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Economia, Patriarcado e Sociedade

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2.2 DECIFRANDO O FUTURO MEDIANTE FACTUAL PRESENTE

2.2.1 Economia, Patriarcado e Sociedade

Usando como referência as memórias de seu Joaquim (2017), encontramos informações que correspondem à questões sociais e econômicas da comunidade quilombola do Engenho II, pois o mesmo, ao lembrar do passado ele disponibiliza informações sobre seu pai Domingos, falecido a mais de 20 anos:

Meu pai só vivia assim mudava de um ponto e ia pro outro, quando ia, ia com galinha, com porco. Assim a vida intirinha até o dia que Deus tirou ele. Ai ele ficava assim, um ano num lugar, e quando não tava bom ribava ia pra outro ponto ficava um ano dois ano, num tava bom tornava sair. (JOAQUIM, 2017) A forma como seu pai se comportava, mudar-se para encontrar o melhor espaço para produzir, se dava comumente entre os camponeses por buscar manter sua produção. Desta forma implicava também nas relações sociais e de parentesco, dentre elas as informações da responsabilidade que seu Joaquim tinha ainda jovem:

Meus irmão, nois era nove irmão dentro da casa lá. Depois que eu dei conta assim, a maioria dos meus irmão fui eu que criei, assim com eles lá, os criador. Ai eu ajudei a trabalhar mais, por que meu pai já tava fraco né, e forçava um bocado, ai um bocado do meus irmão eu ajudava a criar, ajudei eles né. (JOAQUIM, 2017)

Da mesma forma se dá o pano de fundo histórico da comunidade cristã primitiva, que compreende o presente ao unir representações simbólicas em torno de uma visão de mundo. Assim, a força oposta no campo, em um nível histórico, “é o reflexo da situação de dominação que o povo vive, de falta de liberdade, da exploração e espoliação de impérios que sucedem na cena internacional” (NOGUEIRA, 2005, p. 115).

O autor do Apocalipse, ao desenvolver um texto com toda a complexidade que se propõe, observa Kraybill (2004, p. 19) que “João de Patmos teve percepção suficiente para ver que a grandeza política e econômica de Roma atraía alguns seguidores de Jesus” e agir para fortalecer os cristãos mediante o livro.

Sistematizada por Vielhauer (2005, p. 531), a ameaça do estado e a resposta do livro para as situações de conflito revela que:

O Apocalipse, que provavelmente surgiu no início da chamada perseguição domiciana (93-95 d.C.) na Ásia Menor, tem por finalidade fortalecer os cristãos nessas dificuldades para uma perseverança fiel e para um testemunho confessante.

Então, a descrição do cenário seguida pela voz de alerta em Ap 18,3-9, evidencia “a motivação da postura anti-romana do profeta João, encontrar-se-ia, portanto, em sua crítica das relações econômicas e políticas de Roma com as

províncias” (NOGUEIRA, 2003, p. 225) e a necessidade dos crentes em cristo se distanciarem deste sistema econômico.

Nesta mesma lógica de distanciamento, a produção econômica que encontramos no Engenho II se organiza, é através da subsistência que ela encontra seu espaço econômico alternativo, como descreve seu Joaquim (2017), “é igual a gente fala, a gente vende o cumê pra compra o cumê”, evidenciando a relação de troca mútua entre os integrantes da comunidade.

Desta forma, quando adentramos a organização econômica do Engenho II, grande parte das produções econômicas são permutadas sem necessariamente envolver qualquer tipo de moeda:

As vezes cê vende um saco de milho cê compra dois quilo de carne, é assim que nois faz aqui. Cê vende um saco de arroz pra compra uma carne, Cê vende um mei saco de feijão pra comprar o óleo o açúcar, o sabão, e essas coisa assim. (JOAQUIM, 2017)

O Cristão primitivos também criaram sistemas alternativos em razão do sistema de colonização romano. Richter Reimer (2006, p. 82) propõe que “a governabilidade do Estado deve ser garantida por meio do exercício de poder e dominação de homens livres e proprietários” evidenciada pela economia, mas também por aspectos de gênero, que regula as práticas pessoais, com objetivo de evitar o “‘caos’ que poderia acontecer num Estado, onde houvesse liberdade e igualdade para todas as pessoas”.

Ao consideração a categoria de gênero significativa para a análise social, Richter Reimer (2000, p. 23) enxerga a possibilidade de “nossas experiências cotidianas sejam levadas a sério como fonte e reflexão teológicas, como processo decisório de exercício da cidadania” e oposição ao sistema vigente.

Essa representação é presente desde os primórdios do cristianismo, ao se permitir reconhecer o protagonismo das mulheres como elemento de resistência na história narrada nos evangelhos, em particular observação no evangelho de Lucas:

Por lo tanto, Lc 1-2 y Lc 24, establecen las bases teológicas, histórico- sociales sobre las cuales se construye el camino de Jesús y de las comunidades originarias con la participación decisiva e igualitaria – grandemente autónoma– de las mujeres. (RICHTER REIMER, 2003, p. 34) Quando nos deparamos ao sistema que exerce poder, o que as pessoas encontram “não é um mundo espontâneo, onde cada qual faz o que quer e como quer, mas é extremamente regrado em funções e poderes” (NOGUEIRA, 2003, p. 53) coloniais, regidos por uma lógica de dominação pautada no androcentrismo.

Que vai de encontro com a organização camponesa, que apresenta a terra, geralmente, referia a mulher, configurada pelo espaço onde atualmente todos estão lutando pela terra, trabalho e vida, e contra a força desagregadora da expansão capitalista, que leva muitos a migrarem para as periferias dos centros urbanos.

Do mesmo modo, a identidade do “patriarcado romano, portanto, é de dominação e ocupação geopolítica, de exploração de recursos naturais e humanos, de violência física, sexual e psicológica” (RICHTER REIMER, 2006, p. 74) subjugando assim, grupos minoritários nas relações de poder e expropriando outras formas de conceber as relações humanas.

Dentre todas as obrigações para com Roma, algumas são específicas, segundo Nogueira (2003, p. 146) “os romanos impõem aos judeus um imposto chamado fiscus judaicus. Vespasiano determina que os judeus do Império paguem anualmente duas dracmas ao templo de jupiter capitolinus” como forma de tributos aos judeus.

De modo geral, existiam outras formas de cobranças, como as evidenciadas por Richter Reimer (2006, p. 94) ao destacar os tributos das províncias imperiais: “eram cobrados dois impostos diretos: o imposto sobre os produtos do campo (tributum agri) e o imposto capitis” em todas as províncias romanas, aumentando assim, a carga de despesas com o império.

A proposta cristã para essas exigências era a possibilidade de contrapor essa obrigatoriedade e se tornar escravo de Deus, deixando assim de ser escravo do Imperador, o significado dessa ação é descrito por Richter Reimer (2003, p. 51):

Ser “esclava del Señor” no significa abrir la mano de su historia, sino más bien participar creativa y dinámicamente para que la promesa de Dios se concretice en la historia. Reinado de Dios que se hace ¡presencia de justicia y de solidaridad!

Para sustentar a ocupação militar, os funcionários do Império Romano e a engrenagem da colonização, contexto este onde as comunidades judaico-cristãs vivenciaram a forma de dominação “patriarcal-patrimonial” e a prevalência do “latifúndio com sua dinâmica de dominação escravagista” (RICHTER REIMER, 2006, p. 87.90).

Todos estes modo de produção atendiam as necessidades de manutenção do poder “dentro del sistema romano de esclavitud, donde las personas eran transformadas en objeto de placer o de lucro de sus señores”. (RICHTER REIMER, 2003, p. 51)

Conforme o domínio conceitual de Richter Reimer, no campo podemos identificar a terra referia à mulher, ela planta e colhe desde a escravidão, ela está presente nesse contexto, trabalhando na roça pessoal ou de terceiros. Entendemos que a mulher exerce função central e muitas vezes com jornada dupla de trabalho.

Mesmo que nos processos de reconhecimento da importância das atividades realizadas por mulheres passe ‘desapercebida’, entendemos que:

Esta historia de mujer nos muestra cómo mujeres anónimas y anómalas, excluidas del sistema patriarcal, tienen participación transformadora activa en el ministerio de Jesús. El proceso de marginación y exclusión de las mujeres, sin embargo, comienza muy pronto: está presente en el movimiento de Jesús, en el proceso de fijación escrita de la tradición, en el proceso de canonización y en la historia de la iglesia. (RICHTER REIMER, 1997, p. 156)

Concordando que “em muitos casos, a mulher e seus filhos tornam-se elementos básicos de organização da vida e de constituição da comunidade” (GUSMÃO, 1992, p. 118) sendo substancial em seu grupo e assumindo postura de liderança comunitária.

Logo, no ambiente cristão primitivo “las mujeres aparecen como paradigmas de la comunidad no por el lugar que ocupan en la familia patriarcal, sino debido a su participación activa en la visión del Reino de Dios”. (RICHTER REIMER, 1997, p. 160), da mesmo forma, comparável às campesinas, que também é fonte de influência e força de trabalho para a comunidade local.

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