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5.4 CATEGORIAS SEMÂNTICAS DE ANÁLISE

5.4.3 Localização espacial e temporal

A localização espacial e temporal indica as circunstâncias de tempo e de lugar nas quais são realizados os processos desenvolvidos pelos participantes.

a) Localização espacial

Em destaque, estão os locativos representativos na construção da Rd de locutor:

L143-144 [...] o tal Conselho de Ética desta Casa não se veja obrigado L159-160 [...] Não me acomodei, como é hábito nesta Casa.

L199-200 [...] de alguns histriônicos demagogos nesta Casa.

L266-267 [...] É Rui Barbosa, tantas vezes impropriamente citado nesta Casa [...].

L390-394 [...] embora esta Casa tenha sido até hoje a minha segunda Casa, por mais paradoxal que pareça, estou me sentindo num Ambiente de Brutus, com a única diferença: mas não deixo esta

Casa e dela só me afastarei temporariamente.

L398-399 [...] muito cassado por alguns juízes justiceiros desta Casa. L402-403 [...] momentos aqui vividos, que não me honraram [...].

L404-407 [...] fosse resolvido pela Mesa desta Casa, [...] me comprometesse diante do que se falava

nesta Casa.

L437-438 [...] que carrego no coração e por ela sou carregado no coração e nos braços, como ainda hoje ocorreu na entrada desta Casa.

L440-441 Retornar à Bahia é recuperar ânimo e forças para voltar, em breve, a esta Casa - ou, quem sabe, além dela.

L450-454 Srªs e Srs. Senadores, estou deixando hoje esta Casa. [...] Criei áreas de atrito, é verdade, mas nenhuma Casa legislativa se faz altiva.

L462-463 [...] correntes ideológicas com assento nas duas Casas do Congresso Nacional. L466-467 [...] e altiva com que dirigi esta Casa.

L497-499 [...] vejo alguns com prazer mórbido no meu gesto de despedida desta Casa. L536-537 Eu estava em casa, no sábado, redigindo este discurso [...].

L541-542 [...] pelo clima de trucidamento que reinou nesta Casa. L546-547 [...] inclusive de alguns Pares desta Casa.

L550-551 [...] de agradecimento aos funcionários desta Casa [...]. L572-574 [...] chegue a esta Casa com a disposição de trabalhar [...]. L566 Luís, estou aqui, agora, para honrar a sua memória.

O espaço em que se desenvolvem os processos e os participantes na construção da representação discursiva é figurado pelo referente “Casa”, com letra inicial maiúscula, significando Senado Federal. Podemos observar que este espaço físico é designado 21 vezes no texto, destas, 19 vezes vem antecedida pelo demonstrativo “esta”, é o locativo que designa o espaço das atividades parlamentares. Vemos que, na maioria das vezes, ele é determinado pelo demonstrativo “esta”, que enfatiza o objeto em análise. Indica a proximidade que o locutor mantém com esse espaço, revelendo o grau de intimidade e afetividade que ACM criou com o objeto referenciado. Nesse sentido ele aproxima o Senado de si mesmo, sendo incapaz de traí-lo.

Em outro momento, renomeia de “segunda Casa”, recategoriza-a de “ambiente de Brutus” e uso o anafórico: “dela só me afastarei”. Para Cavalcante (2011), o uso do dêitico serve para chamar a atenção do outro para o foco que está sendo direcionado. No caso do discurso de ACM, ele deseja que seus alocutários percebam que todos os fatos e atos praticados contra ele aconteceram no espaço que ele considera muito importante em sua vida pública.

Podemos dizer que há dois eixos semânticos distintos e até opostos dessa localização espacial. O 1º lado, pela série: “esta Casa”, “segunda Casa”, “dela”, “aqui”, com uma conotação positiva. O 2º eixo: “um ambiente de Brutus”, que traz a conotação negativa. Para

essa referência, ele inclui os adversários que o traíram e o envolveram no escândalo de corrupção.

A relação Brutus versus Senadores rememoriza e (re)textualiza a história romana do Imperador Júlio César. A história remete à traição daqueles mais próximos. César foi morto e um dos seus assassinos era considerado o seu filho adotivo, Marco Bruto. Ao denominar os seus pares de Brutus, ACM se coloca em uma posição de injustiçado e de traído, na sua história política e de vida, assim como Júlio César foi. Nesse caso, o locutor cria o par predicativo: ACM é César. Senadores são Brutus.

Em relação à ocorrência da palavra “casa” (com a letra minúscula), ela aparece no texto com 01 ocorrência: “estava em casa”. O locativo, nesse caso, é a residência familiar, no estado da Bahia do locutor.

Outros espaços físicos aparecem para indicar a representação discursiva do locutor:

(L10) [...] serviços prestados ao seu Estado e ao seu País.

(L11) Nas ruas, em toda parte, onde desmascararei, como tenho feito, os ladrões do Erário. (L18) Aliás, como se Eu fosse algum problema para o Brasil.

(L53) [...] povo sofrido e um pouco de independência à nossa aviltada Nação.

(L179-180) Eu fui considerado prefeito do século em Salvador.

(L425) [...] Somente o povo da minha terra me fará silenciar. (L429) [...] Estou voltando para a Bahia.

Notamos que, além da Casa legislativa, o locutor se ocupa de outros espaços comuns:

“ruas”, “em toda parte”, que constituem lugares pertinentes para tornar público atos políticos,

no sentido de prestar conta do mandato à população.

O locativo “país”, redesignado “Brasil/Nação” é utilizado no texto 44 vezes, conforme

a ordem de ocorrências: País (22), Brasil (17), Nação (05). Consideramos que essa localização é a origem de todo o episódio vivido por ACM.

De forma a restringir os locativos a espaços mais específicos, o locutor utiliza as expressões lexicais: Estado (01), Bahia (08), minha terra (02), Salvador (01). Trata-se de um mesmo campo semântico para destacar convívio familiar e eleitoral do político. Nesse sentido, as localizações definem a geografia do locutor, a do parlamentar e a do homem.

Além das circunstâncias espaciais, as temporais contribuem para a construção da Rd de locutor, conforme a nossa análise na seção a seguir:

a) Localização temporal

Focalizaremos as circunstâncias temporais mais usadas pelo locutor-enunciador:

(L17-23) Há mais de três mesesas atenções do País estão voltadas para mim [...].

(L137) Posso lhes assegurar antecipadamente, contudo, que não cometi qualquer crime contra o Erário [...].

(L179-180) Eu fui considerado prefeito do século em Salvador. Compreendo agora, embora não as aceite, sobretudo quando voltadas contra homens de bem[...]

(L 225-227) Há três meses, repito, não se fala em outra coisa, senão no crime que não cometi. (L280-281) Neste momento histórico, faço questão de olhar de frente [...].

(L390-392) Meus senhores e minhas senhoras, embora esta Casa tenha sido até hoje a minha segunda Casa, por mais paradoxal que pareça, estou me sentindo num ambiente de Brutus [...].

(L393-397) [...] Deixo-os antes da traiçoeira apunhalada final. [...] e dela só me afastarei

temporariamente.

(L408-409) Não faço pactos, expressos ou tácitos, quandoa minha honra está em jogo [...]. (L410-412) [...] Mas não me ficaria bem, depois de tantas acusações que fiz [...]

(L442-444) [...] quando, na verdade, crime algum cometi. (L 450) Srªs e Srs. Senadores, estou deixando hoje esta Casa.

(L536-537) Eu estava em casa, no sábado, redigindo este discurso, quando o telefone tocou.

(L 566) Luís, estou aqui, agora, para honrar a sua memória.

Os localizadores temporais indicam o tempo real em se desenvolvem as ações do locutor para explicar, relatar e justificar a sua prática política. A expressão temporal “há três meses”, é usada na abertura do discurso e na parte intermediária do texto. Nas duas ocorrências, ACM demonstra insatisfação com a divulgação do caso. Essa expressão localiza no tempo o período que a mídia divulgou o envolvimento do Senador com a violação do painel do Senado. Diante da divulgação na grande imprensa, o locutor, por meio do elemento temporal “antecipadamente”, enfatiza a preocupação de se defender: “posso assegurar”.

A localização temporal “agora”, repetida duas vezes pelo locutor, indica o momento do pronunciamento e do anúncio da renúncia. A circunstância contribui para o locutor se reconhecer vítima da situação política.

ACM demarca dois momentos importantes quando usa o verbo “deixar” no enunciado:

“deixo-os antes da traiçoeira apunhalada final e só me afastarei temporariamente”. O primeiro

diz respeito à renúncia. O segundo se refere a um afastamento temporário, que dura até uma nova eleição e é isso que garante o retorno dele.

O advérbio de tempo “quando”, utilizado três vezes, focaliza o momento em que o locutor infere possuir as qualidades, ser do bem, honrado, sério: “quando voltadas contra homens de bem, quando a minha honra está em jogo, quando, na verdade, crime algum

cometi”. A outra ocorrência situa o momento em que ACM pensava e redigia o discurso de

renúncia em casa e recebeu a solidariedade de seus amigos: “eu estava em casa, no sábado,

quando o telefone tocou”.

O advérbio “hoje” também é significativo no discurso de ACM, porque indica o momento exato da renúncia, localiza a hora em que pronuncia o discurso e demarca um momento preciso do afastamento do senador.

A expressão adverbial “depois de” nos revela a postura denunciante do locutor, quando sai do papel de acusado e passa a ser acusador. Ao mesmo tempo, estabelece a impossibilidade de realizar atos que poderiam beneficiá-lo.

Convém, enfim ressaltar que a categoria que demarca as circunstâncias temporais em que desenvolvem as ações do locutor se constitui em um importante recurso discursivo para a construção das representações de si que estamos analisando.