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A história natural e o tratamento das MAVs são objetos de contínuos debates, e, para capturar a totalidade dessas lesões complexas, patologias vasculares associadas, como os aneurismas, precisam ser implementadas em modelos de estratificação de risco, pois acredita-se que representem fatores de risco adicionais para evento de HIC (STEIN et al., 2016; STEIN et al., 2015). Aneurismas relacionados às MAVs ocorrem em cerca de 15% dos pacientes, já tendo sido demonstrado que estes podem aumentar de forma independente o risco de hemorragia futura (AGUIAR et al., 2012; DA COSTA et al., 2009; MARKS et al.,1990; PERATA; TOMSICK; TEW JR., 1994; REDEKOP et al., 1998). As MAVs são associadas à presença de aneurismas intracranianos em uma incidência maior em comparação com a frequência individual de ocorrência de cada aneurisma (RAMMOS et al., 2016).

Existem indícios de que os aneurismas associados às MAVs não são tão raros como se pensava anteriormente, e a identificação de aneurismas intracranianos em associação com MAVs aumentou com a melhora nas técnicas de diagnóstico por imagem (PLATZ et al., 2014; RAMMOS et al., 2016). Conforme Stapf et al. (2002b), a alta taxa de aneurismas arteriais simultâneos verificada em pacientes com MAVs levantou hipóteses sobre uma possível etiologia comum entre estas duas lesões vasculares. Porém, na opinião de Morgan et al. (2016), os aneurismas associados às MAVs, especialmente os de localização proximal, seriam

causados provavelmente por anormalidades hemodinâmicas adquiridas, ao invés de um fator etiológico comum com a MAV. Segundo tais autores, essa teoria é apoiada pela maior idade dos pacientes portadores de MAVs com aneurismas associados e pela distribuição desses aneurismas ser proporcional à circulação envolvida na irrigação da respectiva MAV.

Os aneurismas associados às MAVs diferem dos aneurismas espontâneos em geral em vários aspectos, o que pode estar relacionado à hemodinâmica intracerebral patológica induzida pela MAV (PLATZ et al. 2014). Por exemplo, muitos aneurismas associados às MAVs estão localizados mais distantes do polígono de Willis em comparação a aneurismas espontâneos em geral (PLATZ et al., 2014). A presença destes aneurismas concomitantes às MAVs influencia as decisões de tratamento e de manejo agudo do paciente (tratamento invasivo vs. conservador) (STAPF et al., 2002b). Por isso, em casos de ruptura e hemorragia, é importante sempre tentar distinguir qual a fonte do sangramento, ou seja, se foi a própria MAV ou um aneurisma associado (MORGAN et al., 2017). Nos últimos anos, esforços foram feitos para capturar a história natural das MAVs, bem como identificar aneurismas com potencial capacidade de regressão após o tratamento das MAVs, porém muitos aspectos ainda não foram compreendidos (STEIN et al., 2015).

Os aneurismas intracranianos podem conferir maior risco de hemorragia na apresentação e de nova hemorragia (no follow-up) em pacientes com MAVs e, portanto, podem estar associados a uma história natural mais desfavorável, colocando a associação de MAVs e aneurismas intracranianos como um desafio terapêutico importante (CAGNAZZO; BRINJIKJI; LANZINO, 2016; RAMMOS et al., 2016). Compreender o verdadeiro risco que os aneurismas arteriais representam em pacientes portadores de MAVs é difícil, devido ao fato de que várias classificações diferentes foram relatadas, todas baseadas na relação anatômica e fisiopatológica entre as MAVs e os aneurismas (CAGNAZZO; BRINJIKJI; LANZINO, 2016).

Uma revisão sistemática realizada por Cagnazzo, Brinjikji e Lanzino (2016) avaliou estudos que examinaram a associação entre aneurismas e MAVs. Esta revisão incluiu 44 artigos e um total de 10.093 MAVs, enquanto que a proporção de MAVs com um aneurisma associado foi de 20,2%. Em geral, 50% das MAVs incluídas na revisão sistemática apresentaram hemorragia. No entanto, 63,6% das MAVs com aneurismas associados apresentaram hemorragia. Entre as MAVs rotas com aneurismas associados, o aneurisma foi a fonte de hemorragia em 49,2% dos

casos, e o nidus da MAV foi a fonte de hemorragia em 45% dos casos. A taxa de aneurismas associados às MAVs relacionados ao fluxo foi de 71,4%, e estes foram a fonte mais comum de ruptura dos aneurismas estudados (78,5%). Os aneurismas infratentoriais associados às MAVs apresentaram maior risco de ruptura (60%) quando comparados com lesões supratentoriais (29%) (CAGNAZZO; BRINJIKJI; LANZINO, 2016).

Na meta-análise de história natural das MAVs realizada por Gross e Du (2013), a incidência de aneurismas associados foi de 18%, assim como a presença de um aneurisma associado aumentou o risco de apresentação hemorrágica de MAVs em um fator de 1,8. Redekop et al. (1998) revisaram 632 casos de MAVs cerebrais, encontrando uma incidência de 5,5% de aneurismas intranidais, uma incidência de 11,2% de aneurismas relacionados ao fluxo (sediados em artérias que nutrem a lesão) e uma incidência de 0,8% de aneurismas não relacionados às MAVs. Cunha e Sa et al. (1992) reportaram série com 400 pacientes com MAVs, encontrando incidência de 10% de aneurismas associados. Turjman et al. (1994) associaram a presença de aneurismas concomitantes às MAVs com apresentação hemorrágica, observando que 55,1% das MAVs com aneurismas associados se apresentaram com hemorragia, enquanto que 19% das MAVs sem aneurismas tiveram apresentação hemorrágica.

O estudo de Stein et al. (2015) teve como objetivo determinar as características angiográficas e clínicas dos aneurismas associados às MAVs cerebrais. Somente MAVs de localização supratentorial, apresentando aneurismas associados do tipo relacionados ao fluxo das artérias nutridoras da respectiva MAV, foram avaliados. Do total de 409 pacientes portadores de MAV supratentorial, 59 pacientes (14%) demonstraram 85 aneurismas associados do tipo relacionado ao fluxo das artérias nutridoras da MAV. A HIC foi encontrada em 21 (36%) dos 59 pacientes portadores de MAVs supratentoriais e aneurismas associados. Entre estes, 10 indivíduos (17%) sofreram hemorragia devido à ruptura de um aneurisma associado, o que representou quase metade de todos os sangramentos neste subgrupo (STEIN et al., 2015).

Em contrapartida, os aneurismas associados às MAVs e localizados em artérias não relacionadas a estas malformações, parecem estar associados aleatoriamente com as MAVs, apresentando risco hemorrágico semelhante ao dos aneurismas na população geral, e, portanto, sua presença não parece afetar o risco

de hemorragia em MAVs (RAMMOS et al., 2016). Kretschmer e Heros (2011) reportaram que quando os aneurismas são pós-nidais ou remotos (distantes, não relacionados às MAVs), o risco de ruptura parece ser menor. Os verdadeiros aneurismas arteriais intranidais nas MAVs devem ser distinguidos dos pseudoaneurismas, os quais se localizam no ponto de ruptura do nidus ou da drenagem venosa (COGNARD; SPELLE; PIEROT, 2010). A localização dos pseudoaneurismas arteriais indica o local exato da ruptura e representa ponto de fraqueza da parede do vaso (RAMMOS et al., 2016). Adicionalmente, os pseudoaneurismas podem mostrar aumento progressivo em angiografia de controle (RAMMOS et al., 2016). Mais detalhes sobre os aneurismas associados às MAVs cerebrais e seu papel como fator de risco para hemorragia relacionado a essas malformações serão discutidos mais adiante neste trabalho.