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Nas aldeias, percebemos que cada grupo tem função específica. As casas são quase todas de madeira, algumas cobertas de palha. Existem poços artesianos nas aldeias que servem à comunidade, todas possuem banheiro coletivo. Na aldeia Marmelos, por ser a mais populosa, existe um número maior de banheiros que parece ter certa divisão por famílias.

Na aldeia Marmelos, por ser cortada pelo Rio Marmelos, as crianças vão várias vezes tomar banho no rio e até brincar. Nas demais aldeias, os igarapés ficam mais longe e por isso eles usam mais os banheiros construídos pela SESAI. Todas possuem água de poço artesiano, mas a água para as casas não é encanada, o que existe é algumas torneiras em lugares próximos à maior parte das residências. No geral, percebe-se uma preocupação com a higiene das casas, que são sempre limpas. As mulheres, depois do café, começam a varrer ao redor de suas casas, dando uma aparência sempre limpa à aldeia. Essa prática foi observada em todas as aldeias em grau maior ou menor.

As crianças e jovens acordam cedo, arrumam-se e vão para a escola. Um dado importante é que mesmo a escola estando dentro da aldeia, os alunos vão sempre arrumados, assim como os professores. Várias vezes que cheguei nas aldeias, sem aviso prévio, constatei tal situação. Isso demonstra a importância da escola na vida cotidiana do povo Tenharin.

A aldeia Marmelos é subdividida em quatro aldeias (Marmelos 1, Marmelos 2, Marmelos 3 e Marmelos 4). No entanto, existe um cacique e vice-cacique que representa todos da aldeia Marmelos. Durante a discussão do PPP, tivemos participação de todos, inclusive dos mais velhos. Percebemos como eles se interessam pelas decisões que serão tomadas em relação ao Povo. No mapa a seguir, é possível observar que a rodovia corta as terras indígenas no sentido leste- oeste e o Rio Marmelos no sentido norte-sul. As decisões políticas e grandes reuniões, em geral, acontecem no Marmelos 2, sendo que as escolas estão localizadas nessa aldeia. O posto de saúde que se encontra em construção está localizado no Marmelos 1, onde também acontece o jogo de futebol nos finais de tarde, entre os indígenas.

Fotografia 3 – Desenho da Aldeia Marmelos

Fonte: Desenho feito pelo Professor Leandro Tenharin (acervo próprio), 2013.

Durante o dia, alguns homens Tenharin vão para o roçado, caçam e outros pescam. Alguns são funcionários públicos como professores, agente de saúde, motorista e serventes na aldeia. Mas existem os que trabalham e moram fora da aldeia, exercendo outros cargos públicos. Também, alguns alunos que cursam o Ensino Superior moram na cidade. No entanto, é frequente a volta deles para a aldeia a fim de visitar parentes, ou durante a realização de eventos importantes, como o encerramento do curso de formação de professores oferecido pela SEDUC- AM, festa cultural, ritual da menina-moça, ritual fúnebre, assembleias para discutir questões essenciais para seu povo e outras que se fizerem necessárias.

Uma atividade coletiva é a “farinhada”, do qual tive a oportunidade de presenciar. É o momento em que um grupo se reúne para realizar a produção da farinha, alimento indispensável na dieta dos amazonenses. Primeiro, é feita a colheita das raízes no roçado, que geralmente não fica muito perto das casas. Em seguida, o produto é levado para a casa de farinha, essas raízes são descascadas, ficam de molho e depois são raladas e prensadas para separar a massa do líquido, chamado tucupi. Essa massa é levada para um forno à lenha, no qual fica um tacho enorme com mais ou menos 1,50m de diâmetro, nele, uma pessoa fica revirando a massa constantemente com uma colher de pau com cerca de 1m. A temperatura é bastante alta e exige grande esforço das pessoas encarregadas desse processo.

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Depois a farinha é dividida entre os membros que participaram e parte é levada para ser vendida em Humaitá.

As mulheres têm como função principal o cuidado com a casa e com os filhos, como cozinhar, cuidar das roupas, etc. Mas ficou claro, no período de observação, que as mulheres possuem papel muito importante na vida da aldeia. Apesar de não ter reconhecido mulheres em situação de comando, como os chefes das aldeias, são elas muitas vezes que fazem intervenções bastante importantes, como é o caso de Dona Margarida, uma senhora já idosa, que possui uma visão bastante crítica da situação em que o povo Tenharin se encontra.

Entre os jovens existe uma influência grande da sociedade envolvente, eles gostam de se encontrar na casa grande ou casa da cultura, pela noite, para ouvirem música eletrônica e conversarem. Em algumas casas existe aparelho de televisão e antena parabólica, o que os colocam em contato rápido com o mundo exterior. A aldeia possui um telefone público, que quase nunca funciona. Além disso, existe a comunicação por rádio.

Entre as aldeias do Marmelos-Manicoré, permanecia e pernoitava sempre na aldeia Kampinhu, apesar de frequentar todas as demais aldeias. Como ocorre com a aldeia Marmelos 2, a aldeia Kampinhu parece ser a centralizadora dos encontros, talvez por sua localização, entre algumas aldeias, ou pelas suas condições físicas. Na verdade, os indígenas decidiam onde seria melhor para eu ser alojada.

Assim como nas aldeias Marmelos, a vida aqui segue seu curso natural, não precisa pressa, todos têm suas obrigações definidas, as crianças sempre são bem tratadas, nunca presenciei gritos ou uma voz mais áspera com os pequenos. Parece ter um ponto central, que no caso é a casa do falecido senhor Ivan, antigo cacique da aldeia. Seu Ivan faleceu vítima de um acidente de moto na rodovia, isso deixou a comunidade muito fragilizada, todos tinham nele uma grande referência.

No momento em que retornei para finalizar a discussão e construção do PPP na aldeia Kampinhu, em agosto de 2014, alguns professores não estavam presentes, pois estavam em outra atividade. No entanto, os professores presentes não conseguiram manter as atividades, estavam ainda muito abalados com a perda do seu cacique. Uma professora nova, sobrinha do seu Ivan, me falou muito emocionada:

“Professora, é a primeira vez que venho aqui na aldeia do meu tio depois do ocorrido, foi muito triste, quando avisaram que ele tinha sofrido o acidente todos vieram pra cá, ele foi transportado na carroceria de uma caminhonete. Mas, a gente pensava que ele ia ficar bom, depois de alguns dias veio a notícia do seu falecimento. Ainda estou muito, muito triste

(P4)”.

Diante disso, passamos a conversar sobre a participação deles no curso de formação Piraywara14 oferecido pela SEDUC para formação de professores em nível

médio. Como a maioria dos professores do Marmelos-Manicoré não possuem essa formação, passei a questioná-los sobre a importância de sua participação, uma vez que estava sendo oferecido para os professores Indígenas de Humaitá e eles, que estão sob a jurisdição de Manicoré, não foram contemplados. Assim, resolvemos que faríamos um documento solicitando à SEDUC-AM que os professores Tenharin de Manicoré fossem incluídos no curso com o intuito de qualificá-los a fim de que possam desempenhar melhor suas funções. Ficou decido que eu seria responsável por entregar o documento na sede da SEDUC em Manaus. Atualmente, os professores Tenharin de Manicoré já estão participando dessa formação.

Outra atividade de que participei foi a festa cultural que acontece entre os meses de agosto e setembro em uma aldeia especifica dos Tenharin. Algumas pessoas são convidadas para participarem dessa festa, que duram vários dias. Neste caso, fui convidada a participar da festa que ocorreu em 2013.