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Eisenhardt (1989, p.539) menciona que a análise de dados pode ser vislumbrada como o âmago da pesquisa por meio do estudo de caso, mas ressalta que essa fase corresponde “à parte do processo mais difícil e menos codificada”. De acordo com o Quadro 12, a autora identifica dois aspectos essenciais nessa fase: uma análise específica dentro-do- caso, em que se investigam em profundidade as singularidades e as peculiaridades de cada caso; e uma análise cruzada entre os casos, de modo a buscar elementos comuns aos casos e confrontá-los e/ou compará-los com a intenção de “extrair padrões únicos de casa caso” e, em seguida, “generalizar padrões através dos casos” (EISENHARDT, 1989, p.540).

Particularmente em relação a pares de casos, a autora descreve como uma tática listar semelhanças e diferenças entre cada par, de modo que:

essa tática força os pesquisadores a buscar por similaridades e distinções sutis entre os casos. (...) a busca por similaridade em um par aparentemente distinto pode conduzir a entendimento mais sofisticado. O resultado dessas comparações forçadas podem ser novas categorias e conceitos que os investigadores não anteciparam (EISENHARDT, 1989, p.540-541).

Quanto à análise dos dados coletados dentro-do-caso, optou-se pela técnica de análise de conteúdo inspirada na abordagem de Bardin (2004), empregada de forma construtiva sem a preocupação de quantificar e apresentar frequências nas categorias, mas com objetivo principal de aprofundar a análise do processo de inovação. Bardin (2004, p.33) considera a análise de conteúdo como um “conjunto de técnicas de análise das comunicações, que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens”. Neste

estudo, tal análise envolveu o exame dos dados obtidos por meio de pesquisa documental e das entrevistas, ou seja, opiniões e crenças verbalizadas pelos entrevistados, bem como anotações efetuadas pelo entrevistador ao longo das entrevistas.

A análise de conteúdo, de acordo com Franco (2003, p.10), cada vez mais tem sido “utilizada para produzir inferências acerca de dados verbais e/ou simbólicos, (...) obtidos a partir de perguntas e observações de interesse de um determinado pesquisador”, como ocorreu nesta investigação. Por sua vez, ao salientar que a análise de conteúdo é essencialmente temática, Bardin (2004, p.89-95) menciona as diferentes fases em que a análise de conteúdo se organiza, as quais também foram levadas em consideração no âmbito deste estudo, em torno de três pólos cronológicos:

1) a pré-análise – é a fase de organização da análise, que envolve a escolha de objetos a serem submetidos à análise, a formulação de hipóteses e de objetivos, e a elaboração de indicadores que fundamentem a interpretação final.

2) a exploração do material – é à fase da análise propriamente dita, que corresponde à administração sistemática das decisões tomadas, por meio de operações de codificação ou enumeração, em função de regras previamente formuladas.

3) o tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação – fase de validação dos resultados, em que os dados brutos são tratados de maneira a serem significativos e válidos, a partir dos quais se pode propor conclusões e inferências, e adiantar interpretações a propósito dos objetivos previstos ou que digam respeito a outras descobertas inesperadas.

O material coletado no decorrer da investigação configurou-se como um volumoso conjunto de dados em relação a cada caso, composto por: diversos tipos de documentos, alguns de extensão considerável, como regimentos, estatutos e projetos político- pedagógicos, e outros que apresentavam dados financeiros, contábeis e/ou estatísticos, tais como relatórios e demonstrativos; cerca de 20 páginas de anotações realizadas em campo; 102 páginas de transcrições de entrevistas no Caso UAb; e 123 páginas de transcrições de entrevistas no Caso UAB/UnB.

A esse respeito, cabe salientar o que afirma Zanelli (2002, p.86):

(...) existem muitas maneiras de organizar o conjunto volumoso de dados em pesquisa qualitativa, talvez tantos quantos pesquisadores existem. Contudo, é muito frequente um padrão geral no qual, em tentativas que se repetem diversas vezes, blocos ou trechos dos achados vão sendo associados a palavras ou números que representam as principais categorias. Logo após, em um processo de afunilamento, busca-se a essência dos conteúdos, que podem responder ao problema ou objetivos propostos inicialmente na pesquisa.

A exploração desse material envolveu, em cada caso, exames e análises exaustivas dos dados coletados – documentos internos, anotações realizadas ao longo das entrevistas, e verbalizações referentes à transcrição das entrevistas –, de modo a caracterizar o sistema (origem, evolução histórica, amplitude, estrutura, atores relevantes, formas de gestão) e a identificar aspectos mais relevantes em termos de dimensões internas e externas à inovação, e de sua relação com a efetividade percebida da inovação. Desse modo, por meio da análise conjunta dos dados coletados, foi possível identificar as principais dimensões do processo de inovação em cada caso, e analisar de que modo cada dimensão pertinente se associava à efetividade percebida em relação à inovação investigada.

Além da análise de percepções acerca de dimensões e efetividade, buscou-se aprofundar a compreensão acerca do processo de inovação, em cada caso, por meio das seguintes ações: caracterização, na perspectiva do pesquisador, de fatores situacionais e contingenciais acerca do processo de inovação; identificação da presença (ou não) de observações comuns aos processos de inovação, tal como hipotetizados por Van de Ven (1986) e colaboradores, e mencionados na descrição da opção teórica; elaboração de esquema ilustrativo do processo de inovação em cada caso investigado, composto por fases e eventos identificados no decorrer do processo.

Após a organização dos dados e o estabelecimento de unidades de análise em cada caso, o que envolveu leituras sucessivas do material coletado, buscou-se a identificação de temas relevantes em termos de caracterização do processo de inovação na gestão de cada sistema de EaD pesquisado, e analisá-los de modo cruzado entre os casos, o que envolveu esforços para a construção de categorias de dimensões do processo da inovação, bem como o uso da triangulação no decorrer da análise dos dados.

Triangulação corresponde, de acordo com Gondim et al. (2005, p.58), a um termo náutico e militar que “faz alusão ao uso de múltiplos pontos de referência para localizar com precisão exata a posição de um objetivo”. Zanelli (2002, p.86) menciona a triangulação como um procedimento voltado à análise das informações obtidas, de modo a “confrontar os dados obtidos de proveniências diversas para confirmações entre si, ou não”. Particularmente em relação à triangulação dos dados referentes às dimensões internas e externas à inovação e a sua associação com a efetividade da inovação, pretendeu-se verificar o tipo de influência esperado entre esses elementos.

Golafshani (2003), por sua vez, caracteriza a triangulação como uma estratégia para aprimorar a validade e a confiabilidade da pesquisa ou da avaliação dos resultados, na

medida em que fortalece o estudo combinando métodos, o que coaduna com sua compreensão no âmbito deste estudo.

E, a respeito dos tipos de triangulação (MEIJER; VERLOOP; BEIJAARD, 2002; FARMER et al., 2006), cabe ressaltar que foram utilizadas, nesta investigação, triangulação por método e por investigador, compreendidas da seguinte maneira:

- por método: dados de entrevistas e dados de pesquisa documental foram cruzados em cada caso, de modo a identificar aspectos mais pertinentes e ampliar o entendimento de sua influência no processo. Por meio da triangulação, pôde-se verificar se o conteúdo de uma verbalização tinha correspondência com uma fonte documental, ou não.

- por investigador: participação de investigadores, de modo a apontar, por meio do exame do material coletado com as entrevistas, achados que fossem identificados por cada um, a fim de checar se coincidiam (ou não) com os do pesquisador, e que possibilitassem a construção de categorias de dimensões em cada caso.

Especificamente em relação à fase de triangulação dos dados por investigador, cabe salientar que foram convidados a participar os integrantes de um grupo de pesquisa vinculado ao CNPq, que investiga os temas da criatividade e da inovação nas organizações. Como argumenta Eisenhardt (1989, p.538), a participação de múltiplos investigadores é recomendada no decorrer da investigação, de modo a “ampliar o potencial criativo do estudo” e, além disso, “a convergência das observações de múltiplos investigadores aumenta a confiabilidade dos resultados”.

Três especialistas na área de gestão e de inovação, assim, aceitaram o convite, e participaram de uma reunião preliminar na qual foi explanado, por parte da orientadora do pesquisador, acerca do uso da estratégia de triangulação. Em seguida, cada um dos investigadores teve acesso a uma breve síntese de cada caso analisado. Por conseguinte, foram fornecidas aos investigadores as transcrições das entrevistas, agrupadas por caso. Por meio de análise de conteúdo, cada investigador buscou identificar temas relevantes associados à inovação, em cada sistema de EaD. Ao longo de todo o processo de triangulação, a orientadora do pesquisador participou no sentido de fornecer orientações a respeito do emprego dessa estratégia de pesquisa.

Os conceitos-chave da investigação foram apresentados aos investigadores logo na primeira reunião. Por meio de exames sucessivos do material e de diversos encontros para

discussão dos achados, cada investigador procurou detectar temas mais relevantes mencionados pelos entrevistados. Posteriormente, os resultados obtidos por cada investigador foram confrontados, ampliados, analisados conjuntamente, refinados e aprimorados, resultando na identificação de 32 temas presentes no Caso UAb, e de 25 presentes mencionados no Caso UnB. Havia temas comuns a ambos os casos, os quais puderam ser consolidados por meio da análise cruzada. Também havia temas que inicialmente foram identificados como distintos, mas que, por meio do refinamento das categorias, foram agrupados com outros temas.

A categorização dos resultados contribuiu para os resultados da pesquisa, por meio do ordenamento dos achados e a identificação dos elementos centrais que consubstanciam a análise. A respeito da relevância da construção de categorias em pesquisa qualitativa, Zanelli (2002, p.84) afirma que:

organizar e interpretar dados qualitativos é um processo de análise sistemática, em busca de uma descrição coerente. A organização em categorias facilita e permite atribuir significados, ou interpretar a realidade pesquisada. A análise (organizar e interpretar) é também um processo recorrente de aprendizagem para chegar à compreensão do fenômeno.

A partir da detecção de temas por meio da triangulação, balizados por análises dentro-do-caso e cruzada entre os casos, buscou-se construir categorias de dimensões internas e externas à inovação presentes em ambos os casos, conforme os propósitos da pesquisa, salientando as peculiaridades de cada contexto, de modo que as diferenças entre tais categorias de dimensões pudessem ser claramente perceptíveis.

Desse modo, as categorias de dimensões internas e externas do processo de inovação, e da efetividade percebida, foram identificadas no âmbito de cada sistema de EaD investigado, foram construídas por meio de análises repetidas e exaustivas a documentos, transcrições e anotações. Ao refinar as categorias entre si, foram utilizadas regras de exclusão mútua, homogeneidade, pertinência, objetividade, fidelidade e produtividade entre as categorias, conforme sugerido por Bardin (2004).

Adicionalmente, buscou-se desenvolver definições constitutivas e abrangentes para cada construto, as quais são caracterizadas por Pasquali (1998, p.208) como “conceitos (…) definidos em termos de outros conceitos; isto é, os conceitos, que são realidades abstratas, são definidos em termos de realidades abstratas”, relevantes porque impõem limitações sobre o que se deve explorar acerca daquele construto.

As categorias definidas inicialmente em relação às dimensões internas, externas e efetividade da inovação puderam ser refinadas e expandidas, iterativamente, submetidas a novos julgamentos quanto a sua abrangência e delimitação, e então interpretadas em relação ao tema investigado, com base nos objetivos propostos. Dessa forma, foram identificadas categorias de aspectos característicos em relação a dimensões que interferem no processo de inovação no âmbito de ambos os sistemas de EaD pesquisados.

Oportunamente, cabe salientar que, em certo momento, o pesquisador se deu conta de que os dados triangulados denotavam a emergência de quatro categorias de dimensões internas do processo de inovação que não haviam sido mencionadas pela opção teórica adotada, de modo que tais elementos, por meio de sua caracterização no âmbito do processo, poderiam ser hipotetizados de modo a representar uma das contribuições do estudo, na perspectiva de expansão do modelo teórico desenvolvido por Van de Ven (1986) e colaboradores.

Tal exame iterativo das evidências de cada construto, aliado à busca pela identificação de evidências para as inter-relações entre os construtos – os quais constam no sexto passo definido por Eisenhardt (1989) como atividades de pesquisa por meio do estudo de casos –, culminou na construção de 18 categorias de dimensões internas e de cinco categorias de dimensões externas ao processo de inovação, além da categoria de efetividade percebida da inovação, presentes em ambos os casos, salientando suas especificidades.

Desse modo, ao confrontar os resultados obtidos com a opção teórica adotada, remete-se ao sétimo passo indicado por Eisenhardt (1989), conforme o Quadro 12, de modo que as atividades referidas nesse passo envolveram a análise dos achados com: abordagens teóricas similares, de modo a denotar as correspondências entre as dimensões categorizadas e aspectos mencionados por abordagens acerca da inovação organizacional; e com abordagens teóricas conflitantes, considerando os achados em face de desenvolvimentos teóricos que excluem a inovação organizacional, tal como o Manual de Oslo, que enfoca a inovação tecnológica, e apenas em sua versão mais recente passou a incorporar a inovação organizacional em seu escopo de pesquisa.

Adicionalmente, buscou-se analisar a validade do desenho e dos achados da investigação, de modo a verificar precisão e credibilidade de seus resultados. A relevância da verificação da validade é ressaltada por Creswell (2007, p.200) no tocante à pesquisa qualitativa, apontando estratégias primárias que podem ser utilizadas nesse sentido, dentre as quais foram empregadas neste estudo:

- triangulação de diferentes fontes de informações de dados, examinando as evidências das fontes e usando-as para criar uma justificativa coesa para os temas;

- descrição rica e densa para transmitir os resultados, o que pode transportar os leitores para o ambiente e dar à discussão um elemento de experiências compartilhadas;

- tempo prolongado em campo, de modo que o pesquisador possa desenvolver um entendimento profundo do fenômeno que está sendo estudado;

- conferência de membros para determinar a precisão dos resultados qualitativos, levando o relatório final, ou as descrições específicas, ou os temas, de volta para os participantes, e verificando se esses participantes os consideram precisos.

Em suma, de modo a tornar mais robusta e rigorosa a análise dos dados e a validação dos resultados obtidos, foram adotados os seguintes procedimentos: exame e organização dos dados de forma a delimitar categorias relacionadas às percepções dos participantes acerca das dimensões do processo de inovação; triangulação dos resultados provenientes de diversas fontes de pesquisa, para confrontá-los e verificar sua coesão; participação de juízes nas etapas de triangulação e categorização, de modo a conferir à análise a perspectiva de outros especialistas, e buscar reduzir a influência de vieses do pesquisador.

Inicialmente, o pesquisador havia previsto realizar a apresentação de síntese dos resultados obtidos a um ou mais gestores participantes da pesquisa, conforme indicado por Creswell (2007), no sentido de identificar se considerariam tais resultados coesos e precisos. Contudo, devido a diversas mudanças em nível hierárquico e gerencial que ocorreram em ambos os casos investigados no decorrer da pesquisa, com alterações funcionais e até mesmo a saída de alguns gestores dos sistemas de EaD investigados, a aplicação dessa estratégia foi prejudicada, e também diante do tempo exíguo para a conclusão do estudo, após o encerramento da etapa de triangulação e categorização dos resultados. Desse modo, essa lacuna pode ser apontada, desde já, como uma limitação da investigação.

Por fim, houve o cuidado e o esforço com vistas ao alcance de saturação teórica, conforme consta no Quadro 12 e mencionado por Eisenhardt (1989) como o oitavo e último passo da abordagem para pesquisa por meio de estudo de caso, no qual o investigador opta por encerrar o processo iterativo relacionado à análise e discussão dos resultados, a partir do momento em que o ganho incremental é mínimo.

Nas páginas a seguir, avança-se rumo à apresentação dos resultados da investigação, por meio de uma análise específica de cada caso, e em seguida uma análise cruzada entre os casos, promovendo uma discussão a respeito dos principais achados.