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CAPÍTULO II- FORMAÇÃO DE PROFESSORES, ENSINO, APRENDIZAGEM E SER BOM PROFESSOR

2.1 Algumas questões relacionadas à formação de professores

A proposta de escrever sobre a formação de professores e o currículo decorre de nossas indagações e da busca por compreender alguns dos indícios que colocam o ensino em crise e o mal-estar docente desde o pós-guerra, conforme destacam Tardif e Lessard (2014), e as implicações desta situação no currículo educacional.

A percepção de uma crise educacional sugere movimentos de transformação na educação como forma de sacudir ou questionar também o sistema social, “a crise parece indissociável da vida social [...] contradições, aliás múltiplas e articuladas entre si, mas não redutíveis a uma única”. (TARDIF; LESSARD, 2014, p. 257). As contradições não serão abordadas como tema a ser discorrido neste item e, sim, pesquisar-se-ão algumas implicações dos saberes do professor como materialização no currículo em um curso de formação do professor.

A abordagem sobre a formação de professores pode ser explorada como um eixo que engloba um conhecimento mais amplo por lidar diretamente com a formação de crianças, jovens, adultos e idosos, já que “o saber é sempre o saber de alguém que trabalha alguma coisa no intuito de realizar um objetivo qualquer”. (TARDIF, 2014, p.11). Neste sentido, existem cuidados que podem ser tomados ao tratar-se de formação de professores para não simplificar ou reduzir o saber docente, conforme denomina Tardif (2014), e para não relacionar a formação de professores apenas à mente ou às questões sociológicas. Para isso, o autor sugere que o saber do professor é social porque: 1 - trabalha na coletividade e sob a orientação de documentos; 2 - o saber do professor é legitimado por um sistema; 3 - sua prática e ação são sociais; 4 - a Pedagogia e a Didática do professor não partem de uma ciência lógica e 5 - o saber do professor é construído ao longo de sua carreira.

Para García (2014), a formação de professores é um eixo amplo que abarca a formação inicial, seja na academia ou na escola secundária (magistério), no caso do Brasil; o desenvolvimento pessoal, a prática propriamente considerada, as tecnologias, a sociedade e a reconstrução da profissão são constantes. “A formação de professores procura desenvolver nos docentes um estilo próprio assumido refletidamente” (GARCÍA, 2014, p. 23). Assim, o autor propõe alguns princípios referidos à formação de professores. O primeiro princípio foi chamado

de contínuo, ou seja, a formação tem início, é permanente e está pautada pela ética. O segundo princípio diz que “A formação de professores deve ser analisada em relação com o desenvolvimento curricular e deve ser concebida como uma estratégia para facilitar a melhoria do ensino”. (GARCÍA, 2014, p. 27). O terceiro princípio fortalece o segundo ao referenciar que a formação do professor precisa estar relacionada à organização como um todo da escola, e o quarto princípio de García (2014) sugere que a articulação entre os princípios anteriores é importante à formação pedagógica do professor. O quinto princípio sublinha a importância da integração da teoria com a prática na formação do professor, e o sexto princípio sugere o isomorfismo, ou seja, a equivalência entre o que o professor aprende para depois ensinar. O sétimo princípio é registrado com a questão da valorização da individualização, considerando que cada sujeito dispõe de seus próprios artifícios para desenvolver suas potencialidades e, por último, García (2014) sugere o princípio da capacidade de reflexão que cada professor pode desenvolver, principalmente para saber valorizar o conhecimento do outro.

Neste sentido, Tardif (2014), com a questão do cuidado na formação de professores, e García (2014), com os princípios na formação de professores, apresentam tendências relacionadas à formação de professor que convergem sob os aspectos que indicam pontos que podem ser atendidos ao se tratar de formação de professor, como o sujeito professor atentar desde a primeira formação com que se tem contato em um curso de licenciatura para a área escolhida. A área de formação é importante para delinear um campo de atuação para que o professor possa pesquisar em conformidade com o seu interesse. O conhecimento aprofundado em um campo pode possibilitar segurança para o sujeito entender que os saberes docentes são diversificados, mas que lhe será relevante formar um objeto mais específico para desenvolver sua profissão.

A profissão do professor acompanha a tendência da globalização em que o conhecimento tornou-se cada vez mais instantâneo e o que se percebe é a valorização de novos procedimentos entre as instituições educacionais, como a universidade, por exemplo, que é veículo de disseminação do saber sistematizado que será socializado (TARDIF, 2014). A universidade acaba sendo o local responsável pela renovação do saber em que um grupo de professores (os pesquisadores) desenvolve a criação de um novo saber/procedimento, e os outros professores (os que ensinam) ficam responsabilizados por levarem o conhecimento para a sala de aula. “Os educadores e os pesquisadores, o corpo docente e a comunidade científica tornam-se dois grupos cada vez mais distintos, destinados a tarefas especializadas de transmissão e produção dos saberes sem nenhuma relação entre si”. (TARDIF, 2014, p. 35).

Assim, a formação de professores e os saberes atribuídos a estes profissionais não são reduzidos tão somente à transmissão de conhecimentos, pois a relação entre os diversos saberes pode ser considerada rizomática e plural. Assim, a formação de professores está entrelaçada com outras questões como os “saberes disciplinares, curriculares e experienciais”. (TARDIF, 2014, p. 36).

O saber racional e sistematizado, que representa e orienta a atividade do professor, é o saber pedagógico, pois é a partir deste conjunto de reflexões e ações trilhadas pelo professor que se busca a legitimação para o saber pedagógico, na ciência da educação. (TARDIF, 2014). Um saber orientado e sistematizado como um processo de formação evolutiva centrado em objetivo que não seja apenas a sala de aula. As estruturas racionais no campo de formação de professores podem ser percebidas na escola e nos currículos. (GARCÍA, 2014).

E o saber disciplinar circula entre os departamentos e as diferentes faculdades que formam os professores. Por exemplo, em Letras, as disciplinas condutoras são da Linguística e da Literatura, conforme Lajolo (2011). “Os saberes das disciplinas emergem da tradição cultural e dos grupos sociais produtores dos saberes”. (TARDIF, 2014, p. 38).

Em seguida, aparece em Tardif (2014) uma referência ao saber curricular como um meio de formação do conhecimento do professor, pois este se apresenta nos programas das disciplinas que selecionam e organizam a cultura para uma formação erudita a ser apreendida e aplicada pelo professor. E um último saber apresentado é o experiencial, em que o professor desenvolve suas experiências a partir de suas atividades de rotina a partir de suas experiências individuais e coletivas.

Assim, os saberes pedagógicos, disciplinares e curriculares são elementos que mesclam a constituição da profissão docente como um arcabouço que reúne “os saberes sociais, transformados em saberes escolares através dos saberes disciplinares e dos saberes curriculares, os saberes oriundos das ciências da educação, os saberes pedagógicos e os saberes experienciais”. (TARDIF, 2014, p. 39). Para o autor, essas características dos saberes fundamentam o profissionalismo professoral como um conjunto de atribuições e práticas necessárias para a sua prática.

Pode-se dizer que a profissionalização do professor acompanha os acontecimentos do desenvolvimento econômico das “duas últimas décadas, no contexto de generalização e de massificação da educação, e por extensão no Quadro de burocratização dos sistemas educativos”. (TARDIF; LESSARD, 2014, p. 255). Assim, algumas implicações são parte da formação de professores como, por exemplo, a história da profissão do professor como sendo antiga e esta ser entendida como um ofício sacerdócio, além de estar ligada à questão da

formação do outro. À parte das representações voltadas para a profissão dos professores, segundo Tardif e Lessard (2014), a formação de professores é um processo complexo que demanda pesquisas.

Neste sentido, o desenvolvimento do ofício de ensinar ao mesmo tempo em que é considerado um dos mais antigos (TARDIF; LESSARD, 2014) também é considerado jovem, enquanto formação de professores, pois a profissão começa a ser mencionada na modernidade após a Segunda Guerra Mundial. Como aludem os autores, para algumas pessoas, a escola já não é a mesma e os professores são comparados a vigilantes, pois os jovens só estariam indo para as escolas para não estarem em outros lugares. Entretanto, assim como os alunos, “os docentes são abandonados a si mesmos, em sua relação diária com os alunos e na construção do sentido que eles tentam encontrar ou dar à sua experiência”. (TARDIF; LESSARD, 2014, p. 259).

Assim, as experiências de professores e de alunos estão inseridas nesta diversidade que é a sala de aula e nem sempre estão relacionadas aos saberes institucionalizados. Considerando que as especificidades de um curso de licenciatura vigoram a partir da aprovação da Resolução CNE/CP 9/2002, a formação de professores no Brasil é recente. Além disso, cada curso possui um currículo específico para cada área e a profissão do professor é entendida como um arcabouço amplo “porque envolve, no próprio exercício do trabalho, conhecimentos e um saber- fazer bastante diversos, provenientes de fontes variadas e, provavelmente, de natureza diferente”. (TARDIF, 2014, p. 18). Entende-se, assim, que a atuação do professor é uma profissão que está em processo e a formação inicial como a contínua faz parte da “história de vida e de uma carreira profissional”. (TARDIF, 2014, p. 19-20).

Para o autor, além da história de vida como professores, estes sujeitos vivenciam experiências familiares e sociais, bem como a diversidade de experiências de professores que são diluídas na educação como forma de senso comum sobre a profissão de professor, neste sentido é que Tardif (2014) chama a atenção sobre a questão da temporalidade em uma profissão. Um sujeito pode se sentir mais ou menos preparado para uma função de acordo com as experiências por ele já vivenciadas nas mais diferentes situações, mas isso não garante o conhecimento em sua totalidade, pois na formação de professores os saberes pedagógicos, disciplinares e curriculares podem ser diferentes de suas crenças, por exemplo, sobre como desenvolver a sua atividade docente.

Além disso, existem as experiências com as salas de aula; as atuações em cargos administrativos e o papel social que os professores desempenham junto aos outros sujeitos na educação. Assim, para Tardif (2014), não se trata de uma caminhada tênue e nem linear e, sim,

de realidades inseridas em tensões, em dilemas, em dúvidas, e em crenças que são reproduzidas ou revistas o tempo todo dentro da profissão do professor. Neste sentido, essa engrenagem educacional que envolve a formação de professores tem contato rotineiro com a diversidade de cultura, de história e formação de sociedade.

Para cada realidade cultural, social e histórica, por exemplo, podem-se considerar determinadas situações, e a formação de professores pode ser inserida entre os diferentes conflitos como o ambiente familiar, a situação da carreira e toda a organização que envolve a formação e a atuação de professores. (GARCÍA, 2014). Para este autor, a formação de professores é evolutiva no quesito fisiológico por envolver um ser humano que é biológico; é cognitivo, pois está em constante aquisição de conhecimento teórico e prático como formação contínua; é pessoal porque cada professor escreve a sua caminhada; e é moral por ser uma profissão que trabalha com a formação de outros sujeitos. Conforme Tardif (2014), a formação de professores envolve os saberes e

Todo saber implica um processo de aprendizagem e de formação; e, quanto mais desenvolvido, formalizado e sistematizado é um saber, como acontece com as ciências e os saberes contemporâneos, mais longo e complexo se torna o processo de aprendizagem, o qual, por sua vez, exige formalização e uma sistematização adequadas. (TARDIF, 2014, p. 35).

Assim sendo, quanto mais o sujeito professor passar por formação, mais se terá a necessidade de busca por aperfeiçoar-se na profissão. Essa busca coloca o professor em permanente interação, e a formação de professores é importante para que se continue vivenciando diferentes realidades apresentadas a cada dia. A formação de professor é a possibilidade de o professor olhar para sua prática e ressignificá-la, ainda que conforme Tardif (2014, p. 41), a prática docente e os saberes nem sempre estejam articulados ou ainda “a prática docente e os saberes constituem mediações e mecanismos que submetem essa prática a saberes que ela não produz e nem controla”. A profissão do professor não pode ser comparada a outras porque o professor, além de saber algo, terá que ensinar, e o ensino e a aprendizagem não seguem os mesmos princípios que os antigos filósofos utilizavam, assim,

O corpo docente, na impossibilidade de controlar os saberes disciplinares, curriculares e da formação profissional, produz ou tenta produzir saberes através dos quais ele compreende e domina a sua prática. Esses saberes lhe permitem, em contrapartida, distanciar-se dos saberes adquiridos fora dessa prática. (TARDIF, 2014, p. 48).

Então, por mais que haja estabelecimento das relações entre os saberes apontados por Tardif (2014) com a experiência do professor, em sua formação, as experiências dos professores alinhadas aos saberes disciplinares e curriculares são subjetivas e pertencem a cada professor conforme sua vivência na docência. Os saberes experienciais são favorecidos pela atuação do professor, pois, nas palavras de Tardif (2014), o professor retraduz outros saberes adequando- os a sua realidade.

Para García (2014), as reflexões dos professores passam por sua subjetividade e esta é uma forma de o professor rever crenças e atitudes relacionadas à sua prática. Tardif (2014) diz que a profissão do professor requer muitos anos de formação teórica e a prática tem importância igual. Assim, a inserção destes requisitos na formação de professores lhes possibilita a assunção do gosto em querer transformar constantemente sua prática.

Dentre as atribuições de um professor, a competência devida e assumida por professores precisa de suporte que lhe dê o “domínio adequado da ciência, técnica e arte da mesma, ou seja, possuam competência profissional”. (GARCÍA, 2014, p. 22). Estas características de formação profissional para professores desvelam a realidade de preocupação da área educacional com a profissionalização dos sujeitos que desenvolvem a educação das futuras gerações.

Assim, a compreensão de formação de professores, para García (2014), une a parte pedagógica à parte da formação acadêmica, pois também se trata de uma formação profissional e apresenta alguns princípios a serem considerados. E como uma ação educacional, a formação de professores é antes de qualquer ação uma formação de formadores, pois é preciso reunir as características didáticas e pedagógicas com a capacidade prática profissional para a atuação com o outro. Em Tardif (2014), a formação de professores está relacionada a outros saberes como os pedagógicos, os disciplinares, os curriculares e os experienciais.

Neste subitem procurou-se apresentar algumas questões relacionadas à formação de professores porque esta pesquisa é proposta e desenvolvida em um curso que forma professores e na continuidade far-se-á outras abordagens relacionadas à temática do ensino ou do ensinar na formação de professores.