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A construção da figura do editor de livros na narrativa jornalística do caderno Sabático de O Estado de S Paulo

No documento Jornalismo / Periodismo (páginas 185-195)

MAriAnA scALAbrin MüLLer

marianasmuller@gmail.com

Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Resumo

Este trabalho objetiva problematizar a construção da figura do editor de livros em reportagens publicadas no

Sabático, suplemento cultural do jornal O Estado de S. Paulo. Criado em março de 2010, o Sabático é herdeiro do

tradicional Suplemento Literário do Estado de S. Paulo (1956-1974), e deixou de circular em abril de 2013. Foram analisadas as edições publicadas no período compreendido entre maio de 2012 e abril de 2013. Identificamos, nesse recorte, quatro edições que têm como capa e matéria principal um editor de livros. Considerando a tradição dos suplementos literários (Abreu, 1996), a lógica da publicação relacionada à notoriedade e à construção de prestígio (Golin; Cardoso, 2010), a proposta é analisar as quatro reportagens selecionadas sob a perspectiva da narrativa jornalística. A partir do recurso da personalização (Alfonso, 2010) e da reincidência de temáticas nas quatro entrevistas, percebemos que o suplemento coloca o sujeito editor na posição de protagonista ao narrar parte da história editorial brasileira e os atuais desafios do mercado. Conforme Bragança (2005), o lugar do editor, que mesclaria comando, decisão e criação é reiterado nas páginas do Sabático.

Palavras-Chave: Jornalismo cultural; suplemento cultural; narrativa; editor

supleMentos: o passadoeo presente

A década de 1950 foi o palco do lançamento de suplementos literários na maioria dos grandes jornais brasileiros. Em um período marcado pela urbanização, por mudanças na estrutura produtiva e pelo desejo de modernização do país, a imprensa começou a abandonar o jornalismo marcado pela opinião, uma herança francesa. A notícia e a objetividade ganharam espaço nos periódicos que, naquele momento, começaram a ser financiados com força pela publicidade. Em paralelo a tantas mudanças, surge uma sociedade de consumo nos diferentes setores da cultura e um espaço nos jornais dedicado à arte, à literatura e, por consequência, aos intelectuais (Abreu, 1996).

Grande parte dos suplementos era publicada aos sábados ou aos domingos e muitos tinham em sua origem os cadernos femininos, que reuniam temas como moda, culinária e poesia. É importante destacar, conforme Abreu (1996), que na década de 1950 a mulher era a grande consumidora de produção literária no país. Em relação às temáticas publicadas pelos suplementos literários nessa década, a literatura é a que mais aparece, seguida por temas culturais, históricos e políticos. A análise dos suplementos do período feita por Abreu (1996) ainda permite perce- ber quais editoras eram as mais atuantes no mercado da época e quais eram os

intelectuais de referência. Outra característica dessas publicações era a capacidade de inserção de jovens escritores no mundo literário.

Criado em 1956, com projeto editorial de Antonio Candido e design concebido pelo artista plástico Ítalo Bianchi, o Suplemento Literário de O Estado de S. Paulo influenciou de forma marcante o segmento. Foi criado com a proposta de aliar tradi- ção e inovação e se destacou pela boa remuneração de seus colaborados, acima da média do período. Apesar dos poucos anúncios comerciais, era eficiente ao conferir prestígio para o jornal, reunindo segmentos importantes da intelectualidade paulis- tana (Golin & Cardoso, 2010). Ao segmentar os cadernos que analisou de acordo com suas características dominantes, Abreu (1996) inseriu o suplemento do jornal

O Estado de S. Paulo entre os que abriam espaço para os movimentos de vanguarda

tanto na literatura quanto no teatro, nas artes plásticas e no cinema. No final da década de 1960, o caderno começou a passar por mudanças, na esteira da imposi- ção da cultura de massas e do apelo técnico, que acompanhou a modernização das redações.

As constantes transformações que atingiram a imprensa nas décadas seguintes modificaram o perfil dos cadernos focados em cultura e literatura. Muitos semanais foram extintos, alguns substituídos por cadernos diários de cultura e entreteni- mento. Os que ainda existem mantêm a circulação semanal e fazem parte de uma lógica onde as notícias e as reportagens convivem com outros gêneros, incluindo o texto literário. Segue tratando-se do espaço em que o jornal prescinde, trazendo um conteúdo sem o qual a edição permaneceria completa. Os suplementos ainda mantêm a lógica do arquivo – ler e guardar – inserindo, assim uma outra perspectiva de tempo à efervescência dos jornais diários.

Em alguma medida, os suplementos carregam parte do conceito etimológico da revista, no ato de re-vista, de examinar, pressuponto a crítica e o ensaio (Golin

et al., 2013). Para Golin et al. (2013), os cadernos especializados poderiam funcio-

nar como um metassistema perito, que têm poder de legimitar ou de deslegitimar a confiança nos sistemas peritos, conforme Miguel (1999), algo já praticado no jornalismo. Como sistemas peritos entende-se sistemas de excelência técnica ou de competência profissional1. A isso, soma-se a questão da hierarquia, a defesa do superlativo, ou seja, o poder de definir o que há de melhor no segmento cultural.

Na condição hieráquica de juiz artístico, os suplementos traduzem de forma consciente ou não uma espécie de projeto formador e pedagógico. Em graus diferentes, difundem valores seculares da cultura letrada, constitutivos da gênese do jornalismo cultural por meio do texto crítico, atribuindo-se funções múltiplas como alertar, descobrir e explicar, ou seja, de “iluminar o leitor” (Golin

et al., 2013: 110).

Ao jornalismo cultural cabe o poder de dizer e de silenciar, interferindo no processo de consagração de determinados produtos e agentes de produção cultural, provocando efeitos também no processo produtivo (Golin & Cardoso, 2010). Nessa 1 Miguel (1999) parte de categorias propostas por Anthony Giddes em As consequências da modernidade (1991).

luta por prestígio, os autores (Golin & Cardoso, 2010) salientam que vem à tona um jogo de distinção: o jornalismo toma para si o poder da assinatura de alguns artistas e instituições para legitimar-se; ao mesmo tempo, artistas e instituições utilizam a visibilidade da mídia para dar mais alcance à sua assinatura. Para Alfonso (2010), um dos recursos utilizados pelo jornalismo é o tratamento de fatos culturais a partir do sujeito, da personalização. Esse fenômeno criaria um discurso apoiado em persona- gens, onde se produz um efeito de sentido em que a confiabilidade do conhecimento é deslocada para a credibilidade individual do sujeito.

Ao analisar o discurso, Benetti (2010) conclui que o jornalismo adquire poder normativo ao estabelecer saberes dignos de serem denominados “contemporâneos”. Dessa forma, a maior força do discurso jornalístico não estaria na singularidade das notícias, mas naquilo que se repete, definindo como é o mundo, quais são os valores contemporâneos e como se deve agir nesse mundo narrado. Os suplementos, muitas vezes, operam nesta lógica de repetição de ideias. Além disso, o presente social oferecido pelo jornalismo carrega uma noção estendida nessas publicações. Nesse sentido, cabe lembrar que o tempo presente, segundo Franciscato (2005: 165), “é a construção social que fundamenta o jornalismo”.

Para Travancas (2001), os suplementos conferem prestígio para os jornais que os publicam, o que colaboraria para mantê-los circulando. Porém, muitos suple- mentos, incluindo os dois brasileiros analisados pela autora2, têm sido extintos nos últimos anos. Já nos anos de 1950, de acordo com Abreu (1996), havia registros de suplementos com vida irregular, devido às dificuldades que atingiam a imprensa no período. Mário Pontes, que participou da criação do semanal Livros, editado pelo

Jornal do Brasil a partir de 1974, também relata que, em momentos de crise econô-

mica, os suplementos eram os primeiros a serem cortados (Gadini, 2009). Criado em março de 2010 com foco no mercado editorial, o caderno Sabático, herdeiro do

Suplemento Literário do Estado de S. Paulo, circulou apenas até abril de 2013, quando

uma mudança editorial no jornal O Estado de S. Paulo o extinguiu. os edItoresde lIvrosdopontodevIstadanarratIva

Há diversas razões para se estudar as narrativas. Entre as elecandas por Motta (2013), está compreender a representação do mundo. Assim, o trabalho simbólico das análises narrativas seria compreender a experiência constitutiva do sujeito. A proposta de Motta (2013) é uma análise com caráter hermenêutico, uma técnica de interpretação dos discursos sobre uma realidade. É preciso salientar as especificida- des de uma análise de narrativa de um produto da mídia.

...a narratologia midiática é diferente da narratologia literária. Na análise da mídia precisamos colocar o foco no processo de comunicação narrativa, na atitude e na posição do narrador, em suas intencionalidades e estratégias, seu papel mediador, nos dêiticos e implicaduras, nos efeitos de sentido possíveis

2 Em sua tese de doutoramento defendida em 1998 e publicada em livro em 2001, a autora comparou quatro suplementos

literários de jornais franceses e brasileiros. São eles: Mais!, da Folha de S. Paulo, Ideias, do Jornal do Brasil, Les livres, do

e em outros aspectos do processo integral de comunicação narrativa – e não apenas com o produto, como faz a narratologia literária cujo foco permanece ainda na obra e nas suas estruturas imanentes (Motta, 2013: 92).

Entre os desafios impostos pela narrativa jornalística está o jogo de vozes. Motta (2013) reitera que é preciso levar em conta pelo menos três narradores ou vozes sobrepostos. São eles: o veículo, o jornalista e a personagem. Na maioria dos casos, essas vozes se manifestam nas reportagens quase como em um confronto, numa disputa por poder simbólico. Além disso, verificar as temáticas que se repetem é fundamental para compreender o enredo.

Considerando o recurso da personalização e o foco do Sabático nos livros e na leitura (Costa, 2012)3, analisamos as edições do Sabático publicadas entre maio de 2012 e abril de 2013, quando o caderno para de circular. Nesse recorte, encontramos quatro edições que tem como capa e matéria principal um editor de livros. São eles: Sergio Machado, no comando do Grupo Editorial Record (26/05/2012); Roberto Feith, que dirige a editora Objetiva (25/08/2012); os irmãos Evandro e Alexandre Martins Fontes, responsáveis respectivamente pelas editoras Martins Fontes – Selo

Martins e WMF Martins (02/02/2013); Charles Cosac, editor e fundador da Cosac Naify

(20/03/2013).

A função de um editor é considerada indispensável e notória, sendo responsá- vel por fazer um texto transformar-se em livro. Comparado a um parteiro, o editor de livros impressos ainda “dá forma, corpo e roupa à obra que fez nascer – e finalmente chegará às livrarias” (Bragança, 2005: 223). Trata-se de uma mescla entre um lugar de decisão, de comando e de criação que, por pelo menos cinco séculos, esteve no centro do processo cultural do Ocidente.

Já a figura do editor-empresário, que não tem vínculos com a tipografia e com a livraria, surge apenas no século XIX e ainda permanece. Em paralelo, há o crescimento do comércio de livros, com processos como a internacionalização e a formação de grandes grupos editoriais. O século XX, para Bragança (2005), impõe aos editores-empresários o desafio de buscar novas fórmulas para concorrer com a cultura da imagem, um exemplo são as coleções de bolso, vendidas a custo inferior em relação ao livro tradicional.

Motta (2010) entende que o jornalismo costuma colocar as personagens, de forma muito individualizadas, no eixo das histórias. Dessa forma, a análise narrativa foca na observação da representação da personagem como figura do discurso jorna- lístico. “Nosso objeto é a versão, não a história”, reforça Motta (2010: 152). Assim, a escolha pela análise da figura desses editores-empresários justifica-se, também, por sua posição de centralidade no mercado editorial, foco do Sabático.

análIse: osedItoresenquantopersonaGens

O caminho para compreender como os editores são construídos enquanto personagens na narrativa do Sabático inicia por uma descrição das reportagens 3 A autora pesquisou o primeiro ano do Sabático, com edições selecionadas no período de março a dezembro de 2010, em

publicadas. Há semelhanças e diferenças entre elas que precisam ser destacadas nesta análise. As quatro têm um formato e tamanho comum: foto do editor na capa do suplemento e duas páginas de entrevista na parte interna. Em todas elas há uma outra foto do editor nas páginas internas, um texto pequeno em que ele é apresen- tado e, a seguir, as perguntas. Na parte inferior das duas páginas, há pequenas fotos com informações e curiosidades sobre o editor e a editora pela qual é responsá- vel. Isso ocorre em três matérias, exceto na entrevista realizada com Charles Cosac, editor e fundador da Cosac Naify. É importante destacar que a entrevista com o editor da Cosac Naify foi publicada no dia 20 de abril de 2013, última edição do caderno que circulou.

Figura 1: Da direita para a esquerda, as capas das quatro reportagens analisadas: Sergio Machado,

Grupo Editorial Record; Roberto Feith, editora Objetiva; os irmãos Evandro e Alexandre Martins Fontes,

editoras Martins Fontes – Selo Martins e WMF Martins; Charles Cosac, editora Cosac Naify.

Figura 3: A entrevista com os irmãos Evandro e Alexandre Martins Fontes, responsáveis respectivamente pelas editoras Martins Fontes – Selo Martins e WMF Martins.

Conforme Motta (2010), a reincidência e a continuação de temáticas é um indi- cativo relevante para a compreensão da narrativa. A leitura das quatro entrevistas permitiu identificar um núcleo temático principal: a trajetória das editoras coman- dadas por cada um dos entrevistados. O texto de abertura das quatro entrevistas é dedicado a recontar a criação e o desenvolvimento das empresas, seus títulos de maior sucesso e as perspectivas de futuro. É possível identificar um desenrolar de acontecimentos e de temáticas semelhantes nos quatro textos, escritos por jorna- listas do suplemento. Traços da personalidade ou vivências dos editores ajudam a contar o desenvolvimento de suas editoras, como é possível perceber nos trechos a seguir, retirados do texto de abertura de cada entrevista.

“Há muito que contar desde que, aos 24 anos, recebeu uma oferta “irrecusável” do

pai, Alfredo Machado, para trabalhar com ele na Record. Era 1972. Após a morte

do fundador da editora, em 1991, Sergio achou que era a hora de reposicionar a marca.” (Entrevista de Sergio Machado, grifo nosso)

“Ex-correspondente da TV Globo na Europa e ex-editor chefe do Globo Repórter, Feith aceitou em 1991 a proposta de dois conhecidos e comprou 60% de uma

editora inexpressiva – ela mesma, a Objetiva.” (Entrevista de Roberto Feith, grifo

nosso)

“Waldir era um visionário tão talentoso para os negócios que, em plena ditadura, chegou a publicar, com editoras portuguesas, autores censurados – não por moti- vos ideológicos, mas guiado pelo tino comercial, como lembra o filho Evandro, editor da Martins Fontes – Selo Martins.” (Entrevista de Evandro e Alexandre Martins Fontes, grifo nosso)

“Charles está longe de ser um editor burocrático. Colecionador de arte, sua editora, criada para publicar livros da área, viria a se tornar uma referência ao lançar monografias de outros artistas contemporâneos, sozinha ou em parceria com instituições como a Bienal de São Paulo.” (Entrevista de Charles Cosac, grifo nosso)

A trajetória das editoras segue presente nas respostas dos entrevistados. O início se dá com a história da editora e a inserção dos editores nelas, em seguida, as perguntas focam em desafios encontrados no percurso e, por fim, são abordadas temáticas relacionadas ao futuro das empresas e do mercado editorial. Na voz de uma personagem jornalística os editores contam seus maiores acertos e erros, além de momentos de dificuldade financeira. Essa ideia de balanço do que aconteceu até o momento da reportagem algumas vezes faz com que os editores possam ser identificados como batalhadores, vitoriosos. Como no trecho a seguir, de Charles Cosac: “O ano de 2012 foi o primeiro que não fizemos nenhum aporte e que a editora terminou no azul. Claro que isso não contempla o passado, mas olhar para o passado não é a solução”. Na voz dos jornalistas, surgem questionamentos que indicam uma provável dificuldade de manter-se no mercado editorial. Os irmãos Martins Fontes responderam de forma negativa a seguinte pergunta: “Em algum momento pensa- ram em desistir desse negócio? Sentiram desânimo?”.

Nas perguntas e nas respostas também é possível identificar as subtemáti- cas que perpassam as quatro entrevistas. São elas: questões pessoais relativas aos editores, a editora atualmente, mercado editorial, livros digitais, leitura, livrarias. Percebe-se, assim, que existem dois grandes eixos nas reportagens: a editora que cada editor comanda e o mercado editorial que os cerca. Esses dois eixos aparecem nas quatro entrevistas, a variação ocorre apenas em subtemas como a questão das livrarias e da leitura. Além de serem questionados sobre sua inserção na editora, os entrevistados responderam sobre desafios do mercado de livros impressos e digi- tais, como mostra o trecho que segue:

“O e-book é coisa do futuro e será uma coisa do presente. Mas eu não vejo o livro físico sendo a menor parte do mercado. Não vejo o digital ocupando a maior parte do mercado brasileiro no horizonte de uma década” (Roberto Feith, da Objetiva)

Os questionamentos dos jornalistas sobre mercado editorial (como está hoje, quanto se vende, quanto se paga por um título, lucra-se ou não, vale a pena perma- necer no mercado, incentivos governamentais etc) demonstram que os editores estão efetivamente no centro desse mercado, são protagonistas. O Sabático lhes concede espaço para que falem como estão suas empresas – as editoras – contem como montam seus catálogos e opinem sobre temas polêmicos como negociações com empresas estrangeiras, por exemplo a Amazon, para efetivar a venda de livros digitais. Essa escolha temática reforça o caráter de notoriedade empregado pela narrativa jornalística a esses personagens, os editores. Cabe reforçar que os quatro entrevis- tados que compõem esta amostra estão à frente de editoras significativas no Brasil.

“Ninguém imagina que uma pessoa possa entrar numa livraria, pegar uma dúzia de livros e sair sem pagar. Mas algumas pessoas argumentam que na internet você pode e deve fazer isso” (Roberto Feith, da Objetiva)

“Nesse ambiente do e-book, das licenças, o que vai fazer a diferença, na hora que a gente estiver na última batalha mortal com a Amazon, é o catálogo nacional” (Sergio Machado, da Record)

“A briga é cada vez maior. Num bom sentido. É briga por espaço dentro das livra- rias, briga para ter o livro na imprensa, para comprar os direitos.” (Alexandre Martins Fontes, da WMF Martins)

“Quando voltei ao Brasil, conheci a obra do arquiteto Paulo Mendes da Rocha. Três editoras tentaram tirar o livro de mim e eu falei: vocês estavam aqui há milhões de anos e não viram.” (Charles Cosac, da Cosac Naify)

Também é possível perceber a disputa de vozes entre jornalista e entrevis- tado. Ao lado disso, está o jogo de distinção, que faz com que instituições e agentes tentem reforçar sua relevância no espaço notório do jornal. As perguntas e respostas a seguir, retiradas, respectivamente, da entrevista com os irmãos Martins Fontes e com Sergio Machado, da Record, denotam isso:

“A Martins Fontes não é vista em grandes leilões comerciais. É uma opção editorial? Alexandre: Se entendermos que o livro merece, certamente vamos participar. Quase com certeza vamos perder. Já participei de muitos leilões sabendo que perderia, mas fiz isso para mostrar que existíamos. (...)” (Grifo nosso indica a pergunta feita pelo jornalista)

“Editoras brasileiras têm sido assedidas pelos estrangeiros. E a Record? Eles vêm conversar, estão sempre vindo. Tive essa conversa várias vezes.” (Grifo nosso indica a pergunta feita pelo jornalista)

Fica evidente, ao analisar as quatro reportagens, que a história das editoras e um panorama do mercado editorial brasileiro é narrado a partir do sujeito, seja ele o editor entrevistado no momento ou o criador da editora. São os editores que ganham espaço, que são ouvidos sobre questões relevantes do mercado. Por meio do recurso da personalização, em que a confiabilidade do conhecimento é deslocada para a credibilidade individual do sujeito (Alfonso, 2010), o suplemento reconstrói parte da história editorial do país e evidencia o mercado editorial atual, a partir de editoras consideradas de referência.

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A lógica dos suplementos literários, onde é possível perceber a construção da notoriedade de instituições e de sujeitos fica evidente nesta análise do Sabático. Em uma amostra de quatro reportagens publicadas no período de um ano – de maio de 2012 a abril de 2013 – percebe-se a disputa por prestígio (Golin; Cardoso, 2010) que leva a um jogo de distinções. Em alguns momentos, é o jornalismo que se utiliza do prestígio de instituições e sujeitos; em outros, esses sujeitos, os editores, utilizam-se do espaço jornalístico para dar um alcance ainda maior às suas assinaturas. Isso fica evidente quando os editores reforçam suas marcas, enaltecendo decisões acertadas que tomaram ao comprar ou negar determinado título, por exemplo.

No documento Jornalismo / Periodismo (páginas 185-195)