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3. O papel da regulação e da supervisão na indústria bancária

3.3. A Supervisão

O conceito supervisão não possui uma definição universalmente aceite, contudo é possível identificar traços comuns na literatura, os quais definem a atividade de supervisão, no sentido estrito, como sendo o acompanhamento da atividade das instituições financeiras reguladas e a fiscalização do cumprimento das normas que lhes estão prescritas, através de processos administrativos e intervenções concretas, podendo as mesmas assumir um carácter sancionatório e, no sentido lato, como a junção das tarefas anteriormente referidas com responsabilidades e poderes de natureza regulamentar (Malaquias [et al.], 2009).

Malaquias [et al.] (2009) distinguem ainda a supervisão prudencial da supervisão comportamental, pois enquanto a primeira visa, através de uma ação ex ante, garantir atuações prudentes por parte dos agentes económicos, desincentivando a

30 | P á g i n a tomada excessiva de riscos e fomentando o reforço da solvabilidade e liquidez das instituições financeiras reguladas, a segunda tem como objectivo acompanhar a atividade das entidades reguladas junto dos clientes, numa ação ex post, visando aferir o grau de cumprimento das normas vigentes e aplicar o respectivo sancionamento, caso sejam detectadas infracções. Cavaleiro (2010) complementa ainda o conceito de supervisão comportamental, sugerindo que esta alberga as funções de regulação e supervisão da conduta das instituições financeiras nos mercados financeiros a retalho, de modo a atenuar os problemas decorrentes da informação imperfeita característicos dos instrumentos financeiros, garantindo assim uma maior equidade e eficiência nesses mercados.

Cavaleiro (2010) acrescentou ainda que a supervisão prudencial pode ser subdividida em supervisão microprudencial e macroprudencial, distinguindo dessa forma uma supervisão cujo âmbito se circunscreve mais nas instituições financeiras e nas suas relações com os clientes (assumindo por isso uma dimensão mais micro), de outra supervisão cujo âmbito é significativamente mais alargado que o da tipologia anterior, uma vez que procura identificar no global, factores que possam influenciar o local, pretendendo aferir a probabilidade de ocorrência de choques adversos, assim como estimar a dimensão potencial das eventuais consequências decorrentes dos mesmos sobre o sistema financeiro.

A supervisão microprudencial persegue então, como objectivo geral, a definição de incentivos a práticas responsáveis por parte das instituições financeiras, em termos de solvabilidade e liquidez, de modo a salvaguardar os valores que lhes são confiados, reforçando, simultaneamente, a confiança pública nas atividades por estas empreendidas e a estabilidade nos sistemas financeiros (Cavaleiro, 2010). A supervisão macroprudencial,34 por seu turno, procura avaliar e acompanhar os riscos que emergem quer dos mercados, quer do sistema financeiro no seu todo, com o intuito de detectar possíveis vulnerabilidades promotoras de desequilíbrios sistémicos (Cavaleiro, 2010).

Assim sendo, a literatura financeira atribui à supervisão como principais propósitos a manutenção da estabilidade sistémica, da resiliência dos sistemas

34 O BP, decorrente do exercício desta função, divulga anualmente um documento onde consta a análise

intercalar da evolução do sistema financeiro português, designado de “Relatório de Estabilidade Financeira” (CAVALEIRO, 2010).

31 | P á g i n a financeiros, da equidade nas transações e a promoção da confiança pública, salvaguardando os interesses dos clientes, através do fomento de práticas e condutas transparentes por parte das instituições financeiras, regulando, fiscalizando e sancionando em conformidade.

Ainda no que respeita à atividade de supervisão importa referir que a mesma pode ser concretizada através da prossecução de diferentes modelos, os quais variam consoante as especificidades dos sistemas financeiros em causa. Assim, é possível distinguir três modelos de supervisão, designadamente: o Modelo de Supervisão Institucional, o Modelo de Supervisão por Objectivos e o Modelo de Supervisão com um Único Regulador (Santos, 2002).

O Modelo de Supervisão Institucional é o modelo mais tradicional de supervisão, sendo principalmente adoptado a sistemas financeiros em que há a clara distinção dos três segmentos de mercado – financeiro, bancário e segurador - e onde cada operador circunscreve a sua atividade a um dos segmentos referidos. A cada segmento é atribuída uma autoridade de supervisão a qual é responsável por acompanhar todas as vertentes da atividade do intermediário financeiro, compreendendo os processos de seleção de entrada, o próprio desenvolvimento da atividade e até as eventuais saídas do sistema financeiro.

Este modelo de supervisão permite um acompanhamento mais eficaz das entidades supervisionadas, pois possibilita um maior grau de especialização da autoridade de supervisão no controlo por segmento e evita a duplicação de controlos. Contudo, importa referir que o seu ambicioso objectivo – controlo de toda a atividade dos operadores financeiros – pode ser visto também como a sua principal desvantagem, uma vez que pode suscitar sérios conflitos entre os vários propósitos a que se propõe.

A transformação dos sistemas financeiros evidenciada pela tendência para a diversificação das atividades dos vários segmentos que os compõem, para a emergência de conglomerados financeiros de grande dimensão e para uma crescente integração dos mercados e instrumentos financeiros, tornam inadequado o modelo de supervisão institucional, pois as vantagens que lhe eram reconhecidas, com tais mudanças, deixam de se verificar.

32 | P á g i n a No Modelo de Supervisão por Objectivos35 as autoridades de supervisão

centram-se nos objectivos da regulação, pelo que o controlo efectuado a todos os intermediários e mercados é realizado por mais do que uma autoridade de supervisão, independentemente da sua natureza jurídica, das funções ou atividades que desenvolvam. Este modelo de supervisão é o mais adequado para sistemas financeiros com elevada integração dos mercados, com operadores multifuncionais e conglomerados, na medida em que possibilita uma uniformização da regulação para entidades destintas mas que desenvolvem as mesmas atividades. Contudo não se pode refutar as suas desvantagens, destacando-se a duplicação ou a falta de controlos quando não há uma clara delimitação das áreas de responsabilidade e os elevados custos de supervisão associados a este modelo, decorrentes da forma de controlo que o caracteriza.

O Modelo de Supervisão com um Único Regulador36, tal como a própria

designação indicia, consiste num modelo de supervisão no qual existe uma única autoridade de controlo, separada do Banco Central, encarregue da supervisão de todos os mercados e intermediários. As suas funções visam abranger todos os objectivos da regulação: a estabilidade do sistema financeiro, a promoção da transparência, a proteção dos clientes e a eficiência dos mercados. A existência de uma autoridade única de supervisão permite à mesma a construção de uma visão unificada, integrada e geral da realidade do sistema financeiro; contudo o seu sucesso depende da rapidez do processo de decisão, o que obriga a um elevado grau de organização interna, estruturação e coordenação, de modo a prosseguir tal fim. Importa ainda referir que este modelo de análise, dada a sua abrangência, enfrenta dificuldades devido à enorme quantidade de objectivos de regulação que persegue e à conflitualidade37 que, por vezes, surge entre

eles.

35 Como exemplo de uma Supervisão por Objectivos identifica-se o Sistema Italiano, no qual desde 1998,

o Banco de Itália e o Consob (Commissione Nazionale per le Società e la Borsa) partilham a supervisão dos serviços financeiros, sendo o primeiro responsável pelo controlo do risco e da estabilidade financeira, e o último pela transparência e comportamento dos intermediários.

36 Este modelo de supervisão foi adoptado pelo Reino Unido, o qual deu origem à Financial Services Authority, resultante da fusão das autoridades de supervisão anteriores.

37 A título de exemplo, apresenta-se o trade off entre os objectivos de regulação: promoção da

concorrência e promoção da estabilidade do sistema financeiro, em que o alcance de um implica efeitos negativos sobre o outro.

33 | P á g i n a No contexto atual, verifica-se que não existe um modelo de supervisão predominante, identificando-se uma grande disparidade nas escolhas dos países europeus. Países como a Dinamarca, a Suécia e o Reino Unido adoptaram o Modelo de Supervisão com um Único Regulador, já a Áustria, Alemanha, Luxemburgo, Finlândia, as tarefas de supervisão bancária são atribuídas a uma agência. No caso português,38 vigora o Modelo de Supervisão Institucional, comummente designado de Modelo Tripartido, em que os três segmentos de mercado - bancário, financeiro e segurador – têm como entidades de supervisão específica o Banco de Portugal (BP), a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) e o Instituto de Seguros de Portugal (ISP), respectivamente.

Assim sendo, depreende-se que o Modelo de Supervisão Institucional predomina enquanto modelo de supervisão adoptado, contudo importa salientar que é também possível identificar modelos de supervisão que resultam de um certo mix dos modelos anteriormente apresentados.