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A situação da inserção de jovens trabalhadores no mercado de trabalho brasileiro

CAPÍTULO I – A RELAÇÃO TRABALHO E EDUCAÇÃO E A CRISE

1.3 A situação da inserção de jovens trabalhadores no mercado de trabalho brasileiro

Ao trabalharmos com a categoria “jovem trabalhador”, faz-se importante, de antemão, destacar que o jovem trabalhador ao qual nos referimos não se encontra delimitado no conceito de “juventudes”. Desse modo, concordamos que

Quando tratamos de concepções sociológicas a respeito de determinadas categorias, é importante termos em mente que tais concepções não são estáticas. Ao contrário, são sempre suscetíveis a novos olhares e aportes. É nesse sentido que entendemos que o recorte etário para a categoria juventude, até então utilizado recorrentemente por pesquisadores das mais diversas vertentes teóricas, possui – sobretudo na sociedade do pós-guerra, que trouxe consigo profundas remodelagens na estrutura econômica capitalista e, consequentemente, no mundo do trabalho – sérios limites. Da mesma forma, as abordagens funcionalistas, de matriz positivista e iluminista, que imputam à juventude uma natural predisposição à transgressão e à delinquência são absolutamente inadequadas para qualquer análise social que se procure fazer. (SILVA et al., 2013, p. 4)

É nesse sentido que ressaltamos que nosso estudo tem por base a classe social desses sujeitos. Sem negar, contudo, as diversas opressões que afligem os jovens da classe trabalhadora.

No modo de produção capitalista, o emprego – na qualidade de trabalho assalariado –, traduz a inserção no mercado de trabalho, seja ele formal ou não formal. No entanto, nesse sistema, não há garantia de inserção de todos os trabalhadores aptos e necessitados de vender sua força de trabalho.

No cenário macroeconômico, esse quadro se agrava com a crise estrutural do capital, que, para recomposição de suas taxas de lucro, submete a classe trabalhadora aos constrangimentos e efeitos mais radicais dessa crise. Além disso, os jovens-trabalhadores que

precisam trabalhar desde a mais tenra idade encontram, desde cedo, a precarização de sua existência por meio do trabalho.

Coerentemente com a lógica e o metabolismo social do capital, a classe que vive do próprio trabalho encontra-se alijada das condições de seu desenvolvimento integral, tanto nos períodos de crescimento econômico como em períodos de recessão e retração. Desse modo, a crise estrutural afeta sobremaneira os países de capitalismo dependente, sobretudo as frações mais empobrecidas da classe trabalhadora (ANTUNES, 2009).

De acordo com o relatório22 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a taxa

de desemprego jovem23 na América Latina e Caribe em 2017 registrou os maiores aumentos

do mundo. A previsão para o Brasil era de que a taxa de desemprego alcançasse 30% dos jovens.

Apesar de o relatório da OIT ter como base as pesquisas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), este instituto tem utilizado em seus relatórios acerca da mesma temática o termo desocupação. Segundo o IBGE, “a taxa de desocupação dos jovens de 18 a 24 anos de idade (27,3%) continuou apresentando patamar elevado em relação à taxa média total (13,0%)” (BRASIL, [20--]). Nessa informação, além do termo “desocupação” já assinalado e do alto índice de desemprego entre os jovens, também cabe destacar a diferença na delimitação da idade que caracteriza o jovem no país.

Essas diferenças, aparentemente sutis, parecem-nos estratégias para confundir e reduzir os conflitos sociais gerados pela crise do capital, já que grande parte dos trabalhadores, embora desempregados – sem direitos trabalhistas –, continuam subsumidos ao capital, de forma cada vez mais precarizada.

Outro aspecto importante de se destacar nos discursos e nas análises desses organismos supranacionais diz respeito ao constante encorajamento e ao incentivo aos países de capitalismo dependente, em relação ao investimento em educação diante das transformações tecnológicas que configuram o dito “novo mundo do trabalho”.

Em média, os jovens trabalhadores agora são mais educados do que as gerações anteriores. Além disso, crescendo em um ambiente mais aberto à tecnologia, eles estão mais bem preparados do que os adultos para colher oportunidades decorrentes da atual onda de tecnologia e podem se adaptar mais facilmente a novos empregos.

Os jovens trabalhadores também têm mais vantagens no uso do computador do que os trabalhadores mais velhos. Uma análise de dados da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) sugere que os trabalhadores

22 “Tendências Globais de Emprego para a Juventude 2017”.

23 Segundo a lei nº 12.852, de 5 de agosto de 2013 (BRASIL, 2013a), que instituiu o Estatuto da Juventude, são

jovens são melhores equipados para resolver problemas em ambientes ricos em tecnologia do que os trabalhadores mais velhos.

As habilidades demandadas também estão mudando. Houve um declínio na busca por capacidades de nível médio, enquanto a procura por trabalhadores altamente qualificados e menos qualificados está crescendo, contribuindo para uma maior polarização no mercado de trabalho.

A demanda por jovens altamente qualificados cresceu fortemente em países de renda alta, enquanto nos países em desenvolvimento e emergentes houve um aumento no trabalho de baixa habilidade. (CAZARRÉ, 2017, grifo nosso)

Apesar do incoerente discurso que aponta melhores oportunidades para os jovens e altos índices de desemprego dessa camada da população, cabe sublinhar a manutenção da divisão internacional do trabalho que corrobora as desigualdades entre os países de capitalismo central e dependente.

Além disso, esses organismos encampam lutas que, na aparência, demonstram grande preocupação com a educação e com a inserção dos jovens no mercado profissional, ao mesmo tempo em que ocultam de que forma e a que custo se dá tal inserção. Para tanto, organizam conferências e apresentam propostas que buscam incidir sobre as políticas públicas voltadas à juventude.

Em 2012, durante a 101ª Sessão da Conferência Internacional do Trabalho, a OIT alertou que o mundo corre o risco de perder uma geração inteira se a crise de emprego juvenil não for enfrentada com urgência. A Conferência aprovou o documento “A Crise do Emprego Jovem: Um Apelo à Ação ”, que recomenda uma série de medidas, como enfrentar o desajuste entre a oferta e a demanda de qualificação para os jovens, melhorar os sistemas de aprendizagem e promover a capacidade empresarial dos jovens. Além disso, a Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável da ONU inclui metas relacionadas à juventude, incluindo a promoção de emprego pleno e produtivo e trabalho decente para jovens e a redução da proporção

de jovens sem emprego, educação ou formação. (ORGANIZAÇÃO

INTERNACIONAL DO TRABALHO, 2012)

Contudo, vale lembrar que, diante da contradição intrínseca do capital, muitas vezes, é por meio de ações que visam à manutenção e à ampliação do capital que a classe trabalhadora, mediante disputas e lutas, conquista mudanças significativas.

A Lei da Aprendizagem, por exemplo, não foi formulada para fomentar uma educação emancipadora, tampouco para proporcionar uma educação omnilateral aos jovens da classe trabalhadora, isto está claro. Cabe considerar, no entanto, que a aprendizagem profissional sob uma perspectiva crítica pode ampliar as reflexões desses jovens trabalhadores sobre as contradições mais intensas encontradas no mundo do trabalho, sob o emprego formal, através da inserção prática que essa lei possibilita. Uma vez que esses jovens, de qualquer modo, precisarão vender sua força de trabalho para sobreviver, como o fazem historicamente os jovens da classe trabalhadora.

Não podemos negar que o acesso à profissionalização através da primeira versão da Lei da Aprendizagem (BRASIL, 1943) garantiu a sobrevivência e possibilitou diversas lutas dos trabalhadores até os dias atuais.

Contribuem para essa análise os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), que mostram que o país contabilizou a contratação de 386.791

aprendizes em 2017, enquanto o potencial24 de contratação foi de 939.731, o que corresponde

apenas a 41,16% desse potencial. No Rio de Janeiro, esse potencial foi de 82.909 jovens, mas foram admitidos apenas 35.088 (42,47%).

Apesar de se observar o crescimento na admissão de aprendizes desde a

regulamentação da Lei da Aprendizagem em 200525, fica evidente, diante do contraste entre o

potencial de contratação e o número de aprendizes contratados, a resistência de grande parte do empresariado à aprendizagem. Mesmo para determinados setores que demandam reposição mais acelerada de seu exército industrial de reserva.

Cabe destacar que, ao longo dos treze anos dessa política, há uma estagnação em relação às ocupações nas quais os aprendizes têm sido contratados. Em 2017, por exemplo, apesar de os setores de comércio terem 97.721 (25,26%) aprendizes admitidos e de a Indústria de Transformação ter feito 94.648 admissões (24,47%), a maior parte desses jovens foi admitida nas ocupações de auxiliar de escritório (155.512) e assistente administrativo (70.192).

Outro argumento que evidencia essa resistência de parte do empresariado é do diretor de Políticas de Empregabilidade do Ministério do Trabalho, Higino Brito Vieira, ao ressaltar o trabalho de convencimento dispensado pelo MT na promoção da aprendizagem: “Ainda temos o desafio de convencer os empregadores de que pode ser vantajoso para as empresas” (PERES, 2018).

Apesar desses esforços de convencimento, tem sido através da coerção que se tem alcançado êxito para a ampliação do número de contratação de aprendizes. Em 2017, a Secretaria de Inspeção de Trabalho (SIT) contabilizou a contratação de 111.146 jovens no Brasil por meio da fiscalização do setor. Apenas no Rio de Janeiro, foram 15.256 jovens contratados.

Além das disputas em torno da Lei da Aprendizagem, observam-se também, através dos discursos dos atores envolvidos nessa política, as contradições que a constituem. A chefe

24 O potencial refere-se à cota mínima (5%) das empresas que devem cumprir a cota de aprendizagem,

conforme a Lei nº 10097/2000 (BRASIL, 2000).

25 Segundo dados do Ministério do Trabalho, através do CAGED, ao longo dos últimos 13 anos, foram

da Divisão de Erradicação do Trabalho Infantil e Promoção da Aprendizagem da Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), Marinalva Cardoso Dantas, a fim de convencer o empresariado e ampliar o número de contratação de aprendizes, sobretudo de adolescentes oriundos do trabalho infantil, argumenta que “A aprendizagem prepara a mão de obra para o empresário, que pode conduzir o perfil dos seus empregados”.

Outro argumento mobilizado, que também está no cerne das ações de formação profissional, é o da junção da formação social com a profissional (LIMA, M., 2016). Segundo Marinalva, “A Aprendizagem, portanto, é preventiva e constrói cidadania e conhecimentos, qualificando o trabalhador, que iria entrar desqualificado, despreparado pela falta de estudo e técnica” (PERES, 2018).

Os dados acerca da realidade da juventude brasileira ressaltam a importância de se disputar essa política e de se fazer cumpri-la. No primeiro trimestre de 2016, o IBGE apontou que cerca de 24,1% dos jovens brasileiros estavam desempregados. A OIT, a partir dos dados do estudo Tendências Globais de Emprego para a Juventude 2017, apontou que 30% das pessoas entre 15 e 24 anos estavam em busca de emprego, destacando a taxa brasileira – 13,1% – como o dobro da média mundial, número que corresponde a 70,9 milhões de jovens desempregados em 2017.

Apesar desses números, a OIT sublinha a melhora desde o auge da crise em 2009. Entretanto, a estimativa para 2018 foi de um aumento de 200 mil jovens desempregados, totalizando cerca de 71,1 milhões de jovens em busca de emprego.

No que tange à educação, dados do IBGE, obtidos através da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2016 (BRASIL, 2016b), apontam que 32,8% dos jovens de 18 a 24 anos estavam frequentando a escola e que apenas 23,8% cursavam o ensino superior.

Esses dados apresentam um pouco do panorama dos jovens trabalhadores no que diz respeito ao emprego, ao desemprego e ao acesso à educação básica e profissional. Além disso, ajudam a compreender as políticas, os programas e os projetos pensados para os jovens da classe trabalhadora, tal como a lei nacional da aprendizagem.