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PARTE I Os circuitos políticos da Corte

1.3. A posição sociopolítica do anfitrião na Corte

D. Rodrigo de Souza Coutinho foi nomeado para a Secretaria de Estado da Marinha e Domínios Ultramarinos em 7 de setembro de 1796, após ter passado dezessete anos ausente de Portugal como ministro plenipotenciário na Corte da Sardenha (1779-1796).111 Para compreender a importância de sua posição sociopolítica na Corte mariana serão analisados alguns aspectos de sua trajetória e de seus familiares. Particularmente, colocar-se-á o foco de atenção na sua correspondência privada, especialmente as cartas enviadas ao seu pai e aos seus irmãos, Mariana e José Antônio, que, em boa medida, permitem reconstruir os percalços de sua ascensão ao topo da administração central.

Nascido em Chaves, cidade próxima à fronteira de Portugal e Espanha, em 3 de agosto de 1755, D. Rodrigo era filho de D. Francisco Inocêncio de Souza Coutinho e de D. Ana Luísa Teixeira de Andrade da Silva.112 Com aproximadamente seis anos de idade foi enviado a Lisboa, junto com seu irmão mais novo, D. José Antônio, para ser educado pela avó, D. Maria Antônia de São Boaventura e Meneses. A família de seu pai gozava de grande distinção, com uma origem que podia ser encontrada na primeira dinastia de Portugal, em Martim Afonso Chichorro, um filho bastardo do rei D. Afonso III; e nos Souza, cujos integrantes eram tidos como os mais ricos do reino.113 Entre seus descendentes localizam-se Martim Afonso de Sousa, donatário da capitania de São Vicente, e Tomé de Souza, primeiro governador geral do Brasil, leais vassalos do rei D. João III.114

Seu avô, Rodrigo de Souza Coutinho Castelo-Branco e Meneses (1680-1748), era filho do 10o conde de Redondo, Fernão de Souza Coutinho e de sua mulher D. Luísa Simoa de Portugal, filha do 1o conde de Sarzedas. Sua avó, D. Maria Antônia, era filha de Roque Monteiro Paim, secretário e conselheiro do rei D. Pedro II, e de D. Joana Maria de Meneses. Senhora culta e conhecida por seu gosto pela escrita, D. Maria Antônia publicou uma

110

Cf. Jorge Pedreira e Fernando Dores Costas, op. cit., pp. 52-54.

111 Cf. Nívia Pombo Cirne dos Santos. "Um turista...".

112 D. Rodrigo era o terceiro filho. Antes dele, nasceram suas irmãs: Mariana, com quem trocou ao longo de sua

vida uma rica correspondência, e Luísa Margarida, falecida em idade tenra. Todos os dados relacionados à linhagem de D. Rodrigo podem ser apreciados em Andrée Mansuy-Diniz Silva. Portrait d'un homme d'État..., vol. 1, especialmente o capítulo 1, pp. 19-38.

113 Ibidem, pp. 19-20. 114

Apesar de Andrée Mansuy não incluir Martim Afonso de Souza e Tomé de Souza na árvore genealógica de D. Rodrigo, ambos descendem de Martim Afonso Chichorro. Essa ligação é feita pelo Marquês do Funchal. O

tradução do francês da obra História da Igreja do Japão em que se dá notícia da primeira entrada da fé naquele império, do padre João Crasset, e um pequeno livro de devoção, dedicado ao conde de Oeiras, futuro marquês de Pombal.115

A dedicatória do livro revela a fidelidade da família ao marquês de Pombal. Não é mera coincidência, portanto, que os filhos de D. Francisco Inocêncio tenham chegado à casa da avó no ano de reabertura do Real Colégio dos Nobres (1761-1837), instituição de caráter militar voltado para a educação dos filhos da nobreza de Portugal. Integrado ao conjunto das reformas educacionais capitaneadas por Sebastião José de Carvalho e Melo, seus estatutos traduzem bem o objetivo de preparar uma parcela da elite para a administração dos negócios do império: “os colegiais [...] que nele [Colégio dos Nobres] se conduzirem regularmente, serão por mim [o rei] atendidos com especialidade para os empregos e lugares públicos".116 A família Souza Coutinho matriculou quatro crianças na instituição: D. Rodrigo, seu irmão D. José Antônio de Souza Coutinho, seus primos D. José Maria do Carmo e Souza Botelho Mourão e D. Alexandre Domingos de Souza Holstein.117 Lealdade recompensada com as nomeações, na mesma ocasião, de D. Francisco Inocêncio de Souza Coutinho para o governo do reino de Angola (1764-1772) e, de seu cunhado, o morgado de Mateus, para a capitania de São Paulo (1765-1775).

Se a descendência paterna de D. Rodrigo tinha, entretanto, origem fidalga; a família materna não era tão nobre. D. Francisco Inocêncio não era o primogênito de seus pais e, ao invés de seguir a carreira eclesiástica como era costume, preferiu as armas. Para se casar foi preciso procurar capital, conseguindo ao unir-se em matrimônio a Ana Joaquina Luísa Teixeira de Andrade, filha de um fidalgo da Casa Real e mestre de campo do regimento de infantaria do Rio de Janeiro, Domingos Teixeira de Andrade e, de sua mulher, Maria Barbosa da Silva, filha de Matias Barbosa da Silva, um minhoto que fez fortuna nas Minas Gerais do começo do século XVIII, casado com uma senhora nascida no Brasil, Luísa de Sousa de Oliveira, com “defeitos mecânicos” inequívocos.118

115 D. Rodrigo foi enviado para Lisboa por volta de 1761, tinha aproximadamente 6 anos de idade, acompanhado

por seu irmão José Antônio, futuro Principal Souza, dois anos mais jovem. In Andrée Mansuy-Diniz Silva.

Portrait d'un homme d'État..., vol. 1, pp. 19-38. Sobre a sua avó e seu gosto pela escrita, cf. Portugal. Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Bibliográfico, Numismático e Artístico. Vol. 4. Lisboa: João

Romano Torres Editor, 1908, p. 1055.

116

Nívia Pombo Cirne dos Santos. D. Rodrigo de Souza Coutinho..., p. 117-118.

117 ANTT. Colégio dos Nobres. Registo de Colegiais. Livro primeiro de registo das entradas, saídas, profissões e

actos que fizerem os colegiais do Colégio Real de Nobres. (1765-1771).

118

Nuno Gonçalo Monteiro. "O ‘Ethos’ nobiliárquico no final do Antigo Regime: poder simbólico, império e imaginário social". In Almanack Braziliense, no 2, Nov. 2005, pp. 4-20, p. 18-19. Disponível em: http://www.almanack.usp.br/PDFS/2/02_forum_1.pdf. Acesso: 12/01/2010.

Matias Barbosa, de alcunha o “Cabeça de Ferro” era um homem riquíssimo. Por volta de 1700 recebeu uma sesmaria do governador de Minas Gerais e do Rio de Janeiro, Artur de Sá e Meneses (1697-1702), pelo reconhecimento dos serviços prestados à Coroa na ocasião da disputa entre Portugal e Espanha em torno da Colônia do Sacramento em 1680. Nestas terras foi instalado o Registro de Matias Barbosa, considerado o mais rendoso e importante da colônia. Faleceu em Vila Rica em 1742, deixando uma grande fortuna em ouro, prata e escravos.119 Patrimônio que em parte foi transferido ao genro Domingos Teixeira, como atesta uma das testemunhas inquiridas no processo de partilha de seus bens, por volta de 1760:

[...] O Sargento-mor de batalha Domingos Teixeira de Andrade, pai e sogro dos justificantes, era das pessoas da principal nobreza desta província, com o foro de fidalgo e cavaleiro da Ordem de Cristo, possuindo grossos cabedais por si, e como herdeiro de seu sogro Matias Barbosa da Silva, em forma que tinha a fama de um dos homens do maior e mais avultado cabedal do reino.120

A fortuna de Ana Luísa Joaquina, no entanto, não foi suficiente para convencer os Souza Coutinho do casamento, provavelmente, avessos à união de um dos seus filhos com uma família suspeita de "defeitos mecânicos". Uma delas relaciona-se à existência de dois documentos diferentes que registram o enlace: o primeiro, de 6 de abril de 1748, revela uma cerimônia realizada na residência do sogro, Domingos Teixeira, em Contins, Trás-os-Montes. O segundo celebrado em 27 de abril na Espanha, na Igreja de Santa Maria Lober, na província de Zamora.121 A família também viveu distante, em Chaves primeiramente, depois em Contins, e, apesar de manterem uma residência em Arroios, não há evidências de que Ana Luísa, mãe de D. Rodrigo, tenha frequentado a Corte em Lisboa.122 É possível que D. Francisco Inocêncio tenha optado por viver afastado dos murmúrios da capital. Em carta de 2 de abril de 1779 dirigida a Frei Inácio de São Caetano, arcebispo de Tessalônica, D. Francisco Inocêncio desabafou seu ressentimento pela incompreensão de seus parentes:

Nasci tão pobre como filho segundo de uma Casa pobre; pelo meu casamento se levantaram contra mim todos os meus parentes, de sorte que ao aparecer no mundo não tive nenhuma linha de herança de meus pais, nem a mais leve proteção dos mesmos [...] O meu procedimento, o meu desinteresse, e a minha honra me

119

Nívia Pombo Cirne dos Santos. D. Rodrigo de Souza Coutinho..., p. 26; ainda sobre as origens de Matias Barbosa, cf. Cf. Pedro Calmon. “Nogueira da Gama, sua origem, sua vida, suas memórias”. Rio de Janeiro:

Revista do Instituto Histórico Geográfico Brasileiro. Anais do Congresso de História do Segundo Reinado, vol.

2, pp. 257-430.

120

ANTT. Desembargo do Paço (Estremadura-Corte-Ilhas). Próprios, maço 196, n. 22.

121 Andrée Mansuy-Diniz Silva. Portrait d'un homme d'état..., vol. 1, p. 30.

conduziram aos grandes empregos [...] e não devendo nada aos que me viram nascer, venho só a dever tudo à minha Augusta Ama [...].123

A mácula na linhagem passaria a ser uma sombra na carreira dos filhos de D. Francisco Inocêncio. D. Rodrigo de Sousa Coutinho, que em mais de uma ocasião traçou comentários acerca do casamento de seus pais, em uma carta ao seu irmão José Antônio, escreveu que mesmo "amando menos do que ninguém o dinheiro", teria

[...] maior escrúpulo de lesar os meus sucessores de um real daquilo que constituía o seu fundo. Se assim tivessem pensado o meu avô materno [Domingos Teixeira] e meu pai, considera qual seria agora a nossa riqueza e o nosso fundo. Eu escrevi outro dia a meu pai, dizendo-lhe que preferiria a sucessão inteira e intacta de meu bisavô a quantos títulos e bens de Coroa que pudessem jamais vir, mas que igualmente tinha assaz força de espírito para desprezar os males que não podia remediar.124

A mancha na linhagem mostrou-se pública e notória, quando os irmãos de D. Rodrigo precisaram pleitear títulos e funções no real serviço. D. Francisco Maurício, filho mais novo de D. Francisco Inocêncio, precisou falsificar sua ascendência para ingressar na Ordem de Malta – uma das mais castiças de Portugal que exigia votos de castidade, pobreza e obediência –, fazendo-se passar por bisneto de outro Matias Barbosa, senhor de engenho, fidalgo da casa real e natural da Bahia.125 Quanto a José Antônio de Meneses, sua trajetória para o ingresso na Sé Patriarcal de Lisboa foi marcada por vários percalços. Em 1784, D. Rodrigo queixou-se com sua irmã Mariana de saber que José Antônio, o "monsenhor mais antigo, de mais luzes, de melhor procedimento e mais digno", tenha sido preterido por outros "a quem a anterior vida, e os talentos, dariam justamente uma inteira exclusão".126

Para D. Rodrigo a razão para a recusa de seu irmão estava diretamente relacionada com o problema da linhagem. Situação que descreveu em detalhes ao ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Pinto de Sousa:

[...] As últimas cartas que acabo de receber da minha família me obrigam a pedir a Vossa Excelência queira por humildemente na Augusta presença de Sua Majestade outra nova representação a respeito de meu irmão Monsenhor, que vi agora ser preterido na nomeação de Principais: o que pouco importará se a voz pública de

Lisboa o não ultrajasse, dizendo que isto nasce dele não ter um nascimento

123 Carta de Francisco Inocêncio de Souza Coutinho à Frei Inácio de São Caetano. Madri, 2 de abril de 1779. In

ibidem, pp. 357-358.

124

Carta de D. Rodrigo ao seu irmão José Antônio. Turim, Fevereiro de 1780. Publicado in Andrée Mansuy- Diniz Silva. Portrait d'un homme d'état... vol. 1, pp. 495-496.

125 Luiz de Mello Vaz de São Payo. “Indevida admissão na Ordem de Malta: D. Francisco Maurício de Sousa

Coutinho”, Revista Filermo, Lisboa, v. 3, 1994, pp. 83-100.

126 Carta de D. Rodrigo à Mariana. Turim, 28 de abril de 1784. Publicado in Andrée Mansuy-Diniz Silva. Portrait d'un homme d'état..., vol. 1, pp. 518-519.

correspondente àquele lugar; donde resulta ficar assim injustamente infamada toda a família, que perfeitamente conhece a origem de uma voz que nasce de pessoas que

se amam mais entre si do que o Estado, que se reputam elas só nobres, e que

finalmente não fariam tanto motim nos primeiros tempos da monarquia quando os Souzas tinham a honra de ver sobre as sepulturas dos seus avós os tijolos de parentes dos Augustos Soberanos [...]. 127

A "voz pública de Lisboa" assumia o papel de reacender a memória coletiva, preservando os valores de uma parcela específica da sociedade, neste caso, as tradições da fidalguia portuguesa e seu estatuto de limpeza de sangue. Vozes que nasciam de pessoas que "se amam mais entre si" e "se reputavam elas só nobres", deixando de lado os serviços de famílias como a dos "Souza Coutinho" que há séculos serviam ao rei com lealdade. Nem mesmo o tempo e a distância que a família vivia da Corte eram capazes de abafar os murmúrios de uma linhagem que se perdeu em um casamento mal arranjado. D. Rodrigo, ao contrário, recorria ao talento de seu irmão José Antônio, afirmando serem suas "luzes" a razão principal de sua aptidão para seu ingresso para Principal da Igreja Patriarcal de Lisboa. Confiando na importância dos méritos de seu irmão e de seus antepassados, elaborou sua defesa:

[...] queira humildemente representar a Sua Majestade que a exclusão que se pode dar a meu irmão pode só nascer da minha avó e de minha mãe. A primeira é filha de um homem que serviu muitos anos o Estado com grande distinção [...] A segunda é filha de um homem que, depois de servir com a maior distinção na guerra do princípio do século [...] morreu governando as armas da província de Trás-os- Montes [...]. Se dois tão honrados progenitores excluem meu irmão da honra a que pode chegar o nosso tronco principal, isto é a Casa de Redondo [...] então confesso que a infâmia que querem fazer recair sobre nós é justa [...] [peço] que se declare que não é a sua qualidade quem lhe impede o acesso àquele lugar, mas uma infelicidade de família.128

A situação da família revelava a insegurança de D. Rodrigo quanto ao futuro da casa pela qual tinha por obrigação zelar.129 A distância do centro de poder dificultava uma pressão direta junto ao rei e, por essa razão, contou com a ajuda de seus irmãos Mariana e José Antônio; de amigos de seu pai, como Frei Inácio de São Caetano, o arcebispo da Tessalônica e confessor de D. Maria I; e dos poderosos ministros que ocuparam a pasta da Secretaria de Estado da Marinha e Domínios Ultramarinos: Ayres de Sá e Melo, Martinho de Melo e Castro e Luís Pinto de Souza. Mas lamentava as resistências e oposições dos inimigos na Corte:

127 ANTT. Ministério dos Negócios Estrangeiros. Legação Turim, caixa 863. Carta de 20 de dezembro de 1788.

Publicado in Andrée Mansuy-Diniz Silva. Portrait d'un homme d'état..., vol. 1, pp. 211-212. Grifos nosso.

128

Ibidem.

129 Ibidem. Sobre as dificuldades financeiras da Casa e as dívidas da família, ver especialmente o capítulo IX

[...] Lembro-me de ouvir os detratores da memória de Pombal queixar-se da preferência que dava sempre aos seus amigos, e hoje vejo que os que mais se queixam debaixo de qualquer Ministério, são sempre os mesmos que tendo o poder, fariam atos de maior força, e que mais facilmente se esqueceriam da estrita justiça.130

A correspondência de seu pai D. Francisco Inocêncio revela que, após a saída do marquês de Pombal do ministério, Ayres de Sá e Mello passou a ser o principal benfeitor da família Souza Coutinho. Um dos ministros da transição do período josefino para o mariano, Ayres de Sá acumulava amplos poderes por chefiar duas Secretarias de Estado, a dos Negócios do reino (1777-1785) e a dos Negócios Estrangeiros e Guerra (1775-1786). D. Francisco Inocêncio confiava a ele o encaminhamento do filho ao real serviço, agradecendo com frequência a atenção do ministro com o seu filho D. Rodrigo. A proteção incluía o zelo com sua família em sua ausência:

[...] devo segurar que a ambição de riquezas me não guiou a escrever-lhe, e é sim a fome da minha família; não há quinze dias que um médico que cura em minha casa me escreveu que vira minha mulher quase morta em um acidente que lhe deu a ler uma carta minha, que em resposta às suas aflições lhe fazia, segurando-lhe a não podia remediar em nada: tenho servido quase trinta anos, e cuido que na Secretaria, e no Erário se sabe bem o proveito da Coroa com que o fiz; os meus inimigos

sempre cruéis comigo procuraram afastar-me toda a consolação, e só a tenho quando

vejo, que triunfará a piedade e a grandeza de uma Augusta Rainha.131

A convicção de D. Francisco da existência de "inimigos cruéis" na Corte se traduz na incerteza quanto ao futuro da família e das carreiras dos irmãos Souza Coutinho. Dúvidas que se evidenciam ao ser focada a atenção em D. Rodrigo: afinal, por que ele se manteve por dezessete anos em assistência diplomática em uma Corte pouco expressiva no quadro das potências europeias, sem grandes benefícios honoríficos e financeiros a sua casa?132 Insatisfeito com as despesas de um ofício mal remunerado e impossibilitado de cuidar dos rendimentos dos bens da família, D. Rodrigo, com a ajuda de seu irmão, tentou formar arranjos políticos que permitissem nomeações para cargos mais atraentes. Uma primeira tentativa ocorreu em 1782, quando decidiu acatar uma sugestão de José Antônio para um governo colonial: "dos governos da América, só quereria o Vice-reinado do Rio de Janeiro se

130

Ibidem. Carta de D. Rodrigo à Mariana. Turim, 28 de abril de 1784, pp. 518-519.

131 Ibidem. Carta de D. Francisco de Souza Coutinho a Ayres de Sá e Mello. 30 de janeiro de 1778, p. 352.

Grifos nossos.

132

Ibidem. Os emolumentos dos enviados extraordinários eram menores do que dos ministros plenipotenciários. As despesas com a legação de Turim eram altas e D. Rodrigo queixou-se com frequência de sua "penúria" financeira nas cartas aos seus irmãos. Ver especialmente as cartas escritas de Turim para seus irmãos, p. 401 e ss.

me o dessem, que agora facilmente o proverão a alguém, e que daria este passo para bem comum, apesar da repugnância que tenho ao mar".133

O governo do Rio de Janeiro traria acrescentamentos a casa, pois o cargo de vice-rei era, com frequência, recompensado com um título nobiliárquico. Aos poucos, a ideia de um governo na América converteu-se na possibilidade de cuidar do patrimônio deixado por herança por seu bisavô, Matias Barbosa e, para além do Vice-reinado, D. Rodrigo passou a nutrir interesse por um governo em Minas Gerais:

Siga-se enfim o teu plano, e vejamos se ao menos podemos obter o Governo de Minas ou o do Rio de Janeiro para restabelecer as fazendas que ali nos restam, vendendo-as convenientemente [...] O Rio de Janeiro seria muito mais útil, mas Minas Gerais não deixariam de ser convenientes. Enfim, a utilidade é também tua, e o plano teu, assim bem o podes trabalhar, e tocar-me-á a mim arranjar depois as fazendas que ainda lá restam.134

A solicitação dos ofícios foi feita em 1783 em carta endereçada a Ayres de Sá e Melo e outra ao arcebispo da Tessalônica, conforme anunciou D. Rodrigo a sua irmã Mariana em 12 de março de 1783. Mais uma vez reforçou a ideia de que era essa a forma de "ir arranjar lá [na América] os nossos negócios", justificando sua atitude, "pois enfim em um país onde toda a nobreza é mercenária e dependente da Coroa, só nós é que não havemos de ter coisa alguma, e é preciso pensar em tornar-nos ao que é nosso". D. Rodrigo não recebeu respostas sobre suas pretensões, apesar da influência de seus protetores junto à rainha D. Maria I.

Como as análises quantitativas demonstram, as nomeações para as regiões mais importantes do império, como o Rio de Janeiro e Minas Gerais, estavam reservadas aos fidalgos do reino, especialmente aos filhos segundos de casas tituladas.135 Considerando que naquele momento a mácula da linhagem circulava os corredores do Palácio de Queluz, pode- se considerar que a recusa para a nomeação também estivesse relacionada a este fato. Dentro da lógica do sistema de Corte, na qual o rei funcionava como um equilibrador do sistema, se pode pensar que o benefício se faz para os que estão mais próximos e exercem maior pressão.