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A questão norteadora nº9

5. APRESENTAÇÃO, ANÁLISE DOS DADOS E DISCUSSÃO DOS

5.1 Unidade de análise I, educação do surdo

5.1.2 A questão norteadora nº9

Professor, na sua prática docente necessidade de adaptação metodológica/atitudinal da aula que é ministrada ao aluno ouvinte em relação ao aluno surdo em sala? Se positivo, comente esse processo.

O objetivo desta pergunta foi saber se os professores, na sua prática, alteram ou não sua forma de trabalho em sala de aula frente ao aluno surdo. No item 5.1.1, a ideia inicial era saber se o professor tem informações e conhecimento da prática docente frente à surdez, e, nesse caso, entender se é feita, como é esse processo, sua importância e relevância.

Para tanto, não só como resposta, mas, também, como postura e prática, foi solicitado ao docente exemplo do dia a dia para se compreender como isso acontece no ensino superior. Seguindo a mesma linha dos pesquisados, ou seja, da IES-A, somente (26,66%) dos professores (4) fazem algum(a) ajuste/adaptação na aula ministrada para o público de alunos surdos. A grande questão ficou em uma justificativa que ratifica a ideia da necessidade e uso dos serviços de tradução e interpretação que o professor tem em sala de aula.

Salientaram que

PR09AP “... com muita dificuldade tento adaptar, sim, os conteúdos, meus

textos e leituras, por exemplo, eu já não trabalho com tanta frequência, percebi que somente os surdos não conseguiam entregar os trabalhos, e quando o faziam era numa qualidade muito ruim, chamei os dois para conversar e eles me disseram que não conseguiam entender os textos muito bem, pois tinham dificuldade no português; aí que eu percebi, e me recordei dos trabalhos anteriores, perguntei para o intérprete se isso era normal, se eles não sabiam português e conversando com ela, entendi que pra eles (os surdos) a leitura e trabalhos individuais de leitura prejudicariam seu desempenho; a partir daí tentei mudar os trabalhos para trabalhos em grupo e com mais participação do intérprete, já que ele (intérprete) só estaria disponível em sala de aula e, em casa, o aluno não seria capaz sozinho de trabalhar os conteúdos da forma que estavam sendo propostos.”

PR12AL “... minha postura é a seguinte: não é sempre que dá, mas sempre que

posso eu trabalho com os cases de empresas, para ajudar o aluno a compreender os conceitos teóricos; já me falaram muito sobre a questão visual do surdo, então compreendo que seria o campo a ser mais explorado, não passo mais músicas como antes, até passo, mas acabo falando antes com a intérprete pra ver se ela entende o que eu vou trabalhar para ficar fácil depois; teve um dia que passei uma atividade que a intérprete não tinha entendido, então ficou uma situação constrangedora, a sala ficou com pena da aluna surda e parecia

que eu não tinha me importado com a aluna que era surda, na verdade era porque a atividade era difícil até pro ouvinte, mas depois disso tenho mais cuidado no planejamento da aula, mas com a correria do dia a dia não é sempre que dá pra fazer isso.”

PR10AP “... nas minhas aulas uso muito trabalho em grupos até porque as

salas de aula são enormes (turmas com mais de 80 alunos), e com isso acabo trabalhando a interação e participação do surdo; com isso acredito que a chance de ele (surdo) socializar mais com os ouvintes é maior e com isso aprender melhor e entender mais com a vivência da atividade proposta; uma vez fiz um teatro e todos os alunos gostaram da história que ele fez, e o intérprete narrava os acontecimentos, senti que ele (surdo) estava mais solto em sala e participou muito mais, queria mostrar que tinha algo a oferecer, e eu mesma fiquei impressionada com a capacidade dele, acho que essa adaptação passa a ser um diferencial frente a essa questão.”

PR11AP “... todas as aulas que tenho que trabalhar os novos conteúdos antes

de iniciar eu falo com o intérprete e entendido as temáticas e proposta em sala de aula até o intérprete se sente melhor no trabalho que deve desenvolver; sempre que posso eu dou uma mudada pra ajudar o aluno, tem sido proveitoso, ele próprio (surdo) veio me dizer que compreende melhor a minha matéria se comparado com os outros professores.”

Trabalhos apontam essa necessidade, no artigo de Dorziat (1999), há contribuições que ratificam a postura necessária frente a adaptações de conteúdos, entendemos que são necessárias e fundamentais se o objetivo é a promoção da educação para o surdo, a autora apresenta as seguintes contribuições: usar textos variados; utilizar recursos de ensino apropriados ao surdo e ter domínio dos sinais (Libras), também entendemos que se aplicam na perspectiva do ensino superior.

Um contingente significativo, aqui apresentado de forma resumida dos relatos, afirma que não há necessidade de se adaptar os conteúdos, metodologias, atenção ou mesmo forma de ministrar as aulas, trabalhos e atividade docente como um todo:

PR08AF “... não tem necessidade, a aula é igual pra todos, não dá pra ficar

planejada para a grande maioria, ele já tem um tradutor então isso não vai mudar minha forma de dar aula.”

PR05ARH “... a aula é a mesma, a única coisa é que sempre fico de olho pra

ver se o intérprete tá conseguindo acompanhar, às vezes acabo falando rápido demais.”

PR01AA “... não, a minha metodologia de trabalho não muda, eu trabalho há

anos com ensino superior e não vejo necessidade de mudar isso, ele só é surdo, mas compreende tudo.”

PR14AE “... não mudo e nunca perguntei se deveria, pois eles (alunos) sempre

reclamam de tudo. Imagina o surdo, acho que lógico ele iria reclamar, em relação ao intérprete ele nem professor é! Imagina ele me dizendo o que fazer, é o fim da picada! (risos do professor) .”

PR15ATI “... em relação à atitude não mudo nada, os conteúdos são os mesmos

e a aula a mesma, as provas sim eu encaminho para o coordenador que parece que adapta a prova para o surdo, não sei se ele que faz isso, mas sei que a prova sempre tem que ir primeiro pro coordenador.”

PR07ARH “... respeito o aluno e sua deficiência mas ele tem que se adaptar ao

mundo, e não dá pra fazer tudo, eu nunca vou dar aula em sinais, então ele tem que respeitar também que a proposta de aula é essa.”

PR03AM“... Não vejo nada de significativo, acho que a aula é igual, sem

adaptações e receio, conto até piada.”

Com isso posto, (73,33%) dos professores (11) informaram e justificaram não necessitar de nenhuma adaptação, pois em sala de aula há o intérprete que é, segundo os professores, para essa finalidade.

É importante dizer, então, que grande parte dos docentes, por confiarem nesse método de interação com o aluno surdo, nunca questionou o intérprete sobre a necessidade de se adaptar/ajustar, ou mesmo qual poderia ser sua postura e/ou atuação frente a essa particularidade.

Se compararmos a postura do grupo que faz algum tipo de adaptação, há algumas considerações, pois a postura adotada pelos professores que somaram (26,66%) nesse quesito, foi informar que trabalham em parceria com o intérprete e/ou com algum cuidado na proposta em sala de aula, ou seja, antes de fechar o método e procedimentos, inclusive

avaliatórios e provas, discute os procedimentos a serem adotados com o intérprete, pois entendem que, com essa prática, poderão atender melhor e fomentar a aprendizagem do aluno surdo adequadamente.

Outra prática comum aos professores que ajustam seus conteúdos e aulas ao público de alunos surdos é a aplicação de provas ajustadas na perspectiva da Libras (mesmo sem ser em Libras), que sempre são encaminhadas para uma comissão da instituição que as devolve com as devidas alterações e adaptações para o aluno surdo.

A comissão de prova (Libras) tem a função de adaptar o conteúdo para a maneira acessível ao surdo, colocando-a de forma que os alunos não sintam a necessidade do intérprete e possam resolver a prova sozinhos; é importante esclarecer que os professores, quando desenvolvem a prova, estão com o pensamento no aluno ouvinte e não no surdo e, dessa forma, e por meio dessa comissão, após realizados os procedimentos, a prova pode atender a todos os públicos da sala de aula, não de maneira ideal, mas cuidadosa e respeitosa com o aluno.

Seria, no nosso entender, como prática inovadora, a possibilidade de a prova ser totalmente em Libras, ou seja, haveria a prova para o aluno ouvinte e a prova para o surdo em Libras, e com isso a instituição atenderia completamente às diferentes necessidades; hoje, ou mesmo nos últimos anos, vimos isso acontecer em práticas pontuais nos concursos públicos, onde é solicitada ao candidato a indicação da particularidade que esse deverá ter, frente à necessidade para a realização da prova.

Ainda há muito trabalho a ser feito, mas iniciativas como a da instituição já dão indícios de que não só é preciso mudar, mas também que é por meio desses movimentos em prol do respeito ao indivíduo que se pode chegar a um ponto satisfatório para o estudante surdo. Uma questão considerável apontada pelos professores foi a aplicação de exercícios via internet. Todos os professores informaram que, em geral, salvo algumas raríssimas exceções, os alunos surdos têm muita dificuldade de estudar e concluir as disciplinas a distância (EAD). Salientaram a necessidade de se flexibilizar essa modalidade em outra abordagem metodológica.

PR07ARH “... Na minha visão, até mesmo o EAD deve sofrer algumas

RH, veio me solicitar falar com o coordenador, pois não aguentava mais reprovações na disciplina na modalidade em EAD. Disse pra ele qual era o problema, já que a disciplina era considerada simples, e não complexa a ponto de tantas reprovações... em conversa com o coordenador resolvemos que ela faria a disciplina no período da manhã, assim poderia fazer na modalidade presencial, já que a aluna já tinha sido reprovada na disciplina mais de 3 (três) vezes, conseguindo a aprovação com nota mínima no semestre seguinte. Já na modalidade presencial, essa atitude de ajuste foi realizada para a aluna e outros alunos (2), em outras ocasiões, e as matérias que estavam pendentes foram concluídas da mesma maneira; entendo que isso seria um ajuste necessário para o surdo.”

PR09AP “... tenho dois alunos surdos, e os dois me informaram que preferem as

aulas em sala de aula e não em EAD, coincidentemente, os únicos reprovados na disciplina são eles, claro tem alguns outros mas esses não realizaram as aulas e atividades, os meus alunos fizeram todas as atividades e fóruns, postagens entre outros, mas não obtiveram as notas necessárias para a aprovação, eu acho isso um ponto importante, e a faculdade tem que fazer algo em relação a isso.”

PR15ATI “... nossa, se eu reclamo do aluno que não faz as atividades na sala

imagina os de EAD; como administro também a plataforma em EAD vejo que as solicitações dos surdos para mudança nas disciplinas são no mínimo interessantes... veio um pedido do coordenador de relatório de reprovação, identificamos que do contingente de alunos reprovados, acho que mais de 90% era de alunos surdos, não sei, mas acho que eles não sabem mexer com computador, plataforma, login, resgate de senha, reset de senha, entre outros procedimentos técnicos de postagens, envio etc., coisa muito comum na modalidade em EAD.”

Entendemos que a questão de baixo rendimento na modalidade a distância se deve ao fato de não haver a preocupação de adaptação desses conteúdos ao aluno surdo, ou seja, uma linguagem acessível, também porque muitos deles têm dificuldade na Língua Portuguesa, então, as suas notas, em geral, são inferiores à média dos alunos ouvintes que realizam a mesma disciplina em EAD.

Outro ponto levantado é o do acesso e manuseio das disciplinas em EA, acreditamos que se trata da maioria dos alunos que não têm familiaridade com a modalidade em EAD, então, a

dificuldade é mesmo de acesso à nova atividade em si, um novo modelo que entrou em vigor nas instituições e os alunos não tinham muito conhecimento sobre ele.

Para sanar esse problema, por vezes a instituição optou por disponibilizar a disciplina na modalidade presencial, conforme relato do professor, por haver, segundo os relatos dos alunos, mais flexibilização em relação aos procedimentos e metodologias de ensino e o auxílio do intérprete, o que não existe na modalidade EAD, pois só conhecemos hoje essa modalidade na UFSC que, além de ter o curso completo, tem uma plataforma toda acessível para o surdo usuário de Libras.