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CAPÍTULO 3 A RECONSTRUÇÃO DO PRINCÍPIO DA CAPACIDADE

4.2 DO DIREITO AO DESENVOLVIMENTO

4.2.1 A Resolução da ONU de 1986 Acerca do Direito ao Desenvolvimento

Em 1986, foi proclamada pelas Nações Unidas, a Declaração do Direito ao Desenvolvimento, a qual elucidou questões concernentes aos sujeitos, ao fundamento, ao conteúdo do Direito ao Desenvolvimento. A Declaração da ONU de 1986 reconheceu o caráter multidimensional do processo econômico, social e político abrangente para a efetivação do desenvolvimento.

O Direito ao Desenvolvimento foi concebido na Declaração de 1986 como imanente ao Homem e atribuído aos Estados e toda a Sociedade, de cada um e todos, simultaneamente. O Estado é instrumento indispensável para a promoção do desenvolvimento dos indivíduos e

255

PEIXOTO; FERNANDES, 2005, op. cit., p. 671.

256

TAVARES, Maria da Conceição. Transformação social como eixo do desenvolvimento. Folha de São Paulo, 4. nov., 2001.

da própria sociedade, mas é esta que detém a soberania para fazer valer as normas consagradas no texto.

A ordem econômica traçada após Segunda Guerra Mundial está voltada à satisfação da dignidade da pessoa humana, reforçando que a democracia é essencial para o desenvolvimento. Sua implementação está diretamente ligada à manutenção da paz nas relações internacionais, bem como, à implementação nos ordenamentos jurídicos dos Estados, normas instrumentalizadoras na concretização do Direito ao Desenvolvimento.

A consagração do Direito ao Desenvolvimento deu seus sinais, pela primeira vez, na Resolução da ONU, de 4.3.1979, que recomendou ao Conselho Econômico e Social estudo aprofundado dos obstáculos junto aos países em desenvolvimento e subdesenvolvimentos para assegurar o gozo do Direito ao Desenvolvimento.257 A partir de então, o Direito ao Desenvolvimento evoluiu significativamente no plano internacional, passando a figurar em diversas Constituições, inclusive a Brasileira de 1988, ocupando espaço nos Parlamentos.

A concepção consagrada na Organização das Nações Unidas abarca não só o desenvolvimento econômico, mas também, a satisfação das necessidades econômica e sociais indispensáveis à dignidade humana, à participação pública, à sustentabilidade ambiental e à capacitação das pessoas, como forma de ampliar as oportunidades das pessoas e sociedades.258

A orientação da ONU traçada na Resolução nº 41/128, de 4.12.1986, é no sentido de que o desenvolvimento econômico só será capaz de trazer a dignidade humana, quando devidamente conjugado com os aspectos sociais.259 Trava-se, assim, o grande desafio para os Estados Soberanos, centrados no compromisso no Desenvolvimento, travado pela ONU a partir da sua Resolução nº 41/128 que adverte estar em jogo questões sociais como o combate a fome e ao analfabetismo.260

257

TAVARES, Maria da Conceição. Transformação social como eixo do desenvolvimento. Folha de São Paulo, 4. nov., 2001.

258

VINHA; RIBEIRO, 2005, op. cit., p. 668.

259

ORGANIZAÇÕES DAS NAÇÕES UNIDAS. Resolução da Assembléia Geral 41/128. Assembléia Geral. Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento. Genebra, 1986. Disponível em:

<http://www.unangola.org/uploadfiles/DeclaraosobreoDireitoaoDesenvolvimento.doc > Acesso em: 10 fev. 2007.

260

WERTHEIN, Jorge; NOLETO, Marlova Jovchelovitch (org.) Pobreza e desigualdade no Brasil: traçando caminhos para a inclusão social. 2. ed. Brasília: Unesco, 2004. p. 19.

Após a Declaração Universal de 1789, registra-se, em 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a qual veio ao mundo jurídico internacional reforçar o mandamento universal de paz social na Terra, representando o segundo tratado de direitos humanos consagrado pelos Estados Modernos. Após os dois principais tratados de direitos humanos, foram decretados: o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, ambos de caráter compulsório para os Estados-partes, os quais levaram vinte anos para serem aprovados perante a ONU, e trinta anos, no total, para entrarem em vigor. Em 1976 obtiveram o número de ratificações necessário à aprovação, e até os dias de hoje, registra-se que não receberam a adesão de todos os países do mundo.261

Herdeira do Iluminismo, assim como a própria ONU, a Declaração de 1948 explicita no preâmbulo, sua doutrina.262 Nenhum dos dispositivos chegava, contudo, a ofender as tradições de qualquer cultura ou sistema sociopolítico. Ainda assim a Declaração Universal dos Direitos Humanos foi submetida a voto, na Assembléia Geral da ONU, em 10.12.1948, e aprovada por quarenta e seis a zero, mas com oito abstenções (África do Sul, Arábia Saudita e os países de bloco socialista).263

Os direitos humanos foram formalmente universalizados pela Conferência de Viena de 1993. Durante a Cúpula Mundial para o Desenvolvimento Social, realizada em Copenhague (Dinamarca), no ano de 1995, inaugurou-se o Relógio da Pobreza, uma tentativa de mostrar ao mundo, de forma dramática, a rapidez do crescimento da pobreza no mundo.264

A Conferência Internacional sobre a Democracia, realizada em Varsóvia, em 2000, que reuniu somente os Estados (não ONG’s, nem o meio acadêmico), concluiu por declarar a “universalidade da democracia no mundo”. Foram 107 Estados que aprovaram o relatório. Isto tem real importância para a consagração do meio e modo de governo a que devem se submeter os interesses mundiais futuros.265

261

ALVES, José Augusto Lindgren. A Declaração dos Direitos Humanos na pós-modernidade. Revista da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo: Centro de Estudos, n. 51/52, p. 61, jan./dez., 1999.

262

Ibid., p. 63.

263

Ibid., p. 63.

264

WERTHEIN, Jorge; NOLETO, Marlova Jovchelovitch. A Unesco e o compromisso com o desenvolvimento e o combate à pobreza. In: WERTHEIN, Jorge; NOLETO, Marlova Jovchelovitch (orgs.) Pobreza e desigualdade no Brasil: traçando caminhos para a inclusão social. 2.ed. Brasília: Unesco, 2004, p. 17.

265

ANNONI. Os novos conceitos do novo direito internacional: cidadania, democracia e direitos humanos. p. 100.

Ao divulgar seu Relatório sobre o Desenvolvimento Humano de 2001, a ONU procurou chamar a atenção da opinião pública, para o debate sobre a efetividade dos regimes democráticos. Comemora-se o fato de, hoje, três quartos da população do planeta viver em democracias. Mas, a questão colocada pela ONU consiste em que medida sistemas políticos que possibilitam maior participação popular, têm sido eficazes para melhorar a condição de vida dos mais pobres.

O Brasil ocupava em 2002, segundo Relatório do Plano das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD -, a 73ª posição no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), embora seja a décima economia do mundo.266 Referido relatório estimou que o país precisaria crescer 5% ao ano, durante 20 anos, e implantar, com urgência, políticas redistributivas e autopromotoras para que possa se igualar a padrões como o da Grécia, país em que a população não enfrenta níveis intoleráveis de desigualdade social e que conseguiu promover reformas no campo social e econômico.267

Além disso, o relatório do PNUD indica que será preciso, necessariamente, elevar os níveis de participação democrática da população, respeitar os direitos humanos além de desenvolver um compromisso com a igualdade e a democracia, para que o país atinja um grau razoável de desenvolvimento.

A ONU procura estabelecer índices de qualidade de vida, oferecendo balizamentos para o mínimo existencial em diversos países, dentre eles o Brasil. Trata-se, na denominação de Ricardo Lobo Torres, do problema da quantificação do mínimo existencial.268

Para Diego Marin-Barnueve Fabo, o quantum existencial para viabilizar a dignidade da pessoa humana deve levar em conta as percentagens habitualmente utilizadas pelo Organismo de Cooperação para o Desenvolvimento Econômico – OCDE -, e pela União

266

MOURA, Joana. Empresa quer chegar ao clube das dez maiores do mundo em 2010. Diário Econômico, 18 jan. 2007. Disponível em:

<http://diarioeconomico.sapo.pt/edicion/diarioeconomico/edicion_impresa/destaque/pt/desarrollo/729566.html > Acesso em: 26 set. 2008.

267

PIOVESAN, Flávia. Pobreza como violação de direitos humanos. In: WERTHEIN, Jorge; NOLETO, Marlova J. (org.) Pobreza e desigualdade no Brasil: traçando caminhos para a inclusão social. Brasília: UNESCO, 2004. p. 135.

268

Européia (instituída pelo Tratado de Maastricht, em 1992) com base na denominada Escala de Oxford.269

A referida Declaração da ONU de 1986 acerca do Direito ao Desenvolvimento endossa a importância da participação dos Estados, dos indivíduos, das instituições em geral para o fomento de políticas públicas visando a sua concretização. A Declaração deve ser concebida no contexto das necessidades básicas de justiça social. Os artigos 2º e 4º esclarecem que o Direito ao Desenvolvimento demanda uma globalização ética e solidária.270