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Episódio 01: Construção dos combinados – 2ª sessão de leitura (28/10/10)

P. T.: Se o colega daqui está falando, eu vou ter que estar escutando

4. A CHAVE DA LITERATURA

4.2 A REINVENÇÃO DO LITERÁRIO

Na tentativa de descobrirmos outras chaves que possam subsidiar a resistência contra o fim da literatura, é importante retomarmos o debate acerca das novas formas de criação do literário, as quais parecem sugerir que a arte literária que sobrevive hoje necessita de uma reforma com vistas ao atendimento das necessidades contemporâneas.

Após refletirmos sobre o que é a literatura e sobre a sua importância, com base naquilo que consideramos constante em sua constituição, é relevante que nos questionemos acerca das funções que a literatura inaugura em face das novas tecnologias predominantes. A chave para esse entendimento ficará mais acessível se olharmos com atenção para as produções literárias que emergem na contemporaneidade, tendo em vista a pergunta: como a literatura tem se reinventado?

Com a ampliação da internet e das tecnologias disponíveis nos computadores pessoais, presenciamos mudanças significativas nas práticas leitoras, nas produções textuais e na própria literatura, que, além de se perpetuar nos livros, começa a encontrar vida na rede, em e-books disponíveis para downloads, em bibliotecas virtuais e em livros simulados, sob a forma de poesias e de microcontos.

Essas revoluções têm provocado a criação de novas formas de texto que sinalizam a necessidade de uma atenção diferenciada, no sentido de considerar as reinvenções literárias resultantes dos imperativos da revolução eletrônica da mídia, assim como seus novos modos de produção e de consumo.

É inegável o fato de que, com a revolução tecnológica e a ampla adesão aos meios midiáticos, já é possível acessar a literatura em diferentes suportes de hipermídia e em diversos hiperlinks. Esse texto migrou para os ambientes virtuais, sobretudo a partir da década de 80, e já pode ser facilmente encontrado em blogs, fóruns eletrônicos e em sites que atendem a diversos propósitos, apresentando-se ora como adorno, ora como objeto para download e, consequentemente, para uma leitura virtual. Assim, a literatura que defendemos como arte da palavra parece estar à disposição daqueles que preferem a tela ao livro, em uma rede de possibilidades.

A literatura outrora guardada, em repouso, nos livros fechados e apresentada ou representada nos livros abertos, se dispersa por uma momentaneidade imprecisa através de múltiplos terminais de computador, saída de múltiplos servidores, em códigos que alimentam os sistemas e que são tanto interpretados pelas máquinas quanto reconvertidos em linguagem humana (RETTENMAIER, 2010, p. 122).

É assim que emergem muitas discussões acerca da possibilidade de apreciação do literário, mediado pela tela, ou acerca da literariedade de textos “inventados” para interface digital. Enquanto uns estudiosos defendem com veemência a cultura do impresso, outros se colocam a favor dos hipertextos digitais como se as variações nos textos e nos suportes que promovem o encontro da literatura com o leitor fossem um resultado inevitável da evolução da leitura literária adequada aos novos tempos.

Coelho (2003) é enfática ao afirmar que a literatura continuará impressa porque é a forma que mais se adapta a uma leitura sustentada, repleta de vazios ficcionais, que exige altos níveis de concentração e desperta uma relação afetiva

com o objeto livro, uma vez que aciona todos os sentidos. O livro de literatura permanece porque ele vai além da mera informação. Ele necessita do corpo-a- corpo, na relação de coautoria com o leitor. Exige a ação de imaginar (imaginação), pois é uma forma de resistência a qualquer passividade aparentemente imposta pelos meios multimidiáticos, como afirma a autora.

Em concordância com essa visão, Palacios (2006) sugere que a narrativa literária, por sua própria natureza e constituição linguística, é inadequada para a apresentação em hipertexto digital, ainda que persista na rede, pois se trata de uma organização linguística que não foi criada para a silhueta de linguagens hipertextuais; diferentemente do jornal que se apresenta em fragmentos e, na sua própria composição, é estruturado em forma de hipertextos.

Nessa discussão, o suposto fim da literatura está atrelado ao fim do livro e dos demais materiais impressos, como se a maior necessidade de mudança fosse de suporte e não de conteúdo. Sabemos, no entanto, que a relação com o material impresso é parte constituinte da literatura, já que a relação com o suporte livro especifica a leitura literária. Esse é o pensamento de Zilberman (2001, p. 119), traduzido na compreensão de que

[...] a literatura que aparece nos livros apresenta uma particularidade resultante do formato desse objeto: acolhendo a matéria da imaginação, estruturada em termos de narração da ação própria e alheia, ou desnudamento da interioridade do eu, ela suscita a participação, bem como a identificação com seres fictícios. A linearidade com que as palavras se apresentam é enganadora, porque, entre umas e outras, escondem-se lacunas, como se os espaços vazios não fossem visíveis a olho nu. O tecido literário é fino e delicado, mas não maciço: contém orifícios, mimetizando a porosidade constitutiva do papel, e por essa superfície propensa à absorção do outro penetra o leitor. Livro e literatura constituem, por força da índole da escrita e da materialidade do papel, as duas faces de uma única moeda. A sobrevida do livro é a da literatura, no modo conforme se apresenta em nossos dias. Porque suscita a interferência do leitor, este também não a abandona. [...] talvez ainda tenhamos de aguardar mais tempo; enquanto isso, contentemo-nos em experimentar os espaços infindáveis oferecidos pelo texto escrito, em papel sensível, o que acolhe nossas disposições e fantasias.

Nessa perspectiva, entendemos que a literatura, “fundada essencialmente no signo linguístico, não teria em seu genoma os ‘cromossomos’ necessários para uma evolução adaptativa no novo ambiente multimidial” (RETTENMAIER, 2010, p. 120).

Entretanto, apesar dessa mobilização teórica a respeito da inadequação do texto literário para os meios multimidiáticos, é evidente o crescimento de ocorrências para obras literárias, clássicas e contemporâneas, que tecem uma biblioteca virtual, acessada e legitimada pelos seus usuários; bem diferente daquela de antigamente que funcionava como receptáculo de proteção e de perpetuação dos impressos.

Muitos comungam dessa opinião, a exemplo de Lucas (2001), que defende a ideia de que, apesar de as tecnologias eletrônicas produzirem reformulações significativas em nossa civilização, a crise no campo literário é provocada por outras causas mais maléficas, tais como a falta de cânones, a falta de valorização dos clássicos como fonte de sabedoria humana e a desqualificação de obras impressas. Nesse cenário, a literatura é incompatível para os meios eletrônicos e digitais porque o poema exige do leitor um estado de “comunhão” que as ondas sonoras e/ou luminosas não propiciam. Além disso, a lógica consequente/consecutiva das mensagens audiovisuais elide o processo de consulta retroativa que a leitura em profundidade muitas vezes reclama (LUCAS, 2001, p. 29, grifo do autor).

Nessa direção, emergem problemáticas que podem, por um lado, sinalizar que a inadequação da literatura para as multimídias consumidas na atualidade atribuirão a essa arte um valor de relíquia “démodé”, como uma forma de comunicação obsoleta e, de outro lado, podem sugerir a morte da literatura como objeto impresso e marcado por um suporte material, já que, ao ser transformada em hipertexto eletrônico, dispensa a conservação de sua fonte original.

Entre uma nova sacralização (que pressupõe o distanciamento entre o texto e o leitor dos dias de hoje) e a destruição da literatura impressa, escolhemos tomar outra chave para a superação desse impasse e para elucidarmos o que a literatura pode representar no contexto de revolução da mídia eletrônica. Com essa chave, lançaremos um olhar para os modos como a literatura tem-se reinventado em novas formas de aproximação da literatura impressa e da literatura digital.

O surgimento de uma literatura criada especificamente para a interação digital é apontado por alguns teóricos como uma metáfora para a pós-modernidade, embora muitos críticos questionem o caráter literário dessas obras que se apresentam como literatura eletrônica. Essa literatura de essência eletrônica tem

crescido rapidamente nas últimas décadas, em diferentes variações que já determinam a caracterização de subgêneros digitais.

De um modo geral, os textos eletrônicos podem coexistir com os impressos, principalmente com o texto literário impresso, que leva a linguagem ao ponto máximo de elaboração. As produções diferenciadas desde a sua gênese enriquecem a experiência do leitor, alargando as possibilidades de interação e permitindo que aquele leitor reclamado pela literatura para participar da realização da obra possa, em um processo igualmente não-linear, ser leitor e autor, emitir valores e juízos sobre as produções de seu tempo e, ao mesmo tempo, refletir sobre os valores e o juízo emitido por outros.

Com esses textos (pela primeira vez, no mesmo suporte), podem ser conservados e transmitidos imagem, texto e som, isto é, uma produção que apela para todos os sentidos, como se possibilitasse o contato sensível com a realidade universal. Essa criação provoca uma revolução no campo da leitura, comparada à revolução iniciada por Gutenberg, já que

o fluxo sequencial do texto na tela, a continuidade que lhe é dada, o fato de que suas fronteiras não são mais tão radicalmente visíveis, como no livro que encerra, no interior de sua encadernação ou de sua capa, o texto que ele carrega, a possibilidade para o leitor de embaralhar, de entrecruzar, de reunir textos que são inscritos na mesma memória eletrônica: todos esses traços indicam que a revolução do livro eletrônico é uma revolução nas estruturas do suporte material do escrito assim como nas maneiras de ler (ZILBERMAN, 2001, p. 27).

Figura 18: Coletânea de Literatura Eletrônica – Volume I (2009) (Fonte: internet. Acesso: Jul; 2010).

É evidente que estamos diante de textos que se apresentam de modo diferenciado, o que ocasiona mudanças na comunicação com o leitor, especificando o processo de leitura. Considerando a larga produção e o amplo acesso a esses textos, emergem gêneros diversificados que começam a construir suas marcas próprias, em um fenômeno que Lucas (2001) chama de “a babel dos subgêneros”. Dentre esses textos eletrônicos, interessa-nos, de modo específico, caracterizar o texto que vem sendo definido como a literatura eletrônica.

Na busca de uma conceituação da literatura definida como eletrônica, exploraremos as características fundamentais desse gênero, à luz do que entendemos como literatura impressa, assumindo-a como parâmetro de comparação e não como um gênero em posição hierárquica privilegiada ou como a única arte aceitável para a formação do leitor literário. Diferentemente, olhamos para a literatura eletrônica como uma possibilidade de (por meio de suas diferenças) alargar a experiência do leitor e o trabalho de ensino de literatura no contexto escolar.

Talvez a chave da compreensão do lugar que a literatura ocupa nos dias atuais esteja no conceito de literatura eletrônica, que aponta minimamente um espaço para recriação do literário e que emerge em um cenário no qual todos se perguntam sobre a persistência do texto literário como arte da palavra, como se sugerissem a necessidade de uma reinvenção da literatura, ou de uma adaptação aos novos tempos e às necessidades dos “neoleitores”. Diante de tamanha pressão, cabem os questionamentos: a literatura necessita de uma reforma para a sobrevivência no mundo atual? A literatura eletrônica seria uma forma de reinvenção ou de adaptação da literatura?

A Emília de Lobato sabia, por sua própria experiência, que em uma situação de guerra, um processo de adaptação e uma reforma tornavam-se indispensáveis. A personagem, que tinha a chave para o fim de qualquer guerra, costumava assim se pronunciar: “Adaptar-se quer dizer ajeitar-se às situações. Ou fazemos isso, ou levamos a breca. Estamos em pleno mundo biológico, onde o que vale é a força ou a esperteza” (LOBATO, 2008, p. 36).

A Emília acrescentaria, em sua análise privilegiada acerca da guerra travada pelas “gentes” e da importância do tamanho, outra questão relevante frente à provável guerra entre a literatura, que carrega a tradição do impresso, e os gêneros emergentes nas novas mídias eletrônicas: será que a literatura, independente de

sua força textual e de seu potencial transformador, precisa diminuir de tamanho para que gêneros “mais contemporâneos” possam ganhar espaço no meio virtual e na experiência dos leitores?

Pensamos que a ideia frequentemente difundida em contextos de guerra, de que um oponente não pode sobreviver ao outro, isto é, de que um dos oponentes precisa ser derrotado para que o outro possa prevalecer, não se aplica ao confronto entre a literatura impressa e a literatura eletrônica. “Agora, porém, temos de reformar essa ideia, como também temos de reformar todas as ideias tamanhudas” (LOBATO, 2008, p. 39), pois, nesse diálogo que propomos, a harmonia entre a diversidade de textos é sinal de avanço na discussão acerca da formação leitora, assim como é fundamental para o entendimento das representações da literatura na pós-modernidade. Então, fica evidente a urgência na reforma de ideias e não de artes já afirmadas no decorrer dos séculos ou de artes que surgem, que se desdobram em reinvenções criativas.

Nessa direção, interessa-nos esse novo tipo de literatura que cresce com a ampliação da internet e o aperfeiçoamento dos recursos de computadores; a literatura, que, além de essência eletrônica inerente à sua composição editorial, carrega uma interface digital de comunicação com o leitor e é criada exclusivamente para o meio eletrônico. Trata-se de um gênero que, ao ser criado no ciberespaço, mescla-se com outros gêneros e recursos da cultura digital contemporânea, incluindo artefatos de animação, de jogos, de arte digital e design gráfico, o que torna a sua hibridização uma marca que a difere da outra literatura que se manifesta essencialmente na linguagem verbal impressa; ou seja, a literatura eletrônica recorre a outras fontes para a sua criação.

Hayles (2009), em sua obra Literatura eletrônica: novos horizontes para o literário, empenha-se na discussão das novas possibilidades estéticas resultantes das mudanças nas formas e nos suportes de comunicação e aponta a literatura eletrônica como um novo meio de “alterar nossa forma de ver o mundo, de morar no tempo, de viver os espaços, de experimentar a vida, seja na realidade viva das coisas, seja em realidades virtuais, em simulações fidedignas” (HAYLES, 2009, p. 10).

Segundo a autora, a literatura eletrônica é criada exclusivamente para uma interface digital no intuito de intermediar as inteligências e as experiências estéticas dos leitores, indo além dos objetivos cognitivos e afetivos, já que emerge,

principalmente, como um elemento de humanização das práticas computacionais e de revelação de nossa situação contemporânea. Assim, ela conceitua essa arte digital:

A literatura eletrônica, geralmente considerada excludente da literatura impressa que tenha sido digitalizada, é, por contraste, “nascida no meio digital”, um objeto digital de primeira geração criado pelo uso de um computador e (geralmente) lido em uma tela de computador. [...] Obra com um aspecto literário importante que aproveita as capacidades e contextos fornecidos por um computador independente ou em rede. [...] a literatura eletrônica é normalmente criada e executada em um contexto de rede e meios de comunicação digital programáveis, ela também é movida pelos motores da cultura contemporânea, especialmente jogos de computador, filmes, animações, artes digitais, desenho gráfico e cultura visual eletrônica (HAYLES, 2009, p. 20).

Figura 19: Coletânea de Literatura Eletrônica – Vol. II (2011) (Fonte: internet. Acesso: Jul; 2010).

Nesse sentido, a literatura eletrônica encaminha-se para um conceito amplo, que alia um trabalho criativo, artístico, mercadológico e híbrido, na medida em que interroga a própria literatura impressa em seus valores essencialmente verbais. É marcada por uma textualidade feita em camadas multimidiais e precisa ser observada para além da ótica do texto impresso, já que faz parte da tradição literária, mas introduz mudanças que redefinem o que é literatura, aproveitando as capacidades e os contextos fornecidos pelo computador e pelas redes.

Em seus processos de criação verbal, imagética e sonora, a literatura eletrônica, assim como a impressa, assume variações de gênero, definidas por Hayles (2009) como um resultado da ampla interação com o leitor em um movimento de infinitas recriações, dada a rapidez das mudanças que ocorrem nos recursos de software e nas necessidades e exigências dos usuários de computador.

A manifestação da literatura eletrônica em gêneros é um indicativo do crescimento dessa forma de criação textual. Dentre eles, encontramos variações diversas que abrangem desde as associações com a literatura impressa até as propostas exclusivas para o meio digital eletrônico e para a rede programável. Yoo (apud KIRCHOF; MENEZES, 2010) define cinco tipologias:

a literatura digitalizada (a simples transposição de textos do ambiente impresso para o ambiente digital), editoração colaborativa (textos que dependem de recursos exclusivamente digitais), escrita colaborativa (experimentos de escrita coletiva, a partir de recursos da web), literatura hipertextual (obras em que predominam recursos hipertextuais) e literatura hipermidiática (obras com predomínio de recursos hipermidiáticos) (YOO apud KIRCHOF; MENEZES, 2010, p. 144).

Para Hayles (2009), todos os tipos de literatura existentes na atualidade são interpenetrados pelo código digital, de modo que a literatura impressa pode ser considerada como mais uma produção de texto eletrônico, ao invés de um meio completamente diferente. Porém, as manifestações dos textos diferem, na medida em que o eletrônico assume esse caráter para além da produção, isto é, realiza-se em um ambiente de execução de códigos essencialmente e funcionalmente eletrônicos.

Nessa perspectiva, a autora contempla uma tipologia, destacando, primeiramente a ficção de hipertexto, caracterizada pela ligação de estruturas digitais, escritas em Storyspace, programa criado para a criação de obras literárias autônomas e distribuídas em CDs (HAYLES, 2009). No entanto, com a ampliação de possibilidades da Web (World Wide Web), essa forma de literatura eletrônica deu espaço para textos que não são apresentados em blocos, com gráficos, som e animação limitados, mas com possibilidades multimodais da Web. Assim, a ficção de hipertexto, acessada por meio de links, é considerada a primeira geração da literatura eletrônica, podendo ser chamada de literatura eletrônica clássica.

Um exemplo dessa tipologia é a obra Afternoon, de Michael Joyce, publicada em 1990, considerada a primeira ficção em hipertexto, na qual os leitores podem decidir o desenrolar do enredo a partir de links. A obra conta a história de Pedro, um recém-divorciado que testemunha um acidente. Nessa ficção de hipertexto, o público

decide se quer ler a versão na qual a ex-mulher e o filho do protagonista estão envolvidos, com um simples click em “yes” ou “no”.

Figura 20: Afternoon, de Michael Joyce, ilustração de uma obra de ficção em hipertexto – orientações para o leitor-usuário (Fonte: Internet. Acesso: Set; 2012)

Após ler as orientações para a “navegação” na obra, o leitor tem acesso à obra, clicando em links, conforme evidencia a figura abaixo:

Figura 21: Afternoon, de Michael Joyce, ilustração de uma obra de ficção em hipertexto – links clicados pelo leitor-usuário. (Fonte: Internet. Acesso: Set; 2012).

Em suas formas mais contemporâneas e pós-modernas, as ficções de hipertexto ganharam variações híbridas, com narrativas que emergem de uma coletânea de armazenamento de dados, que permitem a interação entre som, texto falado, texto animado, montagens gráficas e outras funcionalidades de uma estrutura de redes interligadas. Essas obras podem ser nomeadas como ficção

digital, já que fazem uso da tecnologia do hipertexto para a criação de narrativas emergentes e recombinatórias.

Um tipo de ficção digital pode ser representado pelas obras que passamos a nomear de flipalbuns ou flipbooks, livros digitais considerados precursores da literatura eletrônica, que recorrem à silhueta do impresso, com páginas sobrepostas reunidas pelo dorso e sequenciadas com o recurso de som para imitar o folhear de páginas, como podemos observar abaixo:

Figura 22: Páginas de flipalbum da obra Chapeuzinho Amarelo, de Chico Buarque, em ficção digital. (Fonte: adaptação da pesquisadora).

Esse texto é reconhecido como um tipo de literatura digitalizada, já que é a adaptação da fonte impressa para interface em meio eletrônico, como a transposição de uma literatura que passa a ganhar marcas digitais e acesso em outra via, em um processo de emigração.

Ainda na visão de Hayles (2009), dessa forma de ficção digital deriva uma ficção interativa, que tem “elementos de jogo mais acentuados. [...] não pode avançar sem a participação dos usuários. [...] As ficções interativas expandem o repertório do literário por uma variedade de técnicas” (HAYLES, 2009, p. 25). Contudo, há uma diferença entre a literatura eletrônica e os jogos, que podem confundir-se no uso dos mesmos elementos eletrônicos e de narrativa, mas se distinguem quanto ao fato de que, no jogo, o usuário interpreta e configura ambientes digitais para alcançar um objetivo; nas obras de literatura eletrônica, o objetivo é a própria narrativa que o usuário configura a fim de interpretá-la. Com isso, essas obras promovem “modificações inteligentes dos dispositivos literários

tradicionais” (HAYLES, 2009, p. 25). Assim sendo, podemos destacar o jogo como