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A teoria da carga desmedida e suas implicações indesejáveis

Neste tópico, que na verdade é um complemento do que foi desenvolvido no tópico anterior, buscar-se-á delinear algumas especificidades acerca da capacidade contributiva naquilo que alguns denominam “teoria da carga desmedida” e suas implicações indesejáveis, sempre na linha do trabalho, que visa demonstrar as imperfeições de nosso sistema tributário.

Ao falar da teoria da carga desmedida, para Martins (1988), trata-se de uma ficção jurídica, uma teoria na qual se afirma haver uma tendência do ser humano, quando no exercício do poder, e tal se verifica desde o fortalecimento do contratualismo, de exigir sempre mais da sociedade daquilo que ela pode dar, consentir, admitir, tidas estas subjetividades coletivas em acordo com o princípio da proporcionalidade (limites do bom senso que emana da coletividade, do grau de possibilidade desta). Neste sentido, a carga tributária é tratada como plus, ou seja, é sempre maior do que a necessidade tributária do Estado, especialmente no caso brasileiro.

Como já visto no desenvolvimento deste trabalho, mesmo que fosse admitida a proporcionalidade da imposição, que estivesse, via de regra, a carga tributária de acordo com a capacidade contributiva do cidadão, as finalidades arrecadatórias não seriam atendidas. Se for ainda tratada a imposição tributária como um plus, ou seja, “precisamos de mais um extra para conduzir nossas políticas públicas”, mais desproporcional ainda será a imposição. Mais nocivo ainda será o sistema tributário visto sob o problema da sua substancialidade (realidade).

A linha de tal assertiva reside no fato de que, em sendo poucos aqueles que se beneficiam do poder tributário, como visto acima, e bem assim dos privilégios “odiosos” de que já igualmente falamos, a mecânica tributária serviria não para que o Estado pudesse atender a suas necessidades (econômicas, sociais e culturais),

mas como uma espécie de “gordura”, de lucro, e tal se mostra inadmissível na nossa realidade constitucional.

A carga desmedida se corporifica como desmedida quando as despesas do Estado refogem ao escopo do interesse público, que é o de atender apenas as políticas públicas destinadas ao custeio social, de forma a atender à dignidade humana. Isto é, são canalizados recursos públicos para atender interesses privados, ou econômicos-financeiros, além das possibilidades reais.

Opera-se positivamente, por exemplo, no caso dos pedágios (considerados tributos quando não há outra via), em que o poder público realiza obras de vulto para entregar à iniciativa privada a exploração da rodovia, cujos preços públicos nem sempre atendem aos critérios de bom senso. E opera negativamente pela política equivocada de distribuição de privilégios a determinados entes privados, como também já se falou neste trabalho.

Essa prática excessiva de cobrar tributos, por ferir todo ordenamento constitucional, deve ser rejeitada pela sociedade, que é quem, na verdade, arca com a grande massa do ônus tributário. Martins (1988) enumera alguns elementos que caracterizam a “carga desmedida”: a) objetivos mal colocados; b) gastos supérfluos; c) contribuintes apenados, porque incentivos e privilégios são mal distribuídos; d) sonegação e tratamento prático diferencial; e) fiscalização com baixa moralidade exatora e f) sonegação e aumento de receita, que se traduz pelo princípio de que a tributação seria mais elevada para compensar a receita não arrecadada pelos sonegadores.

Nesse contexto, devemos considerar o governo como avatar do Estado, como condutor das políticas deste Estado, embora se fale em Estado, indistintamente. Efetivamente, os objetivos são mal colocados quando o Estado, pelo governo, não estabelece claramente onde serão utilizados os recursos tributários; quando não permite à sociedade participar das decisões sobre programas econômicos, sociais e culturais; quando as diretrizes de determinadas ações de Estado estão em desacordo com a Constituição; quando tais diretrizes, mais especificamente, não sustentam a realidade do Estado Democrático de Direito.

Tome-se como exemplo prático o Programa de Ajuda a Bancos (PROER), pelo qual o Conselho Monetário Nacional e o Banco Central permitiram que bancos e instituições financeiras repassassem os preços de aluguéis, serviços próprios à população, estabeleceram parcelamentos de débitos para auferir receitas impróprias e permitiram privilégios sob outros objetivos que não o social, o humano etc.

É o caso também quando o Estado dispende gastos de forma supérflua, ou seja, quando paga energia acima do valor ao Paraguay, quando remite dívidas de países sul-americanos como no caso da Bolívia, ou quando contribui para desastres em outros países, como o Haiti, Malásia, ou quando empresta dinheiro ao FMI para financiar economias menos desenvolvidas que o Brasil, etc.

Se boas políticas mundiais são necessárias no campo diplomático, não há esclarecimento à população (cidadania tributária) sobre a necessidade efetiva destes gastos; não há exame de outros órgãos componentes do Estado, como o Legislativo e o Judiciário, e da própria sociedade.

Há que se verificar se estas despesas, que diminuem o saldo dos cofres públicos e tornam necessário um maior incremento da arrecadação (que sabemos recai na população) são suportáveis, se não aumentam a carga desmedida. De pronto, temos em conta a realidade brasileira em determinados estados da federação, onde viceja a pobreza e mesmo o estado de miséria humana.

A política de incentivos e privilégios, como já evidenciamos, é nociva quando dirigida apenas aos representantes do poder econômico, ou seja, não é canalizada para o social. Pode ser considerada, inclusive, forma de evasão fiscal, pois o perdão de dívidas ou a não taxação afetam sobremaneira a sociedade, exigindo incremento da arrecadação. A sonegação é medida de evasão fiscal, de forma que sistemicamente significa desestabilização do sistema e sobreoneração da sociedade pela questão da carga desmedida.

Desta sorte, decorre um emperramento da máquina estatal arrecadatória em razão da ausente discricionariedade na condução da política fiscal e tributária, emperrada pela interpretação restritiva e objetiva (princípio da legalidade plena) da

lei tributária, provocando não raras incursões dos contribuintes pelo Judiciário buscando uma melhor interpretação da lei. Mal aparelhada a administração, e emperrada por infindáveis discussões judiciais (na maioria das vezes sob o comando de liminares), há um déficit na arrecadação tributária (postergada pela demora dos julgamentos finais) e o Estado se vê obrigado a buscar, compensar estas “perdas”, ou ingressos de receita, receitando novos tributos ou aumentando alíquotas, diminuindo isenções, etc., o que também se constitui em mais um motivo de “carga desmedida”.

Como já vimos, o Estado contemporâneo exige receitas mais robustas, em razão do aumento das demandas sociais. Todavia, no caso brasileiro, em sendo o Brasil um dos países que mais arrecada no mundo, a situação da carga desmedida assume contornos ainda mais significativos.

Ocorrendo a hipótese de carga desmedida, não há uma correta política fiscal, pois a arrecadação sofre déficits não previsíveis e exige compensação, a finalidade tributária resta desatendida na medida da ausente justiça fiscal, além de gerar desemprego, prejudicial ao desenvolvimento econômico, social e cultural, e influenciar negativamente as políticas de meio ambiente.

Barbosa (2005) nos mostra alguns números, identificadas as fontes na obra, de que no Brasil nunca se tributou tanto como nas últimas décadas. Nem à época do Império, do Brasil-colônia, se tributou tanto proporcionalmente (a autora não refuta a ausência de dados de arrecadação nesta época, quando ainda as finanças do imperador eram as mesmas do erário público, separação que só veio a ocorrer com a Constituição de 1924). Segundo a autora,

em apenas oito anos a carga tributária foi acrescida em 10 pontos percentuais do PIB (todos os bens e serviços produzidos no país durante um ano): em 1994, ela era de 27,9%, e vem crescendo ano a ano, e subiu de 35,48% do PIB em 2001 e para 36,45% em 2002. Do total da arrecadação brasileira, a tributação sobre o consumo representa 44,8%, sendo que o Imposto sobre a Renda representa 13,8%. (BARBOSA, 2005, p. 36).

Ora, como já visto neste trabalho, a maior parte de nossos tributos se dá de forma indireta, ou seja, recaem na população rica, pobre e miserável, pois a

ninguém é dado o privilégio de não gastar com gêneros alimentícios, remédios, etc., gêneros estes de primeira necessidade.

Empresários repassam para os preços de bens e serviços quase a totalidade do que pagam em tributos, o que gera aumento de preço e inflação, embora diminua a demanda, e a diminuição da demanda tem influência sistêmica no desenvolvimento econômico, social e cultural.

A política brasileira de meio ambiente é culturalmente desprezada em matéria de recursos para combater nossos maiores problemas: saneamento básico, assoreamento de rios e lagos, queimadas, desmatamento, prejudicando a sustentabilidade.

Todas estas situações postas têm profunda interferência na condução da política fiscal e tributária (distinção feita apenas porque alguns tributos têm natureza arrecadatória, como o IR, ICMS, etc., e outros natureza fiscal, como Imposto de Importação e Exportação, o IPI, etc.). Nessa má gestão influências como a “carga desmedida” são detectadas por grande parte dos doutrinadores tributários.

Por óbvio, a carga desmedida impõe uma inobservância do princípio da capacidade contributiva. Há ferimento à cidadania tributária na medida em que o cidadão sequer participa das políticas tributárias, além de desconhecer os mecanismos da tributação, como o repasse para os preços de bens e serviços.

Essa falta de clareza na condução da política tributária é proposital. Manter o povo na ignorância, aqui setorizada, é medida cruel e faz parte da velha política, do autoritarismo, e não condiz com a matriz constitucional, que pressupõe efetivo Estado Democrático de Direito.

Há problemas de redistribuição de renda, como aponta Baleeiro (1997, p. 141), na medida em que:

os impostos sobre bens e serviços são inversamente progressivos, retiram dos pobres maior porcentagem de recursos do que aos ricos, já que os artigos de alimentação e vestuário absorvem a quase totalidade dos salários e apenas pequena parte dos altos rendimentos das classes abastadas.

Somam-se a isso problemas na progressividade do imposto sobre a renda, pois nosso sistema de progressividade é perverso e beneficia os ricos em detrimento dos mais pobres, como veremos adiante.

Verifica-se que, na verdade, o sistema de faixas implementado para executar a tributação pelo imposto de renda atinge frontalmente a classe assalariada, a classe média, intermediária na pirâmide social, com o nítido objetivo de densificar a incidência tributária, ferindo tanto a própria progressividade, que resta viciada, podendo-se exemplificar: o contribuinte que recebe uma renda infinitamente superior (por exemplo, R$ 100.000,00 – salário estimado de um executivo da Petrobrás, o seu Presidente percebe R$ 150.000,00 mais dividendos em mais de 13 salários anuais – UM MILHÃO/ANO), está no vértice da pirâmide. É tributado pelo máximo da alíquota, via de regra 27,5%, para quem recebe desde R$ 44.818,28/ano , conforme Tabela IR/201 (RECEITA FEDERAL, 2010). Quem recebe R$ 1000.000,00/ano ou mais, é tributado pela mesma alíquota.

Uma simples equação aritmética deixa antever a mesma tributação (em alíquota) para quem recebe vinte vezes mais. E, veja-se, não há ainda regulação do imposto sobre grandes fortunas previsto programaticamente pela CF/88. Isso é “carga desmedida”. Onde fica a máxima de que “os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade contributiva de cada um”, princípio da capacidade contributiva previsto no § 1º do art. 145 da CF/88? Verifica-se que a velha e já não aceitável política tributária iniciada sob a égide do liberalismo continua com o neoliberalismo e com os governos ditos de “centro esquerda”.

A teoria da carga desmedida, nomenclatura emprestada do professor Martins (1988), trata de um plus tributário agregado ao valor do tributo, presente tanto na fiscalidade como na extrafiscalidade, entendida esta como aqueles tributos utilizados no desenvolvimento da política econômica, social e cultural, vinculados a determinado programa, como base de financiamento de atividades estatais impróprias (PIS, COFINS etc.).

Esta colocação merece importância, porquanto a capacidade contributiva pode ser entendida como corolário da justiça fiscal, aqui também, e em maior monta,

ferida de morte. A carga tributária deve necessariamente ser repartida de acordo com a possibilidade de cada indivíduo de suportá-la. Neste sentido, cumpre analisar que a capacidade contributiva e a carga tributária (quer como “normal”, quer como “plus”) submetem em alto grau de excessividade os indivíduos, ferindo toda uma sorte de outros princípios constitucionais.

A capacidade contributiva se relaciona com o princípio da igualdade, somente obedecido se cada um contribuir de forma equitativa, de acordo com suas possibilidades, só se admitindo, por regra de exceção, no caso de desigualdade entre desiguais. No exemplo acima já vimos que quem aufere cerca de R$ 44.000,00/ano é tributado no mesmo percentual de quem recebe um milhão/ano, segundo a tabela oficial do imposto sobre a renda.

Se há um direito fundamental de contribuir segundo a capacidade contributiva, esta se dirige a atingir o objetivo de construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a promover o desenvolvimento, a permitir seja respeitada a dignidade da pessoa humana, como já visto no item anterior quando tratamos da capacidade contributiva de forma geral.

Segundo Herrera-Molina (1998, p. 98, grifo nosso), “o princípio se estrutura em três aspectos: determinação da capacidade econômica objetiva, da capacidade subjetiva e da intensidade do gravame.”

A determinação da capacidade econômica objetiva assenta-se noutros três princípios: o do rendimento líquido (tributar a riqueza disponível), o da continuidade na determinação da capacidade econômica, que visa verificar os diversos períodos impositivos (impostos progressivos incidem de maneira irregular entre os sujeitos passivos da obrigação tributária, entre classes de bens e serviços) e o da riqueza efetiva, que não permite taxar rendimentos puramente nominais, ou seja, salários e rendas brutas, sem sistema de deduções legais.

Verifica-se, ao longo destas explanações, que ligados intensamente os institutos da “carga desmedida” e os capacidade contributiva, pois dizemos que há capacidade contributiva e, portanto, capacidade de o cidadão arcar com o tributo de

forma justa, quando a carga não é desmedida. São faces de uma mesma moeda.

O ideal seria que a tributação só pudesse recair sobre parcela do rendimento que exceder ao valor das despesas necessárias à própria subsistência, o que alguns doutrinadores cunham de “mínimo existencial”, ou seja, o mínimo vital à existência humana. Mas mesmo assim, haveria de se averiguar se os valores excedentes, sua finalidade, seu destino (se investimento em casa própria e outros bens e serviços futuros), tributados de forma desigual, não continuariam a ferir tais princípios.

Exemplificando de outra banda, no Brasil, a tributação do IR permite determinadas deduções da base de cálculo do imposto, tais como despesas médicas, de saúde, educação, previdência complementar, etc. Cada pessoa, segundo maior ou menor renda, aufere maior ou menor dedução, segundo critérios subjetivos (da necessidade e de renda de cada um). Mas as deduções possuam caráter objetivo (regradas exaustivamente pela lei objetiva). Está na lei do IR que pode deduzir “x” a título de pagamentos com educação, instrução, etc. Se há diferença de renda, é lógico que a dedução terá peso diferente para cada um, o que fere a isonomia, a igualdade, a capacidade contributiva. Então, a lei objetiva está em descompasso com a capacidade contributiva (critério subjetivo) e, portanto, em desacordo com a Constituição.

Conforme Buffon (2009, p. 181),

num Estado que existe em razão do homem, é imperiosa a necessidade de que as condições de sobrevivência da pessoa não estejam aquém de um patamar mínimo. Para que se efetive, portanto, o princípio da dignidade da pessoa humana, deve o Estado assegurar um conjunto de direitos, absolutamente indispensáveis para uma vida digna. Ou seja, não pode se pode falar em dignidade humana, se não for garantido o denominado “mínimo existencial”. Para que isso se concretize, por um lado, o Estado deverá dar a máxima eficácia aos direitos sociais de cunho prestacional, que estejam aptos a assegurar as condições minimamente necessárias a uma existência digna. Por outro lado, é defeso ao Estado exigir tributos que possam atingir aquele mínimo essencial a uma existência digna.

Decorre daí que tributar o cidadão desprovido de manter o próprio sustento, no que se refere a saúde, educação, segurança, habitação, salário digno, velhice amparada, meio ambiente de mínima condição de vida, amparo ao desemprego imprevisto, etc., é no mínimo incompatível com o dever fundamental de pagar

tributos, caracterizando tributação de “carga desmedida” e ferimento ínsito ao princípio da capacidade contributiva dentro da ordenação da Constituição, do próprio Estado Democrático de Direito. É nesse sentido que se fala em capacidade econômica subjetiva como elemento ínsito à capacidade contributiva.

Por isso, as peculiaridades de cada um relativamente à capacidade contributiva, dentro daquilo que pode ser denominado de “mínimo existencial”, ou seja, um nível de vida que se considera digno, devem restar afastadas da incidência tributária desordenada.

Nesse sentido, o mínimo existencial (como conjunto de circunstâncias materiais mínimas a que todos os homens têm direito) deve ser protegido negativamente pela imposição estatal externada pelo tributo e positivamente pelas políticas sociais, que são prestações estatais.

Outra implicação indesejável é o aspecto da progressividade do IR em relação à concretização da capacidade contributiva – por isso ligada à questão da teoria da carga desmedida. A progressividade veio para permitir a exacerbação da exigência tributária à medida que cresce a capacidade de contribuir da coletividade. E se operacionaliza pelo sistema de alíquotas (maiores ou menores) a incidir na base de cálculo – a renda auferida (onde vai incidir a alíquota). Resta evidente, como acima explicitado, que quem recebe na tabela bem acima do máximo será tributado pela mesma faixa de alíquota, 27,5%, tendo um maior excedente de renda, de disponibilidade financeira para a realização de outras necessidades, investimentos, lazer, etc., fatores que contribuem para uma vida melhor.

Ora, a progressividade também é uma das dimensões do princípio da capacidade contributiva, servindo para reforçar o seu conteúdo social: produz distribuição mais harmônica de riqueza; permite seja obedecida a proporcionalidade; se mostra compatível ao princípio da isonomia, da igualdade; justifica a desigualdade para tributar os mais ricos em proteção aos mais pobres; e dá ensejo, assim, à efetiva justiça fiscal, portanto, mais compatível com a estrutura constitucional que ampara o Estado Democrático de Direito.

Evidentemente, as questões postas acima dizem com uma concepção ideal de progressividade, voltada para tornar efetivo também o princípio da capacidade contributiva. Porém, no caso brasileiro, o próprio princípio da capacidade, pelo prisma da progressividade, não se afirma, como já estudado noutro item. A progressividade encontra amparo no modelo de Estado Democrático inserido pela Carta de 88, que deve visar à redução de todas as desigualdades sociais, econômicas e culturais.

Mesmo no imposto sobre a renda, em que a progressividade mais aparece e se mostra necessária, é distorcida, pelo exemplo citado anteriormente, pois a alíquota é a mesma entre pessoas que ganham muito mais do que outras. Não se observa a não tributação do mínimo existencial porque está distorcido nosso sistema de deduções, simplesmente porque o que ganha menos consome seu salário em necessidades básicas que o Estado lhe sonega.

A própria Constituição se auto-regula, estabelecendo que as cláusulas pétreas, somente poderão ser alteradas se for possível alterar a norma que regula a emenda constitucional. No âmbito de sua rigidez, teríamos de modificar a própria regra da emenda que não permite alteração de cláusulas pétreas (a da capacidade contributiva aí se inclui). Trata-se de um paradoxo (ou entrave) jurídico de difícil solução.

Nos tributos vinculados, como as taxas, contribuição de melhoria, contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico, etc., a exigibilidade se condiciona a uma contrapartida do Estado por uma entidade de natureza não estatal de fins de interesse público (contribuições de interesses de categoria profissional, previdenciárias), a proporcionalidade também deve ser aplicada. No entanto, há instituições, como as religiosas, entidades filantrópicas, de beneficência e assistência social, que operam no mercado financeiro e econômico sem o dever de pagar tais emolumentos. Há que se averiguar se há justiça nisto, pois outros entes da sociedade civil que exercem as mesmas finalidades são tributados.9

9O Supremo Tribunal Federal, na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1802/DF, ora entende que as imunidades estendidas às entidades beneficentes, no caso de contribuições sociais, se estendem às filantrópicas, sem fins lucrativos, ao interpretar os arts. 150, VI, “b” e 195, § 7º, ambos da CF/88,

Há isenções de grandes empresas transnacionais para se instalarem em determinado local. Há deslocamento de empresas para outros estados da federação porque lá o ICMS é menor e porque recebem incentivos fiscais. Entidades religiosas (por exemplo, de ensino, gráficas, beneficentes, de assistência social, etc.) não são tributadas, são imunes a impostos (art. 150, VI, “b”, da CF/88) constitucionalmente, mas à revelia de controle do Estado investem ou podem remeter dividendos ao