CAPITULO III – O PERCURSO METODOLÓGICO
3.5 PROCEDIMENTOS DE TRATAMENTO E ANÁLISE DOS DADOS
3.5.1 Processamento da análise das evocações dos participantes
O tratamento dos dados nas investigações de natureza qualitativa em pesquisas sobre as representações sociais, segundo alguns estudos como os de Pereira (2005), utiliza-se de análises estatísticas que são agrupadas em quatro domínios: as Análises de Semelhanças, as Escalas Multidimensionais, as Análises Fatoriais de Correspondências e as Análises Hierárquicas ou de Clusters, que podem ser utilizadas separadamente ou em conjunto, o que permite uma visão global do fenômeno representacional.
A análise de dados sobre a representação social das disciplinas de Antropologia da Religião e Ética realizou-se com a combinação destas análises: a de Semelhanças revela os campos semânticos próximos, a Escala Multidimensional identifica as dessemelhanças e as oposições semânticas, a Fatorial de Correspondência informa as estruturas globais permitindo enquadrar os campos semânticos, e, por fim, a Hierárquica define os grupos semânticos (PEREIRA, 2005). Este procedimento foi desenvolvido por Pierre Vergès, com a elaboração de um Software EVOC, que realiza a análise dos dados qualitativos e quantitativos, com o cruzamento das frequências e ordem de evocações para encontrar as estruturas e os conteúdos das representações sociais como o núcleo central, os processos de ancoragem, objetivação e comparação entre os grupos, permitindo identificar a evocação de palavras e a frequência do objeto pesquisado, como esclarece Gray: “na análise qualitativa, o número de vezes que uma palavra ou frase ocorre pode ser medido por meio de uma contagem de frequência, gerando um dado numérico” (2012, p. 166).
O software EVOC-2003 é formado por um conjunto de subprogramas, que executados em sequência, permitem a identificação do núcleo central e do sistema periférico de uma representação social, assim obtendo-se os resultados, executando-os da seguinte forma:
a) Lexique prepara o corpus da pesquisa;
b) Trievoc ilustra que o processamento foi aceito, sendo possível prosseguir no tratamento dos dados;
c) Nettoie possibilita a limpeza do banco de informações como os agrupamentos de palavras de significados semânticos equivalentes ou fazer as modificações e agrupamentos necessários;
d) Rangmot é o instrumento usado para selecionar o número mínimo das evocações; no caso deste estudo utilizamos o número 5, pois pedimos aos participantes para representar as disciplinas pesquisadas em cinco palavras; o instrumento ainda mostra a média geral das palavras, o que ajuda o pesquisador a escolher as frequências mínimas e intermediárias, preparando o rangfrq;
e) Rangfrq permite ao pesquisador colocar as frequências mínima e intermediária, decidindo qual será a média das evocações. Esta operação produz quatro quadrantes com a frequência e a ordem média das evocações (OME), os quais resultam no núcleo central e os elementos periféricos de uma representação.
Pereira (2005) preleciona que na análise de Vergès há três campos distintos sobre o processo cognitivo dos participantes a respeito de uma representação social: o primeiro constitui um processo de seleção dos elementos que compõem a representação; o segundo é o processo conotativo para atribuir significados aos elementos escolhidos; e por último, o processo de esquematização que “organiza o conteúdo da representação numa rede onde cada elemento só adquire significado através das relações que estabelece com os outros” (p. 31).
Na sistematização de uma representação social o pesquisador organizará o discurso dos sujeitos dentro de uma lógica, estruturando-o em mapas cognitivos que possibilitará uma análise explicativa das semelhanças dos dados recolhidos sobre as representações mentais dentro de uma rede associativa e esquemas significativos, que permitirão a interpretação da representação por meio de triângulos, círculos, estrelas e gráficos simples que são “um conjunto de nós e ligações” (PEREIRA, 2005, p. 33) que representam categorias esquematizadas e operacionalizadas das informações fornecidas pelos participantes.
No processo de esquematização temos que identificar o saber comum que objetiva o objeto a um conceito ou uma imagem, articulado ao discurso produzido. Assim começamos o tratamento dos dados organizando as evocações de palavras dentro de um universo semântico, com a escolha de “um protótipo, um conjunto específico de expectativas, onde não existe informação organizada, mas que é tratado como um objecto (sic) como uma entidade em si própria” (PEREIRA, 2005, p. 29).
Este processo de tratamento dos dados é realizado para analisar a homogeneidade e heterogeneidade do grupo, agrupando as evocações numa matriz de semelhanças com a identificação das estruturas locais, onde o termo mais frequente constitui o protótipo que agregará um conjunto de categorias que abarcará o maior número de evocações e permitirá aferir análises qualitativas e estatísticas. Estas categorias e conjuntos homogêneos de significação serão relacionados aos índices de semelhança das evocações livres, confirmando ou não a centralidade dos seus elementos cognitivos e sociais.
Na elaboração da análise prototípica temos que considerar dois níveis, como Pereira (2005) propõe:
a) a identificação de categorias por cruzamento das frequências de ocorrência dos conceitos associados ao objeto da representação, com a sua ordem de evocação, o que permite obter elementos do núcleo central e do sistema periférico, que foram emitidos no discurso de forma livre e espontânea;
b) a introdução dos aspectos subjetivos na organização dos dados em categorias prototípicas em que o conceito mais frequente dará significado para a categoria. Com esta organização cria-se uma matriz de semelhanças estruturada em índices de semelhança escolhidos dos fenômenos que se quer investigar como pontos fortes ou fracos de uma representação.
O pesquisador classifica lexicograficamente os significados em uma matriz, produzindo o mapa cognitivo para efetuar análises dos nós e ligações entre as categorias, relacionando uma estrutura semelhante com o local de maior densidade nas relações de semelhanças, a qual possibilita uma análise hierárquica dos elementos de uma representação.
A partir deste segundo nível de análise é que podemos obter a estrutura da representação, confirmando ou não a centralidade dos elementos do núcleo central
e compreender como uma representação social se organiza cognitivamente, segundo Pereira (2005).
O frequenciamento das respostas cruzando com o esquema prototípico de relevância implícita possibilita chegar ao núcleo central e aos elementos periféricos da representação social.
O cruzamento das duas coordenadas, classificadas em valores altos e baixos, gera quatro zonas que caracterizam a tabela de resultados da análise prototípica. A zona do núcleo central compreende palavras com alta frequência e baixa ordem de evocação: ou seja, respostas fornecidas por grande número de participantes e evocadas prontamente. Os elementos do núcleo central das representações sociais têm boa probabilidade de estarem representados por algumas das palavras contidas nessa zona. (WOLTER; WACHELKE, 2011, p. 522).
Na identificação das representações sociais da disciplinas pesquisadas cruzamos os dados quantitativos (frequência das evocações) com os dados qualitativos (ordem de evocação), construindo uma tabela prototípica que respeita com o máximo de fidedignidade e clareza o pensamento dos sujeitos da pesquisa, seguindo os seguintes passos:
a) buscar a homogeneização das evocações sem nenhuma preocupação com a análise de conteúdo;
b) elaborar um esquema relacionando as frequências pela ordem de evocações, em uma hierarquia para as evocações das palavras mais frequentes com a menor ordem de evocação até as menos frequentes com a maior ordem de evocação (PEREIRA, 2005).
Este procedimento possibilita a construção de quatro quadrantes com duas divisões baseadas, uma na frequência e outra, na ordem média das evocações - OME proferidas pelos participantes, como descreve Pereira (2005) comentando o software EVOC, o qual se sistematizou na figura abaixo:
Figura 02 – Distribuição de frequência e Ordem Média das Evocações do software EVOC,
adaptado de Pereira (2005).
Este quadro nos ajudará na análise das evocações. Abric (2001) expõe que o primeiro quadrante retrata os elementos consensuais e estáveis estruturantes do themata ou núcleo central, e os demais quadrantes são importantes para compreender os fatores completam a representação.
Seguindo estes passos no tratamento dos dados teremos uma tabela com quatro quadrantes, a qual organiza os elementos internos que estruturam os sistemas central e o periférico de uma representação social, como retrata a figura, abaixo:
O primeiro quadrante (+ +) evocações de maior frequência e ordem de evocação inferior a média geral das evocações, são os elementos pertencentes ao núcleo central.
O segundo quadrante (+ -) as evocações de maior frequência e maior ordem de evocação, com evocações foram muito citadas, a primeira coroa do sistema periférico.
O terceiro quadrante (- +) evocações de menor frequência e de menor ordem evocação formando-se a segunda coroa do sistema periférico.
O quarto quadrante (- -) evocações de menor frequência e maior ordem de evocação, com a última coroa do sistema periférico.
A composição de uma representação social com os sistemas central e periférico, conclui Abric (2001), são como entidades em que cada um exerce um papel específico e complementar, pois o núcleo central expressa o normativo e social, depende das condições sociais, históricas, ideológicas e sociológicas, é mais difícil de ser alterado. O sistema periférico está conectado às experiências individuais e convive com as diferenças, por isso mais flexível, sensível às mudanças e contradições. Estes dois sistemas nos ajudam a estruturar e compreender os termos indutores „antropologia da religião‟ e „ética‟.
Sistema central
Ligado à memória coletiva e à história do grupo
Consensual; define a homogeneidade do grupo
Estável, coerente, rígido
Resistente à mudança
Pouco sensível ao contexto imediato
Funções: gera a significação da representação social; deternima sua organização
Sistema periférico
Permite a integração das experiências e histórias individuais
Suporta a heterogeneidade do grupo
Flexível, suporta as contradições
Evolutivo
Sensível ao contexto imediato
Funções: permite adaptação á realidade; permite a diferenciação do conteúdo; protege o sistema central Figura 03 – Descrição das características e funções dos sistemas internos de uma
CAPITULO IV - CONTEÚDO E ESTRUTURA DAS REPRESENTAÇÕES