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AGIR EM SAÚDE – O QUE É NECESSÁRIO DE PARTE DO EDUCADOR

Na questão do processo educativo em saúde desenvolvido com o idoso faz-se necessário enfatizar a importância de trabalhar em conjunto com a família de forma ativa, participativa, uma vez que essa estratégia propicia interação entre a enfermeira, o idoso e o cuidador, possibilitando a valorização de crenças, valores e atitudes na busca de mudanças comportamentais. É preciso valorizar, respeitar o saber empírico do idoso, seus mitos e significados atribuídos ao diabetes. Também é fundamental considerar, aceitar, valorizar as mudanças gradativas e lentas, oferecendo reforço positivo aos comportamentos de autocuidado ou aos atos de cuidado realizados pelos cuidadores evitando focalizar as situações que por alguma dificuldade, por desconhecimento ou insegurança apresentaram resultados insatisfatórios.

A valorização de conhecimentos anteriores das pessoas para expor conceitos novos torna-se prioritário no processo educativo em saúde. O ideal é procurar saber primeiro o que elas sabem ou pensam sobre determinado problema38. As pessoas podem ser estimuladas a identificar o significado e os sentimentos envolvidos na situação de doença e como podem interferir no processo136. Essas atitudes de apoio quando realmente assumidas pelos profissionais representam um fator fundamental na ação de ajudar os idosos e seus cuidadores no esforço de promover e obter mudanças significativas no seu estilo de vida e adotar comportamentos congruentes para um melhor enfrentamento da situação de cronicidade imposta pelo diabetes.

A enfermeira, em seu papel de provedora de cuidados, com embasamento científico e sensibilidade deve incentivar e orientar os idosos com DM para seu autocuidado, ressaltando a importância de contar com a participação do cuidador familiar, que poderá ser um membro da família, ou pessoa amiga, o qual poderá ser capacitado nas habilidades básicas para cuidar do idoso como, por exemplo, cuidando da dieta, dos medicamentos, do controle glicêmico, da higiene em geral e dos pés em especial.

Nesse sentido, é importante a enfermeira estar ciente de sua intervenção na assistência aos idosos com DM, haja vista que assume o papel de educadora e como tal pode favorecer- lhes uma melhor condição de vida, independente do convívio com a doença, preparando-os para um processo de envelhecimento bem-sucedido. Para tanto, faz-se necessário compreender a educação como um ato de transformação que é dinâmico e crítico em que os sujeitos, idoso e seu cuidador familiar, não apenas executam o que lhes é informado, mas são incentivados a perguntar o porquê de realizar tal cuidado buscando entender mais sobre o diabetes e as formas de controlá-lo.

A enfermeira educadora vivencia seu agir em saúde na propagação de conhecimentos científicos de forma clara e objetiva para melhorar o cotidiano do idoso com diabetes, a fim de auxiliá-lo na reorganização de seu estilo de vida e no desempenho de novos comportamentos que lhe possibilitem viver melhor o tempo que tem para ser vivido. É imprescindível que ao desenvolver o processo de educação em saúde com base na relação dialógica de Freire32, a profissional tenha a convicção de que a mudança é possível, embora seja difícil. A certeza de que é possível mudar, de que é preciso mudar acompanha a ação educativa e possibilita intervir na realidade, tarefa mais complexa e geradora de novos saberes do que simplesmente adaptar-se à realidade.

Entretanto, não menos importante é a enfermeira reconhecer a crítica de Merhy124,125,132, ao modelo tecno-assistencial ora vigente em saúde, o qual é centrado na biomedicina, focalizado na doença e no individualismo. A mudança desse modelo deve ser construída a partir do compromisso de profissionais que tenham capacidade de expor as falhas do mundo do trabalho em saúde, como o jogo dos sentidos e sem sentidos de suas próprias práticas. A produção de processos interseçores, entendidos como das relações entre sujeitos, por meio das práticas de acolhimento e de formação de vínculo, permite desobedecer a um padrão do tipo “pacto da mediocridade”124:130. Padrão este, que permite que as pessoas que procuram um serviço de saúde pública, na sua grande maioria, saiam prejudicadas por não terem seus problemas satisfatoriamente resolvidos.

Essa lógica perversa identifica certo jogo entre forças institucionais que cristalizam interesses de distintos tipos, expressos de forma explícita ou implicitamente nos serviços132. Acrescenta-se que essa lógica geralmente perpetua o autoritarismo das formas tradicionais de atendimento nos serviços públicos, onde o usuário é frontalmente desrespeitado no seu direito de receber uma atenção qualificada e resolutiva.

Nessa perspectiva, a enfermeira, entre outros profissionais de saúde, deve ter a capacidade e sensibilidade para abrir a própria “caixa-preta” e revelar sobre como e porque

está trabalhando e analisar qualitativamente o modo de operar o cotidiano, tentando revelar interesses efetivos na intencionalidade de construção de um novo modelo de atenção em saúde.

Dessa forma, o desenvolvimento do processo de educação em saúde focalizando o idoso com DM e seu cuidador familiar exige da enfermeira referenciais que alicercem a ação de cuidar e educar. Nessa perspectiva, acredita-se primeiramente, que é necessário o domínio do conhecimento científico, num movimento de ultrapassar o senso comum. Conhecimento das características do processo de envelhecimento humano e de suas várias teorias explicativas. Sem ele, ficará muito difícil trabalhar informações com credibilidade diante de pessoas inseguras e temerosas de um futuro incerto quando estão vivenciando uma situação de adoecimento. Isso implica valores, ética, princípios humanísticos, consciência crítica, apreensão da realidade, sobretudo, visão de mundo coerente com o modo de levar a vida, conforme se apreende de Freire32.

O conhecimento implica também a percepção de que para cuidar é necessário conhecer as necessidades da pessoa a ser cuidada e responder a elas apropriadamente, compreendendo o seu contexto cultural por meio de um mergulho profundo em outra realidade para apreender o todo. Conhecer o motivo das necessidades, de forma explícita e implícita, de forma direta e indireta.

A relevância de conhecer os fatores culturais que possivelmente interferem no comportamento da pessoa que necessita de cuidados, ou que potencializem suas habilidades de autocuidado, tais como: fatores psicossociais; crenças e mitos em saúde que possam indicar a prática de um cuidado culturalmente aceito; melhor grau de aceitação da doença; maior competência para o enfrentamento da doença; adequado suporte social principalmente, da família; bem-estar emocional estável; maturidade cognitiva favorecendo melhor estado de saúde a partir da compreensão da complexidade dos regimes terapêuticos e do desenvolvimento de novas habilidades, bem como maior e melhor acesso e resolutividade nos serviços de saúde é fundamental para o processo de cuidar educando132,137.

Compreender os aspectos psicossociais e culturais representa o alicerce para a construção do planejamento de ações educativas. Essas são fundamentais para informar, motivar e fortalecer o idoso e cuidador familiar no sentido de conviver bem com a condição crônica determinada pelo DM. Cada ação realizada deve representar a construção de um novo espaço interseçor no qual por meio do diálogo e de discussões que promovam momentos de reflexão, pode ser reforçada a percepção de risco à saúde e incentivado o desenvolvimento de habilidades para a sua superação.

Resgatando a construção teórica de Waldow136 acerca do cuidado humanizado, observa-se que no processo educativo em saúde o acolhimento é fundamental. Para a autora, o acolhimento representa a concretização da relação humanizada. É a flexibilidade nas tentativas de buscar a melhor forma para cuidar educando. É preciso mover-se entre estruturas mais rígidas ou mais amplas; entre ação e reflexão. Exige intuição e reflexão crítica. Envolve mudança de comportamento no sentido de ajudar a outra pessoa136.

Acolher é refletir sobre o agir em saúde no sentido de avaliar se esse agir é eficaz. É promover a formação de vínculos repensando o processo de trabalho em saúde sob a ótica do trabalho vivo em ato que passa a ter uma dimensão que o abre para práticas criadoras. É a prática do vínculo que representa a produção de processos interseçores e de relações entre sujeitos124.

Também é fundamental a paciência. Essa, não significa manter-se a espera que os fatos aconteçam. Envolve sim, estar presente na relação entre sujeitos, exige solidariedade, diálogo, tolerância e respeito ao outro. Significa também ter paciência consigo mesmo identificando seu próprio ritmo, aprender sobre seus limites e descobrir suas próprias potencialidades.

Concordando com Waldow136 entende-se que o educador precisa ter honestidade, pois o agir em saúde engloba a confrontação consigo mesmo, sendo necessário buscar coerência entre o que faz e sente, analisar se está favorecendo ou impedindo o crescimento do outro sujeito. O educador precisa trocar as lentes para ver esse sujeito como ele é e não como gostaria que ele fosse.

Isso consiste em abrir a própria “caixa-preta” a fim de avaliar atitudes e comportamentos diante do outro. A confiança remete à compreensão da necessidade de confiar no crescimento do outro em seu próprio tempo e ritmo, respeitando suas diferenças e sua capacidade de aprender, inclusive com seus próprios enganos. Confiar no outro significa deixá-lo viver suas próprias experiências.

Ah! A humildade. Essa envolve profunda prontidão e desejo de aprender mais acerca do outro sujeito e sobre si próprio. É necessário desprendimento, honestidade, tempo para refletir, paciência para esperar e orgulho pelo que se faz136. Consiste no reconhecimento da singularidade do outro, num exercício de saber escutar com generosidade e empatia os ruídos e os silêncios emanados das situações vivenciadas nos mais diversos cenários e realidades110,132,136,137.

Já a esperança é uma expressão da plenitude do presente, um presente vivo com uma perspectiva de possibilidade para a realização do outro por meio do cuidado. Ter esperança envolve coragem em assumir riscos com quem conquistamos136.

A enfermeira no seu papel de educadora precisa ter a coragem de buscar o desconhecido, desafiando o fato instituído, mergulhando fundo na realidade concreta circundante, ou nas muitas realidades fluidas em busca do novo. Significa assumir riscos tendo consciência de decisões tomadas com bom senso iluminadas pela ética.

As estratégias eleitas pela enfermeira para desenvolver uma metodologia que favoreça a incorporação de conhecimentos devem estar em consonância com o referencial teórico que embasa a ação educativa. Tais estratégias, tanto podem ser coletivas quanto individuais como, por exemplo, a realização de atividades grupais, prioritariamente, envolvendo o cuidador familiar para a discussão dos aspectos positivos do tratamento, assim como das dificuldades encontradas, é uma estratégia importante no manejo do diabetes. Os grupos representam mais uma das ferramentas que preferentemente é utilizada pela enfermeira no desenvolvimento do processo de educação em saúde visando obter-se sucesso na promoção da saúde e no seguimento do tratamento.

A atividade de grupo na assistência à saúde deve respeitar as habilidades dos sujeitos, seguir uma programação apropriada às suas necessidades e manter continuidade no que se refere ao local e horário dos encontros94. Representa uma oportunidade para que as pessoas possam expor e compartilhar sentimentos; momento em que podem manifestar seus depoimentos de melhora ou relatar experiências112,138.

Além da estratégia de grupo, a visita domiciliar apresenta-se como uma forma assistencial de grande relevância. Está prevista em ações do Programa de Saúde da Família para adequar o cuidado ao idoso e familiares139. Pode revelar o contexto em que o idoso está inserido, facilitando a compreensão das dificuldades relativas ao conhecimento do dano, controle do regime terapêutico e, principalmente, das relacionadas às condições socioeconômicas e relações intrafamiliares. Pode revelar evidências sobre as habilidades do cuidador familiar e o tipo de apoio que é oferecido ao idoso.

A enfermeira, em caráter privativo, desenvolve a consulta de enfermagem. Trata-se de um processo metodológico de construção de conhecimentos, de perspectivas educativas e de cuidado, capaz de responder as ansiedades da pessoa assistida. Entretanto, a educação em saúde somente ocorre se a pessoa demonstra aprendizagem de novos conhecimentos e se há sensibilidade e competência da enfermeira para avaliar essa aprendizagem.

No desenvolvimento de tais estratégias recomenda-se utilizar técnicas de comunicação. É necessário falar pausadamente, olhando nos olhos do idoso, sem levantar o tom de voz, pois as pessoas idosas não suportam sons de alta intensidade, principalmente, quando padecem de hipoacusia. Demonstrar paciência e respeito ao escutar o que o idoso deseja falar. Confirmar se o que foi dito expressou a sua vontade, ou necessidade de falar. Prestar atenção ao silêncio, à simbologia contida nos gestos e expressões faciais da pessoa com quem se pretende estabelecer a comunicação, uma vez que podem indicar uma comunicação não-verbal.

A utilização de recursos pedagógicos é também recomendada. Pode ser a apresentação de vídeos educativos, de conteúdos expostos com recursos de multimídia; jogos, cartazes, “folder” e manuais. Observar que os símbolos de tais recursos sejam impressos em dimensões aumentadas, facilitando sua visualização e leitura, visto que os idosos têm diminuição da acuidade visual. Da mesma forma, o emprego de técnicas lúdicas facilita a ação educativa. Podem ser realizadas oficinas de teatro, canto, dança e pintura; livre expressão de significados por meio de materiais como argila, madeira, tecido, papel e tantos outros que só a criatividade do ser humano é capaz de conceber.