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Contextualização e Enquadramento da Diplomacia Económica em Portugal

CAPÍTULO V: O INVESTIMENTO DAS EMPRESAS PORTUGUESAS NO BRASIL – UMA APOSTA SUSTENTÁVEL?

5.1 Avaliação da Intervenção do Estado – Enquanto Diplomacia Económica – Papel no Desencadeamento da Vaga do Investimento

5.1.1 Contextualização e Enquadramento da Diplomacia Económica em Portugal

De acordo com o exposto no capítulo I, a diplomacia económica desenvolveu-se ao longo do século XX, tendo ganho um papel cada vez mais importante a partir da segunda metade do século passado.

Com o final da Guerra Fria e a consequente desintegração do sistema bipolar, assistiu- se a uma alteração de prioridades da política externa dos Estados e da diplomacia. No mundo actual, onde as relações internacionais, incluindo as económicas, representam um sistema de relações de poder político e económico, os Estados e os agentes

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económicos individuais querem ganhar cada vez mais protagonismo e influência. Ao mesmo tempo, as economias estão a perder gradualmente o seu carácter nacional tornando-se crescentemente globais.

Num mundo globalizado e interdependente, a economia tornou-se cada vez mais importante como um elemento determinante nas relações internacionais. Daí que, se durante algum tempo o trabalho dos diplomatas se concentrava, sobretudo, em tarefas políticas, actualmente as tarefas de âmbito económico ganham um peso crescente na diplomacia.

As Missões Diplomáticas e Consulares de um Estado no território de outro Estado, apresentam-se como uma extensão de serviço público. Na verdade, as funções da actividade diplomática, consagradas no artigo 3º da Convenção de Viena sobre as Relações Diplomáticas (de 16 de Abril de 1961) são as seguintes:

ƒ Representação – Conjunto de actuações do agente diplomático que têm um carácter puramente representativo, isto é, de simples afirmação de presença ou responsabilização do Estado em nome do qual actua.

ƒ Protecção – Protecção de certos interesses específicos do Estado acreditante, incluindo os dos seus cidadãos, junto do Estado receptor.

ƒ Informação – Recolha, por meios legítimos, de informações que são transmitidas para os Serviços Centrais pelo Chefe da Missão ou em seu nome. É, sem dúvida, uma das principais funções da actividade diplomática.

ƒ Promoção – Trata-se de um elemento dinâmico, impulsionador da actividade diplomática e consiste no conjunto de acções exercidas pelo agente diplomático no sentido de criar ou incrementar um determinado tipo de relações entre o Estado acreditante e o Estado receptor (promoção de relações económicas, comerciais e culturais).

ƒ Negociação – Em sentido amplo, significa o contacto pacífico entre os Estados com a finalidade de concertarem entre si a resolução de interesses comuns ou recíprocos (negociação informal contínua). Em sentido restrito, traduz a concertação entre Estados com o objectivo de alcançar um acordo sobre uma questão específica (negociação formal). A negociação pode ser directa (entre os detentores do poder político) ou indirecta (feita por intermediários); pode ser bilateral ou multilateral (consoante as partes negociadoras sejam dois ou mais Estados).

Hoje em dia os interesses económicos dos Estados são também defendidos pela diplomacia. Com efeito, esta vai exercendo, em diferentes graus, as actividades ligadas à promoção, negociação e protecção dos interesses económicos e comerciais do Estado que representa, como é o caso da internacionalização das empresas do seu país.

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Paralelamente, a globalização transformou as fronteiras profissionais da diplomacia, pondo em causa a exclusividade de actuação dos diplomatas tradicionais. Outros actores diplomáticos têm emergido, dentro e fora, do Estado, actuando na esfera internacional. Estes agentes, na maior parte dos casos, actuam de forma independente e sem qualquer coordenação com o MNE.

Focalizando agora a atenção no tema em análise, a diplomacia económica abrange a exploração, promoção e captação de oportunidades de comércio e de investimento entre um país e os demais, mediante o uso de canais diplomáticos. Nesta perspectiva, a comunidade diplomática de um Estado passou a desempenhar um papel significativo no seu desenvolvimento económico.

“A diplomacia económica abrange políticas ligadas ao sector produtivo, ao movimento e troca de bens e serviços, aos fluxos de investimento e à informação e análise dos enquadramentos legais e internacionais.” 1

A diplomacia económica concentra-se em três fins: facilitação do comércio, facilitação de investimento e transferência de tecnologias, bem como, do saber. Assim, os diplomatas, ao mesmo tempo que enfrentam os desafios de âmbito político, também podem ser criadores de valor para o seu país.

Retomando a distinção de Carrière2, a diplomacia económica exerce-se a dois níveis: macroeconómico (no âmbito das Organizações Internacionais, etc.) e microeconómico (no âmbito das empresas).

Neste contexto, o papel dos Estados e das respectivas diplomacias - enquanto instrumentos de promoção e protecção de interesses dos países - mantêm-se bastantes relevantes, em particular na esfera das relações económicas. Consequentemente, o sistema contemporâneo de relações internacionais e os processos de globalização e integração impõem a necessidade de intensificar a actividade da diplomacia económica direccionada para o desenvolvimento e defesa das prioridades económicas e dos interesses dos países. Hoje em dia, não são apenas os países desenvolvidos que praticam a diplomacia económica; os países em transição e os países em desenvolvimento vêem-se forçados a seguir os exemplos dos países mais avançados.

Em Portugal, em termos de evolução, foi a partir das décadas de 50 e 60 que se assistiu a um trabalho árduo do MNE que, em articulação com o Ministério da Economia, reuniram esforços no sentido da integração de Portugal nas Organizações Internacionais que estavam a emergir (OCDE, OTAN, EFTA, entre outras). Como se sabe, era uma época em que Portugal estava “virado para dentro”.

1 Cf. definição de J. Odell, Negotiating the World Economy, (Ithaca e Londres: Cornell University Press,

2000).

2 Cf. Guy Carron de la Carrière, La Diplomatie Economique, Le Diplomate et Le Marché (Paris: Económica,

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Em 1986, com a entrada de Portugal nas Comunidades Europeias, o Gabinete de Fomento Económico fechou, acentuando-se a vertente política do MNE. Segundo o Embaixador F. Seixas da Costa3, foi claramente um erro, pois o Gabinete de Assuntos Económicos, posteriormente criado, ainda não conseguiu alcançar o peso que o Gabinete que o precedeu obteve.

Somente em 1997, é que pela primeira vez foi aludida oficialmente a diplomacia económica, através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 61/97. O então Ministro da Economia, Augusto Mateus, quis criar mecanismos permanentes de diplomacia económica. Nesse contexto, assistiu-se a uma tentativa de conciliação entre o Ministério da Economia e o MNE no sentido de se criar um dispositivo de diplomacia económica. Tiveram lugar várias reuniões para o efeito, todavia a implementação da diplomacia económica, como um instrumento contínuo e permanente, não vingou4. Mais recentemente, a diplomacia económica voltou a ganhar protagonismo tendo, em 2002, o então Ministro dos Negócios Estrangeiros, A. Martins da Cruz, procurado introduzir um modelo de diplomacia económica5.

Em suma,

“o atraso da existência de uma verdadeira diplomacia económica no âmbito do MNE deve-se de alguma forma a uma mentalidade de um certo desprezo e distanciamento do económico que tem raízes profundas em certas elites nacionais e em especial nas classes especialmente dedicadas à representação externa. Durante séculos, a chefia de missões diplomáticas era entregue, entre nós, a membros de classe nobre, na qual era comum o desprezo por transacções comerciais e operações financeiras, assuntos tradicionalmente deixados aos judeus. (…)

3 Cf. F. Seixas da Costa, “Enquadramento Histórico, Conceitos e Protagonistas”, Colóquio sobre Diplomacia

Económica, Seminário de Abertura do Mestrado em Gestão Pública, (Aveiro: Universidade de Aveiro - CSJS,

22 de Outubro 2004).

4 Dentro do próprio MNE havia algumas divergências: enquanto o Ministro dos Negócios Estrangeiros, Jaime

Gama, preferia a diplomacia pura, o Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, F. Seixas da Costa, era um adepto da diplomacia económica, defendendo este projecto.

5 Este novo modelo estabelece um triângulo de competências entre o MNE, o Ministério da Economia e o

ICEP. Este último passa a obedecer a ambas as instituições. O objectivo é que os postos do ICEP no exterior de Portugal partilhem pelo menos a mesma co-localização física das Embaixadas. Neste novo modelo, os Embaixadores passam a ter as funções de coordenação de apoio às empresas nacionais, promoção dos bens e serviços portugueses e apoio à captação de investimento estrangeiro. Compete-lhes, também, a avaliação do risco político dos negócios e a identificação de novas áreas e oportunidades de negócio. Em relação ao Conselheiro Económico, este passa a ter, entre outras, as funções de apoio às empresas nacionais na vertente de internacionalização, a recolha, tratamento e proposta de resolução de restrições e entraves ao comércio, investimento e turismo.

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As agências do Ministério da Economia no estrangeiro actuaram quase sempre de forma inteiramente autónoma sem nenhuma ligação com as nossas representações diplomáticas, dispondo, estranhamente, de maiores meios financeiros do que as Embaixadas. Esta separação fez também com que fosse desprezado muitas vezes o potencial gerido pelo desenvolvimento de boas relações políticas, uma importante base para a dinamização das relações económicas.”6

5.1.2 Avaliação da Intervenção do Estado – Enquanto Diplomacia Económica

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