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Análises comparativas acerca dos diferentes resultados produzidos pelo OP

A literatura sobre o OP enumera uma lista de fatores que condicionam a implantação do OP em outras localidades, evidenciando a necessidade de se adaptar essa experiência às circunstâncias locais. Esses estudos também procuram fazer valiosas reflexões teóricas acerca das causas que explicam os diferentes resultados de OPs.

Teixeira (2003) analisa a experiência do OP no Brasil através da pesquisa “Experiência de OP no Brasil”, realizada pelo Fórum Nacional de Participação Popular (FNPP), com 103 municípios que implementaram o OP, na gestão 1997-2000.

A autora determina um conjunto de fatores em três casos de implantação de OP no âmbito municipal: Icapuí (CE), Serranópolis do Iguaçu (PR) e Medianeira (PR), os quais têm em comum uma característica a priori, isto é, são municípios de pequeno porte

46 Esse assunto será abordado mais adiante, no Capítulo 4, por meio da análise comparativa de três experiências

populacional47.

A partir dos aspectos observados (recursos orçamentários disponíveis, tradição associativa prévia ao OP, composição do governo e formatos assumidos pelo OP) nos casos anteriormente citados, a autora verifica alguns problemas relacionados à tentativa de implementar formatos de OPs nos moldes de Porto Alegre (RS), tais como a inexistência de tradição associativa, as dificuldades orçamentárias e a escassez de recursos humanos frente às dividas sociais dos municípios, as divergências internas e as relações com o Legislativo, tendo como conseqüência a falta de participação da população, bem como a necessidade de maior autonomia no processo por parte da sociedade civil.

Desse modo, a autora procura destacar que para implementar o OP em outras localidades nunca será possível obter as mesmas condições, principalmente nos casos de pequenas cidades analisados nesse estudo. Assim, é preciso observar como o clientelismo e o personalismo aparecem na implementação do OP.

Outro estudo, realizado por Silva (2003), analisa os fatores que condicionam a implantação do OP, determinando seus resultados através da comparação de quatro processos de OP desenvolvidos na Região Metropolitana de Porto Alegre48. O OP de Porto Alegre foi utilizado como referencial empírico para a identificação de quatro fatores explicativos na implantação do OP: o desenho institucional, o associativismo, o comprometimento político governamental e a capacidade de investimento do município.

A análise desenvolvida demonstra que as variáveis, definidas como explicativas para o êxito da implantação do OP em Porto Alegre, são parcialmente explicativasnos dois casos que poderiam ser identificados como exitosos de implantação do OP (Alvorada e Gravataí), fornecendo elementos para uma compreensão dos motivos de debilidade do OP de Viamão.

Dessa forma, cada caso apresenta as suas especificidades decorrentes das suas configurações próprias e das suas trajetórias locais. “Observa-se que em determinados momentos, elementos do modelo instituído em Porto Alegre acabaram sendo implantados sem

47 Na mesma vertente, Rover (2003) aprofundou o debate acerca da dimensão rural do OP. 48 Porto Alegre, Alvorada, Gravataí e Viamão.

a devida adequação às condições locais, gerando entraves e problemas para o êxito do processo” (SILVA, 2003, p. 176).

Avritzer (2006), em um estudo mais recente, questiona se a expansão do OP, após a emblemática experiência de Porto Alegre, compartilha as mesmas características deliberativas e os mesmos efeitos redistributivos verificados na capital do Rio Grande do Sul.

O autor argumenta que as condições que favoreceram a emergência do OP em Porto Alegre são características sociais e políticas próprias desse município. Além disso, os importantes papéis desempenhados pelas organizações da sociedade civil e pelos elementos deliberativos, presentes no desenho do OP de Porto Alegre, são variáveis que influenciaram diretamente os resultados redistributivos dessa proposta.

O autor assinala que após o sucesso da experiência da capital gaúcha, o OP se difundiu alcançando cerca de 170 cidades brasileiras em 2005 (AVRITZER, 2006, p. 623). Entretanto, diferentemente da experiência de Porto Alegre, a maioria desses municípios que implementou o OP nesse período, era de pequeno a médio porte, tinha fraca tradição associativa e estava concentrado nas regiões sul e sudeste do país. Além disso, quase metade desses novos experimentos estava ligada ao PT, enquanto a outra metade estava aliada a outros partidos políticos, respectivamente. Nesses casos, o governo freqüentemente exercia maior influência no processo devido a fraca tradição associativa. No geral, o OP era simplificado e algumas cidades não possuíam recursos para dar sustentabilidade às reformas participativas. Assim, na visão do autor, as características deliberativas e distributivas que impulsionaram o sucesso dessa experiência na capital do Rio Grande do Sul não estiveram presentes em todas essas cidades (AVRITZER, 2006, p. 633-34).

Desse modo, o autor conclui que pode haver pelo menos dois tipos de experiências participativas. O primeiro foi o que emergiu em Porto Alegre e se estendeu para grandes cidades como Belo Horizonte, São Paulo e Recife, englobando também as grandes cidades do estado de São Paulo. Essas experiências foram caracterizadas pela forte tradição associativa, pelo envolvimento entre as associações de moradores e a administração pública, pelos índices de participação que alcançaram cerca de 1% da população local e pelos resultados exitosos quanto ao crescimento da cultura política e os respectivos efeitos redistributivos. O segundo tipo de OP, de acordo com o autor, foi o que se difundiu entre as

pequenas e médias cidades, especialmente, do sul e sudeste do país. Essas experiências foram essencialmente produtos do “efeito demonstração” do OP de Porto Alegre, mas não atingiram o mesmo êxito em democratizar a gestão municipal. Nessas condições, o OP poderia funcionar bem, na visão do autor, se a cidade não fosse muito carente de recursos públicos e se fosse capaz de estabelecer um processo distributivo, bem como um consenso no governo quanto à implementação desse novo arranjo participativo, o que tornaria o projeto mais dependente da administração municipal. Nesses casos, o autor observa que poderia haver melhoria quanto à eficiência administrativa, mas não quanto às práticas democráticas (AVRITZER, 2006, p. 633-34).

Tendo em vista as variações significativas dos resultados do OP, Wampler (2003) busca compreender e explicar as suas conseqüências por meio das seguintes variáveis: o desenho institucional, a composição política do governo, a densidade da sociedade civil, o tempo de vida do OP e os recursos financeiros do município.

O desenho institucional constitui a mais importante forma de explicação na medida em que “regras conformam as estratégias dos atores políticos e estabelecem os parâmetros para os recursos políticos e de políticas públicas” (WAMPLER, 2003, p.74). Nesse aspecto, “o OP introduz um novo conjunto de regras que, quando seguidas, têm o potencial de mudar como e onde as decisões serão tomadas” (WAMPLER, 2003, p.75). O compromisso político da administração municipal de incluir os cidadãos no processo de tomada de decisão depende, na visão do autor, da filiação partidária e/ou da coligação do gestor e da habilidade da administração criar maioria na Câmara.

O nível de participação, a capacidade de investimentos do município e o tempo de vida do OP são variáveis centrais para demonstrar as amplas variações nos resultados dessa instituição inovadora de tomada de decisões.

O autor exemplifica seu argumento através do caso do OP de Porto Alegre, que é o mais conhecido, e seus resultados são considerados padrões através do quais outros OPs são medidos, o que é injusto pelo tempo de vida desse OP em relação aos demais. Por isso, é importante analisar um conjunto de fatores responsáveis pelo sucesso, pelo fracasso ou pelos resultados marginais do OP.

Dentro dessa perspectiva, Wampler, em outro estudo mais recente (2008), analisa oito municípios brasileiros que implementaram o OP49 produzindo resultados diferenciados: dois casos de sucesso, dois programas fracassados e quatro outras experiências tiveram efeitos diversos e contraditórios.

O principal argumento do autor é que há significativas variações nos resultados produzidos por essas instituições participativas que podem ser melhor explicados a partir do interesse dos governantes em instituir as mesmas.

Nesse sentido, um OP forte deve aumentar os níveis de suporte do prefeito em delegar autoridade diretamente aos cidadãos e, simultaneamente, envolver as organizações da sociedade civil em políticas cooperativas e conflitantes. Assim, quando o apoio do prefeito diminui e as organizações da sociedade civil são incapazes de se empenharem em ambas as formas de comportamento político, os resultados do OP são fracos. Entretanto, quando esses dois fatores interagem entre si podem produzir diferentes resultados como, por exemplo, um aumento do número de reivindicações realizadas por organizações da sociedade civil pode freqüentemente levar os governos a transferirem maior autoridade e a ampliarem a quantidade de recursos destinados a esses programas. Por outro lado, existe a possibilidade do crescimento dessas manifestações por parte da população levar ao enfraquecimento do apoio do prefeito, e como conseqüência ao fracasso dessas iniciativas.

Para examinar essa proposição, Wampler desenvolveu uma estrutura analítica (uso de políticas contestatórias por organizações da sociedade civil versus apoio do prefeito ao OP) para demonstrar como e onde instituições participativas podem contribuir para o amadurecimento da democracia. Com essa preocupação, o autor identificou quatro tipos de interações entre os casos analisados: democracia participativa institucionalizada (Porto Alegre e Ipatinga), fraca democracia participativa (Blumenau e Rio Claro), democracia participativa cooptada (Santo André e São Paulo) e democracia participativa informal e conflitiva (Recife e Belo Horizonte).

Tendo em vista essas importantes constatações realizadas a partir dos estudos comparativos apresentados é importante evidenciar que as condições que favoreceram a

49 Belo Horizonte (MG), Blumenau (SC), Ipatinga (MG), Porto Alegre (RS), Recife (PE), Rio Claro (SP), Santo

emergência do OP em Porto Alegre são características sociais e políticas próprias desse município, e não estão presentes em todas as cidades onde essas reformas foram introduzidas (AVRITZER, 2006). Dessa forma, é essencial analisarmos um conjunto de fatores responsáveis pelo sucesso, pelo fracasso ou pelos resultados marginais do OP. Além disso, uma vez que a implementação de reformas participativas depende do compromisso da administração municipal e da sua habilidade em criar maiorias na Câmara, o qual é contingente à filiação partidária e/ou à coligação do gestor, os diferentes resultados produzidos pelo OP podem ser melhores explicados a partir do interesse dos governantes em instituir as mesmas, bem como da capacidade das organizações da sociedade civil de se envolver em políticas cooperativas e conflitivas (WAMPLER, 2003; 2008).