• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 3 – METODOLOGIA DA PESQUISA

3.2 Análise do contexto da prática

A segunda dimensão da pesquisa é um estudo de casos com aspectos comparativos (Small N), de natureza qualitativa, complementado por dados quantitativos, desenvolvido em escolas que representam tipos distintos de instituições de Ensino Fundamental que recebem estudantes surdos no nosso país:

 Escola de Educação Regular Inclusiva, com alunos surdos estudando junto com ouvintes nas mesmas salas de aula;

 Escola que, em sua Sala de Recursos Multifuncional, atua como polo bilíngue de uma determinada região, recebendo, no contraturno, alunos surdos

58 Em português: Entretanto, há claras exceções a respeito, tais como artigos em jornal e relatórios de

pesquisas organizacionais (um relatório do Banco Mundial, por exemplo) que contêm análise, mas também podem se tornar objeto de análise de texto ao se estudar o sentido que eles dão ao contexto político do qual se originam. [Tradução da autora, JM]

matriculados nessa instituição, nas suas turmas inclusivas, ou em outras escolas regulares inclusivas que não oferecem esse atendimento especializado;

 Escola de Educação Especial somente para surdos;

 Escola de Educação Regular Inclusiva, com turmas de 1º ao 5º ano exclusivamente compostas de alunos surdos, outras, no mesmo nível, apenas com crianças ouvintes, e outras ainda, do 6º ao 9º ano, onde surdos e ouvintes estudam juntos.

Como em cada uma dessas situações a implementação das políticas educacionais apresenta características específicas e que parecem trazer resultados distintos, optou-se pelo estudo de casos acatando-se as recomendações de Yin (1984, p. 39) de que...

...você usaria o método de estudo de caso quando desejasse entender um fenômeno da vida real em profundidade, mas esse entendimento englobasse importantes condições contextuais – porque eram altamente pertinentes ao seu fenômeno de estudo.

Além disso, entende-se ser esta a forma mais adequada de se examinar o tema em questão, uma vez que, como destaca esse autor, “a força exclusiva do estudo de caso é sua capacidade de lidar com uma ampla variedade de evidências – documentos, artefatos, entrevistas e observações” (Id., 1984, p. 32), o que fica totalmente de acordo com a concepção deste trabalho.

Ainda segundo esse autor, “o estudo de caso é preferido no exame dos eventos contemporâneos quando os comportamentos relevantes não podem ser manipulados” (Id. Ibid., p.32), o que também é a realidade desta investigação.

Na seleção dos casos estudados, certos cuidados foram tomados, seguindo-se as recomendações de Ball (1994) e de Hopkin (2010). Assim sendo, ainda que, por motivos logísticos, a pesquisa tenha ficado limitada a três cidades do Estado do Rio de Janeiro, procurou-se escolher escolas cujas práticas educacionais retratassem os principais tipos distintos, e muitas vezes contrastantes, de instituição pública que atende a alunos surdos brasileiros nas redes públicas de ensino, de forma que diferentes aspectos da realidade pudessem vir a ser apresentados e os resultados encontrados não

corressem o risco de parecer – ou mesmo de ser – resultantes de algum viés tendencioso (biased) e apriorístico da pesquisadora.

Neste sentido, ressalta-se que, apesar da imensa importância do INES no cenário educacional brasileiro, seu Colégio de Aplicação não foi escolhido como uma das unidades a ser pesquisada justamente por ser um caso único e diferenciado no país.

O segundo cuidado foi o de se evitar fazer generalizações a partir dos casos estudados. Embora exemplificando, como dito, os modelos típicos de escolas que atendem à população estudantil surda, cada caso foi considerado no seu contexto e visto como uma complexa combinação de múltiplas configurações ou variáveis específicas daquela situação.

Por outro lado, ainda seguindo-se as indicações dos dois autores, além das orientações de Yin, para evitar que o estudo ficasse enfraquecido pelo fato de abordar situações muito particulares, o que poderia impedir uma visão científica dos problemas tratados, procurou-se, a todo o tempo, referenciar cada situação e cada observação a estudos teóricos anteriormente desenvolvidos e consagrados na área, de forma a embasar e ampliar sua significância e pertinência. Como declara Yin (1984, p.39), “a meta [dos estudos de caso] será expandir e generalizar teorias (generalização analítica) e não enumerar frequências (generalização estatística)”.

Quanto à decisão de fazer uso de comparação, faz-se referência a Collier (1993, p. 105), que afirma:

Comparison is a fundamental tool of analysis. It sharpens our power of description, and plays a central role in concept-formation by bringing into focus suggestive similarities and contrasts among cases.59

Neste caso específico, acredita-se que o uso de comparação tenha sido apropriado e particularmente proveitoso uma vez que a educação de surdos vem se desenvolvendo em um cenário repleto de polêmicas abarcando pelo menos duas posições marcadamente antagônicas.

59 Em português:Comparação é uma ferramenta de análise fundamental. Ela aguça nosso poder de

descrição e desempenha um papel central na formação de conceitos, colocando em foco sugestivos contrastes e similaridades entre os casos. [Tradução da autora, JM]

Por um lado, encontra-se a política do Ministério da Educação, que, embasada na Constituição Federal de 1988 e através da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, de 2008, recomenda que todos os alunos, independentemente de suas necessidades educacionais especiais, sejam preferencialmente incluídos nas escolas regulares com apoio da Educação Especial e da garantia de oferta do AEE.

Por outro prisma, situa-se a posição de especialistas nacionais e internacionais (surdos e ouvintes), notadamente nas áreas da Linguística, da Psicologia e da Educação, acompanhados por um número expressivo de membros da comunidade que argumentam que o modelo de ensino bilíngue em escolas ou classes exclusivas, principalmente na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, tem se mostrado mais eficaz para garantir tanto o desenvolvimento linguístico, emocional, cognitivo e sócio- afetivo, quanto o aprendizado dos conteúdos escolares por parte das pessoas com surdez.

Embora não tenha sido pretensão da autora desenvolver extensivamente a comparação entre as duas propostas, entende-se que esta investigação pode ser caracterizada como um estudo com aspectos comparativos no sentido de que parte da proposta foi de se tentar desvelar as possibilidades, os impasses, as dificuldades, as vantagens e desvantagens na interpretação das determinações e recomendações legais por parte dos agentes educacionais que defendem e trabalham dentro de cada uma das duas posições acima expostas.