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CAPÍTULO II AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

2.2 A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS, ENFOQUE CULTURAL

A francesa Jodelet (2001, 2006) é uma das principais pesquisadoras da Teoria das Representações Sociais no campo da cultura, concebendo-a como formas de um saber prático impregnadas de elementos culturais que servem de ligação entre o sujeito e um objeto.

As representações sociais, na concepção de Jodelet (2001, 2006) assumem três dimensões: a imagem, a prática e a comunicação. Estas veiculam fenômenos cognitivos que estão presentes na vida social dos indivíduos, expressando sentimentos, normas, práticas, condutas por meio de discursos, mensagens e símbolos.

Dessa forma, as pesquisas que utilizam a abordagem da Teoria das Representações Sociais devem considerar que “as representações sociais são abordadas concomitantemente como produto e processo de uma atividade de apropriação da realidade exterior ao pensamento e de elaboração psicológica e social dessa realidade” (JODELET, 2001, p. 22). Acrescenta:

As representações sociais devem ser estudadas articulando-se elementos afetivos, mentais e sociais e integrando – ao lado da cognição, da linguagem e da comunicação – a consideração das relações sociais que afetam as representações e a realidade material, social e ideativa sobre a qual elas têm que intervir. (JODELET, 2001, p. 26).

Essa compreensão sistemática e global das representações sociais trazidas à baila por Jodelet (2001) tem o seu foco de análise no saber prático. Consagrados pela autora no seguinte esquema:

a) Quem sabe e de onde sabe? Baseia-se na cultura coletiva ou de grupo que cria modelos fundamentais que vinculam e partilham valores que objetivam organizar, estratificar e inserir o sujeito na sociedade, criando as condições necessárias para a produção e circulação das representações sociais por meio da linguagem e da comunicação interpessoal, institucional ou midiática;

b) O que sabe e como sabe? Este saber demonstra os estados e os processos representacionais, prescreve a função e a eficácia dos conceitos que o sujeito (epistêmico, psicológico, social, coletivo) constrói para expressar, representar, interpretar e fazer a mediação com o objeto (humano, conceitual, social, ideal, material, mítico, etc.) na realidade empírica. Esta maneira de conhecer revela que o sujeito ancora o seu conhecimento em uma cultura prática e coerente (valores,

noções, símbolos, orientações práticas), objetivada em suas percepções concretas fundadas no senso comum;

c) Sobre o que se sabe e com que efeitos? O sujeito construtor do saber interpreta e representa o objeto por meio de conceitos e modelos significativos. Elabora um estatuto epistemológico para as representações sociais que seja capaz de expressar todas as fontes de saber: prático, cultural, real, verdadeiro e científico. Estes saberes produzem efeitos gerais, funcionais e naturais para interpretar os diversos fenômenos da realidade, desde os mais simples aos mais complexos, que são difundidos, transformados e mensurados de acordo com a dialética cultural em que o pensamento social está inserido.

A Teoria das Representações Sociais, no expectro de compreensão da autora, está, pois, centrada na cultura que gera significados para a nossa existência atribuindo ao objeto um conhecimento intersubjetivo, produzido socialmente pelo sujeito e passado de geração em geração. Este pacto geracional altera de acordo com os impactos do contexto sociocultural, e pela experiência “social e socialmente construída torna-se constitutiva do sentido que o sujeito dá aos acontecimentos, às situações, aos objetos e às pessoas que povoam seu ambiente próximo e seu mundo” (JODELET, 2006, p. 100).

O conceito que a autora utiliza é o da Antropologia Interpretativa de Geertz (2008), enquanto uma ciência hermenêutica em busca de significados para compreender o homem como um animal eminentemente cultural e social.

O conceito de cultura que defendo [...] é essencialmente semiótico. Acreditando como Max Weber, que o homem é um animal amarrado a teias de significados que ele mesmo teceu, assumo a cultura como sendo teias e a sua análise. (GEERTZ, 2008, p. 4).

A teoria de cultura de Geertz (2008) contribuiu para a Psicologia Social desenvolvida por Jodelet (2001, 2006) na compreensão dos processos e conteúdos de uma representação social. Como estudiosos de fenômenos humanos e sociais, temos que buscar nas diversas ciências suportes teóricos que possibilitam desvendar os saberes produzidos socialmente.

A nossa dupla tarefa é descobrir as estruturas conceptuais que informam os atos dos nossos sujeitos, o „dito‟ no discurso social, e construir um sistema de análise em cujos termos o que é genérico a essas estruturas, o que pertence a elas porque são o que são, se destacam contra outros determinantes do comportamento humano [...] O dever da teoria é fornecer um vocabulário no qual possa ser expresso o que o ato simbólico tem a

dizer sobre ele mesmo, isto é, sobre o papel da cultura na vida humana. (GEERTZ, 2008, p. 19).

Da mesma forma que as ideias de Geertz (2008) vêm fortalecer a Teoria das Representações Sociais, Certeau (2012) reforça também a importância do papel do homem comum como produtor de cultura na vida cotidiana e o seu esforço em sua consolidação, pois “o enfoque da cultura começa quando o homem ordinário se torna o narrador, quando define o lugar (comum) do discurso e o espaço (anônimo) de seu desenvolvimento” (p. 61).

Estes estudiosos confirmam a proposta hermenêutica de Jodelet (2001, 2006): a ancoragem e a objetivação das Representações Sociais estão focadas na cultura e na comunicação, como instrumentos de construção de saberes populares e epistemológicos, propagados por imagens e justificados por discursos simbólicos, os quais refletem as experiências cotidianas. Portanto, o olhar da cultura é uma interpretação complexa e multidimensional do saber prático por meio de uma análise compreensiva do sujeito que se compreende e compreende o outro, e pela análise contextual de que é influenciado pelas orientações e prescrições sociais. Há então uma simbiose que integra o sujeito, o objeto e o contexto, sendo impossível analisá- los separadamente.

A Teoria das Representações Sociais é multidimensional, abarcando uma diversidade de enfoques e o seu referencial teórico-metodológico influencia pesquisadores em todo mundo, seja na Psicologia Social, como nas diferentes áreas do conhecimento e das ciências, sejam elas humanas, exatas sociais, sociais aplicadas e saúde. Encontramos diversos estudos que usam este referencial teórico- metodológico.