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A literatura apresentada até o momento nos fornece subsídios para repensarmos a importância do OP para o PT e para os governos locais.

No Capítulo 1, podemos destacar, entre os argumentos relativos à compreensão dos fatores políticos que permeiam esse debate, as seguintes proposições: o OP por seu “efeito demonstração”73 ajudou o PT a ganhar eleições74, o OP foi uma forma de o Executivo sobrepor-se ao Legislativo75 e o OP faz parte da competição política76. Esses argumentos nos direcionam no sentido que o OP e o PT são termos inseparáveis e por essa razão a análise do discurso participacionista ao longo da história dessa legenda, bem como dos diferentes formatos produzidos por esses mecanismos participativos nos governos locais são importante para o aprofundamento dessa questão.

Neste Capítulo, além do debate sobre o papel do Estado na implementação de instituições participativas, a literatura apresentada evidenciou o importante papel da administração pública e dos partidos políticos no desenvolvimento dessas experiências participativas, bem como das relações entre os níveis nacionais e sub-nacionais de implementação dessas propostas, os quais influenciaram o desenho desta pesquisa.

73 Fedozzi (2002) 74 Baiocchi (2003). 75 Dias (2000).

Desse modo, o modelo de análise elaborado a partir dos objetivos, dos argumentos e da literatura examinada nos permite repensar o OP a partir do conceito de aprendizado. Assim, se nós invertêssemos nossos argumentos, poderíamos pensar do local para o nacional o seguinte:

Nos governos locais, o OP foi implementado não somente tendo em vista o aprofundamento da democracia, mas com o objetivo de promover novas alianças políticas para a consolidação do partido que o implementou. Esse processo pode ser observado a partir das mudanças nos desenhos de políticas locais. Assim, a partir do aprendizado das experiências vividas nos governos locais, o OP nasceu do amadurecimento do projeto político inicial do partido e foi, aos poucos, se transformando em uma estratégia política de consolidação do partido como uma opção de governo nacional.

Dentro dessa perspectiva, o conceito de aprendizado desenvolvido nesta tese, comporta quatro dimensões:

1. Aprendizado quanto às composições políticas (alianças políticas); 2. Aprendizado técnico (administrativo);

3. Aprendizado relativo à mudança no discurso programático do partido; 4. Aprendizado eleitoral.

Essas dimensões, por sua vez, não foram analisadas isoladamente nesta tese. Elas estão diluídas ao longo das esferas local e nacional, bem como das arenas governo (administração pública) e partido.

No âmbito governamental, os diferentes resultados produzidos por essas instituições participativas foram analisados tendo em vista as estratégias adotadas pelos atores políticos governamentais estudados através das mudanças institucionais verificadas por meio do legado deixado por essas instituições participativas, ou seja, dos novos desenhos de políticas ou das novas relações, alianças ou parcerias com atores políticos e sociais. Os instrumentos analíticos necessários a esta análise foram baseados na abordagem institucional comparativa (EVANS, 1995) que analisa a natureza e o papel desses mecanismos participativos em termos comparativos. Assim, para compreendermos os diferentes resultados produzidos pelo OP, nos inspiramos no argumento de Peter Evans (1995) de que iniciativas do Estado podem produzir transformação e desenvolvimento devido as suas características

organizacionais. Segundo o autor, “Estados variam dramaticamente nas suas estruturas internas e nas suas relações com a sociedade”77 (EVANS, 1995, p.11) e “diferentes tipos de estrutura de Estado criam diferentes capacidades para a ação”78 (EVANS, 1995, p. 11). Essas capacidades desenvolvem-se a partir de uma combinação entre coerência corporativa e conexão social, denominada pelo autor de “embedded autonomy” (autonomia inserida), que é o tipo concreto de aliança social que conecta o Estado e a sociedade e provém canais institucionalizados para contínua negociação e renegociação dos objetivos e políticas (EVANS, 1995, p. 92).

Por outro lado, para analisarmos as relações entre OP e PT, partimos da idéia, desenvolvida por Panebianco (2005)79, de que desafios ambientais provocam mutações em uma estrutura organizativa. Segundo o autor (2005, p. 91): “um partido, como qualquer organização, é uma estrutura em movimento que sofre evoluções, que se modifica no tempo e que reage às mudanças externas, às modificações nos ambientes nos quais está inserido e atua”. O autor desenvolve uma tipologia das organizações partidárias para a compreensão do funcionamento, bem como das mudanças experimentadas por essas legendas, centrada na análise das relações de poder no interior dos partidos (a configuração da coalizão dominante) e das relações dessas organizações com seus ambientes externos. O modelo de evolução organizativa do partido, segundo Panebianco, é desenvolvido a partir do modelo originário (características genéticas) e do modelo de institucionalização (as modalidades pelas quais a organização se solidifica)80. Esse modelo evolutivo indica a passagem de um momento inicial (construção da organização) para um momento posterior (fase de estabilização) do partido. O processo de institucionalização, por sua vez, enuncia a passagem de uma fase onde predomina uma estratégia agressiva de dominação do ambiente, a outra onde se sobrepõe uma estratégia de adaptação ao ambiente. Assim, o autor mede a institucionalização a partir de duas

77 Tradução nossa. 78 Tradução nossa.

79 Nesse estudo, Panebianco (2005) desenvolve uma análise do funcionamento dos partidos políticos através de

uma metodologia adaptada dos instrumentos de análise da sociologia das organizações acrescidas da literatura da ciência política sobre os partidos.

80 Panebianco (2005) nos adverte que não há uma única direção, mas uma pluralidade de caminhos pelo qual a

organização se forma ou se consolida, os quais são influenciados pelas pressões ambientais e pelo modo como essas pressões se refletem nas suas relações de poder internas.

dimensões: o grau de autonomia do ambiente que a organização se desenvolveu e o grau de sistemicidade, de interdependência entre as diversas partes da organização. Nesse sentido, embora uma organização tenha objetivos e interesses diversificados, a manutenção da estabilidade organizativa, ou seja, a conservação do mesmo grupo no poder é o objetivo fundamental dos líderes (coalizão dominante). A estabilidade organizativa pode ser ameaçada, sob esse prisma, pelos desafios ambientais que podem em qualquer momento colocar a organização em dificuldade e oferecer subsídios aos grupos minoritários que almejam o poder. Portanto, a mudança acontece quando os grupos minoritários alcançam o poder da organização, seja através de alianças ou de outras estratégias tais como expansão e adaptação ao ambiente81.

Neste estudo, observamos, inicialmente, que na medida em que o PT vem crescendo e ocupando cargos importantes no cenário político nacional, o OP está percorrendo o caminho inverso no interior do conteúdo programático do partido. Assim, se as estratégias de predomínio e adaptação ao ambiente podem explicar as mudanças ocorridas nos partidos políticos, elas também podem nos ajudar a compreender a trajetória do OP, através das mudanças programáticas sofridas ao longo da história petista e dos seus respectivos impactos na consolidação dessas instituições participativas. Segundo Panebianco (2005):

A literatura organizativa, conforme algumas escolas e autores, representou de maneira às vezes muito diferentes essas relações. A alternativa que deparamos com mais freqüência se dá entre as teorias que enfatizam a tendência das organizações a se 'adaptar' mais ou menos passivamente ao ambiente a qual estão inseridas e as teorias que enfatizam, por sua vez, a tendência das organizações a 'dominar' o próprio ambiente, a adaptar, por assim dizer, o ambiente a si próprias, transformando-o. Costuma-se relacionar a essas duas elaborações questões diversas: como o ambiente influencia a organização, no primeiro caso; como a organização modifica o próprio ambiente, no segundo. No caso dos partidos, as várias teorias existentes na literatura geralmente são reconduzíveis a uma ou outra elaboração” (PANEBIANCO, 2005, p. 21-22). (…) No entanto, mais uma vez a alternativa adaptação/predomínio está mal formulada (PANEBIANCO, 2005, p. 23). (...) “Portanto, nas suas relações com o mundo externo, toda organização impulsionada, ao mesmo tempo, em duas direções contrárias: será tentada a colonizar o próprio ambiente por meio de uma estratégia de domínio, mas também a pactuar com ele por

81 Segundo Panebianco (2005), a mudança nos partidos políticos, tal como qualquer outra mudança organizativa,

altera a estrutura de poder da organização, modifica a conformação da sua coalizão dominante e conseqüentemente, implica em mudanças nos comportamentos e nas atividades dos partidos. Ao admitir que qualquer organização deve-se institucionalizar para sobreviver, o autor adverte que a mesma conserva alguns de seus traços constitutivos.

meio de uma estratégia de adaptação (PANEBIANCO, 2005, p.24).

Desse modo, as estratégias de predomínio e adaptação ao ambiente podem nos ajudar a compreender a trajetória descendente do OP (no âmbito petista). Para tanto, analisaremos no próximo Capítulo as mudanças programáticas sofridas ao longo da história petista e os seus respectivos impactos na consolidação desses novos arranjos participativos. Ao examinarmos o modelo originário do partido, observamos que as questões da participação e da distribuição de recursos, tônicas do OP, estavam presentes na ideologia do mesmo através da idéia de “socialismo democrático”. No entanto, o programa político inicial do partido tinha uma forte conotação classista, restringindo a mensagem partidária a uma pequena parcela do eleitorado. Assim, o OP, num primeiro momento, pode ser pensado como fruto do programa político originário do PT que foi amadurecendo, tendo em vista os dilemas enfrentados por essa legenda e as estratégias utilizadas para conquista de espaço institucional. Nesse sentido, o OP colonizou o PT quando se torna a tradução prática do “modo petista de governar”, começando a ser adotado na maior parte das administrações petistas. Contudo, o PT vai mudando suas estratégias político-eleitorais quando passa para a esfera de governo federal, abandonando o OP, o qual também se adapta a esse novo ambiente através de formatos participativos mais regulados e restritivos.

Capítulo 3

Do local para o nacional: o significado do OP para o PT

Introdução

O OP será analisado, ao longo deste Capítulo, tendo em vista os objetivos partidários presentes nessa proposta. Tomamos como base a premissa de Panebianco (2005) acerca das mudanças institucionais para explicar como as mudanças programáticas, sofridas ao longo da trajetória petista, impactaram na consolidação dessas políticas participativas. Segundo o autor, a evolução organizativa de um partido depende do modelo originário e das pressões e desafios exercidos pelos ambientes nos quais a legenda atua. Assim, o processo de evolução organizativa implica a passagem de um momento inicial (construção da organização) para uma fase posterior (estabilização). Nas suas relações com o ambiente externo, o processo de institucionalização indica ainda a passagem de uma fase onde predomina uma estratégia agressiva de dominação do ambiente, a outra onde se sobrepõe uma estratégia de adaptação ao ambiente.

Dentro dessa perspectiva, este Capítulo tem como objetivo fazer uma reflexão acerca da questão participação popular, ao longo da história do PT. Ao examinarmos o modelo originário do partido, observamos que a questão da participação e da redistribuição de recursos, tônicas do OP, estava presente na ideologia do mesmo através da idéia de “socialismo democrático”. No entanto, o programa político inicial do partido tinha uma forte conotação classista, restringindo a mensagem partidária a uma pequena parcela do eleitorado. Assim, o OP será pensado como fruto do programa político originário do PT que foi amadurecendo, tendo em vista os dilemas enfrentados por essa legenda e as estratégias utilizadas para conquista de espaço institucional. Pretende-se verificar em que medida o OP pode ser considerado uma estratégia do PT para se consolidar como uma opção de governo nacional. Assim, para analisar a trajetória do OP, selecionamos uma seqüência de eventos históricos importantes de acordo com os pressupostos da path dependence, amplamente

utilizados pelos institucionalistas históricos. Em seguida, construímos um quadro geral comparando a evolução das mudanças nas estratégias político-eleitorais petistas, observadas pela literatura, assim como o crescimento da inserção dessa agremiação política em esferas estatais e as mudanças programáticas verificadas na implementação de políticas participativas, ao longo da história petista. Esse quadro foi construído a partir de fontes de informações primárias e secundárias, conforme descrito no Apêndice Metodológico.