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A amostra da pesquisa

3.8 Análise dos dados coletados (3ª Etapa)

A análise do material coletado tem três finalidades: (a) A “heurística”, como descobertas da pesquisa. (b) A “administração de provas”, adquirida entre “os achados, as hipóteses ou pressupostos”. E (c), a ultrapassagem do nível espontâneo das mensagens (MINAYO, 2006, p. 300).

Quanto às técnicas utilizadas para análise, “poderão existir tantas quantas forem criadas pelos pesquisadores na busca de lapidar os dados para garantir a fase de uma profícua discussão”

(TURATO, 2003, p. 437). O pesquisador então pode ser entendido como um “pesquisador-como-um- bricoleur” (Ibidem, p. 259), termo ressignificado por Lévi-Strauss, ao lançar mão de vários instrumentos e recursos para compreender os fenômenos que estudava. Nesse sentido, o caminho percorrido na análise dos dados evidenciará sempre certa originalidade. Ou, segundo Orlandi (2003, p. 27), o dispositivo analítico é construído pelo pesquisador, “optando pela mobilização desses ou aqueles conceitos, esse ou aquele procedimento, com os quais se compromete na resolução de sua questão”.

Nesta pesquisa seguimos as seguintes etapas para organizarmos o material coletado nas entrevistas. A primeira aproximação com o texto foi através de leituras flutuantes, a partir da imersão no conjunto de informações coletadas e digitadas com a finalidade de conhecer o texto, apreendendo algumas impressões dele, de forma que se desvelassem regularidades e rupturas discursivas suficientes para responder ao objetivo da pesquisa.

Construímos um esquema de análise (QUADRO 2 - APÊNDICE C), entendendo-o como um instrumento de visualização que nos subsidiou no processo de compreensão dos enunciados dos discursos. O esquema se subdivide em duas partes: a primeira é composta pelo conceito que os profissionais possuem sobre violência sexual contra crianças e adolescentes (o que é, como explicam e descrevem). A segunda parte se refere às práticas dos profissionais (o que fazem, como fazem e o que deveriam fazer).

Para preservar a identidade dos profissionais optamos pelo sistema em que a primeira letra designa a profissão, “M” para médico, “E” para enfermeiro e para a coordenadora, e “A” para agente comunitário de saúde) e, um número para cada letra, distinguindo as falas dos profissionais (M1;M2;M3;E1;E2;E3;E4A1;A2;A3)..

Voltamos a ler os dados colocados no esquema de análise, de forma que embasados em Foucault (2010), buscamos “analisar as regras do discurso que tornam possível a ocorrência de certos enunciados, em determinado tempo e localização institucional” (BEATO; STRANLEN; PASSOS, 2011, p. 531). Lembrando que para Foucault (2010) os enunciados são “como um jogo de posições possíveis para um sujeito [..] com uma materialidade repetível” (FOUCAULT, 2010, p. 123). Eles são produzidos “por um sujeito, em um lugar institucional, determinado por regras sócio-históricas, que definem e possibilitam que ele seja um enunciado” (GREGOLIN, 2004, p. 28). As práticas discursivas dos profissionais sobre a conceituação e encaminhamento dado aos casos de violência sexual contra crianças e adolescentes foram definidas a partir de “um recorte feito pelos pesquisadores, [na] regularidade encontrada em um número de enunciados que estão submetidos à mesma condição de existência” (BEATO; STRANLEN; PASSOS, 2011, p. 531). Quatro foram as dimensões que se destacaram na análise realizada, sendo que os enunciados correspondentes aparecerão nas discussões feitas nessas dimensões: 1) A primazia do modelo biotecnológico; 2) Práticas extradiscursivas institucionais; 3) Conteúdo moral das concepções e, 4) Implicações da pesquisadora, que passaremos a explicitar na discussão dos resultados.

4 Capítulo - Resultados e Discussão

Este estudo partiu de duas hipóteses: uma delas é que não há, entre os profissionais que formam as equipes da ESF, uma mesma compreensão da questão da violência sexual praticada contra crianças e adolescentes (suas formas, causas e consequências), levando a uma falta de sincronia frente à demanda de intervenção, seja na identificação, no acompanhamento ou na condução destes casos. Acrescido a isso, a não existência de um serviço especializado de referência que dê suporte às decisões e ao acompanhamento dos casos de violência sexual contra crianças e adolescentes. Ambas as situações colaborariam para a subnotificação de tais casos. Por isso, nosso objetivo foi o de investigar as práticas discursivas dos diferentes profissionais, inseridos nas equipes da Estratégia Saúde da Família da cidade de Montes Claros/MG, sobre a identificação e a condução de casos de crianças e adolescentes em situação de violência sexual.

Para atingir tal objetivo trabalhamos numa perspectiva arqueológica foucaultiana (FOUCAULT, 2010) buscando entender o aparecimento e a transformação de determinados saberes. Isso se dá através da reconstituição de “um campo histórico, jogando com diferentes dimensões (filosóficas, econômicas, cientificas, políticas, estéticas) a fim de se obter as condições de emergência dos discursos (e não sua validação) em uma determinada época” (EIZIRIK, 2006). Nesse sentido, buscamos analisar os enunciados que aparecem nos atos de fala dos profissionais da ESF, que se relacionam com as práticas discursivas sobre violência sexual contra crianças e adolescentes.

Iniciaremos a discussão dos resultados através das implicações do campo e da amostra na pesquisa.

4.1 O perfil dos profissionais pesquisados da Estratégia Saúde da Família

Com a implantação do Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil, tem havido um investimento na atenção básica em saúde que se estrutura através da Estratégia Saúde da Família (ESF), outrora chamado de Programa Saúde da Familia (PSF). A ESF é caracterizada como uma estratégia por possibilitar a integração e promover ações em um determinado território para conseguir resolutividade nos problemas identificados com relação à saúde. Por ser um serviço da atenção primária em saúde, a ESF é considerada a porta de entrada do sistema de saúde para garantir a maior parte das necessidades de saúde e filtrar o acesso a outros níveis. Nesse sentido a Estratégia Saúde da Família deve ser considerada a porta de entrada para agravos em saúde, incluindo os casos de violência em suas diversas formas (física, sexual, psicológica), e aqui salientamos a violência sexual contra crianças e adolescentes. Por esse motivo, nossa investigação teve como universo da pesquisa a Atenção Primária em Saúde (APS) do município de Montes Claros, MG.

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