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COALIZÕES PRÓ-LEIS MAIS RESTRITIVAS CAOLIZÕES PRÓ-LEIS MENOS RESTRITIVAS

6. ANÁLISE DA POLÍTICA DE ORDENAMENTO TERRITORIAL URBANA À LUZ DO MCD (1991-2009): A DINÂMICA DO SUBSISTEMA

6.4. Analisando Leis Mais e Menos Restritivas: Um Esforço de Síntese

Nesta seção, sintetiza-se a evolução quantitativa de leis que regulam o uso, o parcelamento e a ocupação do solo no DF, desde 1992 até a aprovação do PDOT/2009. Nesse sentido, foram catalogadas 1.037 leis complementares ou ordinárias.

O Gráfico 5 abaixo mostra-nos a evolução do número de diplomas legais sancionados no período de 1992 a 2009, permitindo observar o crescimento médio dessas alterações ao longo dos anos.

0 50 100 150 200 250 300 350 400 450 500 1991-1994 1995-1998 1999-2002 2003-2006 2007-2009

Evolução das leis relacionadas ao uso, parcelamento e ocupação do solo

Nota: para valores absolutos, ver Apêndice F.

Gráfico 5 – Evolução do número de leis sancionadas (1992-2009) Fonte: elaboração do autor, com base em dados da CLDF.

As seguintes situações podem ser percebidas pelo gráfico acima:

• logo após a aprovação do PDOT/1992 pelo governador Joaquim Roriz (PMDB), percebe-se uma estabilidade em termos de produção de leis relacionadas ao ordenamento territorial;

• de 1993 ao final 1994, ainda no primeiro mandato Roriz, a produção de leis relacionadas ao ordenamento territorial deu um salto substancial;

• de 1995 até 1998, período do primeiro e único mandato do Governador Cristovam Buarque (PT), houve uma leve aumento na produção de leis relacionadas ao ordenamento territorial;

• a partir de 1999, com o Governador Roriz por dois mandatos seguidos, até dezembro de 2006, houve um aumento drástico e sem precedentes na produção de leis relacionadas ao ordenamento territorial; e

• a partir de 2007, com o Governador Arruda até sua cassação em 2010, houve de novo uma redução paulatina no número de leis relacionadas ao ordenamento territorial na CLDF, nesse caso em razão de o foco estar voltado à elaboração do PDOT/2009. Em suma, pode-se constatar que, não obstante a existência dos planos diretores e da previsão legal para suas revisões, continuaram tramitando, em número bastante expressivo, leis direcionadas a regular o uso, o parcelamento e a ocupação da terra no DF. Os arranjos institucionais nesse campo foram constituídos, muitas vezes, tanto pela iniciativa do Executivo como pelo Legislativo, para a defesa de interesses particulares, em detrimento do interesse público e sem o devido processo legal de consulta e participação popular da comunidade.

Depois desse levantamento e análise da evolução quantitativa das leis de regulação do ordenamento territorial por fase, passa-se a demonstrar que padrões prevaleceram dentro do recorte temporal do estudo e quais coalizões predominaram em função das categoriais de leis produzidas.

O Gráfico 6 mostra a evolução geral das leis mais e menos restritivas no período estudado.

0 50 100 150 200 250 300 350 400 450 1991-1994 Roriz (PMDB) 1995-1998 Cristovam (PT) 1999-2002 Roriz (PMDB) 2003-2006 Roriz (PMDB) 2007-2009 Arruda (DEM)

Quantitativo total de leis mais restritivas

Quantitativo total de leis menos restritivas

Nota: para valores absolutos, ver Apêndice F.

Gráfico 6 – Quantitativo total de leis mais e menos restritivas relacionadas ao uso, parcelamento e ocupação do solo no DF

Fonte: elaboração do autor.

Os dados apontam para a inegável prevalência das leis menos restritivas na agenda das reformas institucionais em todo período estudado, refletindo o predomínio de coalizões de defesa que se aglutinaram em defesa pró-leis menos restritivas. Esse quadro é fruto essencialmente das imposições das Coalizões Desenvolvimentista e Patrimonialista, mas tem contribuições também da Coalizão Pró-Moradia Popular.

As entrevistas concedidas para esta pesquisa evidenciam que muitas das leis (de caráter menos restritivo) foram criadas para atender pedidos particulares e escusos, envolvendo interesses corporativos com troca de benefícios financeiro, material ou político. Entre os maiores solicitantes desse tipo de norma, foram apontados os grandes empresários, construtores civis e comerciantes.

As mudanças institucionais impostas, em sua maior parte, representaram derrotas das Coalizões Ambientalistas e Modernista. Não raramente, representaram perdas de inúmeras áreas verdes, bem como a regularização fundiária em áreas de interesse ambiental que nem sempre tinham características que dessem suporte a essa ocupação, como o Condomínio Porto Rico em Ceilândia e Itapoã no Paranoá, e a Cidade Estrutural. Portanto, no lugar das áreas

ambientalmente protegidas surgiram áreas residenciais com incontáveis edifícios residenciais e pontos comerciais.

Além disso, alterações feitas nas normas de gabarito e edificações permitiram que os índices de aproveitamento do solo e a taxa máxima de ocupação aumentassem, com a verticalização excessiva de cidades, como é o exemplo do Guará.

Em relação à categoria de leis mais restritivas, o Gráfico 6 mostra que ela representa menos de 15% do universo de leis catalogadas. Isso reflete a pouca ressonância das ideias em defesa do ambiente e do tombamento dentro do Executivo e do Legislativo locais ao longo do período estudado.

Porém, apesar de estarem em número reduzido, as leis dessa categoria são de extrema importância, por representarem interesses de caráter difuso. Ao contrário da categoria anterior, onde muitas vezes as leis atendem interesses particulares, aqui a criação de cada lei esteve diretamente relacionada com os interesses comunitários. Porém, cabe lembrar aqui que determinadas flexibilizações nas normas urbanísticas e ambientais são interessantes do ponto de vista da comunidade, a exemplo da regularização de uma favela. Essas regularizações necessitam ocorrer, mas devem estar pautadas pela atenção, também, com a questão ambiental. A análise da viabilidade dos projetos de regularização fundiária deve ser feita caso a caso, ponderando-se aspectos sociais e ambientais, como previsto na Lei Federal nº 11.977/2009, já citada anteriormente.

Em parte das leis analisadas nesta pesquisa, ficou evidenciada a preocupação com o crescimento desordenado que a cidade vem sofrendo. Fruto da pressão dos ambientalistas, por exemplo, foi transformada a Área de Proteção Ambiental de Contagem em Reserva Biológica. Com a nova classificação, a região que antes permitia presença humana ganhou uma proteção ambientalmente mais rígida. Portanto, existem alterações que ensejaram leis mais restritivas, mas os exemplos são escassos se comparados com os tipos menos restritivos.

Nota-se, também, a grande profusão de leis sobre o ordenamento territorial no governo Roriz, devido ao fato de a Lei Orgânica do DF proibir revisão do PDOT antes de doze anos e o Estatuto da Cidade vedar revisões antes de dez anos. Deparando-se com essa situação e enxergando as brechas para mudanças no ordenamento territorial via leis complementares, desde que em tese atendidos os preceitos legais de interesse público comprovado e motivo

excepcional, tanto o Executivo quanto os parlamentares distritais intensificaram as alterações na legislação, sob a influência das Coalizões Desenvolvimentista e Patrimonialista.

A análise realizada neste trabalho evidencia ainda que, no DF, a maioria dos governos que patrocinaram as reformas institucionais não visaram modernização social e política e, consequentemente, um planejamento urbano eficiente que conseguisse ordenar o crescimento da cidade com observância de parâmetros técnicos de cidades planejadas, em detrimento das instituições tradicionais e clientelistas. Portanto, a situação da cidade é extremamente problemática, em decorrência de um planejamento mal realizado, onde os interesses econômicos, especialmente os de natureza imobiliária, especulativa e clientelista ditaram a maior parte das regras.

Até agosto de 2012, o DF possuía o metro quadrado mais caro de Brasil. Dados da Fipe/Zap (2012), primeiro indicador que acompanha os preços de venda e locação de imóveis em sete capitais brasileiras: Belo Horizonte, Fortaleza, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo e o Distrito Federal. Para a construção do índice a Fipe considera apenas os anúncios de apartamentos e leva em conta a localização (bairro), o número de dormitórios e a área útil (FIPE, 2011).

Assim, os resultados expostos pelo índice Fipe Zap reforçam o entendimento de que as reformas institucionais empreendidas vão na direção de tornar as terras públicas e privadas no DF reservas de alto valor e fontes proeminentes de especulação imobiliária, reforçando-se a segregação socioespacial.

Segue abaixo a Tabela 1, com o preço do metro quadrado por cidade analisada pelo Fipe/Zap. UF Valores em Agosto/2012 Distrito Federal R$ 8.254 Rio de Janeiro R$ 7.991 Média Nacional R$ 6.594 São Paulo R$ 6.448 Recife R$ 5.288 Belo Horizonte R$ 4.872 Fortaleza R$ 4.518 Salvador R$ 3.618

Tabela 1 – Preço do metro quadrado por cidade (Ago./2012)

Esse processo mercantil na construção da cidade, ressaltado por Bassul (1998) e Viana (2008), explica a modelagem de arranjos que apenas perpetuaram ou reforçaram a tendência de segregação social, desde a expulsão dos operários para a realização do espaço como mercadoria sob a necessária preservação do Plano Piloto, até as mudanças de destinação de áreas patrocinadas por interesses privados não raramente ilegítimos e em detrimento do interesse coletivo, provocando perdas sociais e ambientais para toda a comunidade (HONORATO, 2008; DAMIANI, 2003; BASSUL, 1998, GOUVÊA, 1988).