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CAPÍTULO III – APRENDIZAGEM PROFISSIONAL: DA FORMAÇÃO PARA O

3.2 Aprendizagem Profissional na formação para o mercado

A manutenção e a perpetuação do modo societal do capital exigem um conjunto de ações para que ele seja ampliado. Por meio do Estado, na concepção de Gramsci (2000), essa manutenção se dá tanto pela coerção no âmbito da sociedade política – que se concentra no Estado stricto sensu – como pelo consenso através da sociedade civil.

Entretanto, vale ressaltar que ambas as formas de atuação – coerção e consenso – ocorrem nessas duas esferas do Estado Ampliado. Lembremos, pois, dos grandes empreendimentos do período colonial, no qual, diante da ausência de mão de obra “qualificada”, “o Estado envolvia o trabalho e a aprendizagem compulsória, ensinando o ofício aos menores dos setores mais pobres e excluídos da sociedade: os órfãos, os abandonados e os desvalidos” (MANFREDI, 2002, p. 76).

Ambas as formas de dominação têm a Educação como ponto central de mediação, já que ela se relaciona de maneira intrínseca com o Trabalho – enquanto forma de intercâmbio com a natureza na produção da vida. Dessa forma, atuar sobre a formação da classe trabalhadora constitui-se como estratégia fundamental para a reprodução do capital.

É nesse sentido que, historicamente, a classe burguesa vem desenvolvendo uma série de estratégias para legitimar suas ações de (con)formação da classe trabalhadora por meio de seus projetos educacionais que buscam, por um lado, consolidar a dualidade educacional estrutural e, por outro, perpetuar a mercantilização da educação.

Para tanto, os “homens de negócio” vêm desenvolvendo ao longo da História uma série de estratégias que convencem de seus projetos de classe e os legitimam. Nesse ínterim, a atuação do empresariado brasileiro por meio do Estado stricto sensu, e também através das

agências privadas de hegemonia, destaca-se na história da Educação que, no caso da educação da classe trabalhadora, esteve em grande medida atrelada à formação para o trabalho simples.

Ao analisarmos a história da Educação brasileira, observamos que o acesso da classe trabalhadora à escolarização em geral e à formação profissional em especial se deu, por um lado, pela luta da classe trabalhadora em busca desse direito – fosse por meio da pressão ao Estado stricto sensu, fosse pela organização de sua própria educação. E, por outro lado, sempre esteve marcada pelas iniciativas do próprio empresariado, a fim de garantir a força de trabalho necessária para a exploração de mais-valia.

Tais ações se deram tanto por instituições privadas de ensino como por diferentes agências da sociedade civil, tais como as instituições religiosas e as filantrópicas – como a casa dos desvalidos da sorte, por exemplo (CUNHA, 2000; GARCIA, 2000; MANFREDI, 2002).

Embora a formação da força de trabalho por meio da aprendizagem tenha seus marcos desde o Brasil Império (1822-1889), foi na década de 1940, com a criação, inicialmente, do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) durante a era Vargas, que o empresariado consolidou sua atuação por meio do Estado stricto sensu para a formação de sua própria mão de obra (NEVES, 1991).

Apesar dessa histórica atuação da classe burguesa na determinação das propostas de educação da classe trabalhadora, temos como foco deste estudo suas novas formas de atuação. Para tal, faz-se importante analisá-las tendo em vista a restruturação do capital dentro da totalidade das relações econômicas e da divisão internacional do trabalho.

Nesse sentido, consideramos o contexto de consolidação do neoliberalismo no Brasil durante a década de 1990, período nevrálgico do processo de privatização da educação, sobretudo do ensino superior e da educação profissional, nos quais ocorreram mudanças significativas para a nova fase da Aprendizagem Profissional do país.

Foi sob esse contexto que o empresariado brasileiro buscou dar uma nova face à exploração da classe trabalhadora, um capitalismo de face humanizada (MARTINS, A., 2009a). E essa atuação de face humanizada tem como base a estratégia da Terceira Via (ANTUNES, 2009; FALLEIROS et al., 2015), a partir da qual a “sociedade civil”, por meio de seus aparelhos privados de hegemonia, assumiu o papel de protagonista no processo de formação da força de trabalho e de atenuação da exploração do trabalhador, em detrimento do Estado stricto sensu, ressaltando o discurso da “responsabilidade social”.

Diante disso, a criação e a articulação empresarial, através de instituições como o Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife)56 e o movimento Todos Pela Educação

(TPE) , vem desenvolvendo uma série de ações diretas – por meio de seus próprios institutos e fundações – e/ou indiretas – através de projetos, programas e políticas implementadas pelo Poder Executivo.

Isto posto, cabe sublinhar a importância do Gife na formulação da noção de “investimento social privado” que, segundo o grupo, “é o repasse voluntário de recursos privados de forma planejada, monitorada e sistemática para projetos sociais, ambientais, culturais e científicos de interesse público” (GRUPO DE INVESTIDORES SOCIAIS DO BRASIL, 2019).

Com embasamento nas formulações desses novos intelectuais orgânicos da burguesia, são implementadas ações para difusão dessa nova cultura da “responsabilidade social corporativa”. Desse modo, o empresariado é impelido a realizar uma série de investimentos sociais. Não obstante, tanto o Gife como o movimento TPE se consolidam como importantes aparelhos privados de hegemonia (SOUZA, 2014).

Outro aspecto que nos chama a atenção, diz respeito à difusão da ideologia da responsabilidade social adotada pelo Gife. Se, por um lado, o Instituto Ethos opera diretamente com a noção de responsabilidade social, por outro, o Gife utiliza o termo “investimento social privado”. Entretanto, não nos parece, a princípio, uma disputa de hegemonia, tampouco conceitual, posto que, em essência, ambos os termos estão embasados na ideologia do capitalismo de face humanizada, mas sim uma diferença de estratégia.

Um dos integrantes do Gife, o banco JPMorgan57 “investiu” – segundo ele mesmo –,

na criação do projeto “Conexão Aprendiz”. Um site que visa fomentar a aprendizagem profissional no Brasil, através da divulgação de informações acerca da aprendizagem, assim como de orientação para instituições “sem fins lucrativos” que queiram atuar na formação de aprendizes.

Não à toa, eles lançaram um manual para essas instituições, a “Cartilha para ONGs: Como Elaborar um Programa de Aprendizagem a partir da Lei 10.097”. Nesse documento, além da lei da aprendizagem, de uma série de dados acerca dos jovens no Brasil e das

56 Ver Souza (2014).

57 De acordo com informações em seu site, a JPMorgan constitui uma grande empresa de serviços financeiros,

com investimentos em mais de 100 países. Para além de sua atuação mundial no setor financeiro, vale destacar que o grupo ostenta investir em torno de US$200 milhões por ano em organizações sem fins lucrativos em todo o mundo. Segundo esse banco, eles lideram “atividades de serviço voluntário a funcionários em comunidades locais utilizando nossos diversos recursos, incluindo aqueles que advêm de acesso a capital, economias de escala, alcance global e expertise” (J. P. MORGAN SECURITIES, [201-]). Diante disso, seu interesse e investimento na Aprendizagem Profissional carece de pesquisas.

orientações para elaboração de um programa de aprendizagem propriamente, identificamos no Conexão Aprendiz o estabelecimento de mais um aparelho privado de hegemonia, na medida em que ele busca ditar os parâmetros e a concepção de educação que deve balizar a formação desses jovens. Vejamos:

É muito comum olharmos a profissionalização de uma maneira tecnicista, mas o mundo do trabalho atual exige muito mais que isso. Exige pessoas empregáveis não sob o ponto de vista técnico, mas sob o aspecto comportamental. O importante é saber se relacionar, saber se comportar diante das diferentes situações, ser empreendedor e solucionar problemas. Por isso, é preciso dar um outro sentido aos cursos e às “recheadas e complexas” grades de aula, normalmente oferecidas pelas ONGs. As aulas precisam ir além do comum. É preciso que elas tenham um tempero especial e ensinem aos jovens que eles não podem olhar o trabalho somente como uma oportunidade para ganhos materiais. É necessário olhar essa possibilidade como fonte de sabedoria, ensinamentos e crescimento pessoal. O trabalho faz parte da essência do ser humano, da sua vida e de suas conquistas e, na percepção da Lei 10.097/2000, é visto como uma ação educativa, que deve formar os profissionais do futuro. (MUNIK et al. [20--], p. 7, grifo nosso)

Além da defesa de sua concepção de educação, essa instituição também busca articular a lei da aprendizagem à ideologia da “responsabilidade social”:

Embora a maioria dos projetos de responsabilidade social de geração de renda tenha caráter assistencialista e cause dependência por parte dos beneficiados, a Lei 10.097 leva em consideração a autonomia, a autoestima e o desenvolvimento efetivo do jovem aprendiz. Isso porque ele não recebe uma bolsa gratuitamente, como se fosse uma caridade. O aprendiz se sente protagonista da ação na qual está envolvido. A geração de renda, nesse caso, é vista como resposta de um compromisso e de uma responsabilidade, uma vez que ele tem tarefas e horários a serem cumpridos. (MUNIK et al. [20--], p. 8)

Para além da crítica às políticas de assistência social, chama-nos a atenção o papel disciplinador sublinhado na aprendizagem. Além disso, ao elencar os aspectos que considera fundamentais num programa de aprendizagem, o estímulo ao “empreendedorismo” e ao “protagonismo juvenil” também ganha destaque.

Ao apresentar os casos de “sucesso”, a gerente de recursos humanos do JPMorgan, Vivian Kairalla, argumenta que, na aprendizagem, “o aprendiz vê que as pessoas fizeram uma faculdade para estar aqui, mas aqui dentro continuam estudando. Elas fazem inglês, pós- graduação, etc. Então eles veem que têm que continuar” (MUNIK et al. [20--], p. 30)

E ressalta, ainda, o papel das empresas nesse processo. No caso da JPMorgan, “o banco quer que o jovem se sinta estimulado a estudar pelo exemplo que ele tem aqui e que veja a importância que o estudo tem na formação dele” (MUNIK et al. [20--], p. 30).

Podemos observar que essa argumentação coaduna com a TCH e visa incutir nos jovens a ideologia da empregabilidade, ou seja, a ideia de que basta estudar, fazer diversos cursos, e um bom emprego os aguardará no futuro. Esse discurso falacioso omite a crise

estrutural do capital, o processo de precarização do trabalho, de desemprego estrutural, bem como a dualidade estrutural da educação.

Nesse sentido, a proposta de formação defendida busca a formação de um trabalhador de novo tipo, alinhado às novas determinações do capital produtivo. Conforme Frigotto (1995, p. 51),

[...] estamos diante de um processo em que o capital não prescinde do saber do trabalhador e do “saber em trabalho” e é forçado a demandar trabalhadores com um nível de capacitação teórica mais elevado, o que implica mais tempo de escolaridade e de melhor qualidade. Revelam, de outra parte, que o capital, mediante diferentes mecanismos, busca manter tanto a subordinação do trabalhador quanto a “qualidade” de sua formação.

Outra iniciativa empresarial que vale destacar é a do Instituto Ethos, outro relevante aparelho privado de hegemonia, que atua na formação e na articulação do empresariado em torno das pautas que são de seu interesse.

Além da mobilização de diferentes frações do empresariado nacional, chama-nos a atenção sua articulação junto à OIT, à Unicef, entre outros organismos internacionais, bem como junto ao Estado stricto sensu. Cabe sublinhar, em nosso trabalho, a articulação dessas instituições citadas juntamente com o CIEE e a Fundação Roberto Marinho, na construção da “Rede de Apoio à Aprendizagem”, associação criada em dezembro de 2016, sob o discurso de promoção da aprendizagem no país.

De acordo com sua Carta de Compromisso,

[...] as empresas podem desempenhar um papel de impulsionar, fortalecer e coordenar iniciativas público-privadas e redes de responsabilidade social, comércio justo e cadeias de valor livres de trabalho infantil junto ao setor privado, sindicatos e outras organizações. (INSTITUTO ETHOS, 2017, p. 1, grifos do autor)

Dentre as diferentes frações da burguesia, que buscam fomentar a lei da aprendizagem no país, as instituições financeiras ganham destaque. Além do JPMorgan e da Fundação Bradesco – que desenvolve seu próprio programa de aprendizagem –, o Instituto Unibanco se sobressai nessa atuação.

Em análise da atuação dessa instituição no apoio a ONGs que atuam na aprendizagem, Paulo Bastos assinala que “a partir de 2008, o Instituto Unibanco passou a apoiar 24 instituições que trabalham com a implantação de cursos de aprendizagem em dez estados da Federação” (BASTOS, 2011, p. 88). Ao se debruçar sobre o conteúdo dos cursos de formação dessas ONGs apoiadas pelo instituto, o autor indaga:

Se o Instituto Unibanco, em um papel de mecenato, informa como deverão proceder os cursos por ele apoiados, de certa forma não estaria ele orientando como deveria

ser implantado a política pública em questão? Como veremos à frente, o “Saber Viver”, módulo mencionado acima é um conjunto de competências e orientações que deverão ser repassadas aos participantes dos programas envolvidos; neste ponto reside uma importante análise: existe uma diferença entre as instituições, de um lado, as ONGs executoras de programas, de outro, as financiadoras, elaboradoras, e muitas vezes parceiras do Estado na implementação de uma política pública. Desta forma, pode-se afirmar sem receio, que no interior do universo de igualdade apregoado pela sociedade civil existe, sim, os formuladores de hegemonia, e os que a seguem. (BASTOS, 2011, p. 91-92)

Ora, tal análise explicita o papel hegemônico dessas instituições na execução dessa política. Não somente, ressalta o movimento de sua disputa, enquanto instrumento de (con)formação dos jovens trabalhadores, aos seus interesses mediatos.

Esse conjunto de instituições investe em diferentes áreas sociais, articulando ações que (con)formam a classe trabalhadora não apenas no sentido stricto senso – enquanto força de trabalho –, mas também no sentido de assimilação e adequação ao modo de produção capitalista, bem como de amenização dos conflitos antagônicos entre capital e trabalho. Ainda assim, a educação se destaca entre as áreas de investimento. De acordo com Souza,

Entre os projetos sociais que recebem investimento dos seus associados, a educação é uma das áreas priorizadas. Em 2010, entre 131 associados: 85,5% das organizações financiavam projetos na área da educação com uma movimentação financeira de aproximadamente R$ 983 milhões – do total anual investido de R$ 1,15 bilhões; entre as 112 instituições investidoras em educação estava representado tanto o capital industrial quanto o financeiro, nacional e multinacional. (SOUZA, 2017, p. 25)

Outros aspectos que se destacam na forma de atuação das instituições associadas ao Gife são o investimento e a articulação do que denominaram Grupos de Afinidade (GAs), os quais abrangem áreas como saúde, cultura, meio ambiente, desenvolvimento comunitário, juventude, entre outras, além da educação (SOUZA, 2017).

Destacam-se, para este estudo, os investimentos e a articulação entre o Grupo de Afinidade em Educação (GAE) e o Grupo de Afinidade em Juventude (GAJ). Através deles, observa-se o foco no público com idade entre 15 e 29 anos, alcançado por ações implementadas pelo Estado stricto sensu, especialmente pelos ministérios da Educação e do Trabalho, e, no âmbito da sociedade civil, por meio dos projetos como o Programa Nacional de Inclusão de Jovens (PROJOVEM), o Projeto Aprendiz Legal, o Portal Busca Jovem, entre outros (SOUZA, 2017). Ainda segundo a autora,

Essa atuação orgânica do GAE e do GAJ demonstra uma relevante estratégia do Gife para agregar as forças dos seus dirigentes e associados, buscando difundir experiências que estão fundamentadas em seu projeto educativo, bem como pactuar alianças com o Estado stricto sensu e a sociedade civil sob a lógica da política de parcerias. (SOUZA, 2017, p. 27)

É mediante a articulação dessas duas áreas – Educação e Juventude – e o recorte etário de parte dos investimentos que a Lei Nacional da Aprendizagem (BRASIL, 2000) materializa uma importante estratégia para a (con)formação dos jovens da classe trabalhadora.

Cabe destacar que, como o próprio nome aponta, o investimento social privado se configura como um investimento cujo retorno se dá de forma mediata e imediata (FRIGOTTO, 2010). Mediata quando os projetos educativos para a classe trabalhadora são empreendidos durante um determinado período e, de modo geral, surtem efeitos a posteriori. Sejam eles de caráter mais técnico-instrumental, voltados para a aplicação mais direta na produção, sejam eles ações de (con)formação ideológica mais geral, buscando “integrar” o jovem trabalhador à ideologia do modo de produção capitalista. E imediata quando o retorno ratifica a caracterização da Educação-Mercadoria enquanto serviço (pacotes, softwares, apostilas, entre outros) comercializado pela fração do capital comercial.

Nesse contexto, por um lado, a Aprendizagem Profissional potencializa o ganho mediato com Mercadoria-Educação, posto que vende, tanto aos jovens da classe trabalhadora quanto às frações do empresariado, a ideia de mão de obra qualificada, ainda que de maneira aligeirada e voltada, em sua maioria, para o trabalho simples.

Por outro lado, materializa-se enquanto Educação-Mercadoria e potencializa os ganhos imediatos do capital por meio do Poder Executivo, ao possibilitar que essa forma de qualificação profissional seja financiada pelo Estado stricto sensu.

Empiricamente, ao analisarmos o número de jovens contratados por meio da lei da aprendizagem desde sua regulamentação, em 2005, verifica-se, de acordo com o boletim da aprendizagem profissional elaborado pelo Ministério do Trabalho, a contratação de 3.460.904 aprendizes – de 2005 a junho de 2018.

Considerando o potencial de contratação – pela cota mínima de 5% –, que foi de 953.721 apenas no primeiro semestre de 2018, evidenciamos o descumprimento dessa política pelo empresariado industrial, assim como certo desinteresse por parte da fração empresarial que atua no mercado da educação profissional (BRASIL, 2018b). Sobretudo, diante do investimento para o convencimento do empresariado para o cumprimento dessa lei.

Entretanto, o então ministro da educação Cid Gomes, ao anunciar que a meta para o “[segundo mandato da presidenta Dilma Rousseff] é abrir 12 milhões de vagas” (CRUZ, 2015) financiadas pelo Estado, por meio do Pronatec Aprendiz. Evidencia o papel do Estado na mercantilização dessa política, bem como para a configuração de um novo nicho do mercado da educação profissional (CRUZ, 2015).

Contudo, é importante sublinhar as contradições que atravessam a aprendizagem profissional. Por um lado, essa política potencializa a subsunção do jovem trabalhador à lógica do capital, posto que, em grande parte, trata-se de adolescentes e jovens em sua primeira experiência formal de trabalho, sobretudo mediada por um processo de “qualificação profissional”.

Essa intensificação da (con)formação possibilitada pelo processo de aprendizagem prática na empresa – período no qual o aprendiz tem parte de sua formação profissional no chão da empresa –, no qual o jovem aprendiz é inserido de maneira mais intensa na cultura da empresa contratante, na lógica empresarial e, consequentemente, na ideologia do capital, leva- os, muitas vezes, a “vestir a camisa da empresa”. Concordamos com Lima M. (2016, p. 110) quando diz:

Em nossa perspectiva, os programas de educação profissional em geral tendem a restringir os currículos confinando os conteúdos e práticas educativas que resultam numa aprendizagem por parte dos educandos que não vão além de uma leitura superficial da ciência que fundamenta os processos produtivos e se contentam com o domínio prático das atividades de produção frutos de uma formação adestradora.

Por outro lado, o potencial inverso, de ampliação do antagonismo entre capital e trabalho, também é possibilitado. Sobretudo quando a formação desses jovens é atravessada por uma concepção crítica de educação. Nesse contexto, as contradições e as tensões experimentadas no ambiente de trabalho também potencializam de maneira significativa o antagonismo entre as classes fundamentais.

Tal contradição pode ser reforçada se retomarmos as iniciativas relativas à aprendizagem profissional da década de 1940, que, embora tenham sido impulsionadas por interesses corporativos da fração industrial à época, possibilitaram avanços significativos na formação e na inserção da classe trabalhadora no mercado de trabalho.

Importante retomar também o seguinte: para além do contexto histórico da consolidação das bases do neoliberalismo no Brasil, a adesão ao discurso da profissionalização enquanto garantia de desenvolvimento econômico e social, bem como de ascensão das frações mais empobrecidas da classe trabalhadora, deu-se sob a ideologia da Teoria do Capital Humano (FRIGOTTO, 2010).

Essa teoria teve e tem importante papel não apenas para a (con)formação da classe trabalhadora, mas também para a adesão das diferentes frações da classe burguesa à ideologia neoliberal, pois considera o investimento em educação um investimento em capital, assim como qualquer outro que potencializa o “fator trabalho” e a extração de mais-valia (FRIGOTTO, 2010). Além disso, apresenta um retorno sólido e linear desse investimento,

desconsiderando e/ou camuflando a inexistência de emprego para todos, as crises cíclicas do capital, bem como a divisão desigual e combinada entre capital nacional e capital estrangeiro. A análise sobre o processo de assimilação da Teoria do Capital Humano no Brasil permite observar as mediações que contribuem para a assimilação e para a implantação de concepções internacionais nas políticas púbicas do país. Essas relações no âmbito da política internacional são mediadas pelo capitalismo monopolista, com ênfase na relação desigual e