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Algumas notas históricas sobre as Associações

CAPÍTULO 2 CONTEXTUALIZAÇÃO DAS ASSOCIAÇÕES

2.1. ASSOCIAÇÕES: FUNCIONAMENTO E FINALIDADES

2.1.1. Algumas notas históricas sobre as Associações

O movimento associativo nasceu com o fluxo migratório dos anos 60 e sofreu várias mudanças sociais e históricas, ao longo dos anos, as quais lhe conferem o seu verdadeiro significado. As Associações dos anos 60 transmitiram uma cultura popular, expressão da ruralidade (Cordeiro, 1987b). Os anos 70 representaram a sua fase de organização e de lutas. Com os anos 80 viu-se chegar o movimento associativo da geração dos jovens nascidos em França, portadores de novas necessidades e novas formas de expressão, como formas autónomas de organização, adesão a Associações francesas ou pluriétnicas. Como podemos ler na Presença Portuguesa14, n’O Emigrante15 (1983) :

“Dans une première phase, les communautés portugaises ont eu la nécessité de créer d’innombrables associations pour pouvoir sortir de leur isolement […]. Dans une seconde phase, ces associations se sont rapprochés les unes des autres et cela a contribué à la création de fédérations ayant des objectifs politiques communs, dans un premier temps, et à la création d’interassociations ou de coordinations, dans un deuxième temps ».

Este foi o período de autonomização e de saídas do universo estritamente português. Ainda hoje, essas diversas formas de expressão cultural coexistem no seio do movimento associativo. Por motivos de ordem ideológica e política, as associações desejam atingir um maior número de actores sociais e revelam uma vontade do uso dos dois idiomas: português e francês. Estas praticam o entre-dois (cultural e linguístico) (Sibony, 1991). As Associações dos anos 90 reivindicam o reconhecimento da diversidade como valor. Actualmente, é de pluralismo cultural da sociedade francesa que se trata, no sentido da definição de Oriol,

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La coordination des associations : une action efficace, In Presença Portuguesa, nº2, novembro 1983, p.3

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(1995): “Une conception de la société qui donnerait les moyens institués de préserver et d’user d’un certain nombre de ressources pour se manifester dans sa spécificité quand on appartient à une minorité”.

Cada Associação tem uma função estética, de conservação ou de propagação, de inovação ou de degradação. O meio associativo da 1ª geração exprime a sua cultura rural onde se pratica uma sociabilidade “à portuguesa”, à volta dos significantes que são a língua, a gastronomia, o folclore e o desporto. Quanto às camadas jovens, elas foram sociabilizadas em meios urbanos, alimentadas de valores, de história e de cultura francesas. Para eles, o grupo de pertença constitui um grupo de referência, mas não é o único: existem outros. Não se encontram no universo dos pais, no entanto, são portadores de uma herança e de experiências próprias que fazem deles filhos de portugueses. Daí a criação de novas formas de expressão, novas Associações, que traduzem a vontade de se afirmarem com a sua especificidade portuguesa, reavivando a tradição, mas modificando-a.

As Associações culturais portuguesas, uma média de 1000, publicadas no Journal Officiel de la République Française16 (Leis e Decretos), são associações regidas pela lei de 190117 cujo objectivo principal é o ensino da língua e cultura portuguesas a alunos de 2.º, 3.º ciclo e ensino secundário.

No Portal das Comunidades Portuguesas18 as Associações estão distribuídas por áreas consulares (Bayonne com 23 associações, Bordeaux: 22, Clermont-Ferrand: 36, Strasbourg: 73, Lille: 25, Lyon: 80, Marseille:30, Nantes:26, Nogent-sur-Marne: 108, Orléans: 17, Paris:87, Rouen: 20, Toulouse: 28, Tours:38, Versailles: 68). Estão registadas uma média de 681 associações, que recebem subsídios). Além do ensino, desenvolve-se a vertente cultural (identidade cultural e nacional), e, nesse sentido, organizam e participam em numerosas manifestações lusófonas, tais como: saídas ao teatro, concertos, exposições, feiram, folclore, publicações associativas em França, música portuguesa, entre outras. Pretendem, igualmente, promover a integração da comunidade portuguesa, desenvolver acções no contexto social e trabalhar no sentido de favorecer as trocas culturais entre Portugal e França (Coordination des Collectivités Portugaises de France).

A importância do movimento associativo português prende-se com a vitalidade da comunidade portuguesa, mas também com a sua capacidade de organização. A sua problemática articula-se à volta do conceito da dualidade das afiliações, que dá conta da dinâmica identitária da comunidade portuguesa em França (Hily & Poinard, 2004). Segundo

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O Journal Officiel de la République Française (JORF ou JO) é o jornal oficial da República Francesa. O jornal publica as informações oficiais mais importantes.

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Lei criada no mesmo ano, 1901, base da criação de associações francesas e da criação das associações das comunidades estrangeiras. As comunidades estrangeiras necessitavam de uma autorização do ministério do interior.

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Cordeiro (1994), a vida associativa não está directamente ligada a códigos jurídicos, pois a pertença só é regulamentada e confirmada pelo voluntariado, desempenhando, portanto, um papel mediador entre o pólo institucional e o pólo existencial.

As Associações constituem, para os pais, um espaço privilegiado de partilha de interesses em relação à sua identidade. São analisadas como espaço de reprodução de identidade (produtora de pertença), transmissão de cultura e conservação da identidade cultural minoritária. Da mesma forma, são um espaço de negociação em áreas locais ou bairros. O facto de não existirem ajudas institucionais, levou a que os agentes sociais tivessem de imaginar e criar espaços de trocas pluri-familiares - as associações - para evitar, deste modo, o desaparecimento da identidade cultural minoritária, numa sociedade que não tolera mais que uma identidade cultural. As Associações portuguesas em França têm um papel de relevo, na medida em que são uma rede de transmissão identitária. Elas têm duas funções principais: a conservação, a difusão e a afirmação dos modelos culturais que os residentes portugueses são portadores; por outro lado, a promoção de uma acção no sentido da sua inserção e integração na sociedade receptora. Com esta acção, o grupo assegura a reprodução das práticas associativas no país de acolhimento e, nesse sentido, os costumes da 1ª geração constituem uma forma de resistência à dominação simbólica da cultura maioritária. Concluindo, podemos dizer que existem dois tipos de associações: as que têm por dominante o folclore (grupos folclóricos, celebrações, festas, jogos tradicionais) e as associações das novas gerações, portadoras de um fermento identitário conflitual. As actividades nelas desenvolvidas são pluridimensionais. Todas testemunham uma vontade de re-apropriação da história e da cultura portuguesas, de conservação da língua e da valorização da expressão bilingue. Devido às numerosas interrogações sobre a sua identidade e as suas pertenças, os lusodescendentes necessitam da aprendizagem da língua. Observam-se acções que consistem na luta contra a repulsão e a reconciliação de forma activa com a língua, a cultura e a história portuguesas.