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Capítulo 2 Semiótica e Semiologia, buscando intersecções

2.2 A verbo-visualidade na Teoria bakhtiniana

A extensão verbo-visual da linguagem atua diretamente sobre a construção dos significados cotidianamente negociados e construídos nos mais diversos meios sociais, em razão disto, está presente entre os elementos constitutivos da formação do sujeito e suas representações, sobretudo, na sua história. Nessa perspectiva, segundo (BRAIT, 2010), a articulação entre os elementos verbais e visuais compõem de maneira uníssona a totalidade do texto.

Ao sopesar o texto como uma unidade constituída a partir da articulação entre os elementos verbais e visuais, o analista assume uma postura investigativa na busca do reconhecimento das particularidades, considerando efetivamente a forma pela qual é produzida a significação, efeitos de sentido, a imagem do enunciador e enunciatários, destinatário, etc.

A concepção de texto aqui assumida, que pode ser designada semiótico- ideológica, ultrapassa a dimensão exclusivamente verbal (oral e escrita) e reconhece visual, verbal-visual, projeto gráfico/ou cênico como participantes da constituição de um enunciado concreto, de sua arquitetura, de sua inerente propriedade discursiva de oferecer como resposta que engendra sempre novas perguntas (BRAIT, 2010, p. 195).

Nesse sentido, o texto deve ser objeto de análise e interpretação sob uma ótica que considere os seus elementos constitutivos, embate, tensões, particularidades expressivas de sua natureza distintiva, esfera de circulação, autoria e, sobretudo, as características que situam o discurso em seu respectivo contexto histórico, social e cultural.

No que versa sobre o conceito de esfera da comunicação discursiva (ou de criatividade ideológica, ou da atividade humana, ou da comunicação, ou da utilização da língua, ou simplesmente, da ideologia), este faz-se presente ao longo da obra de Bakhtin e de seu Círculo, apresentado da seguinte forma:

(...) é um espaço de refração que condiciona a relação enunciado/objeto do sentido, enunciado/enunciado, enunciado/co-enunciadores (GRILLO, 2006, p. 147).

O texto, produto da atividade discursiva, objeto empírico da análise do discurso - que tem como premissa analisar as construções ideológicas presentes nas práticas sociais letradas - é constituído essencialmente de unidades significativas e enunciados concretos produzidos nas diferentes esferas ideológicas, considerando a influência das instâncias socioeconômica e histórico-cultural de modo a possibilitar a produção ideológica, dinamizando sua existência, agindo sobre as formas de produção, circulação e recepção de acordo com a singularidade de cada esfera, que deve ser compreendida como:

(...) um nível específico de coerções que, sem desconsiderar a influência da instância socioeconômica, constitui as produções ideológicas, segundo a lógica particular de cada esfera/campo (GRILLO, 2006 p. 143).

Investir em uma teoria/análise dialógica do discurso de maneira verdadeiramente significativa requer assumir uma postura crítica postulada na concepção metalinguística cuja relação existente entre língua, linguagem, história e sujeitos seja indissolúvel, posto que estes sejam o locus de produção do conhecimento situado, historicamente, assumindo, assim uma dimensão extralinguística (BRAIT, 2006).

A linguagem, quando considerada como objeto de estudo historicamente situado junto aos sujeitos e ao meio de produção, promove grandes transformações ora simbolizadas na concepção de signo ideológico. Não há signo despido de ideologia, bem como ideologia fundada fora dos signos.

O texto como enunciado, objeto de pesquisa, considerado a essência da comunicação discursiva, deve transformar-se em sujeito, pois somente dessa maneira será desencadeado um movimento de identificação com ele, possibilitando ver o mundo através de seu conjunto de valores e culminando em um processo de alteridade constitutiva, ou seja:

É impossível alguém definir sua posição sem correlacioná-la com outras posições. Por isso, cada enunciado é pleno de variadas atitudes responsivas a outros enunciados de dada esfera da comunicação discursiva (BAKHTIN, 2003, p. 297).

O enunciado deve ser compreendido como um conjunto de sentidos, em que a relação com os enunciados dos outros e com o próprio falante são indissociáveis do objeto, pois é nele que há a discussão, a aceitação, o contato, configurando uma tríade viva. As relações dialógicas entre os enunciados pertencem à metalinguística, entretanto, as relações de sentido entre os diferentes enunciados estão fracionadas entre as diversas vozes, evidenciando o indivíduo e sua singularidade discursiva na construção da imagem.

No que diz respeito aos textos publicitários que serão analisados neste trabalho, podem ser considerados pertencentes à esfera jornalística dentro do gênero discursivo deliberativo no qual o projeto discursivo verbo-visual é composto por ilustrações, gráficos e infográficos; sempre articulados ao texto, de modo a construir significação por meio de uma relação organizacional harmoniosa entre o verbal e o visual, posto que a representação de texto a ser assumida ultrapasse a dimensão verbal (oral e escrita), pois entende o visual como parte essencial na construção de enunciados concretos, constituindo uma concepção semiótico- ideológica (BRAIT, 2010).

Os discursos verbo-visuais oriundos da esfera digital permitem observar que há grande força argumentativa nas fotos e logotipos que lá estão. Estes, se deslocados para outras esferas de circulação, podem constituir diferentes significações, tornando-se outros enunciados concretos. Sobretudo, configuram-se como testemunho real das práticas sociais desenvolvidas nas relações entre (tempo/espaço) e entre os atores envolvidos nestas atividades discursivas.

Considerando que toda palavra está revestida de um conteúdo, de um sentido ideológico ou vivencial (BAKHTIN; VOLOCHINOV, 2002, p. 95), nomes de instituições, slogans, logotipos, etc., estabelecem um forte diálogo com entidades legitimadas historicamente por um conjunto de práticas e valores socialmente constituídos, logo, constituem uma relação de alteridade com aqueles que comungam dos mesmos preceitos em um determinado contexto social imediato.

A presença dos logotipos/logomarcas de parceiros e patrocinadores colabora diretamente com a construção de uma identidade idônea e ética, posto que estes trabalham sob perspectivas ideológico-verbais multiformes, diferentes linguagens e aspectos socioideológicos nas mais diferentes esferas de circulação.

Visto assim, possuem empatia e aceitação social que lhes permitem transferir responsabilidade sobre o discurso do outro, produzindo processos de alteridade constitutiva, autenticados nas relações socioculturais.

Desta forma, a construção do discurso verbo-visual na era digital baseia-se na hibridização e na utilização de recursos linguísticos multimodais, possibilitando a separação das intenções de seus papéis enunciadores, sem repousar a significação nestes, mas sim no conjunto de enunciados linguísticos presentes na conjectura da teia argumentativa persuasiva (BAKHTIN, 1993, p. 113).

Nesse sentido, é justamente pela diversidade linguística, ideológico-verbais e socioideológicos presentes nos textos que se constitui o plurilinguismo discursivo, configurando a base do estilo, as formas e graus diferentes de estilização paródica que autenticam, legitimam e colaboram tanto para desenvolvimento dos diversos gêneros discursivos, de acordo com suas esferas de circulação, como para o surgimento das tensões nas relações dialógicas recorrentes dos processos interativos entre enunciador/enunciado/enunciatário/ na construção da significação e da alteridade constitutiva, além de revelar diferentes posicionamentos ideológicos.