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Algumas considerações sobre a formação de conceitos científicos

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CAPÍTULO 1 O PERFIL CONCEITUAL COMO UM CAMINHO PARA A

1.1 Epistemologia na formação docente

1.1.3 Algumas considerações sobre a formação de conceitos científicos

Atualmente, no ensino de ciências podemos apontar variadas abordagens sobre o ensino de conceitos, visando melhorias significativas na aprendizagem escolar na maioria dos casos, focando a formação conceitual dos estudantes. Contudo, apesar de alguns trabalhos enfatizarem a formação dos significados em nossos estudantes, necessitamos também inserir algumas discussões referentes às práticas científicas, para que estas não sejam caracterizadas de modo unitário simplista e possam repercutir diretamente na aprendizagem de conhecimentos mais conscientes tanto em professores quanto em estudantes (DRIVE et al., 1999).

Presentemente, percebemos que variados conceitos, discutidos no contexto escolar, são tratados relativamente a partir de visões ingênuas da ciência, descrevendo os conceitos científicos como modelos organizados por simples fatos acontecidos, e não como conhecimentos construídos ao longo do desenvolvimento intelectual da humanidade.

Diante disso, Driver et al. (1999) defendem que esses conceitos devem ser ensinados como conhecimentos construídos a partir de muitas interpretações e indagações de fatos e acontecimentos que emergiram dos variados contextos sociais, a partir de grandes esforços intelectuais, conjecturados pelas entidades ontológicas e epistemológicas do conhecimento. Isso significa que a aprendizagem e a construção de significados são organizadas nas formas científicas de se conhecer e interpretar essas entidades, conectadas com as ideias científicas, para que assim os participantes da construção do conhecimento não incorporem que é a ciência é algo estanque e acrítica.

Partindo deste pensamento, Mortimer (1997) e Driver et al. (1999) apontam que, neste caminho, professores e estudantes irão perceber que a aprendizagem dos conceitos científicos são socialmente construídos, isto é, é algo estabelecido pelo inter-relacionamento de pessoas, acompanhado sumariamente pela evolução histórica, filosófica e cultural da humanidade.

Assim, diante do exposto, verificamos que apesar da ciência e do conhecimento científico apresentarem papéis importantes, observamos que os participantes do processo de construção do conhecimento são os principais responsáveis pelas definições e divulgação dos pensamentos científicos.

As definições e questionamentos acerca dos conceitos são vários, e em alguns casos são confundidos por conceitualização, mas segundo Mortimer, Scott e El-Hani (2009, 2011), conceitos podem ser definidos como modelos ou esquemas mentais construídos pelos aprendizes que representam objetos ou eventos; os mesmos também podem ser entendidos como entidades mentais relativamente estáveis que são incorporados por um indivíduo. É importante também discorrermos o termo conceitualização que, de acordo com os autores, trata-se de um processo emergente, que é gerado através da ação mútua dos sujeitos em sociedade, sendo que estes sujeitos são detentores dos significados de determinados conceitos, salientando que estes conceitos devem estar estruturalmente estabilizados na mente da cada indivíduo.

Nébias (1999) também diz que a constituição de conceitos científicos é a consequência de uma atividade complexa, que está relacionada às funções intelectuais básicas de atenção deliberada, memória lógica, abstração, capacidade para comparar e diferenciar.

Sendo assim, notamos que é utilizando-se dos conceitos científicos que conseguimos realizar representações e dar significados a diversos eventos e transformações que nos cercam cotidianamente, sobretudo em sala de aula. Desta forma, podemos pontuar que o processo de formação de conceitos está intrinsicamente ligado às culturas dos povos, como também pela evolução sociohistórica e filosófica da sociedade. Assim, como relatam Mortimer (1997, 2000) e Driver et al. (1999), isso persiste porque as concepções se enraízam na cultura cotidiana e é praticamente impossível extingui-las, permanecendo em cada sujeito seja implicitamente ou explicitamente.

Mortimer (1995, 1997, 2000) explica que é interessante percebermos que muitas ideias da química cotidiana apresentam relações com formas de pensar usadas por filósofos e cientistas em outras épocas, como também relata que muitos estudos na área de construção de conceitos perceberam que existem algumas mudanças na forma de pensar vários conceitos químicos em relação à evolução dos conceitos desde química clássica até a química contemporânea.

Deste modo, Ribeiro (2002) corrobora essa ideia, quando diz que existe uma grande peculiaridade das nossas formas de pensar e transpor os conceitos científicos, sendo que há uma forte relação da química com a cultura no que reflete as evoluções dos conceitos

químicos, legitimamente relacionados ao contexto sociohistórico. “Em outras palavras, vemos o mundo e tentamos compreender seu funcionamento, com ‘óculos conceituais’. Inicialmente com conceitos cotidianos, alternativos, espontâneos, que vão dando lugar aos conceitos científicos” (NÉBIAS, 1999, p. 133).

Diante disso, percebemos que cada ser humano carrega consigo um conjunto de aspectos que reverberam nas suas concepções, que são estreitamente relacionados às vivências de cada pessoa em sociedade. Então, neste mesmo pensamento, devemos reconhecer que a maneira que construímos nossos conhecimentos, irá de alguma forma influenciar em nossas ações na dinâmica das interações no contexto escolar e no processo de ensino-aprendizagem.

De acordo com Mortimer (1995, 1996) e Driver (1999), em muitos casos, o ensino de conceitos está especificamente restrito ao modelo tradicional, no qual tão-só busca tratar a construção de conceitos científicos, apenas pela reprodução dos livros didáticos, compreendida como conceito imutável. Santos e Carbó (2004) expressam que os livros e as aulas não procuram fazer com que os estudantes busquem meios para aprenderem os conceitos, como também aplica-los conscientemente nas suas vidas, e que em muitos casos são vistos de modo rasteiramente lógico e cientificamente inquestionável.

Partindo desse ponto de vista, Ribeiro (2002) relata que o ensino de conceitos científicos, sejam eles químicos entre outros, deve ser compreendido como uma cultura escolar, para que assim possamos formar estudantes conhecedores e aptos a aplicarem os diferentes conceitos científicos, e, dessa maneira, possam problematizar e contextualizar estes conceitos a distintos contextos. Mas, vale salientar, para que os estudantes sejam assim, é preciso da participação primordial do professor e que este saiba ensinar os conceitos científicos corretamente, assim como instigue seus alunos a sempre buscarem novos conhecimentos.

Segundo Mortimer (1996, p. 24):

Essas perspectivas parecem desconhecer que aprender ciências envolve a iniciação dos estudantes em uma nova maneira de pensar e explicar o mundo natural, que é fundamentalmente diferente daquelas disponíveis no senso-comum. Aprender ciências envolve um processo de socialização das práticas da comunidade científica e de suas formas particulares de pensar e de ver o mundo, em última análise, um processo de "enculturação". Sem as representações simbólicas próprias da cultura científica, o estudante muitas vezes se mostra incapaz de perceber, nos fenômenos, aquilo que o professor deseja que ele perceba.

Diante do exposto, percebemos que, em muitos casos, o professor não consegue conceder subsídios para que seus estudantes consigam compreender as vantagens e as limitações da construção de conceitos científicos que literalmente podem ser expressos em novos conhecimentos.

Desta forma, de acordo com Delizoicov, Angotti e Pernambuco (2011, p.122), é preciso que o professor reconheça que o “aluno é, na verdade, o sujeito da sua aprendizagem; é quem realiza a ação, e não alguém que sofre ou recebe a ação”.

Assim, devemos refletir sobre a participação dos professores na construção de significados em sala de aula, para que estes evoluam em suas concepções, compreendendo que seu trabalho deve ir além de um aparato de técnicas metodológicas para ensinar, ou seja, ele deve considerar sumariamente o posicionamento de seus educandos para que, assim, possam ter melhores resultados na aprendizagem de seus alunos.

Delizoicov, Angotti e Pernambuco (2011, p. 127) explanam que grande parte dos professores permanece seguindo livros didáticos, insistindo na memorização de informações isoladas, e continuam a defender o ensino tradicional. Diante disso, entendemos que estes pontos podem acarretar em problemas na construção de conceitos em nossos estudantes, problematizando as ideias prévias e/ou científicas dos estudantes.

Além disso, de acordo com Tavares (2008), o ambiente escolar caracteriza a heterogeneidade dos conceitos e contribui para compreensão das ideias em sala de aula, resultando assim no desenvolvimento da aprendizagem escolar. No entanto, é necessário apontar que, apesar ser de extrema importância na educação dos estudantes, alguns professores ainda ensinam conceitos escolares, apenas para reafirmar as ideias constituídas no senso-comum.

De acordo com Druzian, Radé e Santos (2007), Tavares (2008) e Mortimer (1995, 1996, 2000), um grande desafio a ser superado no ensino de conceitos em ciências são os obstáculos de ordem epistemológica e ontológica, face às concepções ou ideias prévias dos estudantes, uma vez que muitos professores desconhecem informações necessárias de caráter epistêmico e ontológico que podem norteá-los a facilitarem o ensino de conceitos científicos.

Desta forma, para que haja a formação integral dos estudantes primeiramente é necessário que os professores pesquisem, aprendam e apliquem novos anseios que concedam novos direcionamentos para a construção de conceitos dentro e fora do âmbito escolar. Assim, os professores irão desenvolver atividades mais inovadoras que propiciem o desenvolvimento da aprendizagem em seus estudantes, elaborando metodologias que desafiem as concepções

prévias do aprendiz, encorajando-o a reorganizar suas teorias pessoais, beneficiando assim a construção do conhecimento dos mesmos (DRIVER et al., 1999).

Destarte, as aulas de ciências devem conduzir o estudante a formar atitude consciente, na qual edifique tomada de consciência acerca da construção de conceitos, entendendo que esta funciona como ferramenta de interlocução com a realidade e com os contextos em que os sujeitos estão inseridos (SCHROEDER; FERRARI; MAESTRELLI, 2010, p. 27).

Diante disso, tendo em vista a importância da tomada de consciência sobre a construção de conceitos e a inserção de reflexões acerca dos contextos de aplicações dos conhecimentos, promovidos diretamente pelas interações discursivas em sala de aula, mediada pelo professor que age e reflete epistemologicamente, podemos assinalar que, para tais pontos podem ser bem articulados sugerindo a potencial contribuição que pode ser dada pela teoria do perfil conceitual, na qual em seu âmago apresenta discussões que permitem entendermos a evolução dos conceitos científicos nos contextos sociais e reverberar sobre as variadas maneiras de pensar e falar estes conceitos, entre outras características.

A seguir, apresentamos a teoria do perfil conceitual, com suas bases teóricas. Além disso, expomos algumas sugestões sobre a importância desta teoria no contexto da sala de aula, e como instrumento na formação epistemológica de conceitos em sala de aula.

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