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A Proposta ‘Decolonial’

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3.1 A ESPERANÇA E SEUS REFLEXOS TANGÍVEIS

3.1.3 A Proposta ‘Decolonial’

Vamos propor uma crítica epistemológica, por acreditar na necessidade de ir além das bases metodológicas e identificar os fatores normativos que compõe o labor científico, seus pressupostos e construções sociais.

Através da abordagem de Quijano (2005) identificamos que a globalização resulta da formação da américa e do capitalismo colonial/moderno eurocêntrico, isso

se configura pela proporção do poder empregado no projeto colonial e de forma duradoura nas legitimidade racional.

Esse poder se apossou de diversos fatores culturais vantajosos para seu sistema e reprimiu “as formas de produção de conhecimento dos colonizados, seus padrões de produção de sentidos, seu universo simbólico, seus padrões de expressão e de objetivação da subjetividade” (QUIJANO, 2005, p. 121).

As formas dominação colonial na história europeia, levam em consideração as identidade filosóficas desde o renascimento e a difusão do conceito de “filosofia (e teologia), como uma arma que mutilou e silenciou raciocínios similares da África e de populações Indígena no Novo mundo” (MIGNOLO, 2008, p.298).

Compreensão arraigada no pensamento teológico dos europeus, pois as discussões a respeito da alma são condicionantes para a forma como se vê o outro:

De acordo com o mito do estado de natureza e da cadeia do processo civilizatório que culmina na civilização européia, algumas raças –negros (ou africanos), índios, oliváceos, amarelos (ou asiáticos) e nessa seqüência– estão mais próximas da “natureza” que os brancos. Somente desta perspectiva peculiar foi possível que os povos não-europeus fossem considerados, virtualmente até a Segunda Guerra Mundial, antes de tudo, como objeto de conhecimento e de dominação/exploração pelos europeus. (QUIJANO, 2005, p.129)

Por ser tão profunda, a proposta epistemológica do domínio da colonial não se extingue a partir do momento em que o domínio da colônia deixa de existir. Seus mecanismos de poder ainda se fazem presentes nas nações pós-coloniais.

Todos esses fatores culminaram na geração de uma equivoca “perspectiva temporal da história” onde os europeus buscam se situar “suas respectivas histórias e culturas, no passado de uma trajetória histórica cuja culminação era a Europa “(QUIJANO, 2005, p.121). Onde por conseguinte “os povos colonizados eram raças inferiores e –portanto– anteriores aos europeus” (QUIJANO, 2005, p.122).

Estas categorias de identidade eurocêntrica apresentam raiz colonial “racista e patriarcal, por negar o agenciamento político às pessoas classificadas como inferiores (em termos de gênero, raça, sexualidade, etc.)” (MIGNOLO, 2008, p. 287).

Tendo em vista toda essa centralidade da Europa no controle do mercado mundial, ao impor seu domínio sobre outra regiões do planeta, as comunidade foram incorporadas ao seu “sistema-mundo”, constituindo um padrão de poder:

Para tais regiões e populações, isso implicou um processo de re-identificação histórica, pois da Europa foram-lhes atribuídas novas identidades geoculturais. (QUIJANO, 2005, p.121)

Todas as experiências, histórias, recursos e produtos culturais culminavam na teia articulada do sistema previamente estruturado, sistema este centrado na ‘hegemonia europeia’, distanciado da realidade factual dos colonizados.

Diante do exposto e pretendendo construir novas perspectivas de conhecimento, podemos oferecer um pensamento alternativo para tal identidade. A propostas ‘decolinial’ e um conceito que leva em consideração essa possibilidade:

O pensamento descolonial é a estrado para a pluri-versalidade como um projeto universal. O Estado pluri-nacional que os indígenas e os afros reivindicam fica nos Andes, é uma manifestação particular do maior horizonte de pluri-versalidade e o colapso de qualquer universal abstrato apresentado como bom para a humanidade inteira, sua própria similaridade. Isto significa que a defesa da similaridade humana sobre as diferenças humanas é sempre uma reivindicação feita pela posição privilegiada da política de identidade no poder. (MIGNOLO, 2008, p.300)

A partir dela oferecer espaço para sujeitos, que até então foram destituídos do ‘poder de fala’, é uma forma de deparar-se com múltiplas vozes:

Central ao projeto político-acadêmico da decolonialidade é o reconhecimento de múltiplas e heterogêneas diferenças coloniais, assim como as múltiplas e heterogêneas reações das populações e dos sujeitos subalternizados à colonialidade do poder. A dominação colonial seria, portanto, o conector entre diversos lugares epistêmicos. (BERNARDINO-COSTA e GROSFOGUEL, 2016, p. 21)

Caminhar para uma desconstrução dessas barreiras é também ir contra o discurso colonial, ideal claro na afirmação de Richter Reimer (2006, p. 96):

Nessa construção contracultural, colocam-se também a fé e a teologia, a construção e a vivência do simbólico e comunitário como representação do Sagrado, no qual se crê e o qual embala os corações para perseverar nesta construção de novas práticas, de um lugar, no qual se torne possível simplesmente ser feliz!

Essa perspectiva revela identidades sociais escondidas, categorias de pensamento que foram subalternas e desqualificadas “pela hegemonia das categorias de pensamento, histórias e experiências do ocidente” (MIGNOLO, 2008, p.297).

Além disso, a perspectiva decolonial também propõe um diálogo intercultural, incorporando as formulações do conhecimento as experiências de povos indígenas e comunidades negras, no intuito de buscar soluções para os problemas enfrentados especificamente por essas comunidades:

Ao contrário, o projeto decolonial reconhece a dominação colonial nas margens/ fronteiras externas dos impérios (nas Américas, no sudeste da Ásia, no norte da África), bem como reconhece a dominação colonial nas margens/fronteiras internas dos império, por exemplo, negro e chicanos nos Estados Unidos, paquistaneses e indianos na Inglaterra, magrebinos no França, negros e indígenas no Brasil etc. (BERNARDINO-COSTA e GROSFOGUEL, 2016, p.20)

Todo o contexto de filosofia e teologia da libertação, juntamente com os étnico-latinos, formaram ferramentas suficientes para romper coma a hegemônica dominação colonial, abrindo caminho para efetivas mudanças no nosso século através de interculturalidade:

A interculturalidade deve ser entendida no contexto do pensamento e dos projetos descoloniais. Ao contrário do multiculturalismo, que foi uma invenção do Estado-nacional nos EUA para conceder “cultura” enquanto mantém “epistemologia”, inter-culturalidade nos Andes é um conceito introduzido por intelectuais indígenas para reivindicar direitos epistêmicos. A inter-cultura, na verdade, significa inter-epistemologia, um diálogo intenso que é o diálogo do futuro entre cosmologia não ocidental (aymara, afros, árabe-islâmicos, hindi, bambara, etc.) e ocidental (grego, latim, italiano, espanhol, alemão, inglês, português). Aqui você acha exatamente a razão por que a cosmologia ocidental é “uni-versal” (em suas diferenças) e imperial enquanto o pensamento e as epistemologias descoloniais tiveram que ser pluri-versais: aquilo que as línguas e as cosmologias não ocidentais tinham em comum é terem sido forçadas a lidar com a cosmologia ocidental (mais uma vez, grego, latim e línguas européias imperiais modernas e sua epistemologia). (MIGNOLO, 2008, p.316)

Criando então diversos mecanismos para viabilizar essa operação, configurando um habilidoso processo de dominação intersubjetiva, se apossando de todos os processos culturais considerados vantajosos para o sistema capitalista, e reprimindo “as formas de produção de conhecimento dos colonizados, seus padrões de produção de sentidos, seu universo simbólico, seus padrões de expressão e de objetivação da subjetividade”. (QUIJANO, 2005, p.121)

Tais teorias estruturais precisam ser expostas através da identidade de pensamento próprio, oriundas dos conhecimentos e sabedorias locais, isso configura- se também como processo de resistência epistêmica.

Portanto, é plausível condizer nossa pesquisa com saberes populares, levando em consideração a desobediência epistêmica sugerida por Mignolo (2008), pois sem ela não será possível o desencadeamento epistêmico e ficaríamos presos aos conceitos modernos eurocêntricos. Deste modo, a proposta ‘decolonial’ que fazemos, está relacionada à quebra das amarras científicas impostas.

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