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O FUNDEF: ENTRE DIFERENTES DISCURSOS

4.2.2 – A UNDIME: A EXPRESSÃO DOS SECRETÁRIOS MUNICIPAIS

Reconhecendo-se como a legítima representante dos secretários municipais de educação e defensora da municipalização, a UNDIME faz-se presente nas discussões e nos documentos produzidos a respeito do FUNDEF, fato que debita à história de sua criação, marcada pela “respeitabilidade e pela representatividade”. (Balanço de Gestão 1997/1999).

Mesmo apresentando-se a favor do FUNDEF, face à sua defesa da municipalização do ensino, a UNDIME, nas discussões sobre a PEC, diferentemente do CONSED, que denominou a Emenda Constitucional de proposta de redenção do Ensino Fundamental, avalia que “essa proposta traz uma determinação clara do Executivo no sentido de retirar da União a responsabilidade com o Ensino Fundamental” (FARENZENA, 2001, p. 296).

Discurso que inclui elementos e momentos de relação de equivalência quanto à necessidade de criação do Fundo, apresentando-se como sua defensora, mas também demarcando o seu lugar nos conflitos suscitados pelo seu processo de implantação/implementação, conforme atestam os documentos produzidos pela UNDIME e aqui examinados.

Como argumentos de contraposição ao discurso do FUNDEF, a UNDIME centra a sua crítica na desresponsabilização da União no cumprimento da Lei, mediante a complementação dos recursos, de modo a assegurar o custo-aluno estabelecido anualmente, o que teria dificultado a universalização do Ensino Fundamental, bem

como na não observância dos acordos efetuados, sobretudo aqueles definidos no do Plano Decenal e do Pacto de Valorização do Magistério e Qualidade do Ensino.

A UNDIME, desde o início, se posicionou contra a forma autoritária como se deu a implantação do FUNDEF e, de maneira enfática, contesta os percentuais estabelecidos para a concretização do custo-aluno ano. Um outro aspecto de dissenso e, por conseguinte, de conflito, diz respeito à exclusão dos demais níveis e modalidades de ensino, o que motivou o encaminhamento de propostas de alteração da Lei e de sua regulamentação junto ao MEC.

Conforme Farenzena (2001, p. 296), “os municípios reunidos chegaram a dois consensos em torno da Emenda: a manutenção da responsabilidade da União para com o Ensino Fundamental e o entendimento do Fundo como mecanismo disciplinador da aplicação de recursos”.

Nessa perspectiva, a UNDIME afirma o compromisso com a autonomia municipal nas discussões das políticas públicas, não aceitando a sua imposição sem a devida discussão. E nesse sentido defende que o regime de colaboração “jamais deve ser um regime de subordinação dos mais fracos aos mais fortes”. (8º Fórum Nacional, 2001). Aliás, pronunciamento realizado nesse 8º Fórum da UNDIME deixa claro esse desacordo: “nesse momento, o regime de colaboração não está sendo de colaboração, o regime está sendo de imposição e até de competição, competição entre estados e municípios e imposição do Governo Federal de parâmetros totalmente inadequados”. Assim, para a UNDIME as parcerias “são importantes, mas sempre dentro do princípio da soberania em que a entidade se mantém livre”(idem).

Aliás, desde a sua criação a UNDIME acompanhou as ações implantadas, tendo realizado, em 1999, Encontro Nacional dos Dirigentes Municipais para avaliar os “impactos da aplicação dos recursos do FUNDEF no Ensino Fundamental com todas

as suas implicações e o fez no intuito de fornecer à sociedade brasileira uma avaliação sobre a Lei do FUNDEF”78 (Avaliação, 1999). O material trabalhado teve como fonte dados coletados previamente junto às UNDIMEs estaduais, com vistas a verificar os benefícios trazidos pelo Fundo, fornecer elementos para aperfeiçoá-los, bem como apontar as distorções a serem corrigidas.

Com relação aos impactos financeiros do FUNDEF, foi destacado, dentre outros aspectos, o efeito redistributivo produzido a partir da realocação dos recursos disponíveis para a educação. Entretanto, igual relevo obtiveram o descumprimento da Lei, restringindo a complementação de recursos financeiros a oito estados e o congelamento do valor do custo-aluno em R$315,00, diminuindo a participação da União na constituição do Fundo. A ausência de novos recursos foi outro aspecto considerado, o que significaria ter havido, tão somente, redistribuição do dinheiro então existente.

No que concerne à Valorização do Magistério, a UNDIME reconhece ter havido ganhos significativos para o magistério naqueles municípios que estavam muito abaixo da média nacional e ampliação de oportunidades de qualificação profissional, mediante convênios com Universidades. Entretanto, destaca a falta de medidas para a habilitação dos professores das redes de ensino municipais. Além disso, constata que a restrição do FUNDEF ao Ensino Fundamental criou, na maioria dos casos, distorções salariais entre professores deste nível de ensino e os da Educação Infantil e da EJA. Uma dessas distorções foi a estratégia utilizada, por muitos municípios, de efetuar contratos precários de trabalho, não realizando concursos, promovendo reajustes sob forma de abono. Cerca de “noventa por cento do aumento que houve está

78 Para tanto, a entidade adotou dois mecanismos: “escolher, de todos os estados, por meio das UNDIMEs

estaduais, um relatório sobre a diversidade de resultados advindos da implantação do FUNDEF em seus municípios; e escolher em cada uma das regiões, um estado e, dentro dele, dois municípios com realidades diversas” ( O FUNDEF na Avaliação da UNDIME, março, 1999).

em forma de abono, porque todo mundo tem medo e, se sai o FUNDEF, tira-se o abono e volta-se ao salário anterior” (8º Fórum da UNDIME Nacional-2001).

A UNDIME considera perversos os impactos do FUNDEF na Educação Infantil e na EJA, pois em apenas um ano de implementação houve diminuição da oferta de vagas, pela retirada acelerada dos estados no atendimento a esse nível e modalidade de ensino. Na maioria das vezes, os estados sem negociação prévia com os municípios, decidiram não mais oferecer essas oportunidades educacionais, análise que se aplica igualmente à Educação Especial.

Outro aspecto de destaque, nesse processo avaliativo encaminhado pela entidade diz respeito “à fragilidade da fiscalização e do controle de aplicação do FUNDEF”. Em muitos estados, os conselhos foram formalmente instalados, tendo caráter oficialista, estando desarticulados, havendo casos de sonegação de informações, falta de confiabilidade na prestação de contas e malversação na utilização dos recursos.

É, no entanto, o artigo 6º da Lei do FUNDEF, que trata do valor do custo-aluno anual, que é motivo de todos os posicionamentos desta entidade. Consideram-no o calcanhar de Aquiles do Fundo, tendo em vista que a União “decreta valores mais baixos para que ela não tenha que entrar com recursos. Segundo dados da Comissão de Orçamento da Câmara, a União deixou de investir na aplicação do FUNDEF, de 1997 a 2001, R$8,15 bilhões”, conforme pronunciamento do Deputado Federal Gilmar Machado, durante o 8º Fórum da UNDIME Nacional-2001. Para este parlamentar, o “MEC está com uma equipe muito boa de marketing, mas os números comprovam que está havendo diminuição no investimento do Governo e se não tivermos uma reforma tributária, os municípios continuarão de pires na mão” (idem). Diante do descumprimento da União, a UNDIME diz que “é importante que haja um consenso entre nós para que nos unamos politicamente, visando ao enfrentamento dessas

questões” (ibdem), o que revela uma posição de antagonismo em relação ao MEC face ao descumprimento da Lei do FUNDEF que, diga-se de passagem, não obtivera apoio da entidade.

É assim possível dizer que embora não negue a importância do Fundo como mecanismo de promoção da municipalização do ensino e conseqüente reconhecimento da autonomia municipal no provimento do Ensino Fundamental, bem como no avanço da valorização do magistério, o que faria a UNDIME aderir à sua concepção, as formas de sua implementação geraram antagonismo.

De fato, tal como o CONSED, a UNDIME faz coro contra a inobservância da Lei, tornando o não cumprimento do papel suplementar da União pólo de delimitação de diferenças e, portanto, do delineamento de identidades. Desse modo, se a universalização do ensino pode ser entendida como ponto nodal, no que se refere à política educacional, a sua implementação, evidenciando separação entre concepção e ação, põe à mostra o quanto é difícil concretizar em uma determinada sociedade conquistas de natureza democrática. O discurso da CNTE tão somente reforçará essa interpretação.

4.2.3 – A CNTE: A EXPRESSÃO DOS TRABALHADORES EM