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5. Análise dos dados

5.1. A primeira oficina de discussão via chat

5.1.3. A reescrita da entrevista

Das três entrevistas produzidas, pudemos notar que houve realmente obediência às características estudadas do gênero. No entanto, no momento em que a entrevista foi concluída, houve a necessidade dos alunos realizarem a correção dos textos produzidos até então.

Os procedimentos de reescrita do AL e a elaboração dos elementos da entrevista (título, abertura e citação) até então tinham sido feitos em grupos. A entrevista propriamente dita precisava atingir um nível de formalidade lingüística que não foi observada pelos alunos. A necessidade de um discurso mais formal justifica-se pelo fato das entrevistas analisadas em sala de aula terem sido de revistas diversas, cuja linguagem segue a norma da língua escrita.

Sendo assim, fotocopiamos os três textos produzidos pelos alunos e distribuímos aleatoriamente, ou seja, os participantes dos grupos A não receberam as entrevistas por eles produzidas, mas as que foram produzidas pelos outros dois grupos, B ou C.

De posse das cópias, pedimos aos alunos que buscassem corrigir a entrevista prestando atenção nos elementos lingüísticos que não estavam de acordo com o gênero. Para os alunos, os elementos lingüísticos estavam resumidos aos problemas de ordem gramatical (morfologia, sintaxe e ortografia) encontrados no texto, visto que não mencionamos nenhum tipo de noção pragmática durante as aulas, com exceção do nível de formalidade e informalidade dos gêneros em questão.

A análise, por nós realizada, de cada texto corrigido pelos grupos A, B e C foi bastante minuciosa. Isto nos revelou que o monitor, ou a atividade consciente durante o ato de (re)escrever dos alunos frente aos erros encontrados nos próprios textos, ainda precisa ser mais desenvolvida. Tal afirmativa é verdadeira porque durante a nossa verificação dos textos reescritos individualmente, correções ortográficas limitadas à mudança de minúsculas para maiúsculas e sinais de pontuação foram os itens mais encontrados. Correção de sintaxe de concordância e de regência foram poucas e na correção morfológica apenas a mudança de alguns itens lexicais foram identificados.

Optamos por apresentar as ocorrências identificadas no processo de reescrita de acordo com a divisão de cada grupo, i. e., grupo A, com os tipos de correções realizadas pelos alunos e analisadas por nós bem como o total das mesmas. Preferimos proceder nossa análise deste modo, ao invés de incluirmos todas as ocorrências em um único grupo pelo fato de três textos diferentes (um para cada grupo) terem sido produzidos durante o trabalho em grupos.

Ainda que todos tenham sido reescritos a partir de um único texto, o AL1, cada um teve características organizacionais diferentes (a começar pela quantidade de páginas mencionada acima).

O grupo A teve um total de 775 correções ortográficas, sendo 530 destas distribuídas da seguinte maneira40:

1. mudança de maiúsculas para minúsculas:

2. acréscimo de letras às palavras que foram digitadas incorretamente ou de modo abreviado durante o chat e

3. acréscimo de apóstrofo nas formas curtas. • Grupo A – texto A-01 – 226 correções

Trecho original: 26. because was very difficult to do a e mail using cfm or cfm...or other

name so i put xxx7

Trecho corrigido: 26. Because it was very difficult to do an e-mail using cfm or cfm…or other name so I put xxx7.

• Grupo A – texto A-02 – 217 correções

Trecho original: 92. cfm, dont u want to wait till monday

Trecho corrigido: 92.Cfm, don’t you want to wait until monday? • Grupo A – texto A-03 – 87 correções

Trecho original: 54. whichi is ur favorite Trecho corrigido: 52. Which is your favorite?

Como podemos observar nos exemplos acima, a presença de letras maiúsculas no início das frases é constante, mas não é absoluta nos textos deste grupo. O aluno que produziu o texto A-03, que teve 87 correções ortográficas, considerou apenas algumas frases para correção, deixando alguns inícios de frases e nomes próprios com letras minúsculas. Pelo número de correções realizadas neste texto, vemos que o aluno não realizou a atividade com o devido empenho - ou devida monitoração - já que nos outros dois textos o número de correções ortográficas foi superior a 200. Além disso, o material lingüístico disponível para correção no texto do grupo A foi enorme, não sendo justificável um número tão pequeno, a não ser através da não-predisposição para realização da tarefa, muito mais do que a falta de monitoração durante a reescrita.

Um ponto relevante nesta etapa da reescrita é que todos os alunos, em algum momento, corrigiram o uso do pronome you, escrito no chat como ‘u’, e o possessivo your, escrito no

chat como ‘ur’. Porém, a correção do pronome ‘I’, que em inglês deve ser sempre escrito em

letra maiúscula, não teve tanta atenção. Na verdade, ao nosso ver, este deveria ter sido o pronome a sofrer as mudanças de minúscula para maiúscula todas as vezes em que aparece no texto, principalmente se considerarmos que a turma era de nível intermediário. Acreditamos que estas correções aconteceram porque as formas ‘u’ e ‘ur’ não são encontradas na língua escrita em outros gêneros, ao passo que o pronome ‘I’, é constante, sofrendo muitas vezes a influência da escrita da língua mãe, português, que não apresenta diferença entre a escrita deste em maiúscula ou minúscula.

Embora devêssemos ter incluído a inserção do apóstrofo nas formas curtas, como indicativo de correção da pontuação, preferimos indicar tais ocorrências como parte da ortografia. Isto por que em inglês as formas its e it´s, por exemplo, assumem categorias gramaticais diferentes apenas com o acréscimo do apóstrofo, sendo adjetivo possessivo e forma curta de it is, respectivamente. O uso do apóstrofo durante a correção limitou-se a indicar que uma forma curta havia sido digitada incorretamente durante o bate-papo, como podemos ver no exemplo abaixo:

• Grupo A – texto A-01

Trecho original: 223.reading is the most easier becouse for the other thinks its necessery

more "seguranca"

Trecho corrigido: 223.Reading is the most easier because for the other thinks it’s

necessary feel more confident

A quantidade de sinais de pontuação inseridos no meio ou no final da frase para o grupo

A foi de 245, limitando-se à vírgula, ponto final, sinais de interrogação, sinais de exclamação e

aspas, sendo este último para indicar algum termo em português e/ou cujo emprego houvesse sido inadequado. Vejamos os exemplos:

• Grupo A – texto A-02

Trecho original: 124. a think o crime do padre amaro is a true story Trecho corrigido: 124.I think ‘o crime do padre amaro’ is a true story.

Nossa hipótese para um número tão grande de inserções de sinais de pontuação se deve ao fato do domínio dos alunos deste aspecto da gramática, sentido-se seguros o bastante para tais intervenções. Outros pontos simples para o nível em que se encontravam – o uso de auxiliares nas perguntas – não foram corrigidos, levando-nos a crer que este é ainda um ponto não consolidado pelos alunos.

Em relação à morfossintaxe, o grupo A apresentou um total de 53 correções, sendo que deste total 24 estavam adequadas. O restante das alterações feitas neste nível pelo grupo apresentou problemas de ordem estrutural e lexical, de regência verbal e da influência da língua portuguesa na reescrita, como vemos abaixo:

• Problemas de ordem estrutural e lexical:

Texto A-01

Trecho original: 6. because I fall very tired yesterday

Trecho corrigido: 6. Because I was falling very tired yesterday.

Neste exemplo o acréscimo do auxiliar be no passado foi adequada, porém o verbo que recebeu a forma –ing para a formação do passado contínuo em inglês está incorreto: fall significa cair. O verbo deveria ter sido feel, que significa sentir, sendo a sentença corrigida pela aluna traduzida para português como “Porque eu estava caindo muito cansada ontem”, quando

deveria ser “Porque eu estava me sentido muito cansada ontem”. Além disso, a forma verbal no passado simples seria mais próxima do uso dos falantes nativos do inglês, ou seja, “Because

I felt tired yesterday” ao invés de “Because I was feeling tired yesterday”. A forma do

presente contínuo é muito mais usada em português ao nos referirmos a estados, ao contrário do inglês, cuja gramática indica o uso do passado simples ao empregarmos verbos que indicam estados.

• Problemas de regência verbal:

Texto A-02

Trecho original: 186.Please explain to us how to improve our audition Trecho corrigido: 186. Please explain us how to improve our audition.

Neste exemplo a preposição to foi retirada durante a correção, algo que não deveria ter sido feito, já que o verbo explain, quando seguido de um pronome objetivo, precisa da preposição to. Acreditamos também que a omissão desta preposição sofra influência da língua portuguesa, pois de acordo com a gramática normativa, dizemos ‘explique-nos’ ao invés de ‘explique para nós’. Este é um aspecto interessante já que a segunda forma em português co- ocorre com a primeira, sendo uma variante livre na língua falada, mas não na escrita.

Em relação ao grupo B, o total de correções foi bem menor, sendo distribuídas da seguinte maneira: 93 correções ortográficas e 23 correções morfossintáticas. Das 93 ocorrências de correções ortográficas 17 foram sinais de pontuação, e o restante foi a mudança de maiúsculas e minúsculas e a correção da escrita incorreta de vocábulos. A exemplo do grupo A, incluímos apóstrofos nas correções morfossintáticas.

As correções ortográficas neste grupo não diferem das que foram realizadas pelo grupo

A, contudo achamos relevante apontar que as 93 ocorrências incluem o trabalho dos textos B-

01 e B-03. O aluno que produziu o texto B-02 realizou apenas 17 correções ortográficas, com nenhuma pontuação e a apenas 3 correções morfossintáticas.

As correções morfossintáticas neste grupo foram acréscimos de sujeito ao verbo, mudança da ordem verbo-sujeito para sujeito-verbo, acréscimo de auxiliares, exclusão ou acréscimo de itens lexicais, mudança de tempo verbal, havendo 7 correções erradas, das quais destacamos dois trechos bastante relevantes:

• Mudança de tempo verbal:

Texto B-02

Trecho original: 44.I think I am understand better Trecho corrigido: 44. I think I am understanding better

Neste exemplo vemos que o aluno sofreu a influência do verbo to be, presente no trecho original, e efetuou sua correção transformando o tempo verbal em presente contínuo pelo acréscimo de –ing ao verbo understand. Por nossa experiência, vemos que existe, novamente, a transferência do tempo verbal em língua portuguesa associada ao desconhecimento da impossibilidade de uso de verbos de cognição no aspecto verbal progressivo na língua inglesa.

• Acréscimo de auxiliares e inversão verbo-sujeito para sujeito-verbo:

Texto B-01

Trecho original: 28.don't I know when I should use the "going" understands?

Trecho corrigido: 28. I don´t know when I should use the going. Do you understand me? A correção realizada por este aluno foi excelente, o que indica que a monitoração sobre o ato da reescrita esteve aliada ao seu conhecimento lingüístico durante a reescrita. No trecho original somente o verbo understands indica a pergunta. O aluno fez a divisão deste verbo com a primeira parte da sentença, acrescentando o auxiliar, o sujeito e o objeto necessários à construção da pergunta. Além disso, a percepção deste fato fez com que ele realizasse a inversão don´t I, que é a ordem dos termos em perguntas, por I don´t, a ordem em sentenças afirmativas.

O único ponto que deveria ter merecido uma correção, mas que não causa dificuldade de compreensão ao nosso ver, é a palavra going. A exclusão das aspas não deveria ter sido feita e a partícula do infinitivo (to) deveria ter sido incluída, somente para especificar qual forma verbal era o motivo da dúvida do aluno.

As demais correções, como afirmado anteriormente, não diferiram muito do primeiro grupo. O que nos chama mais atenção na análise da correção dos textos deste grupo é a quantidade de alterações realizadas pelos alunos. Mesmo com apenas três páginas o número possível de correções tanto ortográficas quanto morfossintáticas foi muito pequeno. Achamos que faltou um pouco de disposição do grupo para a realização da tarefa e que essa falta de motivação influiu de forma decisiva no processo de reescrita individual. Pela análise dos textos

deste grupo, cremos que o desinteresse se deu pelo fator da dificuldade da tarefa, já que, como apontamos, as correções não foram muitas e não foram significativas.

O grupo C, semelhantemente ao grupo A, teve uma quantidade significativa de correções ortográficas, 534 incluindo a pontuação, e morfossintáticas, em número de 62. O primeiro ponto a ser destacado é o fato deste grupo ter apresentado o maior número de ocorrências em correção morfossintáticas em comparação com os outros grupos. Além disso, uma das alunas deste grupo realizou a única correção adequada no trecho sobre o verbo fall: • Grupo C – Texto C-03

Trecho original: 10. because I fall very tired yesterday Trecho Corrigido: 10. Because I felt very tired yesterday.

Esta não foi a única ocorrência de correção considerada relevante para esta aluna em particular. Houve, também, uma inserção de pronome relativo, ponto gramatical de dificuldade entre os alunos, além da distinção de entre other e another, como apontamos abaixo:

• Grupo C – Texto C-03

Trecho original: 22. because was very difficult to do a e mail using cfm or cfm...or other

name so i put xxx

Trecho Corrigido: 22. because I was very difficult to do a e-mail that I can use cfm or cfm… or another name, so I put xxx.

Embora neste exemplo existam problemas de ortografia, como letra maiúscula não corrigida no início da frase e também de sintaxe, como o uso do pronome I ao invés de it em

“because I was”, consideramos que a inserção do relativo that demonstra o uso da

monitoração na organização de sentenças mais complexas. O uso de another no lugar de other mostra-nos que a aluna conseguiu diferenciá-los, já que another pode ser substituído por

different na frase.

Outras ocorrências neste grupo em termos de correção morfossintática incluíram inversão de sujeito-verbo para verbo-sujeito, inserção e omissão do sujeito nas frases, correção de tempos verbais, exclusão do pronome relativo e sintaxe de concordância verbal. Em relação à concordância, apontamos dois casos nos textos C-01 e C-03 , abaixo:

• Grupo C – Texto C-01

Trecho original: 202.because i want to understand what the people is talking even the bad

words for give to them a good answer too

Trecho ccorrigido: 202.Because I want to understand what the people are talking even the bad words for give to them a good answer too

• Grupo C – Texto C-03

Trecho original: 122.but writing and talk is mor difficult than others

Trecho reesccrito: 122. But writing and talking are more difficult than others.

Vemos que nos dois casos a forma is foi modificada para are em função dos sujeitos. Nossa análise neste sentido é de que a concordância, em se tratando do verbo to be, é um ponto consolidado pelos alunos, mas que depende da complexidade da sentença visto que no trecho corrigido acima, linha 22, o sujeito concorda com o verbo apenas em termos de estrutura. Neste exemplo seria adequado proceder à substituição, à qual nos referimos acima, a fim de que a correção estivesse gramaticalmente adequada.

As observações que realizamos no tocante às correções feitas pelos alunos nos apontam que a metalinguagem é ainda um ponto que precisa ser mais explorado na sala de aula. Não estamos afirmando que a gramática normativa, cheia de regras e listas para memorização deva voltar. Insistimos no fato de que é essencial para qualquer prática de linguagem incluirmos o modo pelo qual o propósito comunicativo do aluno deva ser retoricamente organizado. Para tanto precisamos ter em mente qual o gênero e quais as características para só então trabalharmos a metalinguagem de maneira contextualizada e relevante.

Acreditamos que as competências comunicativas descritas por Canale (1983) Canale e Swain (In: Pires, 1997), através da nossa análise, não foram satisfatoriamente empregadas. Assim, a nossa afirmação anterior encontra respaldo principalmente no tocante à competência gramatical e sociolingüística precisarem ser mais trabalhadas em aulas de língua estrangeira. A competência pragmática é, de certo modo, trabalhada em sala de aula pelo fato de alguns livros didáticos já trazerem noções de formalidade e informalidade, por exemplo. A coleção New

Interchange, publicada pela Cambridge, e a coleção Tapestry, publicada pela Heinle & Heinle

são exemplos ilustrativos. Não queremos dizer que a competência pragmática deixe de ser trabalhada na sala de aula em função do conteúdo dos livros didáticos, ao contrário, tal competência precisa ser aprofundada a fim de que o aluno comece a perceber que o estudo de uma língua não se limita somente a gramática.