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PARTE II CONSTRUÇÕES TEÓRICAS

CAPÍTULO 6 TRAJETÓRIAS DE VIDA DE ADOLESCENTES-PAIS

6.5 Henrique, o filho sobrevivente

Idade: 16 anos

Escolaridade: 5ª série (não freqüenta a escola há dois anos)

Situação profissional: procura um trabalho e enquanto não o encontra “faz bicos” Idade da companheira: 15 anos

Idade do filho: a companheira está no 8º mês de gravidez Apresentação do adolescente

Henrique é um adolescente magro, alto pele e cabelos bem escuros, de sorriso muito branco, o qual esconde uma história de vida marcada pela carência material e abandono afetivo. Comparece à entrevista vestido com uma roupa surrada e aparentemente mal cuidada. Pela dificuldade que apresenta para compreender minhas indagações e expressar-se, presumo a fragilidade da sua trajetória escolar.

Situação e história familiar do adolescente:

Henrique é o sexto filho de uma prole de 10. Sua mãe, Sra. L., teve três uniões conjugais. Cinco filhos são da primeira união e já estão todos casados, e cinco são da segunda união da Sra. L., desta vez com o Sr. V. O adolescente é o segundo filho desse segundo casamento. Com o terceiro marido, Sr. M., a Sra. L. não teve filhos. As informações fornecidas por Henrique sobre a paternidade dos irmãos são imprecisas e não coincidem com os dados contidos no prontuário do adolescente no CDS.

Segundo o adolescente, seu pai abandonou a família quando ele tinha aproximadamente 5 anos. A Sra. L. também foi mãe na adolescência (teve o primeiro filho com 12 anos). Henrique mora, desde os 13 anos, com a mulher – uma adolescente de 15 anos que dará a luz no próximo mês – e com a sogra, na casa desta última.

História familiar da mãe adolescente

C. é filha única e quando Henrique a conheceu (ele tinha 7 anos e ela tinha 6), ela morava na casa de uma tia. Sua mãe morava no Pará e, embora já estivesse separada do pai de C., tinha com ele uma relação muito instável e de muita briga (sic).

Trajetória no CDS

Henrique foi detido pela segunda vez por roubo de carro. Permaneceu 20 dias internado no Cesani. Já havia passado por uma internação anterior que durou um mês e dois dias. Apresentou ótimo comportamento na instituição. Seu relacionamento com professores, técnicos e colegas foi bom, assim como o seu aproveitamento nos cursos profissionalizantes. Atualmente cumpre Medida Socioeducativa em regime de liberdade assistida.

História da gravidez e parentalidade

Henrique se relaciona com a companheira C. desde os 7 anos de idade. C. morava com uma tia numa casa vizinha à sua e, quando esta deixava C. sozinha e saía para buscar roupas para vender, Henrique ia escondido para a casa de C. O adolescente relata que na época, o namoro não passava de abraços e beijos porque eram muito novos e não sabiam direito o que estavam fazendo.

Quando Henrique completou 13 e C. 12 anos, os adolescentes decidiram morar juntos. Nessa época, a mãe de C. se mudou para o Distrito Federal e concordou com a decisão dos jovens, pois, segundo o adolescente, ela não podia fazer nada. O casal passou então a morar na casa da sogra de Henrique.

Na época, o adolescente (com 13 anos) trabalhava em uma madeireira e ajudava na casa. Henrique e C. freqüentavam a escola, mas logo, o adolescente abandonou os estudos. C. continuou na escola até engravidar.

Segundo Henrique, seus pais não se importaram com a decisão. Sr.V. não morava com a família e a Sra. L. não opinou porque o adolescente já trabalhava. Depois da madeireira, Henrique começou a trabalhar com lotação e, muitas vezes, como trabalhava até tarde, ia direto para a casa de C. e não voltava para dormir na casa da mãe.

O adolescente recebeu com surpresa a notícia da gravidez da companheira porque imaginou que ela fosse improvável: Nós passou muito tempo sem pegar, aí achei que não pegava mais não (referência à gravidez) (sic).

Apesar de terem informações sobre gravidez e sexualidade – pois a mãe do adolescente conversava com ele sobre esses assuntos, Henrique achava que a gravidez não era possível porque eles eram muito novos.

O adolescente acha que a experiência de morar com a companheira está sendo positiva pois parou de beber, de sair para festas. O lado negativo da experiência, segundo ele, é não ter um trabalho fixo e ter que fazer bicos como, por exemplo, o trabalho esporádico de ajudante de pedreiro. Teria preferido que a gravidez da companheira ocorresse mais tarde, quando tivesse um serviço bom. Suas preocupações como pai: não deixar faltar nada para o filho e dar de tudo para ele (fralda e leite). Henrique diz também não querer repetir com o filho o comportamento da sua mãe, que batia muito nele quando ele era pequeno.

Apesar de estar feliz com a companheira que lhe dá carinho e conversa com ele, se pudesse voltar atrás diz que não teria se casado, pois ainda é muito novo e é melhor ficar solteiro. Se não fosse casado, iria viajar e curtir a vida. Henrique não vê muitas perspectivas de mudança na sua vida após o nascimento do filho, pois os cuidados com o bebê são, segundo ele, responsabilidades da mãe do bebê. A sua parte, diz respeito ao trabalho fora de casa (função provedora). O adolescente relata que, durante a gravidez, C. emagreceu muito e ficou mais feia. O adolescente não tem planos para o bebê e nem para a companheira. Seu grande sonho é entrar no Exército para ser um policial e fazer altas coisas lá dentro. Gostaria de poder usar as armas do Exército e dar muitos tiros. Tem vontade de usar as armas para caçar como no tempo em que ia para a roça com o pai.

O nome do bebê, Vitor Hugo, foi escolhido pela companheira em uma revista, mas o casal não conhece o seu significado. Henrique espera que o filho estude, que ele seja um menino honesto, humilde, forte, corajoso e que tenha um bom relacionamento com as pessoas. Para tanto, Henrique acredita que tem que pegar no pé dele enquanto ele for pequeno, porque quando crescer não adianta não. O adolescente acha que o pai deve dar apoio e ajudar a mãe a cuidar da criança, pois crescer sem o pai como foi o seu caso, é muito ruim e muito difícil para a mãe. Agora que Henrique está maior, visita o pai de vez em quando, mas até hoje nunca recebeu ajuda da parte dele e nem tiveram muita intimidade.

Henrique tem mágoa do pai e pensa que para um pai estar sempre perto do filho ele precisa respeitar a mulher. Segundo o adolescente, pai que faz uma criança e some não é pai, é um irresponsável.

Gostaria de ser para o filho, um pai alegre que joga bola e brinca com o filho, que está sempre presente e dá carinho (sic). Ser um bom pai é, segundo o adolescente, ser amigo do filho e lhe dar o que for possível. Henrique acha que a presença do pai é indispensável para que o filho seja forte e corajoso.