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A questão norteadora nº15

5. APRESENTAÇÃO, ANÁLISE DOS DADOS E DISCUSSÃO DOS

5.1 Unidade de análise I, educação do surdo

5.1.5 A questão norteadora nº15

Professor, no seu trabalho docente, quais são as principais dificuldades encontradas para a promoção da aprendizagem do aluno surdo?

A questão de número 15 busca identificar na atividade prática do docente quais as principais dificuldades encontradas no ensino de pessoas surdas.

Segundo os relatos dos professores, aqui apresentados de forma suprimida em termos de quantitativo de relatos e agrupados por eixos temáticos destacados, as principais dificuldades são cognitivas e comportamentais. Porém, é importante ressaltar que somente

(46,66%) dos professores (7) apresentaram pontos a destacar sobre essa questão. Para (53,33%) dos professores (8), não há dificuldade no ensino para os alunos surdos.

Em relação aos relatos sobre os ensinamentos e conteúdos, os professores apresentaram as seguintes considerações:

PR01AA “...vejo o aluno surdo com muita dificuldade nos mais diferentes

conteúdos, e, como já ministrei outras disciplinas, enfrento a mesma dificuldade de resultado com o surdo; pra mim, eles têm mais dificuldade que os ouvintes e sinto que nós professores temos mais dificuldade em ensinar pra eles... as notas são muito baixas e isso em todas as provas durante o ano, quando não pegam DP (dependência de matéria), passam raspando.”

PR08AF “...na minha área é muito complicado fazer ele entender coisas

simples, acho que em geral poucos são os conhecimentos em Exatas; em geral, muitos alunos (ouvintes e surdos) ficam para as provas de recuperação, e no caso dos surdos, isso é quase regra.”

PR09AP “...não saber se ele está compreendendo e não ter como falar

livremente com ele acho que é um grande problema, muitas vezes falamos com alunos no final da aula quando eles nos procuram para tirar eventuais dúvidas, mesmo sendo uma professora aberta ao diálogo acho que ele tem vergonha, há receio de vir falar comigo então acabo não interagindo muito com ele.”

PR12AL “... ensinar é por si um desafio já bastante grande e para o surdo acho

que é potencializado; há muitas coisas envolvidas, dedicação, comunicação, ambiente e interação; esses, a meu ver, são elementos tão importantes que no geral são restritos para ele, então, vejo como obstáculos difíceis de serem ultrapassados.”

PR14AE “...tenho muita preocupação em ensinar os conteúdos previstos para a

turma em que eu tenho aluno surdo, pois minha prática docente é muito distante, creio eu, da realidade do surdo; como esse aluno não trabalha, vejo que quando dou exemplos da empresa relacionando com o conteúdo ele normalmente fica falando com o intérprete que não entendeu, como não sei o que fazer...digo que mais à frente ele vai conseguir entender... quando estiver trabalhando, mas é difícil explicar algumas coisas.”

Em relação aos relatos sobre o relacionamento como ponto de dificuldade com o professor, os entrevistados apresentam suas considerações e reflexões:

PR15ATI “...não tem jeito, não consigo falar com o aluno, por mais que tente,

ele não fala comigo, às vezes percebo que o intérprete fica até com vergonha da falta de proximidade que ele (surdo) estabelece, acho que ele ou odeia minha matéria ou não gosta de mim.”

PR08AF “...nas duas IES em que dou aula, eu tenho surdo em sala, e nas duas

eu tenho muita dificuldade de cobrar a participação. Em uma, a aluna nunca vem; quando vem, não quer fazer nada, na outra, ela tem muitos amigos, mas nunca fala comigo, tentei por duas vezes falar com ela, perguntar se estava compreendendo, mas me relacionar com ela como me relaciono com os outros não tem comparação, é muito mais restrito, quase impossível.”

PR14AE “...sei que minha disciplina já é uma pancada na cabeça dos mais

preguiçosos, no geral, todos acabam se aproximando muito pouco, pela complexidade, e minha postura mais rígida acho que evidencia mais ainda essa falta de aproximação, mas no caso do aluno surdo isso é determinante, ele nunca pergunta e tá tudo sempre bem, mas as provas, nossa! ...acho que ele tem vergonha de perguntar, não é possível! e acaba ele mesmo se prejudicando.”

PR07ARH “...na maioria das vezes, vejo ela ( aluna surda) muito distante... às

vezes pede pra intérprete não interpretar... fica ali parada e quase não fala com ninguém; um dia fui perguntar porque ela (a intérprete) parava de gesticular, ela disse que a surda estava com dor de cabeça e às vezes não queria ouvir nada, então por isso ela tinha que aguardar o pedido de retorno da aluna surda... sempre fico de olho na aluna, e vejo que o dia que a intérprete não vem ela fica com uma cara muito brava, e nem olha pra trás, nunca fala com os colegas... acho que deve se sentir constrangida por causa da surdez.”

PR12AL “... foram poucas as vezes que houve participação voluntária do aluno

surdo com a turma no geral; sempre fala e faz trabalho com as mesmas pessoas, isso quando não pede pra fazer sozinha; na minha cabeça, eles dificultam a aproximação, seja ela qual for.”

PR04AM “... tenho uma aluna que é totalmente diferente dos demais, ela é

ótima em tudo, mas no geral todos eles são mais fechados, não falam, não se expressam muito e não interagem com os colegas de turma; no intervalo, que é mais comum essa interação, vejo ela sempre separada e praticamente isolada de todos; fui falar com ela do meu jeito claro e ela disse que estava tomando ar... sorriu e foi embora, fiquei com cara de boba, ela virou as costas e saiu assim direto.”

PR06ARH “... ele não fala com ninguém, fica lá no seu mundo isolado,

relacionamento com os outro é zero.”

Em relação à aprendizagem, destacam que:

PR08AF “...não sei se saem daqui preparados para o mercado nem sei se

trabalham, acho que conheço só uma que atualmente tá trabalhando em uma empresa boa, por sinal, mas os outros dois não; falar que eles aprendem é complicado, como saber se interagem tão pouco...”

PR01AA “...pegar a prova como item de avaliação de aprendizagem não acho o

mais correto, mas o que mais posso fazer... em uma reunião de professores falamos sobre isso, não dá pra ter certeza que estão aprendendo, pelo menos eu não sei dizer, acho que estão lá por estar... aprender mesmo acho que é muito pouco.”

PR12AL “...sempre que termino um conteúdo chamo a intérprete e a aluna

surda de canto e pergunto como estão as coisas, peço pra ela me dizer em síntese como as coisas estão, aprendizagem, dificuldade e conteúdo, às vezes faço até perguntas pra confirmar conceitos trabalhados e ela sabe disso, e responde normalmente, embora seja algo mais complicado de fazer... no início ela deve ter pensado que estava duvidando da sua capacidade e ficou ríspida nas respostas, hoje ela já fala naturalmente sobre os conteúdos, isso é bom pra mim, sei que estou atendendo e ajudando no processo todo.”

PR14AE “...o professor sabe só de olhar pro aluno se ele está entendendo e

aprendendo de verdade, mas confesso que no caso do surdo é mais difícil, meu aluno tá sempre com a mesma cara.”

Em relação ao comprometimento, ressaltam que:

PR08AF “...vou confessar uma coisa: um dia falei pra intérprete que podia

falar com a aluna (surda) que se continuar assim sem participar e fazer os trabalhos não precisava vir na minha aula, e disse que se ela (a surda) não estava preocupada com a aprendizagem eu não ia ficar passando a mão na cabeça não, tinha que parar de ser preguiçosa, lógico ela não gostou e ainda ficou fazendo careta pra mim.”

PR15ATI “...vejo uma particularidade, ou os conteúdos estão difíceis ou meu

aluno não quer nada com nada, alguns alunos sei que vêm de longe, estudam aos sábados e trabalham o dia todo, mas a gente percebe quando é falta de empenho, o professor também está nessa rotina... trabalha o dia todo e ainda

tem o turno da noite pra dar aula e tem que estar muito disposto pra dar aquela aula motivadora; então, por que pro surdo é diferente? sinto falta desse comprometimento por parte do aluno surdo, claro não é só ele, mas falando dele especificamente, sim, falta alguma coisa.”

PR07ARH “...é bem evidente que ela não quer ter trabalho, o comprometimento

é muito baixo, faz o mínimo possível.”

Sobre a inexistência de dificuldades por parte dos professores, declaram que:

PR15ATI “...não vejo nenhuma dificuldade diferente da comum para o ensino

superior nos dias de hoje, alunos com baixa qualificação e vindos de um ensino médio com muitas deficiências em termos de aprendizado e principalmente postura e respeito para com o professor.”

PR07ARH “...destacaria as mesmas dificuldades do aluno ouvinte, muitos são

descomprometidos com tarefas, exercícios, participação e desempenho; então, pra mim, é tudo igual, aluno é aluno em qualquer lugar seja ele quem for.”

PR02AA “...não consigo ver diferença, é sim uma particularidade de ensino,

mas enquanto dificuldade é a mesma coisa que os outros alunos.”

PR09AP “...tirando que as notas são no geral mais baixas que a média da

turma, não há diferença nenhuma, mas também acho que isso (desempenho acadêmico) pode estar relacionado com a dificuldade dele para se adaptar no ensino superior que, a meu ver, tem pouca acessibilidade pra ele, e outra: estamos falando de um aluno, e o outro contingente é sempre de 60 ou 70 alunos, quando não são mais, ou seja, não acho que nesse sentido é relevante a comparação.”

PR03AM “...não vejo absolutamente nada de dificuldade, pode ser que ele

tenha, mas isso se deve à questão da surdez.”

PR12AL “...acho que o aluno tem mais dificuldade até por não poder se

comunicar como nós, mas a dificuldade é pontual.”

Esse percentual de (53,33%) de professores (8), no entanto, trouxe um dado curioso, pois os resultados acadêmicos (notas) dos alunos surdos são inferiores aos dos ouvintes, dando margem à questão sobre o que poderia acontecer sobre essa unanimidade, ou seja, se não há dificuldade na prática docente frente ao desafio de se promover a educação do surdo, por que será que todos eles apresentam baixo rendimento? Esta é uma questão relevante para os estudos sobre a permanência do surdo no ensino superior.

Alguns professores alegaram que o problema está no aluno surdo, pois este tem mais dificuldade na aprendizagem, o que justificaria o baixo rendimento, se comparado ao ouvinte.

Há, então, como ponto de partida, um desconhecimento considerável sobre essa particularidade, que pode justificar porque o professor pouco atua com diferenciação em sala de aula, pois essa adaptação dos conteúdos e metodologias estaria diretamente ligada ao reconhecimento da particularidade cognitiva e comportamental, do ponto de vista da especificidade técnica do aprendizado do surdo.

Salientamos então a necessidade de se considerar para inicio das atividades ações que envolvam o visual, pois o surdo é um sujeito visual, se o professor ajustar gradativamente os trabalhos em sala de aula, há sem dúvida um ganho do ponto de vista do entendimento e aproximação do surdo frente aos ensinamentos e a aprendizagem.

No gráfico a seguir, é possível visualizar as principais alegações agrupadas conforme relatos parciais apresentados.

Gráfico 1 – Principais dificuldades no ensino

Somente sete (7) professores apresentam considerações sobre a dificuldade no ensino, então do total de 15 professores da IES-A (46,66%) dos professores (7), destacam as principais dificuldades para o aluno surdo no ensino superior.

Cem por cento dos professores, ou seja, sete (7) professores destacam que ensinar os conteúdos é o item mais difícil, e apontaram ter alguma dificuldade nesse processo de ensino e aprendizagem em relação ao aluno surdo, e (85,71%) dos professores (6) afirmam que o relacionamento do professor com o aluno surdo é um item relevante, e muitos destacam que pouco ou nada falam com os alunos surdos, muitas vezes por não saberem como fazê-lo e, em outros casos, por acreditarem que os alunos se sentem incomodados por não poderem falar com ele sem a ajuda do intérprete.

Ainda sobre esse item, (57,14%) dos entrevistados (4), destacam que o problema de relacionamento com a turma afeta o processo como um todo, divide o processo de aprendizagem e isola o aluno surdo dos demais colegas porque é visto como um diferente na sala, e, em grande parte, os alunos não se aproximam, isolando o intérprete e o aluno surdo do restante da turma.

Cinco professores (71,42%) alegam não saber se realmente o aluno surdo está aprendendo, e que isso se certifica nas notas finais; porém, em muitos casos, a nota final, por ser um apanhado de trabalhos em grupo e participação, não permite verificar se esse aluno realmente aprendeu.

De acordo com os dados, (42,85%) dos professores (3) se mostram não dedicados, há pouco entrosamento nas atividades propostas em sala de aula, e, por consequência, percebem pouca motivação do surdo em relação às atividades acadêmicas. São mais conduzidos às atividades do que participação efetiva, como se fosse um integrante do grupo de trabalho e não um componente efetivo e participativo do grupo.

Na fala dos professores, foi possível aferir uma série de indagações que eles mesmos não sabiam responder. Muitos professores apresentam uma série de dificuldades, mas as direcionam para a particularidade do aluno surdo, ou seja, é como dizer que as dificuldades estão na verdade no sujeito e não no professor; diante disso, foi possível agrupar os temas que, segundo os professores, acreditam atrapalhar o processo de aprendizagem do ponto de vista do processo de ensino e aprendizagem.

Para os professores que não entendem que há uma dificuldade, existe uma justificativa em prol da particularidade em si, ou seja, segundo esses professores, a aprendizagem parte do aluno, e o professor, sendo um facilitador, tem com o grupo mais ou menos aderência a sua metodologia e, por não ouvir, o aluno passa a ser o “problema” do processo e não o professor, pois a dificuldade está no outro e não no professor que explica e trabalha há anos com docência.

Outro ponto relevante na justificativa é que o aluno surdo é igual a outro, não tem como separá-lo, todas as fragilidades de ensino não podem ser diretamente ligadas à questão da surdez, ou seja, alunos que não querem saber de estudar, participar, fazer os exercícios, tarefas, e interagir com o professor existem em todas as salas e não é uma exclusividade do aluno surdo, e, por esse motivo, não encaram como dificuldade.

Na fala de muitos professores, há uma tentativa de se defender frente às dificuldades, ou mesmo aos desafios da aprendizagem do aluno surdo, e isso ficou claro nos resultados da pesquisa nessa IES, no que tange à pergunta sobre os pontos consideráveis da aprendizagem do surdo frente à “eventual dificuldade do professor em promover a aprendizagem” do aluno surdo.

5.2 Unidade de análise II, formação docente