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COALIZÕES PRÓ-LEIS MAIS RESTRITIVAS CAOLIZÕES PRÓ-LEIS MENOS RESTRITIVAS

7.4. Alinhamento e Articulação Intersetorial

Procurou-se analisar a existência e a eficácia de mecanismos institucionais que favoreçam a articulação e a transversalidade de iniciativas entre vários órgãos públicos no processo de ordenamento territorial no DF. Cabe lembrar que, para Sabatier e Jenkins-Smith (1993), os subsistemas são somente parcialmente autônomos. Portanto, no MCD, as decisões e impactos de outros subsistemas são elementos dinâmicos que afetam um subsistema específico.

Dados documentais e algumas entrevistas evidenciaram um grave problema que se soma às dificuldades de ordenamento territorial, qual seja a dispersão das ações que envolvem esse processo. Foram vários e distintos órgãos identificados executando tarefas de forma isolada, sem transversalidade. O resultado tende a ser o retrabalho oneroso e inoperante.

Analisando os dados, percebemos a existência de diversos órgãos governamentais envolvidos nos estudos da viabilidade urbanística, fundiária, ambiental e social na construção da politica de ordenamento territorial. Os mecanismos de articulação intersetoriais entre esses órgãos tinham previsão legal nas normas de governança territorial, mas se mostraram ineficientes e fragmentados do ponto de vista da operacionalização.

Portanto, os levantamentos feitos da estrutura legal evidenciam que a Lei Orgânica e os diversos PDOTs (Leis Complementares nº 353/1992, 17/1997 e 809/2009) contemplaram o sistema de planejamento, mas não de forma suficiente para garantir sua eficácia. (DISTRITO FEDERAL, 1992a; 1997a; 2000a; 2009).

No último PDOT, o art. 212 formaliza o Sistema de Planejamento Territorial e Urbano do Distrito Federal (SISPLAN). O SISPLAN é um sistema composto pelos diversos órgãos responsáveis pelo planejamento e ordenamento territorial, de forma a coordenar esforços para uma melhor gestão territorial urbana.

O PDOT/2009 determina, nos arts. 213 e 214, o seguinte:

Art. 213. O processo de planejamento e gestão do desenvolvimento territorial se dará por meio do Sistema de Planejamento Territorial e Urbano do Distrito Federal – SISPLAN, estruturado em órgãos e colegiados institucionais.

Art. 214. O SISPLAN, em consonância com o disposto na Lei Orgânica do Distrito Federal, tem por finalidade básica a promoção do desenvolvimento do território com vistas à melhoria da qualidade de vida da população e ao equilíbrio ecológico do Distrito Federal.

A figura arrolada no Apêndice D mostra o organograma do SISPLAN. A SEDHAB é o órgão central do sistema. O CONPLAN, por sua vez, é o órgão colegiado superior, com função consultiva e deliberativa no sentido de auxiliar a administração na formulação, análise, acompanhamento e atualização das diretrizes e dos instrumentos de implementação da política territorial urbana.

Assim, o sistema de coordenação das ações governamentais institucionalizado com a criação do SISPLAN teve como objetivo tornar efetiva a atividade de planejamento. Como a

administração pública se organiza por setores, mas os problemas de ordenamento territorial têm dimensão multissetorial, o sucesso da governança urbana depende de uma boa sintonia das iniciativas a cargo dos órgãos colegiados e executivos centrais e setoriais que colaboram com o ordenamento territorial, inclusive entidades da administração indireta, bem como da sincronia com que tais iniciativas são implementadas.

Estudos mostram que a fragmentação e a falta de coordenação institucional na gestão do planejamento urbano entre as autoridades locais também têm respondido pela não solução de vários problemas urbanos. Questões relacionadas ao planejamento urbano precisam de uma abordagem integrada no sentido de promover a coerência e a articulação, em todos os níveis de governo, de programas de urbanização, de habitação, de regularização urbanística e fundiária, e de proteção ambiental, dentre outros aspectos. Uma abordagem isolada dessas temáticas atrapalha o planejamento efetivo da cidade e é o caminho para a ineficiência no processo de tomada das decisões (KAUFMANN; SAGER, 2006; KÜBLER et al., 2003).

Constatou-se na pesquisa que, no DF, as ações de planejamento, desenvolvimento e intervenção urbana ocorrem de forma fragmentada e desarticulada. Os órgãos envolvidos com o planejamento urbano expostos no Apêndice D, SEDUMA, TERRACAP, Secretaria de Obras, Secretaria de Transporte, Administrações Regionais, as gerências de projetos subordinados ao gabinete do governador, o Grupo de Análise e Aprovação de Parcelamentos do Solo e Projetos Habitacionais (GRUPAR) e a Companhia de Desenvolvimento Habitacional (CODHAB) atuam sem a devida articulação técnica, com sobreposição de funções e desobediência às diversas instâncias decisórias.

Portanto, é necessário romper com o atual quadro de fragmentação, desarticulação e sobreposição institucional em relação à política urbana, e possibilitar a articulação, compatibilização e complementação das políticas setoriais do governo (DISTRITO FEDERAL, 2010a, p. 2).

Nesse âmbito, o processo de construção e implementação dos instrumentos de ordenamento territorial que definem as regras que devem orientar a organização dos espaços urbanos esbarra na inexistência de uma agenda comum de planejamento territorial. Essa inexistência de uma agenda comum resulta em conflitos de interesse e visões institucionais distintas quanto ao processo de tomada de decisão para o uso dos recursos naturais e o uso, parcelamento e ocupação do solo, além da perda da efetividade e da eficácia na consolidação

da boa governança urbana, tarefa que já enfrenta os complexos problemas associados ao poder dos patrimonialistas, enfatizado em diferentes pontos deste trabalho.

Portanto, essa divisão de competências criada ao longo dos anos, que definiu quem lida com a questão habitacional, transportes, meio ambiente, recursos hídricos e agricultura, sem uma clareza sobre como tratar de forma integrada na prática o planejamento territorial no DF, tem gerado dificuldade de se conseguir uma ação coordenada, provocando a perda de capacidade decisória e de intervenção do governo e, como consequência, reforçado a existência da cidade ilegal.

A implementação do PDOT foi entendida como tarefa da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação, mas não das Secretarias de Agricultura, Pecuária e Abastecimento, de Meio Ambiente de Transportes ou de Obras e de outros órgãos do DF. Em razão disso, cada uma dessas secretarias continuou fazendo o que considerava a sua política setorial, em ocasiões com algum sucesso, mas sem integração com as demais políticas e com as diretrizes espaciais gerais para a cidade. A mensagem do atual governador reforça a necessidade de o plano diretor refletir a articulação intersetorial entre várias questões urbanas:

O Plano Diretor de Ordenamento Territorial do Distrito Federal é o instrumento principal das políticas de desenvolvimento urbano, além de ser também norteador de tantas outras políticas transversais, tais como as de desenvolvimento econômico, saneamento básico, infraestrutura, meio ambiente, habitação e regularização fundiária, entre outras (DISTRITO FEDERAL, 2011b, p.1).

O tratamento das questões urbanas e de uso do solo é atualmente disperso por diferentes órgãos distritais. As atribuições da SEDUMA já foram de diferentes secretarias, as relativas à proteção dos mananciais e das APPs foi da secretaria de meio ambiente, ora acoplada à secretaria de desenvolvimento urbano, ora permanecendo órgão com identidade própria, além de outros órgãos ambientais federais e distritais que também têm atribuições nessa área. Os problemas de natureza institucional ocorrem tanto entre poderes constituídos (Legislativo e Executivo) quanto internamente do Executivo (área habitacional e ambiental).

Estudos demonstram que, apesar da redundância organizacional em alguns casos ser tolerada, ela é percebida como a causa de muitos problemas de governança, especialmente a presença de muitos órgãos de governo ineficientes (OSTROM et. al, 2000). Estudos de Landau (1969) já demonstravam que a fragmentação e a sobreposição de funções oneram e reforçam o retrabalho, atrapalhando a viabilidade e a qualidade dos sistemas de governança.

Segundo Ostrom (1990), quando as organizações trabalham de forma isolada uma do outra, o resultado é a fragmentação de esforços e recursos, perdendo-se oportunidades para enfrentar os desafios para o fortalecimento da governança. Por esse principio, as organizações nas políticas públicas deveriam estar fortemente interligados por redes complexas de relações, mas não é o que se verifica na prática no DF.

Deve ser compreendido que o PDOT é o principal mecanismo que pode articular de uma maneira coerente e racional as secretarias, caso contrário elas trabalharão de forma autônoma. Sem uma obrigatoriedade mais clara nessa linha, cada gestor quer dar ao seu órgão sua própria feição, a sua imagem de realização. O PDOT é o grande pacto socioterritorial na esfera local de governo e, se nesse pacto não estiverem acordados os órgãos envolvidos, ele será inviabilizado. Nesse sentido, fala um dos entrevistados:

Enquanto não se criar uma estrutura única, multidisciplinar, capaz de obter todas as informações necessárias das concessionárias do Governo, acabando com a excessiva tramitação dos processos dentro da máquina administrativa, os procedimentos para a regularização continuarão demorados e confusos e o caminho da ilegalidade continuará sendo o mais atraente (Entrevistado nº 6).

Outro elemento adicional a ser comentado que tem implicações negativas no que se refere à aderência ao princípio do alinhamento e articulação intersetorial está nos efeitos gerados por um sistema político com pluripartidarismo exacerbado, que marca a política nacional e também a política do DF. A fragmentação partidária induz a necessidade de organização de coligações na arena eleitoral, muitas vezes incoerentes em termos de projetos políticos, situação que é reforçada na moldagem pós-eleitoral das coalizões governamentais (RENNÓ, 2006; ABRANCHES, 1988). O Apêndice H sustenta este entendimento, mostrando como era fragmentada a composição partidária da CLDF ao longo dos anos.

Com isso, não raramente, órgãos públicos relevantes são verdadeiramente loteados entre os partidos aliados do governador, dificultando a articulação intragovernamental e, não raramente, gerando-se decisões sobrepostas e contraditórias em seu conteúdo. Pode-se afirmar que todos os governos do DF, em alguma medida, têm-se deparado com esse problema.

Note-se que as dificuldades nessa linha alcançam, também, as relações entre o GDF e o governo federal. Essa situação assume especial relevância pelo fato de o DF depender do repasse de recursos federais e comportar em seu território diversas terras de titularidade da União. A própria TERRACAP tem 49% de suas ações nas mãos do governo central.