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A Quinta Alteração à Lei da Nacionalidade

No documento Contencioso da Nacionalidade 2. edio (páginas 150-153)

A CIDADANIA E A QUINTA ALTERAÇÃO À LEI DA NACIONALIDADE

19. A Quinta Alteração à Lei da Nacionalidade

Desde o século XIX que Portugal procura reparar os efeitos do decreto de 1496 que ordenou a expulsão dos judeus. Neste sentido, a 17 de Fevereiro de 1821, um Decreto das Cortes Gerais e Extraordinárias da Nação Portuguesa concede não apenas aos judeus das famílias expulsas, mas a todos os judeus o direito de regressarem a Portugal.

Ainda no século passado, a 11 de Dezembro de 1996, foi aprovada uma Deliberação pela Assembleia da República onde se saúda a reaproximação entre o povo judeu e o povo português.

Em Espanha, idênticos acontecimentos culminaram em 2008 com uma alteração na aplicação das normas relativas à obtenção da cidadania que contempla a possibilidade de por carta de naturaleza atribuir a nacionalidade espanhola aos judeus sefarditas.

A origem sefardita será certificada pela Federación de Comunidades Judías de España.

86 Idem, op. cit. págs. 368. 87 Idem, op. cit. págs. 366.

88 COSTA, M. J. (1992). História do Direito Português. Coimbra: Almedina, pág. 274.

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Em 2010, o grupo parlamentar do CDS-PP foi contactado por representantes da comunidade de judeus sefarditas, residente no estrangeiro, que desejavam recuperar a nacionalidade – portuguesa – dos seus antepassados.

Em Maio e Junho desse ano são feitas várias “perguntas parlamentares” a membros ao Governo pelos deputados daquela bancada.

Em Março e Abril de 2013 são apresentados pelos grupos parlamentares do Partido Socialista e do Centro Democrático Social – Partido Popular dois projectos contendo alterações à Lei da Nacionalidade no sentido de os que forem havidos como membros da comunidade de judeus sefarditas expulsos de Portugal possam obter a nacionalidade portuguesa.

É aprovada na Assembleia da República na sessão de 31 de Maio de 2013 a quinta alteração à Lei da Nacionalidade, que foi publicada como Lei Orgânica n.º 1/2013, de 29 de Julho89.

Esta alteração consistiu na adição de um novo número ao artigo 6.º, da Lei n.º 37/81, de 3 de Outubro.

Este artigo 6.º consagra a possibilidade de obtenção da nacionalidade portuguesa por naturalização exigindo nas várias alíneas, do seu n.º 1, um conjunto de requisitos:

• Maioridade;

• Residirem legalmente no território português há pelo menos seis anos; • Conhecerem suficientemente a língua portuguesa;

• E ausência de condenação, transitada em julgado, por crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a três anos, segundo a lei portuguesa.

Porém, nos termos do n.º 6, daquele artigo 6.º, da Lei da Nacionalidade, para os que forem havidos como descendentes de portugueses esses requisitos ficam reduzidos à maioridade e à ausência de condenação, transitada em julgado, por crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a três anos, segundo a lei portuguesa.

A Lei Orgânica n.º 1/2013, de 29 de Julho, adita um n.º 7, ao artigo 6.º, dedicado à naturalização dos descendentes de judeus sefarditas portugueses.

De acordo com a norma introduzida por esta quinta alteração à Lei da Nacionalidade, os descendentes de judeus sefarditas podem naturalizar-se com dispensa dos 6 anos de residência em Portugal e do conhecimento da língua portuguesa.

89 Por lapso foi inicialmente publicada como Lei n.º 43/2013, de 3 de Julho. Posteriormente foi publicada a Declaração de Retificação n.º 33/2013, de 29 de Julho, onde se anula aquela publicação, republicando o diploma agora como Lei Orgânica. Recorde-se que revestem a forma de lei orgânica – que são leis de valor reforçado – a aquisição a perda e a reaquisição da nacionalidade portuguesa por força dos artigos 166.º, nº 2 e 164.º, alínea f), da Constituição da República.

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Esta descendência terá de ser demonstrada através da prova da pertença a uma comunidade sefardita de origem portuguesa.

Sendo esta demonstração feita com base em requisitos objectivos comprovados de ligação a Portugal, nomeadamente apelidos, idioma familiar, descendência directa ou colateral.

Vejamos detalhadamente cada um destes elementos indicadores de ligação a Portugal.

Quanto aos apelidos existe bibliografia sobre nomes sefarditas, designadamente um “Dicionário Sefaradi de Sobrenomes”90, que inclui “…Cristãos-novos, Conversos, Marranos,

Italianos, Berberes e a sua História na Espanha, Portugal e Itália”.

Nestes textos será sempre possível encontrar os indícios existentes relativos a uma eventual pertença à comunidade sefardita de origem portuguesa.

Quanto à origem portuguesa da comunidade sefardita deve ter-se presente que parte dos judeus expulsos de Espanha em 1492 vieram para Portugal.

No que se refere ao idioma familiar, o nosso legislador, teve presente que os sefarditas portugueses, bem como os sefarditas espanhóis, tinham uma língua própria, o ladino91.

Em Março de 1996, o Knesset (Parlamento de Israel) estabeleceu a Autoridade Nacional do Ladino.

Quanto à descendência directa deve entender-se o parentesco em linha recta, a que se refere a primeira parte do n.º 1, do artigo 1580.º, do Código Civil, onde se determina que “A linha diz- se recta, quando um dos parentes descende do outro…”.

Quanto à linha colateral deve ter-se presente a segunda parte daquela norma onde se diz “…colateral, quando nenhum dos parentes descende do outro, mas ambos procedem de um progenitor comum”.

O nosso legislador terá usado a palavra “descendência” de modo impreciso, na parte final do n.º 7, do artigo 6.º, da Lei da Nacionalidade. Na verdade, não há descendentes colaterais, o que pode haver é parentes colaterais.

Porém, há que tirar o sentido útil daquela norma.

Assim, devemos ter em atenção que o legislador no n.º 6, deste artigo 6.º, da Lei da Nacionalidade, se refere, designadamente, “…aos que forem havidos como descendentes de portugueses, aos membros de comunidades de ascendência portuguesa” e que, neste n.º 7, se

90 Trata-se do Guilherme FAIGUENBOIN, P. V. (2003). Dicionário Sefardi de Sobrenomes – Dictionary os Sephardic

Surnames". São Paulo: Fraiha.

91 Ver no Anexo III, a página de rosto de uma obra em hebraico, ladino e espanhol publicada em Amesterdão.

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refere não apenas a descendentes mas também a colaterais, pelo que se deve concluir que o nosso legislador quis dizer mais do que no referido n.º 6.

Ou seja, partindo desta interpretação sistemática, o nosso legislador pretende abranger não apenas os descendentes de judeus sefarditas portugueses (ou da comunidade sefardita de origem portuguesa), mas também os seus parentes colaterais, o que significa que um membro da comunidade sefardita que tenha um antepassado comum com um descendente de judeus sefarditas portugueses pode requerer a naturalização como cidadão português.

Haverá também que proceder a uma interpretação não apenas numa dedução a partir da lei, mas proceder a uma fundamentação “valorativa” e “não dedutiva”92. E, analisando os valores

em presença, ressalta da norma em causa que o valor presente é o da reparação à comunidade sefardita.

É esta a interpretação mais adequada tanto mais que estamos perante um direito fundamental que não admite, sem mais, uma interpretação restritiva, antes carece de uma interpretação concretizadora.

Foi entretanto publicado o Decreto-Lei n.º 30-A/2015, de 27 de Fevereiro, que procedeu à segunda alteração ao Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 237-A/2006, de 14 de Dezembro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 43/2013, de 1 de Abril, contemplando esta nova possibilidade de concessão da nacionalidade portuguesa, por naturalização a descendentes de judeus sefarditas.

Em Outubro de 2015 foram despachados favoravelmente os primeiros processos de naturalização de descendentes de judeus sefarditas. O primeiro caso foi o de Alfonso Paredes Henriquez, cidadão panamiano, que logrou provar a sua ascendência sefardita, com origem em Amesterdão de onde os seus antepassados emigraram para a América Central, eventualmente passando por Pernambuco, ao tempo sob domínio holandês93.

No documento Contencioso da Nacionalidade 2. edio (páginas 150-153)

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