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PARTE II CONSTRUÇÕES TEÓRICAS

CAPÍTULO 6 TRAJETÓRIAS DE VIDA DE ADOLESCENTES-PAIS

6.6 Antônio, o filho decepcionado com o pai

Idade: 19 anos

Escolaridade: 1º ano do segundo grau. Atualmente não freqüenta a escola.

Situação profissional: trabalha há cinco anos com a irmã no comércio de DVDs e fitas de vídeo (VHS). A irmã é empresária e possui vários pontos de venda de DVDs e VHSs. Atualmente, o adolescente possui o seu próprio ponto de venda.

Idade da companheira: 18 anos Idade da filha: 3 meses

Apresentação do adolescente

Antônio é um jovem bem alto, simpático e sorridente. É moreno claro, tem olhos e cabelos castanhos. Tem uma personalidade sedutora, e durante toda a entrevista, fez questão de enaltecer as alegrias da paternidade e da vida conjugal. Foi muito agradável entrevistá-lo, pois, além da alegria contagiante, Antônio tem bastante humor e é muito afetuoso: durante grande parte da entrevista me chamou de “mulher”, tratamento que “estende carinhosamente”, às outras técnicas do CDS.

Situação e História familiar

Antônio é o segundo filho da Sra. R. Tem uma irmã mais velha, que é casada e mora com o marido e um filho pequeno. O cunhado de Antônio já havia sido casado e tem um filho da idade do adolescente, o qual foi seu companheiro nas primeiras

experiências com drogas, as quais não prosseguiram porque Antônio diz não obter prazer com o consumo delas. A Sra. R. atualmente mora sozinha e trabalha como costureira.

Os pais de Antônio se separaram quando o adolescente tinha 3 meses porque a Sra. R. descobriu que O Sr. I. já tinha uma outra família, embora tivesse sempre se apresentado como solteiro. Depois desta experiência, a Sra. R. nunca mais se casou. O Sr. I., embora seja um comerciante bem sucedido e tenha um bom patrimônio pessoal, nunca ajudou a Sra. R. na educação do filho. Esta sempre “lutou com muita dificuldade” para pagar o aluguel e suprir as necessidades da família. O adolescente nunca conseguiu se reaproximar efetivamente do pai. Fizeram algumas tentativas nesse sentido e a cada experiência, uma nova decepção era vivenciada. Segundo Antônio, o pai perdeu a chance de ter um filho que era seu fã. Quando era pequeno, idealizava o pai e falava bem dele pra todo mundo (sic). No seu aniversário de 9 anos, mais uma frustração foi somada às tantas outras expectativas em relação ao pai. Antônio relata que o Sr. I. lhe telefonou para convidá-lo para almoçar e este o esperou arrumado até as 18 horas sem que ele aparecesse. O adolescente conta que sempre esperou que o pai lhe desse atenção, lhe oferecesse um presente e que tentasse recuperar o tempo perdido, o que nunca ocorreu. Aos 17 anos, na última tentativa de reaproximação com o pai, teve nova decepção. Depois de uma discussão de Antônio com a mulher do pai, por esta ter criticado a Sra. R., o pai do adolescente ao invés de defendê-lo se omitiu mais uma vez. O adolescente relata que ficou muito magoado e foi embora da casa do pai sem dinheiro, quase no meio da noite. Segundo Antônio, o pai o humilhava e sempre era grosseiro com ele na frente dos outros.

Atualmente, o adolescente diz não precisar mais do pai e nem ter expectativas em relação a ele. Conta que não sente raiva, mas que esperou muito a sua ajuda quando era pequeno. Nessa época chegou a passar fome e não ter o que vestir.

Antônio atribui a maioria dos problemas dos jovens ao fato de eles serem criados apenas pela mãe que sozinha não consegue não (sic) dar conta das necessidades materiais e emocionais da família, nem impor autoridade e limites aos filhos. O adolescente argumenta que os filhos precisam da presença concreta do pai e não apenas da sua força simbólica: não é da presença do pai, tem que ter o pai (sic).

Trajetória no CDS

Antônio cumpre Medida Socioeducativa em regime de liberdade assistida por furto cometido em 2005. O adolescente viu um telefone celular tocando em cima de uma bolsa e como ninguém o atendeu, resolveu pegá-lo com a intenção de vendê-lo e conseguir um dinheiro extra. Antônio não é usuário de drogas e não reincidiu no ato infracional.

Anteriormente, teve uma passagem curta pelo CAJE por envolvimento num roubo de carro. Relata que ao invés de ser julgado e rejeitado pela família (mãe, irmã e cunhado), teve todo o apoio e ajuda financeira para não reincidir no ato infracional. História da gravidez e da parentalidade

Quando A., companheira de Antônio, engravidou o casal já namorava há um ano. A. morava na casa dos pais, e Antônio, com a mãe. Após os primeiros sintomas da gravidez fizeram os exames e tiveram a confirmação. O adolescente relata que a notícia foi um choque e que ficou deprimido: fiquei meio pra baixo (...) gostava de ficar na rua. Apesar de as pessoas de fora da família lhe colocarem medo e argumentarem que ele precisaria de muito dinheiro para criar a filha, teve todo o apoio da família (mãe, irmã e cunhado). Para a sua surpresa, ao invés de brigar com ele, a mãe e a irmã se prontificaram a ajudá-lo, argumentando que um filho é a melhor coisa do mundo. A experiência, segundo o adolescente, veio confirmar essa teoria.

No terceiro mês de gravidez, como já tinham intenção de morar juntos e, como Antônio já trabalhava, os jovens decidiram se casar. Moram atualmente no sítio do sogro, na casa da família de A., que é grande e confortável. O casal dispõe de um espaço no andar superior da casa, separado do resto da família.

Antônio acompanhou a gravidez da mulher e acha que ela ficou mais bonita. Quando viu a filha pela primeira vez sentiu um friozinho na barriga. Durante a gravidez e parto teve muito medo de a filha nascer com problemas. O parto foi induzido, pois já havia passado do tempo. Antônio conta que quando viu a filha, a achou feínha porque ela tinha uma mancha roxa no rosto. Logo o sinal desapareceu, e ela ficou com a pele bem clarinha. Apesar de ter gostado do nome da filha – que foi escolhido pela mulher – o adolescente queria ter escolhido um nome mais parecido com o seu. Relata que está

feliz com a vida de casado e com a experiência da paternidade. Acha que encontrou a mulher certa e diz estar conseguindo se organizar financeira e afetivamente. Segundo ele, a vida de casado é melhor do que a de solteiro.

Antônio identifica alguns fatores que o ajudam a desempenhar o papel de pai: um bom relacionamento com a mulher, cumplicidade no casamento, o tipo de trabalho que tem, o qual permite que o adolescente tenha um pouco de dinheiro todos os dias. A ajuda da sogra em relação aos cuidados que dispensa ao bebê, permite que A. auxilie o marido no seu comércio. O apoio da irmã em relação a sua independência econômica foi fundamental para que Antônio desse conta de seu papel como pai, marido e chefe de família. O adolescente tem a simpatia e o apoio tanto da sua família, como da família da mulher.

Suas preocupações como pai, atualmente, concernem à possibilidade de faltar alguma coisa para a filha, uma vez que, pelo tipo de trabalho que realiza, corre o risco de perder sua mercadoria. Se pudesse voltar atrás faria tudo novamente, pois sua vida mudou para melhor e a família ficou mais unida.

Tem projetos que incluem toda a família: comprar um lote, construir uma casa e equipá-la, comprar um carro e melhorar de vida. Para a filha, os planos são de que ela seja uma profissional (médica ou dentista) e principalmente que tenha independência financeira. Segundo Antônio, sua filha representa tudo. Diz que quando chega do trabalho estressado, só de olhar pra ela, o estresse acaba. Pensa que para a pessoa se dar bem na vida precisa ter sabedoria, o que não é o caso do seu pai. Antônio o acha rígido, sistemático e muito burro; pois complicou a sua vida com a infidelidade que cometeu em relação à mãe do adolescente e, ao mesmo tempo, em relação à sua família.

Um mês e sete dias depois desta entrevista Antônio foi desligado da medida.