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A responsabilidade social e a Lei do Sinaes

No documento 2008JefersonSaccol parte1 (páginas 88-91)

CAPÍTULO 2 A EDUCAÇÃO SUPERIOR COMO PROMOTORA DO

2.5 Educação superior e responsabilidade social

2.5.1 A responsabilidade social e a Lei do Sinaes

A responsabilidade social não é assunto recente no contexto do ensino superior brasileiro, pelo contrário, foi utilizada durante décadas por instituições universitárias que lutavam por uma universidade em que o compromisso social era tratado como princípio ético do fazer universitário. No entanto, novamente, agora sob nova roupagem, esse compromisso social se torna exigência no mundo acadêmico numa tentativa de se fortalecer a dimensão pública do ensino superior. Essa dimensão pública, por um lado, torna-se necessária na medida em que se fundamenta em duas constatações irrecorríveis e intercorrentes: a primeira, de que as necessidades e carências da parcela da sociedade em situação de exclusão ampliam-se e aprofundam-se com tal intensidade e velocidade que superam, em muito, qualquer possibilidade de atendimento vindo, exclusivamente, da atuação de órgãos governamentais ou das organizações da sociedade civil. A segunda constatação é de que é mais ampla: o processo de globalização econômica universalizou também a exclusão social.

Por outro lado, essa dimensão pública do ensino superior brasileiro é reafirmada pela Lei nº 10.861, de 14 de Abril de 2004 (Lei do Sinaes), quando determina, no § 1º do artigo 1º, que o Sinaes (Sistema Nacional de Avaliação de Avaliação da Educação Superior) tem por finalidades [...] especialmente, “a promoção do aprofundamento dos compromissos e responsabilidades sociais das instituições de educação superior, por meio da valorização de sua missão pública, da promoção dos valores democráticos, do respeito à diferença e à diversidade, da afirmação da autonomia e da identidade institucional.”

Ashley (2002, p.5) entende que,

[...] a expressão responsabilidade social suscita uma série de interpretações. Para alguns, representa a idéia de responsabilidade ou obrigação legal; para outros, é um dever fiduciário18 [...]. Há os que a traduzem, de acordo com o avanço das discussões, como prática social, papel social e função social. Outros a vêem associada ao comportamento eticamente responsável ou a uma contribuição caridosa. Há ainda os que acham que seu significado transmitido é ser responsável por ou socialmente consciente e os que associam a um simples sinônimo de legitimidade ou a um anônimo de socialmente irresponsável ou não responsável.

Nesse sentido, pode-se dizer que, talvez, essa série de interpretações tenha origem em decorrência da mensagem repassada pelas empresas, organizações do terceiro setor e da mídia que reduzem o conceito de responsabilidade social à atuação social de uma empresa. Paralelamente a esse cenário, no ensino superior, a responsabilidade social consubstancia-se a partir da trajetória histórica de uma instituição de ensino superior, bem como nas novas exigências advindas da Lei nº 10.861, de 14 de abril de 2004 (Lei do Sinaes), a qual fornece indicativos sobre como a responsabilidade social deverá ser observada pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior:

A responsabilidade social da instituição, considerada especialmente no que se refere à sua contribuição em relação à inclusão social; ao desenvolvimento econômico e social; à defesa do meio ambiente, da memória cultural, da produção artística e do patrimônio cultural – contempla o compromisso social da instituição na qualidade de portadora da educação como bem público e expressão da sociedade democrática e plural, de respeito pela diferença e de solidariedade, independentemente da configuração jurídica da IES. (SINAES, 2004).

Nesse contexto, cabe salientar que um dos grandes desafios à gestão universitária é a

“radicalização da extensão, principalmente da forma como ela é operacionalizada.” (CALDERÓN, 2006, p. 33). Radicalizar assume a denotação de construir uma IES socialmente responsável por meio do desenvolvimento de “políticas viáveis de extensão no sentido financeiro, além dos projetos sérios e consistentes enraizados nas atividades de ensino e pesquisa” (CALDERÓN, 2006, p. 33).

Em síntese, diante dessa dinâmica, a responsabilidade social das IES, de acordo com a Lei do Sinaes deve ocorrer na perspectiva da inclusão social, do desenvolvimento econômico e social, da defesa do meio ambiente, da memória cultural, da produção artística e do patrimônio cultural, abrangendo os seguintes aspectos:

Inclusão social: Relação das políticas institucionais com processos de inclusão social,

envolvendo a alocação de recursos que sustentem o acesso e permanência dos estudantes (bolsas de estudo, subvenção para alimentação, transporte e alojamento estudantil, facilidades para portadores de necessidades especiais, financiamentos alternativos e outros). (SINAES, 2004). Desenvolvimento econômico e social: Ações e programas que concretizem e integrem as diretrizes curriculares com os setores sociais e produtivos, incluindo o mercado profissional, podendo expressar-se por relações com escolas, assistência judiciária, associações de bairro, movimentos sociais, conselhos tutelares, campanhas de saúde, postos de saúde, cooperativas, incubadoras, empresas juniores,

escritórios tecnológicos, escritórios de captação de recursos, estágios em setores profissionais específicos, prestação de serviços, parcerias de trabalho com órgãos públicos e privados; Experiências de produção e transferência de conhecimentos, tecnologias e dispositivos decorrentes das atividades científicas, técnicas e culturais, que atendam a demandas de desenvolvimento local, regional, nacional e internacional, bem como do meio rural e/ou meio urbano, incluindo o registro de seus resultados. (SINAES, 2004). Meio-

Ambiente: Ações e programas que concretizem e integrem as diretrizes curriculares com as

políticas relacionadas com a preservação do meio ambiente, estimulando parcerias e transferência de conhecimentos; Experiências de produção e transferência de conhecimentos, tecnologias e dispositivos decorrentes das atividades científicas, técnicas e culturais que sirvam para a preservação e melhoria do meio ambiente no âmbito local e regional, em espaços rurais e/ou urbanos. (SINAES, 2004). Preservação da memória e do

patrimônio cultural: Ações e programas que concretizem e integrem as diretrizes

curriculares com as políticas relacionadas ao patrimônio histórico e cultural, visando sua preservação e estimulando parcerias e transferência de conhecimentos; Experiências de produção e transferência de conhecimentos, tecnologias e dispositivos decorrentes das atividades científicas, técnicas e culturais que sirvam à preservação da memória e do patrimônio cultural no âmbito local, regional, nacional/internacional. (SINAES, 2004).

As instituições de educação superior devem materializar as ações que evidenciam o exercício de funções de interesse público. Essas ações devem ser balizadas pelo comportamento ético e participativo dos processos de transformação social, oportunizando que os benefícios da ciência e as potencialidades existentes na educação superior possam contribuir para o enfrentamento das questões sociais e suas múltiplas dimensões.

Convém destacar que nos últimos anos, em especial a partir das últimas quatro décadas, houve grandes mudanças no cenário da educação superior brasileira. No passado, as instituições de educação superior eram essencialmente estatais. No entanto, hoje, sob a égide do neoliberalismo e da globalização, institucionalizou-se um competitivo mercado do ensino superior. Nesse aspecto, basta se observar os gráficos 1, 2 e 3 do primeiro capítulo.

Esse cenário extremamente competitivo pode fazer com que algumas instituições de educação superior, como estratégia de marketing, utilizem-se do discurso da responsabilidade social para benefício puro e simples na tentativa de atrair um maior contingente de alunos, sem, no entanto, se preocupar com a real finalidade da Lei do Sinaes.

No documento 2008JefersonSaccol parte1 (páginas 88-91)