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CAPÍTULO III – APRENDIZAGEM PROFISSIONAL: DA FORMAÇÃO PARA O

3.1 O Mercado da Educação

A formação profissional brasileira, sobretudo da classe trabalhadora, apesar das disputas, vem sendo determinada pelas demandas da elite empresarial. Além disso, o projeto de educação pensado para os trabalhadores é mediado por um conjunto de ideologias oriundas das mudanças no mundo do trabalho diante da crise estrutural do capital.

Assim, com a mundialização do capital, os organismos internacionais passaram a cumprir um papel estratégico na manutenção da divisão social do trabalho. Ancorados na ideologia da globalização, buscam garantir a livre circulação de capital, assim como a relação desigual e combinada entre os países de capitalismo central e periféricos.

A partir desse complexo, fundamentados na Teoria do Capital Humano – atualizada de acordo com o novo modelo produtivo –, buscam formar o trabalhador de novo tipo, (con)formado sob a ideologia da sociedade do conhecimento – “mito de que é na gestão da atividade intelectual que se constrói o lucro” (RUMMERT; ALGEBAILE; VENTURA, 2013, p. 718).

As iniciativas dos organismos internacionais demonstram, na aparência, preocupação com a educação (alfabetização, escolarização, aprendizado e profissionalização) dos países periféricos. Tais ações, relacionadas ao cenário econômico, determinaram o crescimento da demanda por escolarização, no entanto, segundo Haddad e Graciano (2004), as orientações desses organismos não têm produzido os resultados anunciados, posto que, no Brasil, o processo de desindustrialização incide diretamente no crescimento do desemprego e da informalidade do país, juntamente com a redução da remuneração.

Nesse sentido, o slogan “educação para o desenvolvimento”, na sociedade capitalista, esconde a essência da ideologia da “sociedade do conhecimento”, na qual a educação converte-se em mercadoria. Nesse cenário, o mercado da educação (LEHER, 1999; HADDAD; GRACIANO, 2004), mercado da formação (LIMA, M., 2016), ou mercado de serviços educacionais (RODRIGUES, 2007), é uma das áreas que mais atraem o capital financeiro.

Esse mercado educacional engloba desde a venda direta dos serviços de formação, por meio dos cursos em diferentes níveis, até a venda de materiais das editoras (livros, revistas e

apostilas), softwares, jogos “educativos”, computadores, entre outros produtos dessa indústria do “conhecimento” que, embora esteja em franca expansão nos países em desenvolvimento, encontra no Brasil um dos seus mais lucrativos mercados.

Esse mercado abrange todos os níveis e modalidades da educação, entretanto, segundo Rodrigues (2007), há uma predominância na educação superior, na qual as Instituições de Ensino Superior (IES) privadas são responsáveis por mais de 70% das vagas.

No entanto, na qualificação profissional – atualmente denominada Formação Inicial e Continuada (FIC) –, a iniciativa privada detém 76% das unidades, concentrando 88% das matrículas dessa modalidade (LIMA, M., 2016). Considerando o PLANFOR como marco histórico da criação do mercado da educação profissional no Brasil, o Pronatec constituiu um marco da intensificação desse processo no governo Dilma (LIMA, M., 2012).

Apesar de o Brasil ser o maior mercado de ensino superior privado da América Latina e o quinto maior do mundo nesse lucrativo mercado da educação, segundo o artigo publicado pelo portal da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, da Fiocruz, faz-se importante refletir que não se trata apenas de um movimento “natural” do mundo dos negócios. Assim, buscaremos compreender esse movimento a partir das determinações macroeconômicas dentro da divisão internacional do trabalho.

Para tanto, recorreremos à discussão realizada por José Rodrigues (2007) ao cunhar as categorias Educação-Mercadoria e Mercadoria-Educação. Embora se relacionem e interajam no sistema capital, materializam contradições entre diferentes frações da burguesia – comercial e industrial.

A educação, subsumida ao capital, torna-se uma mercadoria a ser valorizada e comercializada. No entanto, sua circulação no sistema capital se dá de acordo com sua utilização no modo de produção capitalista. Ou seja:

Por um lado, se um capital em particular estiver buscando sua valorização a partir da venda de serviços educacionais, tais como o capital investido em instituições de ensino, sejam elas escolas ou universidades, esse capital comercial tenderá a tratar a prática social educacional como mercadoria cujo fim é ser vendida no mercado educacional. (RODRIGUES, 2007, p. 6)

Desse modo, a educação-mercadoria converte-se, no mercado da educação, em venda de “qualificação profissional”, seja em nível básico ou superior, em grande parte, na venda de certificados.

Por outro lado, enquanto mercadoria-educação “[...] a educação e o conhecimento são encarados como insumos necessários à produção de outras mercadorias, como sói50 ser no

processo, o capital industrial tenderá a encarar a prática social educacional como uma mercadoria-educação” (RODRIGUES, 2007b, p. 6). Entretanto, esse “insumo” precisa atender a duas demandas do capital industrial: a de reposição do seu exército industrial de reserva e a da constituição de uma força de trabalho adequada aos seus processos produtivos (RODRIGUES, 2007b).

Essa diferença de interesses sobre a educação reforça a disputa entre essas frações da burguesia, demonstrando que não há homogeneidade dentro da classe burguesa. Além disso, as análises de Marcelo Lima (2016) acerca das mudanças no mundo do trabalho, decorrentes do desenvolvimento capitalista, da revolução tecnológica e dos novos modelos de organização da produção dentro do modo de produção capitalista, apontam quatro tendências na qualificação profissional:

[...] a tendência da desqualificação, que diz haver uma progressiva degradação do trabalho, tanto em termos absolutos quanto em termos relativos; a tendência da requalificação, que crê na elevação da qualificação média da força de trabalho; a tendência da polarização das qualificações, com um número pequeno de trabalhadores altamente qualificados ao lado de uma grande massa de desqualificados; e a tendência da qualificação absoluta e desqualificação relativa, que afirma a ideia de elevação dos conhecimentos em termos absolutos, abaixo entretanto, do patamar dos avanços no campo científico e tecnológico. (LIMA, M., 2016, p. 55-56)

Essas tendências indicam algumas das estratégias empresariais em disputa para a formação do corpo do trabalhador coletivo. Elas não apontam para uma divisão linear entre trabalhadores qualificados e “desqualificados”, “mas estabelece o seu suposto diferenciador em função do grau de repetição inerente a cada atividade, o tempo necessário de aprendizado e escolaridade requerido” (LIMA, M., 2016, p. 56, grifo nosso).

[...] a obra traz um importante e original debate sobre o conceito de “tempo socialmente necessário para formação profissional”, um conceito que relaciona os tempos produtivos e os tempos educativos. O autor demonstra que há uma tendência de diminuição desse tempo de formação.

Com base em um estudo empírico sobre o tempo de formação do técnico em eletrotécnica na rede federal do Espírito Santo, o autor conclui que houve uma espécie de “reconfiguração” gradativa dos tempos relativos à formação em diferentes áreas, revelando diferentes concepções pedagógicas para os diversos momentos históricos. (VENTURA, 2019, p. 1)

50 Termo que significa “costuma”, de costume/hábito. Apesar de seu uso não ser comum, encontra-se dessa

Esse conceito de tempo socialmente necessário para formação profissional, desenvolvido por Lima M. (2016), articula o tempo produtivo e o tempo educativo, e nos remete à divisão social do trabalho. Nela, além da correlação de forças entre classe trabalhadora e classe burguesa, assim como entre as frações de classe dentro da burguesia, destacam-se as disputas e as articulações entre burguesia nacional e internacional.

No que se refere aos arranjos no mercado da educação, observam-se as articulações por meio dos organismos internacionais. Assim como no Brasil, onde as ações do Poder

Executivo são definidas e legitimadas sob o discurso do combate à violência51, Leher (1999)

aponta que o Banco Mundial – “o ministério mundial da educação dos países periféricos” –, juntamente com o Fundo Monetário Internacional (FMI), a Unesco e outros organismos internacionais, instituíram a educação como estratégia de dominação social e econômica para a garantia da segurança contrainsurgência, sobretudo no período da Guerra Fria.

Sob o discurso da “Aliança para o Progresso”, esses organismos tomaram para si a responsabilidade para com a educação da América Latina, da África e de parte da Ásia, tendo como base a articulação entre pobreza e segurança.

Essas intervenções trataram-se, a princípio, de autoproteção contra o processo de descolonização e o crescimento do anti-Estados Unidos. Posteriormente, com o crescimento do bloco dos países comunistas, através da ideologia da globalização e da intervenção nos processos educacionais dos países periféricos – por meio de vultosos investimentos –, transformou-se numa estratégia fundamental para o desenvolvimento e a ampliação do sistema capitalista.

Além do processo de (con)formação societal ao capitalismo, a atuação por meio dos organismos multilaterais também se consolidou em estratégia de ampliação do capital através da exploração dos recursos naturais e da força de trabalho dos países periféricos.

Diante desse movimento e da consolidação da hegemonia econômica e ideológica desses organismos, a divisão social do trabalho foi sendo determinada a partir das correlações de forças entre os países de capitalismo central e os países de capitalismo dependente. Essa dinâmica relação vai articulando disputas e interesses de classes, tanto dentro de cada país como em suas interações macroeconômicas.

Importante sublinhar que não se trata de imposições entre países centrais e periféricos, mas de disputas e acordos que também se modificam diante das disputas internas entre as

51 Diante da ideologia que busca criminalizar a pobreza, associada ao discurso da TCH, inúmeros programas e

projetos vem sendo implantados, ao longo da história, a partir de estudos acerca dos índices de violência do país, tais como o Mapa da Violência.

classes antagônicas, assim como intraclasse burguesa. Entretanto, diante da hegemonia dos países de capitalismo central, estes vêm incidindo diretamente nas políticas educacionais dos países periféricos, contribuindo significativamente para a manutenção da dualidade educacional.

Obviamente, os discursos vão se modificando de acordo com o contexto histórico, a conjuntura político-econômica e o próprio desenvolvimento do sistema capital. Como exemplo disso, Leher destaca as diferentes “orientações” educacionais do Banco Mundial para os países periféricos:

A educação é o maior instrumento para o desenvolvimento econômico e social. Ela é central na estratégia do Banco Mundial para ajudar os países a reduzir a pobreza e promover níveis de vida para o crescimento sustentável e investimento no povo. Essa dupla estratégia requer a promoção do uso produtivo do trabalho (o principal bem do pobre) e proporcionar serviços sociais básicos para o pobre. (WORLD BANK, 1990 apud LEHER, 1999, p. 25)

Apesar desse discurso pró-educação da década de 1990, o autor destaca que, na década de 1970, a orientação era em defesa do ensino técnico e profissional para os países em desenvolvimento. Já na década seguinte, 1980, defendia-se o investimento no ensino elementar. Cabe destacar que essas orientações dizem respeito às ações empreendidas pelo Poder Executivo, abrindo espaço e até mesmo “reivindicando” a participação da iniciativa privada e da sociedade civil.

Além da interferência multilateral na definição de áreas prioritárias de financiamento – através da imposição de uma série de condicionalidades – e nos focos de investimentos, esses organismos também atuam sobre a regulação dos diferentes tipos de investimento do capital em nível global.

Diante da consolidação do mercado da educação em nível global, e com os grandes investimentos de empresas multinacionais, a Organização Mundial do Comércio (OMC) se viu mobilizada a intervir no movimento de regulação dos investidores estrangeiros de educação, por meio do Acordo Geral sobre Comércio de Serviços (GATS). A OMC engloba a educação em sua ampla lista de serviços e, segundo ela, “os serviços são considerados uma mercadoria que deve obedecer ao critério da máxima liberalização e abertura ao capital estrangeiro, de forma a maximizar os lucros das empresas que investem nesses setores, particularmente as transnacionais” (HADDAD; GRACIANO, 2004, p. 73).

Além disso, Rodrigues sintetiza cinco aspectos que balizam a política dos organismos internacionais para a educação superior na América Latina e no Caribe:

O primeiro deles é a busca de abertura do setor educacional aos investimentos privados. O segundo aspecto, que complementa o primeiro, é a “globalização dos sistemas educacionais”, isto é, o incentivo às universidades públicas e privadas para que se associem a instituições de educação superior de caráter transnacional. O terceiro aspecto refere-se ao fortalecimento das chamadas “universidades corporativas”, isto é, da adoção institucionalizada, por parte de grandes empresas, de programas internos de qualificação e treinamento de sua própria força de trabalho. O quarto aspecto refere-se ao incentivo à educação a distância, impulsionada pelas inovações tecnológicas e apoiada na comercialização de “pacotes educativos”. Finalmente, a quinta diretriz dos organismos multilaterais indica a transferência de recursos orçamentários da educação superior à educação básica. (RODRIGUES, 2007, p. 18-19)

Tais iniciativas tornaram ainda mais atraente esse lucrativo mercado de venda de educação-mercadoria, especialmente no ensino superior.

De acordo com estudo realizado pela Consultoria Merrill Linch (CHANNEL NEWSASIA, s.d.), anualmente a educação, em geral, movimenta cerca de US$ 2,2 trilhões, e em 2001 empregava cerca de 5% da mão de obra mundial. A mesma instituição afirma que a demanda atual mundial por ensino superior é de 84 milhões de pessoas, número que deve chegar a 160 milhões em 2025, com a maioria concentrada em países em desenvolvimento. (HADDAD; GRACIANO, 2004, p. 68)

O Brasil, além de compor a lista de países em desenvolvimento, também figura entre os países com maior nível de privatização do ensino superior (70%), estando atrás apenas das Filipinas (94%) e da Coreia (78%). Apesar desse atraente potencial de investimento, tanto por parte da oferta quanto por parte do público, o Brasil passou por um alto índice de ociosidade dessas vagas, especialmente nos fins da década de 1990.

Essa estagnação na ocupação das vagas se deu, sobretudo, devido às dificuldades dos estudantes para a manutenção das mensalidades, o que foi habilmente solucionado pelo Poder Executivo, representado e representante do empresariado da educação no bojo do Estado.

Em busca de socorrer os empresários da educação, assim como de atender à demanda e à pressão histórica da classe trabalhadora pelo direito de acesso ao ensino superior, atendendo também às orientações dos organismos internacionais, tais como o Banco Mundial, o Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), a Organização das Nações Unidas para Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), o Poder Executivo flexibilizou e ampliou o credenciamento das instituições de ensino Superior (IES). E também promoveu a transferência de recursos públicos a essas IES privadas por meio do Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (FIES) e também do Programa Universidade para Todos (PROUNI).

Apesar de reconhecermos que o FIES e o ProUni – sobretudo este último – inseriram um contingente significativo da classe trabalhadora no ensino superior, não podemos nos furtar à reflexão de que os valores investidos nesses programas que, em essência, representam

uma forma de privatização do ensino superior promovido através de IES privadas, poderiam ter sido investidos na expansão do número de vagas nas universidades públicas. Especialmente devido à diferença da qualidade do ensino e à garantia da formação integral da classe trabalhadora, proporcionada, em sua maioria, nas universidades públicas.

Esse expressivo crescimento no mercado da educação superior52, além de contar com a

adoção do Poder Executivo às orientações dos organismos multilaterais, também segue a “receita” do mercado empresarial, de que tanto se orgulha e que tem como grande exemplo de “sucesso” dessa fórmula o crescimento da Universidade Estácio de Sá (UNESA).

A “receita” de tal crescimento foi sintetizada pela revista Veja Rio (ano 9, n. 25, jun. 1999): 1. vestibular fácil; 2. grande variedade de cursos; 3. mensalidade de baixo custo; 4. campi espalhados pelo Rio de Janeiro, inclusive em shopping centers; 5. marketing que aponta para empregabilidade. Pode-se acrescentar a leniência do poder público, especificamente do Ministério da Educação, para com a autorização de funcionamento de tais empresas educacionais. (RODRIGUES, 2007, p. 24)

A Estácio foi criada na década de 1970, contando com cerca de oitenta alunos. No final dos anos 1990, já tinha cerca de 30 mil alunos; nos anos 2000, possuía mais de 100 mil estudantes e, até 2017, já contava com cerca de 600 mil alunos, figurando como a segunda maior universidade do Brasil (RODRGUES, 2007).

Conforme destacado pelo autor, não se trata apenas de uma receita empresarial que, seguida à risca, constitui-se em garantia de sucesso no “mundo dos negócios”. Ao analisarmos o contexto histórico dos marcos sinalizados na trajetória dessa instituição privada, percebemos que, concomitante às ações implementadas no mercado, também houve diversas estratégias implementadas por meio do Estado.

Cabe lembrar que a reforma universitária de 1968 foi um importante marco do desenfreado crescimento do ensino superior privado no país. Entre as décadas de 1990 e 2000, diante do aprofundamento do neoliberalismo e do desmonte do Estado promovido inicialmente durante o governo de Fernando Collor de Mello, seguido e ampliado por Fernando Henrique Cardoso, seguiu o curso de promoção do ensino superior privado, em detrimento da educação pública. Como marcas legais dessa atuação, destacam-se a Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996 (BRASIL, 1996b), bem como o Plano Nacional de Educação (PNE), instituído pela lei n.º 10.172/2001 (BRASIL, 2001).

Por fim, como último marco legal do processo de regulamentação do ensino superior brasileiro e, consequentemente, do mercado da educação superior do país, temos as ações

52 Dados os limites de tempo e objetivos deste trabalho, não aprofundaremos a discussão sobre o mercado da

educação superior. No entanto, para melhor compreensão do debate proposto por essa pesquisa, faz-se importante situá-lo na discussão mais ampla desse mercado.

implementadas no governo de Luís Inácio Lula da Silva. Quanto a esse período, sublinhamos a lei nº 10.861/2004 (BRASIL, 2004), que criou o Sistema de Avaliação da Educação Superior (SINAES); a lei nº 11.079/2004 (BRASIL, 2004c), que regula as parcerias público- privadas; a lei n.º 11.096/2005 (BRASIL, 2005b), criadora do PROUNI; e o decreto nº 6.096/2007 (BRASIL, 2007a), que reestruturou o FIES e expandiu as universidades públicas por meio do Programa de Apoio a planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI). Por fim, destacamos a criação da Universidade Aberta do Brasil (UAB), criada em 2005 pelo Ministério da Educação, a UAB oferece cursos a distância.

Além de todas essas políticas, o Anteprojeto de lei da Reforma da Educação Superior53, apresentado pelo MEC em dezembro de 2004, e encaminhado ao legislativo em

2006, sob a PL nº 402692/2006, sintetiza o alinhamento político-ideológico das políticas educacionais desse período.

Embora este estudo não tenha como foco as reformas do ensino superior, os marcos destacados objetivam a observação de como os agentes e agências do mercado da educação – cuja grande expressão se dá no ensino superior – operam por meio do Estado, articulando-se com os organismos internacionais.

Desse modo, o que caracteriza o mercado da educação, em essência, não é apenas a comercialização da educação ou a formação em si, enquanto educação-mercadoria, mas, complementarmente, a sua lógica subsunção do trabalho ao capital. Ou seja, seu funcionamento enquanto “espaço” alinhado ao processo de reprodução da força de trabalho (LIMA, M., 2016).

Nesse sentido, algumas ações, ainda que na esfera pública, também constituem o mercado da educação, pois estão permeadas pela lógica de funcionamento do capital. Elas caracterizam, desse modo, uma espécie de privatização por dentro da esfera pública, e não necessariamente a privatização da esfera pública.

Dessa forma, concordamos com Lima M. (2016) ao considerar o PLANFOR como marco histórico de criação do mercado da educação profissional. Posto que, no bojo desse plano nacional, foram implementados diversos programas e projetos determinados – não impostos – pelas demandas do mercado de trabalho, sobretudo pelos setores produtivos com maior articulação no Estado.

Nesse contexto, com discurso de que a rede de ensino técnico profissionalizante no Brasil seria incapaz de atender aos requisitos impostos pelo mundo do trabalho, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) se colocou como articulador de uma nova

53 Ver Leher (2004).

rede de instituições públicas e privadas capazes de se flexibilizarem para garantir um novo modelo de formação centrado no mercado, assegurando o acesso ao emprego. (OLIVEIRA, R., 2001 apud LIMA, M., 2016, p. 113)

Com isso, a mercadoria-educação, requerida pelos setores produtivos na forma de força de trabalho qualificada ou apenas certificada, fomenta esse importante nicho do mercado da educação, cuja qualificação profissional, proporcionada por meio dos cursos FIC, seja em instituições privadas ou públicas, segue, em grande parte, a lógica do mercado da educação em geral.

Apesar de haver tensões e disputas entre as diferentes frações da burguesia, a fim de garantir a hegemonia do capital diante de sua crise estrutural e das mudanças no mundo do trabalho, essas frações convergem no sentido de (con)formar as novas forças produtivas frente à flexibilização dos processos produtivos, das novas profissões e do acirramento da relação capital-trabalho.

Outra mediação fundamental diz respeito às determinações do capital financeiro inserido nesse mercado. Por meio do capital financeiro, considerando a correlação de forças, amplia-se a associação entre capital internacional e nacional em torno do mercado da educação, sobretudo diante dos novos nichos que se abrem por meio da Educação a Distância e dos cursos de pós-graduação.