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CAPÍTULO I – APRESENTAÇÃO

4.8 OS DADOS COLETADOS

4.8.5 Análise do Diário de Campo

Já foi mencionado nesta dissertação o quanto as atividades investigativas podem ser um instrumento importante para o desenvolvimento dos conceitos científicos, uma vez que, proporciona liberdade para uma ação individual ou social desses alunos na tentativa de solucionar uma situação problema aberta, permitindo também o desenvolvimento de outras dimensões de conteúdos, como procedimentos e atitudes (AZEVEDO, 2004). As atividades investigativas procuram envolver os alunos de forma cognitiva e afetiva, sem proporcionar respostas prontas e prévias, com uma condução mais flexível mediada pelo professor (CACHAPUZ; PRAIA; JORGE, 2002). Ao longo de uma investigação é possível notar diversas interações que vão ocorrendo simultaneamente ao longo do seu curso, como: interações entre pessoas e conhecimentos prévios; interações entre pessoas e objetos, todas essas interações passam ser importantes trazendo condições para o desenvolvimento do trabalho (SASSERON, 2013).

Buscar-se-á por evidências que possam sinalizar o desenvolvimento das aprendizagens nas dimensões procedimental e atitudinal, realizando o confronto das informações sobre a qualidade dos planos (BORGES; RODRIGUES, 2004) com os discursos ao longo das investigações realizados pelos alunos, na tentativa de se estabelecer alguma relação que possa indicar os efeitos de uma atividade, construída numa perspectiva sociocultural na elaboração desses planos, e consequente solução dos problemas. Utilizar-se-á a partir do diário de campo os

momentos de interações discursivas relatadas nesse que contemplaram a resolução das três situações problemas, ou seja, tomar-se-á os dados coletados em áudio e vídeo que trazem os discursos entre alunos e professor, e entre eles alunos ao longo da investigação e montagem dos planos para analisarmos como se desenvolveu o processo de compreensão científica dos procedimentos e atitudes.

De acordo com Lima, Aguiar Jr e De Caro (2011, p. 869) “A compreensão é, assim, um trabalho verbal de construção de sentidos, da apropriação do conceito. Emerge nas interações interlocutivas, no confronto entre falantes, no ato mesmo da linguagem”. Aposta-se na interação discursiva ou nos debates entre os pares em sala de aula para organizar os conhecimentos científicos (SASSERON, 2013). Baseando-se em autores como Driver et. al., (1999), que trazem a construção do conhecimento científico como uma dimensão sociocultural, também discorrer-se-á a partir da apreciação dos trabalhos de Mortimer e Scott (2002), quando aproximam as interações nas aulas de ciências como formas de desenvolver significados através dos modos de expressão verbal e não-verbal.

Mortimer e Scott (2002) nos trazem o conceito de abordagem comunicativa importante para a análise da condução do processo de construção dos conceitos físicos, procedimentos e atitudes. O foco da abordagem comunicativa está nos diferentes padrões de interação no âmbito da sala de aula, podendo assim ser caracterizada em termos de duas dimensões: discurso dialógico ou de autoridade; discurso interativo ou não interativo. Nesta pesquisa utilizar-se-á também a classificação trazida por Pereira, Ostermann e Cavalcanti (2009), que inspirados em Mortimer e Scott (2002) nos trazem os seguintes aspectos da abordagem comunicativa no nível dos discursos entre os alunos: 1) o uso da fala como mediadora da ação dos alunos; 2) o nível de colaboração dos alunos com parceiros mais capazes; 3) o uso da língua como expressão das relações e lutas sociais; 4) a abordagem comunicativa dos enunciados.

Os dados oriundos do diário de campo foram tratados na forma de episódios38, tornando a análise pontual, uma vez que, cada sequência de interação que o compõem por menor que seja trouxe um enunciado que caracteriza o gênero de discurso da sala de aula (MONTIMER et. al., 2007). Na sequência de ensino investigativo contou com três situações problemas, tipo laboratório aberto. O diário de campo foi o instrumento utilizado para analisarmos a aprendizagem dos conteúdos procedimental e atitudinal ao longo das investigações.

O ensino de Física para esses jovens e adultos, esbarra ainda na transmissão dos conteúdos que compõem as disciplinas. Ensina-se física para eles de forma tradicional, atendo-se a explicação de teorias, leis, com forte orientação para os conteúdos conceituais. A atividade investigativa é um instrumento capaz de promover o aprendizado conceitual, mas também permitir aos alunos da EJA atingirem o domínio das dimensões dos conteúdos procedimental e atitudinal. Para Azevedo (2004), aprender procedimentos e atitudes dentro do processo de aprendizagem por investigação é tão importante quanto aprender conceitos e/ou conteúdos.

4.8.6 Análise dos Conteúdos/Aprendizagens Procedimentais

Para ser mais específicos na caracterização do que se trata um conteúdo procedimental recorrer-se-á a Zabala (1998), que incluem do ponto de vista operacional para sua execução, regras, técnicas, métodos, destrezas e estratégias, para resolução de um problema, vislumbrando ações ordenadas e com um fim, dirigidas para a realização do objetivo. São conteúdos procedimentais: ler, desenhar, observar, calcular, classificar, traduzir, recortar, saltar, inferir, espetar, etc. Os métodos procedimentais não podem ser confundidos com a metodologia empregada no ensino, como diz Silva Junior (2015, p. 35):

38“[...] um conjunto coerente de ações e significados produzidos pelos participantes em interação, que tem um início e fim claros e que pode ser facilmente discernido dos episódios precedente e subsequente” (MORTIMER et al, 2007, p. 6).

Os procedimentos não se confundem com a metodologia empregada, enquanto esta se relaciona com um conjunto de etapas ou regras a serem seguidas para realização de uma atividade, aqueles estão relacionados com o desenvolvimento das capacidades do aluno de fazer coisas que vão além de uma atividade proposta.

O que é trazido, na literatura de Pozo e Gomez-Crespo (2009), é a dificuldade em se avaliar o conhecimento procedimental, pois, se trata de um aprendizado cujo domínio seja dado de maneira gradual, devido os diferentes níveis de complexidade que requerem outras atividades. Buscou-se na unidade de ensino unir os mais variados conteúdos procedimentais, a fim de entregarmos a esses alunos da EJA, uma sequência de atividades que pudesse ser mais justa as suas realidades, ou seja, focar na construção conceitual dos conteúdos, não abrindo mão, da participação coletiva na construção desses saberes.

4.8.7 Análise dos Conteúdos/Aprendizagens Atitudinais

As atitudes assim como os procedimentos sempre tiveram pouco destaque dentro do currículo de ciências. Associado a esse fato, afirmam Pozo e Gomez-Crespo (2009), está o tratamento dado ao ensino de física, que se dedicou em treinar alunos a partir de algoritmos e técnicas de quantificação, focando-se na explicação do que se deve fazer, e não proporcionar uma ajuda para que aprendam a fazê-lo. Coll et.

al., (2000), Pozo e Gomez-Crespo (2009) e Zabala (1998), caracterizam os

conteúdos atitudinais como uma articulação conjunta de valores, de atitudes e de normas.

Valores: Constituem-se no marco que proporciona sentido, orientando os

juízos e as ações que permitem a tomada de decisões. Condicionam a maneira pela qual as pessoas percebem e representam o mundo.

Atitudes: São predisposições relativas para a atuação em relação a uma

situação, fato, pessoa ou conjunto de pessoas ou ideias. Tem relação como cada pessoa realiza sua conduta de acordo com valores determinados.

Normas: São prescrições para atuação de uma determinada maneira em

situações específicas, regulando o comportamento individual e coletivo tornando as condutas previsíveis.

Ao levar para a sala de aula atividades que ajudam na avaliação do desenvolvimento de atitudes, fica a posteriori a preocupação em como perceber e classificar focos dessa dimensão de conteúdo que se evidenciam ao longo da prática investigativa. Pozo e Gomez-Crespo (2009), nos trazem essa caracterização de aprendizado em três vias, ou tipos de atitudes. De acordo com o quadro abaixo, essas atitudes se classificam em: Atitudes com respeito à ciência, Atitudes com respeito à aprendizagem da ciência e Atitudes com respeito às implicações sociais da ciência.

Quadro 4: Classificação das Atitudes

Atitudes que devem ser promovidas entre os alunos com o ensino de ciências Atitudes com respeito à ciência (atitudes científicas)

Interesse por aprendê-la Motivação intrínseca Motivação extrínseca

Atitudes específicas (conteúdos) Gosto pelo rigor e precisão no trabalho Respeito pelo meio ambiente Sensibilidade pela ordem e limpeza do material de trabalho Atitude crítica frente aos problemas apresentados pelo desenvolvimento da ciência

Atitudes com respeito à aprendizagem da ciência

Relacionadas com o aprendizado Enfoque superficial (repetitivo)

Enfoque profundo (busca de significados)

Relacionadas com o autoconceito Conduta Intelectual Social

Relacionadas com os colegas Cooperativa em oposição à competitiva Solidariedade em oposição ao individualismo

Relacionadas com o professor Modelo de atitude

Atitudes com respeito às implicações sociais da ciência

Na sala de aula e fora dela Valorização crítica dos usos e abusos da ciência

Desenvolvimento de hábitos de conduta e consumo

Reconhecimento entre desenvolvimento da ciência e mudança social

Reconhecimento e aceitação de diferentes pautas de conduta nos seres humanos Fonte: Pozo e Gomez-Crespo (2009, p.38).

A proposta dessa pesquisa nasceu da preocupação com a falta de motivação apresentada por alunos da EJA nas aulas de física. Onde o autor do estudo sentiu a necessidade de promover mudanças na maneira de abordar os conteúdos, logo, agregar elementos pedagógicos na pesquisa, permitindo o diálogo e a troca de experiências de vida entre esses alunos, unindo todos os envolvidos dentro do processo de aprendizagem. Pensando assim, define-se por avaliar a presença da

dimensão atitudinal inferida a partir da ação direta desses alunos, com respeito a ciências (atitudes científicas) e à aprendizagem da ciência.