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CAPÍTULO I: A DIPLOMACIA ECONÓMICA E A INTERNACIONALIZAÇÃO DA ECONOMIA

1.3 A Reorientação do Apoio do Estado às Empresas

Os laços das empresas com os Estados já não são o que eram: as empresas dependem menos dos Estados, a nacionalidade de uma empresa e de um produto tornou-se numa noção cada vez menos clara, as estruturas das empresas evoluíram, os mercados financeiros alteraram-se.

A diplomacia económica mergulhou, já há meio século, em universos novos, em meios que outrora não eram os seus, em problemáticas que emergiram há duas gerações. Por todas estas razões, é necessário ajustar a esta nova configuração as forças económicas.

A diplomacia económica moderna, ainda que mantenha algumas das suas funções tradicionais – protecção das empresas e pessoas, informação, apoio material e financeiro – apresenta uma panóplia de novos vectores com a finalidade de auxiliar as empresas a explorarem os mercados externos, no desenvolvimento dos seus objectivos de expansão, destacando-se os seguintes:

ƒ Uma informação repensada e de melhor qualidade;

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ƒ Facturação dos serviços comerciais de apoio (prática iniciada no começo dos anos 80);

ƒ O Estado “padrinho” das empresas; ƒ O Estado é o estratega comercial.

Em relação à informação repensada, uma informação mais orientada para as

necessidades, os serviços da diplomacia económica detêm um leque de

conhecimentos raros, sendo muitas vezes eles os únicos detentores dessa informação. Essa informação deve ser centrada de modo a responder com pertinência às novas necessidades das empresas. Surge, então a questão: quais são as novas necessidades e os pontos fortes das empresas?

Apesar de existir muita informação, é preciso procurá-la e muitas vezes não é fácil obtê-la, não por ela ser confidencial ou secreta, mas por ser específica. Daí, nem sempre implicar uma investigação regular, nem uma difusão sistemática.

As informações mais valiosas são normalmente as mais raras: aquelas que permitem antecipar eventos, as que indicam as estratégias das empresas que poderão tornar-se concorrentes. Estas informações não se podem obter à distância. Por definição, o melhor banco de dados não pode ter tudo. A informação eficaz e operacional deve ser personalizada. Na maior parte dos casos é na fonte, no local, que se encontram as melhores informações.

Paradoxalmente, a abundância e a rapidez da informação criou novas necessidades. Carrière14sublinha que as relações diplomáticas têm um papel importante pois:

ƒ A força das Embaixadas reside no seu portfolio de contactos que, ao seu nível, podem ser bastante elevados.

ƒ O seu leque de contactos é largo. Um Embaixador tem prestígio o que, normalmente, lhe facilita o acesso a quem quer: empresários, sindicalistas, políticos de todos os quadrantes, artistas, economistas, universitários, personalidades de influência, entre outros.

ƒ A Embaixada “envolve” o meio local. Ela tem um conhecimento directo dos grandes actores do mundo político e da sociedade civil o que lhe dá as chaves dos comportamentos e lhe permite verificar as instituições.

Apesar das Embaixadas e das empresas trabalharem em dois terrenos diferentes - as primeiras, nas relações interestaduais; as segundas, no mercado - a comunidade de interesses, em matéria de informações, é mais larga do que se pode crer.

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Neste novo contexto, as empresas esperam das Embaixadas esclarecimentos a dois níveis:

ƒ Estratégico; ƒ Operacional.

No plano estratégico, trata-se de identificar a política económica e financeira, a evolução da legislação, as forças da economia do país, as relações do trabalho, a força dos grupos de pressão e os interesses em jogo. São questões que fazem de maneira permanente parte do trabalho quotidiano das Embaixadas.

Abaixo do plano estratégico, a difusão das informações de carácter operacional é, pelo contrário, em regra, sistematicamente organizado pelas centrais de informação.

De uma maneira geral, a diplomacia económica tem como missão preparar com êxito, no mercado onde actua, a orientação, o diagnóstico da empresa e a adequação dos seus produtos à procura, dar conselhos e acompanhar as primeiras diligências. Esta missão está estreitamente associada ao fornecimento de informações.

A facturação das prestações comerciais de apoio efectuadas pela diplomacia económica surgiu nos anos 80. Até então era considerada uma actividade gratuita. Parecia contraditório incitar as empresas a irem para o estrangeiro e posteriormente apresentar-lhes a factura.

No entanto, em França, os documentos e as prestações dos organismos de informação e de promoção (OCFCE) há anos que já eram pagos. Nos anos 80, a novidade foi a aplicação do mesmo regime às prestações entreguesno estrangeiro pelos serviços da diplomacia económica, mesmo que as facturações fossem mais uma questão de método do que um assunto de dinheiro. Com efeito, passaram a estar excluídas de pagamento as operações que abarquem actividades de poder público.

“A nova estratégia da diplomacia económica em relação às empresas é ajudá-las a compreender a importância dos mercados mundiais, a tomar consciência que para ultrapassar os riscos, mais vale aceitar o desafio e as alterações do ambiente, do que temê-las. Cabe-lhes abrir o acesso às ferramentas que lhes permitirão enfrentar e seguir o ritmo destas evoluções, enfim de apoiar os seus esforços para que elas façam parte do pelotão da frente nos seus mercados. Mas os Estados não se contentam em colocar em jogo os meios de natureza comercial. Eles não hesitam em exercer pressões políticas como no passado e até talvez mais. Os Estados apadrinham os projectos e as empresas o que pode

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ser excepção no estilo de prestadores de serviços operando comercialmente sobre o mercado que eles parecem ter adoptado.”15

No que diz respeito ao Estado padrinho das Empresas – provavelmente uma excepção - surgiu devido à mudança de contexto histórico-político, isto é, talvez porque as rivalidades e os critérios de potência se deslocaram do potencial militar em direcção às capacidades económicas, o interesse dos Governos pelos projectos das empresas tornaram-se mais fortes.

Actualmente, é normal que numa viagem a outro país um Presidente da República, um Primeiro-Ministro ou um Ministro dos Negócios Estrangeiros se faça acompanhar de uma comitiva composta por empresários e gestores importantes. Em cada viagem surge a oportunidade para anunciar contratos.

Todavia, segundoCarrière16, no essencial trata-se de uma operação privada, em que a eficácia das acções dos Estados deve ser avaliada com prudência:

1. O facto do contrato ter sido assinado aquando da visita oficial, não significa que as discussões que conduziram à sua conclusão tenham resultado da presença das personalidades que estão na viagem, mas sim de deslocações anteriores entre as partes do contrato.

2. Esta intervenção política não se pode exercer em toda a parte. É impensável, por exemplo, nos grandes países de economia de mercado onde as empresas são inteiramente livres de fazerem as suas escolhas.

3. A partir do momento em que o projecto é avançado por um Governo, ele assume um valor político e logicamente fica com um preço que tem de ser pago. A intervenção nunca é gratuita para as empresas.

As pressões políticas só são úteis em determinados casos e muitas vezes atiçam a concorrência. Em qualquer caso nunca têm êxito gratuito.

Finalmente, relativamente ao Estado como estratega comercial, à primeira vista, esta ideia atrai. O Estado quando suporta as empresas não deve ter um papel passivo, estabelecendo a sua ajuda à medida que estas o procuram, mas deve agir em parceria activa, fixando prioridades e concentrando as suas forças sobre os objectivos correspondentes às melhores oportunidades de negociações. Deste modo, os meios utilizados serão melhor utilizados e o impacto será mais forte. No entanto, esta visão tem limites:

1. Não se pode assimilar a economia de um país a uma empresa.

15 Guy Carron de la Carrière, op. cit., p. 141.

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2. O Estado não tem meios para apreciar a rendibilidade das suas acções.

3. As competências dos Estados, já que não são os Estados que decidem o que examinar, o que assinar. Nestes aspectos, apenas auxiliam as empresas, colocando à disposição das empresas meios e os seus serviços – vários elos de cadeia de esforços – que conduzem à conclusão de um contrato. As suas intervenções têm sentido, se eles são conhecidos no seio da parceria.

A colocação judiciosa dos Governos ao lado das empresas pode reforçar em muito o seu poder de negociação no mercado internacional, quer com outros Governos, quer com outras empresas, com a finalidade de obter contratos ou estabelecer alianças estratégicas, ou por outros motivos similares.

O Ramos Silva baseia-se em Kelly17 para chamar a atenção do facto de que as formas tradicionais da diplomacia económica atravessam um processo de transformação que envolve o desenvolvimento de novos mecanismos, métodos e normas. Neste processo participam: Estados, empresas, instituições multilaterais, organizações não governamentais, representantes da sociedade civil.

O mesmo autor18 aponta três consequências do processo em curso da transformação da diplomacia económica:

1. Crescente perda de importância de alguns instrumentos da política comercial (tarifas, moeda, etc.). Esta consequência é potenciada pela formação de redes e de novas infra-estruturas de informação e de comunicação.

2. Analisando o clima diplomático e os fluxos comerciais Bergeijk (1996)19 refere a necessidade de se perceber todo o impacto económico e político da diplomacia indicando que a diplomacia não se cinge às actividades do corpo diplomático, vai mais além, exercendo um impacto considerável sobre as relações entre países.

3. Alargamento e transformação das tarefas da diplomacia económica para as negociações sobre a ordem económica do pós-guerra, aumentou a procura do tipo específico de economistas que tenham conhecimentos não técnicos, e também em outras áreas como a diplomacia, história, política internacional,

17 D. Kelly, “The Business of Diplomacy: The International Chamber of Commerce Meets the United

Nations”, CSGR Working Paper n.º 74/01 (University of Warwick: Department of Politics and International Studies, 2001), in J. Ramos Silva, op. cit., 100.

18 Cf. J. Ramos Silva, op. cit., pp. 101-105.

19 Cf. P.A.G. van Bergeijkin, “The Significance of Political and Cultural Factors for International Economic

Relations”, Interntional Trade, A Business Perspective, eds. C.J.Jepma e A. P. Rohen (Londres/ Nova Iorque/ Heerlen: Longman e Open University of the Netherlands, 1996, pp.195-212), in J. Ramos Silva (a), op. cit., p. 101.

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saibam encetar e conduzir negociações. Surge uma nova abordagem interdisciplinar nas relações económicas internacionais.

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