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Analisando a cobertura jornalística de Relações Exteriores: a reação do Brasil às denúncias de espionagem dos

No documento Jornalismo / Periodismo (páginas 164-175)

EUA a partir dos sites BBC Brasil e VEJA.com

iVAn boMFiM

ivanbp17@yahoo.com.br

Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Resumo

No presente trabalho, analisamos notícias publicadas pelos sites da BBC Brasil e VEJA.com acerca do discurso da presidente do Brasil, Dilma Rousseff na Assembleia Geral da ONU, em setembro de 2013. O pronunciamento acabou se constituindo numa forte reação do governo brasileiro às denúncias de espionagem por parte dos Estados Unidos – segundo o ex-agente da NSA Edward Snowden, o Departamento de Defesa norte-americano teve acesso a comunicações pessoais de Dilma. Observamos que o processo de contextualização das informações, essencial à compreensão das notícias do exterior (Aguiar, 2008; Bomfim, 2012), é realizado de maneira distinta entre os dois veículos noticiosos. Embora sejam notados elementos que identificam as coberturas ao que Marthoz (2008) define como jornalismo glocal, a construção das notícias implica em diferentes horizontes interpretativos.

Palavras-Chave: Cobertura política externa; jornalismo internacional; Dilma Rousseff; relações exteriores

a cobertura jornalístIcadapolítIca externa

A discussão da cobertura realizada pela BBC Brasil1 e Veja.com2 sobre o discurso da presidente Dilma Rousseff na Organização das Nações Unidas (ONU), em 24 de setembro de 2013, deve ser compreendida a partir da dinâmica noticiosa referente às relações entre os Estados, no contexto do jornalismo internacional. Esta edito- ria costuma aglutinar diversos gêneros e temáticas tendo como base a percepção de assuntos internos ou externos às fronteiras nacionais, numa definição de matriz geográfica.

As agências de notícias são as principais fontes da editoria e, ao estabele- cerem fluxos noticiosos em âmbito mundial, permitiram a existência do próprio jornalismo internacional, como afirmam Aguiar (2008; 2013), Boyd-Barrett (1998) e Natali (2004). Devido aos altos custos para manutenção de correspondentes e de enviados especiais, o trabalho realizado por empresas como Reuters (Grã-Bretanha), AP (EUA), AFP (França) e EFE (Espanha) permite a publicação de acontecimentos do mundo inteiro. Sublinhamos que a conformação de grandes empresas apoiadas pelo poder dos países considerados desenvolvidos é significativa: mesmo que atuem

1 http://www.bbc.co.uk/portuguese/ 2 http://veja.abril.com.br/

globalmente, as agências não devem ser consideradas dissociadas das representa- ções de nacionalidade. Isto quer dizer que, dentre as decisões “objetivas” da própria constituição do relato jornalístico, por exemplo, há subjetivamente a efetivação da visão etnocêntrica – um “olhar o mundo” que só é possível a partir de uma represen- tação identitária.

A mecânica de construção da notícia sobre o exterior é definida como pré- -mediatizada, segundo Aguiar (2008), porque o trabalho de apuração dos aconteci- mentos é realizado à distância, além de dependente de outras mídias. É significativa a utilização de fontes oficiais, o que expressa, em geral, um fator de credibilidade, e também porque as outras notícias distribuídas pelas agências possuem um núcleo fundador que, anonimamente, costumam servir como fonte de diversos veículos jornalísticos. Três aspectos desta dinâmica podem ser destacados: o custo de manu- tenção de correspondentes é proibitivo para maioria das empresas; em decorrência, cria-se homogeneidade dos conteúdos noticiosos, assim como da forma destes; por fim, como as notícias das agências indiciam acontecimentos para que as empre- sas enviem correspondentes, elas acabam funcionando como alarme sobre o que está acontecendo no mundo. Seria de esperar que o desenvolvimento das chama- das Novas Tecnologias de Informação e Comunicação modificasse esse panorama. Todavia, observa-se o contrário, dizem Aguiar (2008) e Marthoz (2008: 23, tradução nossa), para quem as persistentes relações de poder entre o Norte e o Sul se passam “também no mundo da mídia, dominado pela lógicas econômicas e financeiras que condicionam e ‘mercantilizam’ o tratamento das informações” e esse “casamento” entre grupos de imprensa e setores industriais e financeiros decorre em consequên- cias na natureza e qualidade das informações noticiosas que circulam globalmente.

As escolhas engendradas nas dinâmicas que envolvem o noticioso global são relevantes para compreendemos o papel essencial que a atividade das agências possui na estruturação do conhecimento sobre o mundo – e, especialmente, sobre como pode ser entendida a “atuação” de um país a partir da cobertura jornalística. A construção do noticiário internacional, sumariamente dependente de uma estrutura que contempla a atuação das agências, estabelece horizontes de compreensão do espaço e formas de contato das unidades estatais.

Entre as resultantes desse processo, Baldessar (2008: 8), aponta que a “hege- monia das agências na produção e distribuição de notícias, por um longo período, formou várias gerações de jornalistas que observam o mundo sob a ótica do Centro e isso traz como conseqüência a Periferia consumir mais notícias sobre o que, aos olhos dela, é a parte mais importante do mundo”. Devemos nos atentar para a trajetó- ria de constituição de representações valorativas bastante claras do espaço mundial. A relação Centro-Periferia pode ser notada a partir de diversas concepções, como a ampla cobertura dos acontecimentos que têm vez nos EUA e Europa em detrimento às informações sobre países da Ásia, África e América Latina. Como observa Natali (2004), em geral essas regiões são noticiadas quando da irrupção de conflitos ou de acontecimentos “exóticos”: notícias que trazem aquilo que poderá ser considerado comportamento ou fato desviante da normalidade.

Essa “normalidade”, a partir da mídia noticiosa global, é uma assumpção ociden- tal. De mesma forma, disputas bélicas não simplesmente acontecem: são exemplos da pouca atenção outorgada pelas agências às realidades de nações tomadas como periféricas, o que se reflete no desconhecimento e desconsideração de costumes e crenças, assim como das dinâmicas sociais, culturais e históricas desses locais. Conforme Marthoz, o jornalismo internacional é marcado por uma precisa hierar- quia, “regida por uma aristocracia que determina em grande parte não apenas o cardápio da atualidade – do que se fala – mas também a maneira como nós falamos sobre ela” (2008: 48).

O interessante é percebermos que, quando nos voltamos para uma análise da cobertura da política externa, há uma congruência de elementos do jornalismo internacional a considerações sobre a situação interna. Ou seja, embora estejamos com foco em situações que envolvem o espaço exterior às fronteiras nacionais, os posicionamentos sobre assuntos internos são um elemento inseparável nessa inves- tigação. Para Marthoz (2008), este esforço configura uma tentativa de investigação sobre o paradigma do jornalismo glocal, caracterizado pela ação de encontrar o local no global e o global no local. Essa consideração abre alguns caminhos para discutir- mos a cobertura noticiosa da política externa do Brasil.

É necessária a contextualização das notícias que abordam acontecimentos ocorridos externamente às fronteiras nacionais. Como as dinâmicas sociais não são percebidas em si mesmas, sua percepção não pode ser efetivada sem que haja uma atribuição prévia de significado. No âmbito do jornalismo, Correia (2009) sublinha que essa dinâmica deve ser entendida a partir da instituição de enquadramentos simbólicos, visto que a “relação entre os media e a realidade não se esgota na repre- sentação, prolonga-se na apropriação dos significados em numerosos contextos de interacção quotidiana” (Correia, 2009: 53). A recontextualização é levada a cabo com a seleção de acontecimentos que são considerados “relevantes” para o público, que depois serão construídos narrativamente. Como o material disponibilizado pelas agências apresenta, de certa forma, grande homogeneidade, os enquadres sob os quais as notícias são construídas e disponibilizadas são parte inseparável da estru- turação dos acontecimentos. Diz Correia que

[…] um traço que torna os elementos mais noticiáveis é a sua facilidade em serem interpretados dentro de um enquadramento sócio-cultural familiar, em termos de imagens, expectativas e estereótipos consagrados. Assim sendo, a chave de uma verdadeira compreensão do papel dos media é aceitar uma contí- nua interacção entre acontecimentos, significados culturais, contratos de leitura e enquadramentos providos pelo campo noticioso (Correia, 2009: 46).

Dentro do horizonte da contextualização indispensável à constituição do noticiário acerca das relações internacionais, destaca-se a necessidade de “imagens, expectativas e estereótipos consagrados”, como é referido por Correia (2009), que trabalha a questão a partir do conceito de tipificações. Estas são um processo de “abstracções e estandardizações, efectuado simultaneamente no discurso existen- cial autêntico da pessoa e o discurso convencional sedimentado pela sociedade é

o reconhecimento de uma situação graças à rotina interiorizada na vida cotidiana e a prescrição de uma receita” (Correia, 2009: 58). Por exemplo, “apreendemos” cons- trutos sociais (como os Estados ou o ambiente internacional) e grupos humanos (“iranianos”, “norte-americanos”, etc) como existentes ontologicamente.

Podemos pensar as tipificações a partir da figura dos estereótipos. Como práti- cas significantes, eles não apenas categorizam, mas estipulam julgamentos sobre as visões de mundo, comportamentos, etc, e são atravessados por tensões sociais e culturais historicamente erigidas. Por meio do conhecimento intuitivo, os estereótipos fomentam a redução da percepção acerca da figura do “outro” a traços facultados a eles, sublimando por completo suas complexificações, história, valores, etc. Para Biroli,

[…] os estereótipos são artefatos morais e ideológicos que têm impacto para a reprodução das relações de poder. Neles, o caráter moral dos valores e julga- mentos está atrelado aos dispositivos ideológicos de legitimação de papéis e posições em uma dada ordem social. Os estereótipos correspondem à definição do outro e do contexto em que as relações se travam em termos de expectativas sociais padronizadas que, por sua vez, pressupõem valores (Biroli, 2011: 80).

A utilização de estereótipos no discurso jornalístico irá cumprir o papel de reproduzir relações de poder por meio de afirmações valorativas, legitimando algu- mas posições e rechaçando outras. Nesse sentido, é necessário entender o “acumu- lado da política externa brasileira”, na definição de Cervo (2008; 2010).

forMas deatuaçãoeprocessos dapolítIcaexternabrasIleIra

Podemos definir a política externa como a área que representa as metas da figura do Estado no plano internacional. Alude à avaliação, formulação e implemen- tação das prioridades externas, sendo que sua definição e prática são prerrogativas do ator estatal, soberano, que opera em um ambiente qualificado como anárquico – note-se, pela inexistência (oficial) de poder superior ao dos Estados. Durante muito tempo, segundo Lima (2000), as investigações sobre a constituição da política externa dos países guiaram-se pelo raciocínio de que a mesma possuía natureza

específica em relação à interna. Todavia, com a adoção de paradigmas pluralistas,

cognitivos e construcionistas3, o panorama dos estudos sobre as relações exteriores foi modificado.

Nos atendo às relações internacionais do Brasil, Cervo (2008, 2010) afirma a existência de pontos estruturais que definem a atuação do país no Sistema Internacional – o “acumulado” da política externa –, o que se traduz em princípios e valores da ação diplomática. Os principais são: auto-determinação, não-intervenção e solução pacífica de controvérsias; juridicismo; multilateralismo; ação externa cooperativa; parcerias estratégicas; desenvolvimento como vetor; independência.

3 Explicamos as escolas de pensamento das RI em artigo (Bomfim, 2012) no qual defendemos que, por serem estruturados

a partir da Sociologia do Conhecimento – destacadamente Berger e Luckmann (1973) – os estudos construtivistas se aproximam da teoria construcionista de investigação do jornalismo. Para nós, o jornalismo internacional pode ser tomado como um âmbito de interação entre as duas áreas.

Cervo comenta que os dois grupos-base4 do pensamento diplomático do país, os

associacionistas e os independentistas, concebem a ação da política externa brasileira

perpassada por um ideal de cordialidade oficial.

Estes conceitos influenciam enormemente as visões dos meios de comunica- ção e por isso incidem sobre a opinião pública. Certos órgãos de comunicação derivam sua interpretação desse ou daquele conceito e, portanto, estimulam a vigência de um ou de outro paradigma de relações regionais. Sabe-se que há órgãos de imprensa que fomentam a rivalidade, outros, a cooperação, sendo outros, ainda, volúveis e, finalmente, existem também aqueles que fazem análise objetiva. Buscar a objetividade significa ser crítico diante de interpretações que evidenciam parcelas da verdade. (...) o fato é que os paradigmas pesam sobre a opinião e o processo decisório do Estado. Os dirigentes são, via de regra, sensí- veis à pressão da opinião, por essa razão os paradigmas condicionam a estratégia de ação dos governos (Cervo, 2008: 206).

A partir do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010), a atuação brasi- leira mostrou-se mais incisiva, especialmente na articulação de posições entre os países subdesenvolvidos, como a criação de grupos como o G-20 financeiro e o BRICS. A dedicação que o Itamaraty5 concentra no multilateralismo condiz com as possibi- lidades do país: não dispondo de poder de enforcement, suas manobras passam pela atuação a partir de metas em comum a vários países, baseadas no valor moral das reivindicações. Além disso, sua localização intermediária (entre os desenvolvidos e os em desenvolvimento) favorece posições universalistas. Esta linha de atuação é seguida pela administração de Dilma Rousseff, iniciada em 2011.

o dIscursode dIlMa rousseffna onu na bbc brasIleeM veja.coM

Neste artigo, realizamos uma análise comparativa introdutória sobre os processos de contextualização concretizados pelos sites BBC Brasil e Veja.com sobre o discurso da presidente brasileira Dilma Rousseff na abertura da 68ª Assembleia Geral das Nações Unidas, na sede da entidade em Nova Iorque (EUA), em 24 de setembro de 2013. O principal tema da mandatária foram as denúncias de espio- nagem6 realizada pela Agência de Segurança Nacional (NSA, na siga em inglês) dos Estados Unidos. Tradicionalmente, o chefe de Estado brasileiro faz o discurso inicial do encontro anual. Para este breve exame, utilizamos duas notícias, a principal de cada veículo sobre o acontecimento.

De maneira inicial, fazemos uma rápida observação sobre alguns aspectos gráfi- cos das matérias. Na BBC Brasil, o título da notícia (figura 1) é Caso de espionagem 4 Os associacionistas defendem uma vinculação às determinações das chamadas “grandes potências”, em especial os EUA.

De forma oposta, os independentistas entendem que o país deve atuar no ambiente internacional a partir da promoção de objetivos próprios. Para Cervo (2008; 2010) e Vigevani e Cepaluni (2007), a primeira vertente pautou a política externa da administração Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), enquanto a segunda representou a linha adotada durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010). Essa divisão, porém, nunca é radical, e em geral as duas escolas de pensamento atuam conjuntamente na formulação das decisões.

5 Itamaraty é utilizado neste texto como sinônimo de Ministério das Relações Interiores do Brasil.

6 Conforme o ex-analista da NSA Edward Snowden, diversos setores do governo brasileiro foram alvo de vigilância dos EUA.

Mesmo aparelhos celulares de uso pessoal da presidente estariam sendo monitorados. Snowden é acusado pelo Estado norte-americano, entre outros crimes, de comunicação de informações de defesa nacional. Ele atualmente vive na Rússia com stagtus de asilado político.

dos EUA viola direitos humanos, diz Dilma na ONU7. Sob a cartola Brasil8, com hiper- link com o material publicado sobre o país em perspectiva ligada a temas políticos (outras seções com abas na mesma disposição são Notícias, Internacional, Economia, Saúde e Ciência e Tecnologia, além dos conteúdos Vídeos e Fotos, jornalístico, e Aprenda inglês, educacional). Uma fotografia apresenta Dilma Rousseff no púlpito da assembleia, realizando o discurso de abertura do encontro. A imagem pode ser facilmente relacionada a sua presença na ONU, pois é o registro de um dos momen- tos de sua fala.

Figura 1

Figura 2

7 http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/09/130924_dilma_assembleia_onu_lgb.shtml. Acesso em 23.10.2013. 8 http://www.bbc.co.uk/portuguese/topicos/brasil/. Acesso em 23.10.2013.

Em Veja.com, a notícia é intitulada Dilma critica EUA e faz discurso na ONU de

olho em 20149 (figura 2). Graficamente, há uma cartola maior (tarja) com hiperlink para seção de notícias reunidas sob o tema Espionagem internacional10, e uma cartola menor sem hipertexto denominada Diplomacia. Junto ao texto, uma fotografia retrata a presidente sentada numa cadeira, sem especificar se foi feita antes ou depois do pronunciamento na ONU. Importa notar que a imagem não traz nenhuma referência ao evento, e a presidente é fotografada em um momento alheio a seu discurso, com uma expressão de surpresa ou incredulidade. Ao final da página, é disponibilizado um vídeo com um resumo da comunicação de Dilma, produzido pela AFP.

processos decontextualIzação

A contextualização realizada pelos sites é um dos principais pontos estrutu- rantes das diferenças entre as coberturas. Na BBC Brasil, o enfoque é a indignação da representante do Estado brasileiro em relação às denúncias sobre a NSA e as duras críticas de Dilma aos programas de espionagem dos EUA. A reportagem destaca a atuação da presidente na definição do discurso e das diretrizes a serem seguidas no tratamento do caso. Destacamos um excerto:

“Dilma Rousseff já tinha avisado que ancoraria o seu discurso na polêmica envolvendo a espionagem americana. Até a Casa Branca já esperava que ela fizesse críticas mais fortes aos EUA, mas ainda havia dúvidas sobre quão duro seria o tom que a presidente adotaria.

A versão final do discurso ficou pronta às 4h da manhã, e assessores do Planalto disseram que até no café da manhã a presidente ainda rabiscava mudanças no texto.

Indiretamente, a presidente fez menção à importância do caso na sua decisão de adiar uma visita ao Estado aos EUA em outubro”.

O relato da recepção do discurso no ambiente da assembleia em conjunto às ações propostas pela mandatária indiciam a consideração da mesma como uma chefe de Estado atuante, conhecedora do tema que iria tratar na ONU. É relatada uma expectativa mundial de críticas às ações dos EUA, mesmo por parte da admi- nistração norte-americana. No entanto, de acordo com o texto, a reação brasileira suplantou o que era esperado pelos líderes mundiais presentes.

Em Veja.com, a contextualização é realizada primeiramente pelo levantamento de temáticas referentes à cena política interna do Brasil. O discurso da presidente é colocado como eleitoreiro, publicitário, preocupado com a promoção de sua admi- nistração. Podemos perceber esta orientação a partir do lead da matéria, do qual reproduzimos o trecho inicial:

“Ao falar na Assembleia Geral da ONU nesta terça-feira, a presidente Dilma Rousseff apresentou um discurso que mais parecia voltado aos eleitores brasilei- ros do que aos chefes de estado presentes. Como era esperado, Dilma focou sua

9 http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/na-onu-dilma-diz-que-espionagem-e-violacao-de-direitos-humanos-e-cobra-

-atuacao-da-onu. Acesso em 23.10.2013.

participação em críticas ao programa de espionagem dos Estados Unidos – mas não faltou tempo para abordar temas como os protestos de junho e os “avanços” conquistados por seu governo. Já na abertura de sua participação, a presidente deixou claro a que veio, classificando a espionagem americana como violação dos direitos humanos”.

A atuação do Ministério das Relações Exteriores é exposta sob a ótica dos objetivos políticos domésticos, sublimando-se tanto a conjuntura internacional contemporânea quanto o histórico externo do país de promoção dos valores como auto-determinação, não-intervenção, solução pacífica de controvérsias, juridicismo e independência da atuação brasileira. A crítica em relação à violação dos direitos humanos, uma das preocupações de diversas entidades mundiais (e da própria ONU, como é noticiado na matéria da BBC Brasil), é definida como um apontamento pura- mente estratégico.

O seguinte excerto fornece exemplo interessante: “A agenda antiamericana

integra a estratégia eleitoral de Dilma, que cancelou a viagem oficial que faria aos Estados Unidos em outubro após ouvir conselhos de seu marqueteiro João Santana e do ex-presidente Lula”. Argumenta-se que as decisões advindas da situação de quebra

de soberania realizada pela NSA são parte de uma tática com vistas apenas à conse- cução de metas internas, sem correlação com fatores externos de grande relevância. A própria atuação do Estado brasileiro não é decidida pela interação entre o corpo diplomático e a chefe de Estado, mas pela obediência da presidente a seu marque- teiro e ao ex-presidente Lula. Seriam ações meramente interesseiras, sem ligação ao histórico do Itamaraty.

É relevante notar que a matéria publicada pela BBC Brasil foi realizada por um enviado especial, enquanto a de Veja.com não possui assinatura, o que indica que pode ter sido feita tanto a partir de agências de notícias quanto pela observação do

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