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2.3 A preocupação com os filhos

2.3.2 A situação dos filhos maiores – cuidados e escola

A maioria das entrevistadas considera o “filho crescido” a partir de dez ou onze anos. Assim, Claudete, por exemplo, deixa a filha menor na creche, e o mais velho fica sozinho em casa. O fato de não haver local seguro para esta idade é preocupante, e parece ser um problema. Creches não aceitariam filhos desta idade, mas a presença de crianças ou pré-adolescentes sozinhos preocupa. É o caso de Claudete:

Hariet: E com o mais velho, tu não te preocupas quando ele está em casa sozinho?

Claudete: Não...Eu me preocupo, tanto que passo no celular ligando pra ele. “Filho, não mexe no fogão”. Comprei um microondas só para ele. E expliquei: “ó mano, mais de um minuto e trinta não tem necessidade”, pra aquecer um lanche, um café.

O filho de Dirce, mesmo com dez ou onze anos, também ficou sozinho em casa. Ela afirma que nunca conseguiu vaga na creche do Bairro Jardim, e quando isto foi possível,o filho não se acostumou. Foi então que apelou para a irmã.

Também ficou evidenciado que a sobrecarga do irmão mais velho é maior. Claudete ensina o menino a lavar as louças, arrumar sua própria cama, organizar “as bagunças da casa”. Aparece novamente a necessidade da presença das avós para tomar conta das crianças maiores, enquanto não for horário escolar. É o caso de Fernanda, de Hortência e de Iris. Joana conta com a presença da filha, que cumpre parcialmente a lacuna de cuidado devido a sua deficiência física.

Quando os filhos são adolescentes ou jovens, a preocupação da empregada doméstica é com seu desempenho escolar. Mas o ensino superior não é a preocupação inicial. Todas parecem mais preocupadas com o ensino profissionalizante, para que os filhos possam logo arranjar um emprego e poder sustentar-se. E em quase todos os casos os filhos adolescentes ou recém-saídos da adolescência tentam trabalhar. Gládis é um dos exemplos:

Hariet: E me diz uma coisa: como é que teus filhos foram na escola?

Gládis: Graças a Deus, bem. Só este que tem 21 anos é que não terminou os estudos. Tá na oitava, e não quis mais.

Hariet: O que teus filhos estudaram? Fizeram todo o ensino médio?

Gládis: Os três que estão em São Paulo, sim. A minha filha é recepcionista, e o meu filho trabalha no mercado. [....] A minha filha mais velha é casada e não trabalha fora.

Hariet: Chegaram a fazer alguma faculdade?

Gládis: Não. A menina vai fazer agora. Esta que está em São Paulo. E a menor que tá comigo tá na oitava série. E o guri não quer continuar. Os outros terminaram o segundo grau. A gente fala, por causa da emprego, mas filho não escuta a gente, não adianta. Eles só vão se dar conta depois que já tiverem uma idade, procurando emprego. Enquanto a mãe tem, a mãe mantém, mas depois... se a mãe não tiver mais aí... Não sei como vai ser...

As filhas de Hortência também são motivo de preocupação, e ela está insistindo que as filhas escolham um curso profissionalizante, técnico, como eletrônica ou designer. Como é uma das poucas que estudou até o final do ensino médio, consegue ajudar as filhas nos deveres escolares, e cobra bom desempenho. Mas uma das dificuldades para o apoio familiar ao estudo é a pouca instrução delas mesmas. O exemplo de Amália confirma este fato.

Hariet: E como vão teus filhos na escola?

Amália: Ah! Mais ou menos. A mais velha parou um pouco de estudar, que está trabalhando num restaurante. Os outros estão estudando no bairro, Mas eu não tenho tempo, e também não entendo quase nada. Só da pequena é que ajudo. Mas eu mesma, não estudei muito, e o pai tem bastante dificuldade, né. Mas eu quero que eles estudem, pra arrumar um emprego bom.

A filha de Dirce estava fazendo a faculdade de Direito, mas foi obrigada a trancá-la, já que o pai não quis mais ajudar no financiamento. Tentou o ingresso pelo PROUNI, mas ainda não conseguiu retornar. Atualmente trabalha numa fábrica de joias, e, segundo a mãe, “está se virando”. Mas afirma que não consegue acompanhar o filho mais novo, pois “a gente não tem mais condição, eu mesmo não entendo muito...”

Iris é a única das empregadas domésticas que estuda. Cursa uma escola técnica de Farmácia. O curso termina em novembro, e ajuda o filho de 9 anos nos deveres de casa. Hortência também cursou o Ensino Médio completo, mas não

pretende estudar mais. De qualquer forma, vê-se que a comunicação é melhor, bem como o planejamento do estudo dos filhos. Joana afirma que não consegue ajudar o filho adotivo de onze anos, já que estudou só até a sexta série, na colônia. E hoje, segundo ela mesma, “é difícil, porque os ensinamentos de hoje...”. Mas pretende terminar o Ensino Fundamental em breve.

A partir dos depoimentos acima, pode-se perceber que existe uma elevação nos níveis de estudo da empregada doméstica, confirmando o que está acontecendo nos centros maiores. Quando a mesma consegue auxiliar em tarefas escolares, apoiando os filhos e incentivando-os no estudo, isto parece acontecer com mais facilidade. Mas a geração que segue ainda é muito desigual neste sentido. De qualquer forma, percebe-se a necessidade de mais cursos profissionalizantes de tempo integral, mais incentivo à permanência na escola, mais oportunidades de estudo alternativo,de acordo com cada interesse. Só assim o futuro poderá ser melhorado, e o trabalho doméstico será apenas uma das opções de profissão.

3 PERSPECTIVAS DO TRABALHO DOMÉSTICO PARA O FUTURO

Ao considerar as perspectivas do trabalho doméstico será necessário levar em conta a análise bibliográfica realizada no Capítulo 01, que trata da visão histórica da profissão no Brasil, bem como de suas conquistas sociais e trabalhistas. As informações originadas das entrevistas com as empregadas da periferia de Ijuí, que é conteúdo do Capítulo 03, serão consideradas também, na possibilidade de se traçar alguns dos possíveis caminhos que deverão nortear a profissão nos próximos anos. Será necessário analisar o novo perfil deste tipo de trabalho, as novas exigências do mercado, os novos arranjos familiares e as necessidades de instituições de apoio para que o emprego doméstico possa sobreviver nas próximas décadas.