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Da leitura das tabelas abaixo podemos observar que existem vários produtos lucrativos a ser explorados no montado, podendo todos eles ser lucrativos ou não, dependendo de vários fatores. Estes fatores têm que ver com gestão mas também com a dimensão da exploração, as suas características físicas, a forma como os diferentes produtos, elementos e práticas agrícolas se relacionam entre si no mesmo espaço agro-silvo-

134 pastoril e com o valor de subsídios atribuídos.

Num sistema agroflorestal e especialmente no montado de sobro, o equilíbrio do sistema e a sua viabilidade financeira está alicerçada na multifuncionalidade do espaço, colocando no mesmo espaço árvores, pastos, culturas cerealíferas e aplicando rotações para permitir a produção dos vários produtos essenciais à vida numa paisagem que é, devido às condições edafo-climáticas, de baixa produtividade primária.

A conjuntura socioeconómica passada e atual, com a presença dos apoios agrícolas, com um mercado agrícola europeu e global entre outros fatores, conduziu a que uma quantidade significativa dos montados e dos produtores se especializassem para conseguir fazer face às exigências do mercado, diminuindo assim o carácter multifuncional do montado. Assim encontramos propriedades e explorações especializadas em gado, outras especializadas apenas na cortiça, outras especializadas apenas nas culturas cerealíferas. Apesar de todas elas terem sempre uma componente mínima de multifuncionalidade esse carácter diminuiu ao longo do tempo de vida dos entrevistados e importa a este estudo verificar se o reforço da multifuncionalidade é economicamente viável.

Paralelamente, um fator de importância determinante para a viabilidade financeira do montado é o da dimensão da propriedade. A dimensão média das propriedades agrícolas no Alentejo é 51 ha / exploração (INE 2014) e na freguesia de São Martinho das Amoreiras é de 34ha. A dimensão média das explorações dos entrevistados estão dentro desta ordem de grandeza, apesar de existirem umas com valores muito inferiores (<5 ha) e outras superiores (>200ha). A especialização pode advir em certo grau precisamente desta disparidade.

Como vimos na apresentação das práticas dos produtos, alguns produtos como o mel ou mesmo a pastorícia de cabras e ovelhas, não implicam a detenção da propriedade da parte do produtor. O produtor pode especializar-se e arrendar, ou utilizar por vezes até de forma gratuita, as propriedades de montado para retirar de lá o seu rendimento. Este tipo de relação de “aluguer” ou uso da propriedade alheia pode teoricamente gerar

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benefícios ou prejuízos para a tal propriedade. Os benefícios podem ser por exemplo a limpeza dos matos ou o apoio à polinização. Os prejuízos podem ser por exemplo a erosão e perda de produtividade do solo decorrentes do sobre-pastoreio.

A avaliação da viabilidade financeira do montado torna-se portanto complexa pois não é obrigatoriamente vista a partir de um único centro de custos, o proprietário ou gestor de uma propriedade com montado.

Se analisarmos a viabilidade financeira apenas pela perspetiva do proprietário / gestor da propriedade, então a forma como a exploração é gerida, nomeadamente se é mais ou menos multifuncional, vai depender por um lado da viabilidade financeira e por outro lado dos outros valores que sejam importantes para o proprietário / gestor. Exemplos destes valores podem ser a prevenção de incêndios, a preservação da paisagem, a preservação do património para as gerações futuras, nomeadamente familiares, a proteção da diversidade e segurança face às alterações climáticas, os valores de uso futuro e adaptação às alterações climáticas, a preservação dos solos, da biodiversidade, o emprego de maior número de pessoas etc..

A exploração especializada num produto versus uma exploração da propriedade como montado multifuncional torna-se portanto uma opção que ou é uma escolha ética (tal como por exemplo a escolha da sustentabilidade forte, para preservar e melhorar a sua propriedade para os seus descendentes) ou é uma escolha prática (por exemplo, por ser a forma que o agricultor conhece e foi ensinado ou ser mais fácil ou mais adequada ao terreno) ou é uma escolha económica ou é uma imposição legal ou é uma combinação de várias destas razões.

Analisando através da escolha económica e financeira, o ponto de partida da propriedade é determinante para as escolhas que se seguem ao nível da complementaridade de produtos na mesma propriedade: é totalmente diferente um proprietário herdar ou comprar uma propriedade de 50ha com uma boa densidade de sobreiros adultos espaçados em jeito de montado (melhor do ponto de vista financeiro) ou uma propriedade sem nenhuma árvore (pior) ou uma propriedade com uma grande

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densidade de sobreiros e medronheiros e arbustos vários num clímax de bosque de sobreiro (intermédio do ponto de vista financeiro mas melhor do ponto de vista da biodiversidade).

Analisemos a viabilidade financeira do montado de sobro partindo de um exemplo que um agricultor com uma propriedade com as características médias da Freguesia de São Martinho das Amoreiras nomeadamente a área, com cerca de 34ha. Neste exemplo, 100% da propriedade está coberta de sobreiral adulto. Destes 34 hectares, cerca de 6,8 hectares (20%) têm uma densidade baixa de árvores e são usados para cereais, 13,6 hectares (40%) são zonas de elevado declive usadas como medronhais e sobreiras e os restantes 13,6 hectares (40%) são zonas de pasto no sob-coberto do montado. Nas tabelas seguintes esta combinação de produtos sempre com esta percentagem relativa ao total da dimensão da propriedade é identificada como combinação1 (c1).

Tabela 7.1 – Síntese das contas dos produtos do montado harmonizados por hectare e ano e extrapolados para uma propriedade média de 34 hectares. Fonte: dados das entrevistas

Cenário Base Cenário Otimista Cenário Pessimista

Produto Receita (média) Custos (média) Saldo (média) Receita Máxima Custos mínimos Saldo máximo Receita Mínima Custos máximos Saldo Mínimo ha % área Aveia + palha (ha) 2.790 € 3.065 € -274 € 2.790 € 2.366 € 424 € 2.790 € 3.763 € -972 € 6,8 20%

Aveia + feno (ha) 4.490 € 3.065 € 1.426 € 4.490 € 2.366 € 2.124 € 4.490 € 3.763 € 728 € 6,8 20%

Trigo (ha) (c1) 4.092 € 3.230 € 862 € 5.340 € 2.737 € 2.603 € 2.845 € 3.723 € -878 € 6,8 20%

Ovelhas (ha) (c1) 2.695 € 2.282 € 413 € 3.380 € 1.225 € 2.154 € 2.011 € 3.338 € -1.327 € 13,6 40%

Cabras (ha) 1.642 € 2.648 € -1.006 € 2.496 € 1.982 € 514 € 788 € 3.314 € -2.526 € 13,6 40%

Vacas carne (ha) 1.545 € 1.523 € 22 € 1.545 € 1.200 € 345 € 1.545 € 1.846 € -301 € 13,6 40%

Cortiça ( ha de sobreiro) (c1) 6.290 € 3.230 € 3.060 € 12.240€ 2.754 € 9.486 € 340 € 3.706 € -3.366 € 34,0 100% Medronho (ha) (c1) 3.978 € 2.734 € 1.244 € 5.100 € 2.734 € 2.366 € 2.856 € 2.734 € 122 € 13,6 40% Mel (80 colmeias)(c1) 6.000 € 3.982 € 2.018 € 6.000 € 3.982 € 2.018 € 6.000 € 3.982 € 2.018 € TOTAL (c1) 23.056 € 15.458 € 7.598 € 32.060 € 13.432 € 18.628 € 14.052 € 17.483 € -3.431 € 34,0

Como vemos pela leitura da Tabela 7.1, o total da exploração da cortiça, medronho, ovelhas e trigo pode dar um lucro de 18628 € anuais ou dar um prejuízo de 3431 € anuais, sendo co cenário base (médio) o saldo de 7598 €. A exploração da cortiça deste montado pode dar um lucro 3060 € / ano ou um prejuízo de 3366€ / ano. Sendo o rendimento da cortiça flutuante e com uma dose grande de incerteza, face ao preço mas

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também face ao estado de saúde dos sobreiros, o proprietário não deve viver apenas do rendimento cortiça, quando possui 34 hectares de terra. Importa ao agricultor proprietário da terra por um lado, reduzir os custos das limpezas do sobreiral (cerca de 50% dos custos associados aos rendimentos da cortiça), como também valorizar o espaço que está entre as árvores.

Do medronho pode-se obter, de acordo com os valores acima, entre 2366€ a 120€ de lucro anual. Para tal é necessário produzir a aguardente de medronho mas tem os custos da apanha do medronho já internalizados. Faltam porém os custos das podas e manutenção do medronhal que são opcionais e que não foram contabilizados. Na verdade devido à dimensão do preço da mão-de-obra face aos saldos máximos possíveis, estas operações de manutenção são cada vez menos praticadas nos sobreirais silvestres, o que consequentemente diminui a sua produtividade.

Do pastoreio de cabras e ovelhas pode-se depreender claramente que os 34hectares não são suficientes para os rebanhos de 220 cabras ou de 500 ovelhas que permitem pagar um salário com valores justos a um moiral (pastor). Isto a menos que os animais sejam alimentados com rações compradas, o que significa que a exploração deixa de ser autossuficiente em termos energéticos, reduzindo assim o seu nível de sustentabilidade e abrindo espaço para a comparação das criações de gado intensivas em parques fechados sem pasto, o que não é o objetivo deste estudo por estar fora do espaço do montado e da análise da viabilidade da sua gestão sustentável. Um certo grau de utilização de rações compradas é porém prática comum devido ao melhoramento e processamento que se pratica nas rações moídas que facilitam o crescimento dos borregos e cabritos e a alimentação das mães em tempo de amamentação.

Quando a dimensão da propriedade é insuficiente para poder pagar a contratação de um pastor, então o trabalho é realizado pelo proprietário (tendo porém um grau de ineficiência que se poderia evitar com um rebanho maior) ou as pastagens são utilizadas por um rebanho maior que circula por várias propriedades. Esta estratégia pode ser implementada de várias formas, podendo ser as pastagens vendidas, alugadas ou até

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um pastor ser contratado por um conjunto de proprietários que detém um rebanho conjunto. Qualquer uma destas soluções tem vantagens e desvantagens mas do ponto de vista financeiro todas elas são vantajosas desde que a gestão do sob-coberto seja bem feita de forma a evitar os gastos necessários com tratores para limpeza dos matos, o que constitui cerca de 50% dos gastos da cortiça, como já foi mencionado acima. Na superfície agrícola útil o agricultor pode cultivar aveia, trigo, feno ou palha ou leguminosas para venda ou consumo interno dos seus animais. Tanto no saldo mínimo como no saldo máximo o agricultor perde dinheiro se contratar toda a mão-de-obra e usar os produtos para venda. Sendo as receitas diminutas e os principais custos da produção de cereais as horas de máquina, o fertilizante e a contabilidade, a forma de eliminar o prejuízo desta atividade é integrar as horas de máquina, sendo feitas pelo próprio, encontrar outras formas de fertilizar o terreno (realizando rotações com leguminosas, misturas de sementes, fertilizante líquido, etc.) e integrar os custos de contabilidade nas restantes contas da exploração. Esta cultura, com esta dimensão de 12 hectares (tal como realizada pelo entrevistado), deve ser portanto apenas realizada se integrada numa lógica de multifuncionalidade, sendo os seus produtos usados para os animais, gerando trabalho para o agricultor e diminuindo os custos com a alimentação do gado.

De acordo com as estratégias praticadas pelos entrevistados, esse espaço entre as árvores pode ser valorizado através de culturas cerealíferas, forragens, leguminosas, pastos e medronhais. As zonas com menos declive e melhores solos são frequentemente usadas para cereais e outras culturas forrageiras e as zonas de maiores declives, nas encostas das serras, são usadas como pastos ou como medronhais.

Estes recursos podem ser explorados recorrendo a mão-de-obra externa ou contratada ou prestações de serviços ou pelo próprio. A análise das contas dos produtos individuais mostra que a forma de o proprietário obter algum rendimento e diminuir os custos é o de realizar ele próprio o trabalho, usando o seu tempo em que não está a realizar outras operações. Esta estratégia porém não permite realizar todos os trabalhos e explorar

139 todos os recursos da propriedade.