proposta explicita claramente a definição das atribuições das instâncias federadas, consoante com o princípio da descentralização adotado a partir da reforma do Estado, quando diz:

“O Governo Fernando Henrique será o promotor, coordenador e gestor das prioridades educacionais. Serão reduzidas as responsabilidades do Ministério da Educação como instância executora e a interferência direta da União nos Estados e municípios. As atribuições das diferentes esferas governamentais serão bem definidas, e sempre associadas a padrões de desempenho, resultados de avaliações e prestação de contas da qualidade dos serviços oferecidos” (p. 113).

No que se refere à política de gestão educacional, a Proposta tem como tônicas a descentralização, a promoção da equidade e o fortalecimento da escola pública, duas medidas ganhando destaque para promover as mudanças pretendidas.

A primeira consiste na meta de democratização da gestão escolar de “aumentar a autonomia financeira das escolas, mediante recursos suficientes para a gestão do cotidiano escolar”. E a segunda, na descentralização, via municipalização, tendo em vista estimular essa instância federada ao cumprimento de suas responsabilidades, conforme determinam a Constituição Federal de 1988 e a LDB –Lei nº 9394/1996 -. A materialização desta segunda tônica se deu através de mecanismos como a Emenda nº14, de 1996, e a decorrente criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério –FUNDEF. Esse Fundo tem por finalidade redistribuir os recursos públicos destinados ao Ensino Fundamental, visando reduzir, conforme explicita o MEC, os problemas, tanto de partilha, como de aplicação de recursos.

Ressalte-se que a Emenda Constitucional nº 14/1996 exerceu papel relevante no processo das reformas institucionais no âmbito da educação, principalmente, junto aos municípios para o cumprimento de suas responsabilidades, conforme determinam a Constituição Federal de 1988 e a LDB –Lei nº 9394/1996.

Em seu Programa de Governo para a segunda gestão – Avança Brasil: mais quatro anos de desenvolvimento para todos -, FHC não inclui a educação como uma de suas prioridades, sob o argumento de que esse novo programa não será uma seqüência do Programa da gestão anterior, Mãos à Obra, tendo como compromisso maior o combate à pobreza.

Nessa proposta, aparecem quatro eixos básicos: “estabilidade da moeda, combate à pobreza, crescimento econômico com maior criação de empregos e aprofundamento da democracia e do respeito aos direitos humanos” (p. 8). No documento fica claro que “as linhas de ação do novo governo deverão ser apresentadas como novas, de um novo governo, e não como continuidade do programa da campanha anterior”. (idem).

Referindo-se à sua gestão anterior, FHC destaca a efetivação da Reforma do Estado e da Administração Pública Federal, afirmando que “revolucionou a atuação do governo nas áreas de educação, assistência social, reforma agrária e qualificação profissional”63.

Face ao diagnóstico traçado de seu primeiro governo, impõe-se “avançar sobretudo, na luta permanente contra a exclusão social, a fome, a pobreza e a desigualdade, tendo realizado uma nova revolução nas políticas sociais e de transferência de renda”.

63 As citações referentes à Proposta do governo de FHC –Avança Brasil- foram extraídas do site

Mesmo não figurando entre as grandes prioridades, a educação é ressaltada como requisito para a efetivação das ações estruturadoras do modelo econômico. Dentre as metas a serem perseguidas no período 1998-2002, é concedido destaque à formação e qualificação do magistério. Pois, conforme o Censo do Professor de 1997, há cerca de setenta e cinco mil professores da primeira à quarta série sem nível médio, cento e seis mil da quinta à oitava série sem nível superior e vinte e cinco mil do ensino médio também sem ensino superior.

Frente a essa constatação, o Programa Governamental aponta o FUNDEF dentre as suas ações para o Ensino Fundamental, que deverá garantir a formação e a qualificação do magistério, vinculando percentual para pagamento dos salários dos docentes, prevendo reajustes, o que exigirá esforços de racionalização no uso dos recursos financeiros disponíveis.

Nesse sentido, o segundo Governo de FHC explicita que as exigências de melhor qualificação profissional e de melhor desempenho docente devem corresponder à elevação dos níveis salariais, destacando, inclusive, a formulação de planos de cargos e carreira que deverão nortear novas contratações dos profissionais da educação.

A segunda gestão de FHC reafirma, assim, o FUNDEF, como uma medida de natureza equalizadora na distribuição dos recursos, devendo contribuir para o resgate do prestígio social da carreira do magistério, ao mesmo tempo em que deverá garantir investimento mínimo anual, contando com a complementação da União, naqueles estados que não apresentem o valor per capita estipulado.

Para tanto, aponta a necessidade de promover mudanças no processo de gastos ligados ao Ensino Fundamental, tendo em vista a melhoria da gestão, mediante a clara definição das responsabilidades das unidades federadas, pela priorização do Ensino

Fundamental, garantindo a qualidade do ensino e o aumento da eficiência do sistema educacional.

Aguiar (2002, p. 75-76) faz alusão ao balanço das ações do MEC, em 1999, segundo o qual “o marco institucional do ensino foi profundamente alterado, por meio da Emenda Constitucional e de leis – principalmente a Lei de Diretrizes e Bases, e indica as intervenções consideradas prioritárias” (MEC, 1999), destacando as realizadas no Ensino Fundamental:

- “A criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF), com a Emenda Constitucional nº 14;

- A fixação dos parâmetros curriculares nacionais para o Ensino Fundamental, Infantil e Indígena, referência para professores e para a seleção de livros didáticos;

- A avaliação prévia da qualidade do livro didático a ser adquirido e a ampliação de quatro para oito séries do Ensino Fundamental; - A criação de um canal exclusivo via satélite para capacitação e

apoio ao trabalho de professores e o envio de kit tecnológico a 50 mil escolas (TV Escola);

- Envio de recurso federal diretamente às escolas por meio de associações de pais e mestres, que administram o dinheiro (Programa Dinheiro na Escola);

- Implantação do Programa de Aceleração de aprendizagem para alunos com alta defasagem idade-série, atingindo, em 1998, 1.200 mil alunos;

- Desenvolvimento de um programa de informatização das escolas, com envio de 30 mil computadores e treinamento de 8 mil professores-multiplicadores;

- Municipalização da merenda escolar, com envio de recursos diretamente para mais de 4.500 municípios;

- Deflagração em 1998 da Campanha Toda Criança na Escola, visando a estimular a matrícula”.

Assim, parece ter sido no Ensino Fundamental que os oito anos de Governo de FHC deixaram forte marca política, sendo aprovados dispositivos legais que tiveram grande impacto na política educacional do país: Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) – Lei nº 9394/1996; Emenda Constitucional nº 14/1996, que foi responsável pela criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino

Fundamental e Valorização do Magistério (FUNDEF) – Lei nº 9424/1996 e o Plano Nacional de Educação (PNE) – Lei nº 10172/2001.