5.16 CATEGORIAS SEMÂNTICAS DE ANÁLISE
5.16.1 A referenciação e os modificadores
A representação discursiva de ACM como presidente do senado faz parte do conjunto das Rds que estamos apresentando:
(L125-130) Governo, que não contou, porém, com um Presidente do Congresso subserviente para atender-lhe naquilo que não merecia ser atendido e diminuir a força do Poder, como muitas vezes é desejo, infelizmente, daqueles que estão no Palácio do Planalto.
(L472-473) [...] mas como Senador e Presidente do Senado. Porque fui corajoso, íntegro e honesto.
No conjunto do seu discurso de renúncia, focalizamos a referenciação “um Presidente do Congresso/do Senado”. A primeira designação vem determinada por um artigo indefinido (um) e pela expressão adjetiva “do Congresso”, bem como recebe o adjetivo “subserviente”. Nesse sentido, percebemos a representação de um Presidente do Congresso comprometido com o povo e não a mercê do poder executivo. A referenciação, nesse contexto, permite que o
participante apresente o seu papel de agente público frente ao legislativo, por meio de suas ações políticas.
No excerto, podemos observar que as características que o referente recebe o tornam um agente político com qualidades positivas:
Referenciação Modificadores da referenciação
“Presidente do Congresso”
“Presidente do Senado” “(não contou) subserviente; corajoso, íntegro e honesto”
Os modificadores da referenciação nos revelam que ACM, quando presidiu o congresso, não obedeceu às normas ditadas pelo Poder Executivo, os traços semânticos de
“corajoso”, “íntegro”, “honesto”, são favoráveis ao referente presidente do senado.
5.16.2 A predicação e os modificadores
Identificamos, nos excertos, as predicações mais recorrentes na Rd de Presidente do Senado:
(L125-131) afirmou que criei alguns problemas para o Executivo, mas que minha atuação foi mais positiva do que negativa. Realmente, sem falsa modéstia, foi muito positiva para o Governo, que não contou, porém, com um Presidente do Congresso subserviente para atender-lhe naquilo que não
merecia ser atendido e diminuir a força do Poder, como muitas vezes é desejo, infelizmente,
daqueles que estão no Palácio do Planalto. É porque eu também não precisava barganhar para ocultar crimes que jamais cometi.
(L132-135) Com respeito, mas altivez, jamais deixei de fazer alertas ao Presidente. Não foi por falta de alerta que despencamos em direção ao abismo. Alertei o Governo, em tempo hábil, para o precipício que de nós se avizinhava. Nada foi feito e hoje quem paga a conta é o povo.
(L450-454) Srªs e Srs. Senadores, estou deixando hoje esta Casa. Deixo-a convencido de tê-la
honrado, sobretudo quando a presidi por duas vezes. Tornei-a altiva e independente, respeitada. Criei áreas de atrito, é verdade, mas nenhuma Casa legislativa se faz altiva - V. Exªs sabem disso-,
independente e respeitada sem atritos, desde que respeitosos e construtivos.
(L455-460) Esse talvez seja o preço mais alto a me ser cobrado neste instante: o de não ter permitido que o Congresso Nacional se quedasse às pressões dos que se julgavam donos dos poderes ilimitados e proprietários da vontade e dos destinos unicamente deste País; dos que tentaram, pela força,
anular a atuação responsável de um dos pilares da democracia, que a tantos custos construímos. Esse
preço, senhores, orgulho-me de pagar. O preço do engrandecimento do Poder Legislativo em uma profícua gestão, que teve, ao seu final, para ficar indelevelmente marcado na vida do Parlamento brasileiro, o reconhecimento externado por membros de todos os partidos, das diversas correntes ideológicas com assento nas duas Casas do Congresso Nacional. Alguns estão acanhados, porque o que disseram aqui, em menos de três meses, tornou-se sem efeito. Outros, mantiveram a sua coerência. A esses, agradeço penhoradamente.
(L466-473) Tenho aqui comigo, impressos em livro, os discursos que muitos dos senhores
pronunciaram com elogios à maneira sensata, correta e altiva com que dirigi esta Casa. É livro quase
depoimentos que o livro contém muito me tocaram. Na época os julguei sinceros. Com humildade, cheguei a me perguntar se os merecia. E me convenci, confesso-lhes que com vaidade, que os merecia, não como Antonio Carlos Magalhães, mas como Senador e Presidente do Senado. Porque fui
corajoso, íntegro e honesto.
Os verbos, em destaque, são de ação e de mudanças de estado. Os usados na 1ª pessoa mostram um locutor que se insere em um processo histórico, que permite a ele apresentar as ações mais importantes para defender o seu mandato: “criei”, “(não) merecia”, “fui”, “(não) precisava barganhar”, “(jamais) cometi”, “(jamais) deixei de fazer”, “estou deixando”,
“deixo”, “alertei”, “tê-la honrado”, “tenho”, “presidi”, “tornei-a”, “agradeço”, “dirigi”, “julguei”, “cheguei a perguntar”, “merecia”, “convenci”, “confesso-lhes”.
Dentre os processos verbais, podemos destacar, primeiramente, os que, na atividade institucional, reforçam a imagem de político comprometido com o patrimônio público:
“criei”, “alertei”, “ter honrado”, “presidi”, “tornei”, “julguei”, “fui”. Os verbos são
reveladores de fatos importantes desenvolvidos pelo locutor. Nesse caso, há uma interligação entre os verbos e os modificadores “corajoso”, “íntegro” e “honesto”.
O uso do verbo deixar, em “estou deixando”, “deixo”, torna pública a renúncia também, do cargo de Presidente do Senado. O verbo tornar, em “tornei-a altiva e independente; tornou-se sem efeito”, aparece no sentido de “vir a ser; fazer-se” e foi empregado em duas situações diferentes. A primeira foi usada para caracterizar a Casa Federal, vinculando à sua forma de administração, durante o período que exerceu o cargo de Presidente. Na segunda situação, o verbo aparece na 3ª pessoa do singular, referindo-se ao discurso dos seus colegas, que deixaram de o elogiar depois da acusação de violação do painel do Senado. Com essa predicacão, o protagonista reafirma a representação discursivade um presidente que provocou e fez mudanças significativas, diferentemente dos outros que o antecederam, que tiveram a gestão qualificada por ele de submissa e sem respeito.
A predicacão de criar em: “criei áreas de atrito”, vem mostrar o perfil polêmico do presidente. Já os verbos “pronunciaram”, “julgavam”, “tentaram”, “estão acanhados”,
“disseram”, “mantiveram” contribuem para a Rd de Presidente do Senado:
(L467) [...] muitos dos senhores pronunciaram com elogios à maneira sensata, correta e altiva [...]. (L457-466) [...] se julgavam donos dos poderes ilimitados e proprietários da vontade e dos destinos unicamente deste País; dos que tentaram, pela força, anular a atuação responsável de um dos pilares da democracia [...]. [...] Alguns estão acanhados, porque o que disseram aqui, em menos de três meses [...]. Outros, mantiveram a sua coerência [...].
Podemos observar que as predicações em destaque revelam posicionamentos de outrem sobre ACM e trazem efeitos de sentido importantes para a Rd de presidente.
No trecho a seguir, ACM parafraseia um membro do Governo e colegas Senadores sobre a sua atuação na época da Presidência do Senado:
(L125-126) Um eminente membro do Governo recentemente afirmou que criei alguns problemas para o Executivo, mas que minha atuação foi mais positiva do que negativa.
(L466-467) Tenho aqui comigo, impressos em livro, os discursos que muitos dos senhores
pronunciaram com elogios à maneira sensata, correta e altiva com que dirigi esta Casa.
Com base nos excertos, podemos constatar que ACM indica discursos de pessoas do governo e do parlamento como estratégia de construção de uma Rd positiva de si. Quando se refere ao membro do governo, apresenta um paradoxo, dizendo que ACM criou problemas, mas que a sua gestão foi positiva. Nesse caso, observamos que, primeiramente, ACM é associado a um político problemático e depois a um político que desenvolveu uma boa gestão frente à presidência do senado.
Nesse sentido, há um julgamento positivo ao dizerem que ACM dirigiu o Senado de
forma “sensata”, “correta” e “altiva”. Os predicativos revelam uma boa avaliação como
dirigente do Congresso Nacional, reafirmando o papel de agente público comprometido. Dentre os modificadores das predicações, destacamos:
Predicação Modificadores da predicação
“foi”
“merecia, precisava barganhar” “ter permitido”
“cometi , deixei de fazer” “deixo-a, presidi”
“tentaram” “agradeço” “pronunciaram” “julguei”
“realmente, sem falsa modéstia, mais positiva, muito positiva; não”
“não (03)” “jamais”
“jamais, com respeito, altivez” “convencido, sobretudo” “pela força”
“penhoradamente”
“com elogios à maneira sensata, correta e altiva” “com humildade, com vaidade”
Os modificadores verbais mais recorrentes são os advérbios modalizadores e os de negação. As expressões modais são usadas para aspectualizar o referente e modalizar o seu discurso: “forma respeitosa”, “altiva”, “correta”, “sensata”, “convencido”, “humildade”,
5.16.3 Localização espacial e temporal
Do ponto de vista dos locativos, a Rd de Presidente do Congresso se limita ao Senado Federal, que é recategorizado durante o discurso pelos referentes: “Palácio do Planalto”,
“Casa legislativa”, “Congresso Nacional”, “Poder Legislativo”, “Parlamento”, “Casas do
Congresso Nacional”, “esta Casa”, “aqui”. São nomes bem específicos que situam o escopo dos momentos vividos pelo presidente até renunciar o mandato.
Já as circunstâncias de tempo são marcadas pelos advérbios “hoje”, “neste instante”,
“quando”, “em tempo hábil”, “na época”, que se referem a dois momentos importantes: o
momento da renúncia, materializado por “hoje”; “neste instante”, e o que a antecede, que se concentra no período em que ACM presidiu o Congresso: “quando por duas vezes”, “em tempo hábil”, “na época”.
As circunstâncias do presente e do passado são constantes na construção da Rd porque localizam no tempo e no espaço os participantes e os atos realizados por eles.
5.16.4 Conexão
A categoria de conexão cria vínculos entre as partes que constroem o conjunto de proposições:
(L125-131) [...] criei alguns problemas para o Executivo, mas que minha atuação foi mais positiva do que negativa. [...] que não contou, porém, com um Presidente do Congresso subserviente. [...]É
porque eu também não precisava barganhar [...].
(L450-454) [...] Criei áreas de atrito, é verdade, mas nenhuma Casa legislativa se faz altiva (L455-460) [...] porque o que disseram aqui, em menos de três meses, tornou-se sem efeito. (L466-473) [...] mas como Senador e Presidente do Senado. Porque fui corajoso [...].
Os fenômenos destacados articulam os períodos para constituírem as unidades de sentido que constroem a Rd de ACM como Presidente do Senado. Podemos ver que as relações mais recorrentes são as adversativas e as explicativas: “mas”, “porém”, “porque”, assumindo dois importantes blocos semânticos. De um lado, as relações adversativas trazem posicionamentos positivos do referente. De outro, as explicativas justificam as práticas de