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PARTE I CONSTRUÇÕES METODOLÓGICAS

CAPÍTULO 2 METODOLOGIA

2.2 O contexto da pesquisa: O projeto Fênix na Comunidade

Uma vez definidos os objetivos e elaborados os instrumentos de coleta de dados, a segunda etapa do trabalho de campo foi iniciada, no contexto do “Projeto Fênix na Comunidade” (anexo 5) desenvolvido no antigo Centro de Desenvolvimento Social da cidade de Ceilândia/DF (atualmente substituído pela Sub-secretaria do Sistema Socioeducativo, subordinada à Secretaria de Estado de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania). Este projeto constituiu-se numa proposta de atendimento psicossocial a aproximadamente 100 adolescentes que cumpriam medida socioeducativa na modalidade Liberdade Assistida com histórico infracional e de envolvimento com drogas. Esta proposta de trabalho foi inspirada num projeto piloto-intitulado “Projeto Fênix”, que também foi concebido e desenvolvido pelo PRODEQUI, a partir de uma demanda da Vara da Infância e Juventude (VIJ/TJDFT), numa parceria com a então Secretaria de Estado e Ação Social do Distrito Federal (SEAS/DF). À diferença do projeto original, os adolescentes que integraram o segundo projeto recebiam uma bolsa de R$ 130,00, desde que fosse mantido o vínculo com a escola. Em função da estrutura reduzida para o atendimento desses adolescentes, a metodologia de intervenção adotada foi a dos Grupos Multifamiliares – proposta por Costa (1998) – que articula fundamentos teóricos da Psicologia Comunitária, do Sociodrama, da Terapia Familiar e das Redes Sociais. A questão da autoridade permeou todo o trabalho, cujo objetivo principal foi resgatar com os adolescentes e com as famílias o significado simbólico da justiça. A parceria entre a justiça, a instituição encarregada da execução da medida e as famílias – que reforça a autoridade e a competência das famílias para cuidar dos seus adolescentes – constituiu-se também em uma das metas do projeto.

O primeiro Projeto Fênix6 – cujo nome foi escolhido por um dos adolescentes do grupo, em referência ao pássaro mítico, de origem etíope que tem o poder de renascer de suas cinzas após queimar-se no próprio calor – aconteceu entre os anos de 2003 e 2004 e teve também como objeto, a promoção psicossocial de adolescentes usuários de drogas no contexto das medidas socioeducativas. Além do atendimento de 100 adolescentes e seus familiares, o projeto teve como meta a capacitação de 40

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As construções teóricas e metodológicas relativas ao projeto estão detalhadas no livro intitulado “Adolescentes e drogas no contexto da justiça” (2003) M. F. Sudbrack ; M.I.G. Conceição; E.M.F.Seidl ; M.T. Silva (Orgs.) Brasília, Editora Plano.

profissionais ligados às duas instituições. Foi coordenado pela Profa. Maria Fátima Sudbrack e supervisionado pelas Professoras Liana Fortunato Costa e Maria Inês Gandolfo Conceição. A partir dessa capacitação, criaram-se nove outros projetos pilotos envolvendo as diferentes medidas: Liberdade Assistida, Semi-Liberdade, Internação e Prestação de Serviços Comunitários.

O contato com a comunidade local onde foi desenvolvida a pesquisa e a experiência oriunda das reuniões multifamiliares me impactaram fortemente. Essa experiência ampliou a concepção que eu tinha da realidade desses adolescentes, de suas famílias e de suas comunidades. Esse (pre) conceito em grande parte alimentado pelo senso comum e reforçado constantemente pela mídia – que na maioria das vezes mostra esses adolescentes apenas como um “cancro” para a sociedade sem denunciar a omissão e incompetência deste mesmo sistema social em garantir os direitos básicos e cuidar desses jovens – me impedia de perceber a fragilidade desta população jovem e o “sofrido universo de invisibilidade social” no qual ela está inserida.

Tendo em vista a natureza do objeto de investigação, que pela sua complexidade nos impõe a necessidade de escapar de teorias simplificadoras e reducionistas, assim como de metodologias apenas descritivas, optei pela metodologia qualitativa González Rey (1997, 2002, 2004 e 2005).

O antigo Centro de Desenvolvimento Social (CDS) da Ceilândia, no qual foi realizada a coleta de dados, era na ocasião uma Unidade da Secretaria de Estado de Ação Social do Governo do Distrito Federal/SEAS7 (vide Figura 1). Localizava-se, aproximadamente, a 40 km de Brasília e funcionava como CDS há 35 anos. O objetivo do trabalho desenvolvido pela instituição era a prevenção de situações de risco social, por meio do fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários e a proteção em situações de violação de direitos e descumprimento da lei. Neste serviço eram oferecidos dois tipos de proteção: a Proteção Social Básica e a Proteção Social Especial.

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Atualmente as medidas socioeducativas estão vinculadas à Secretaria de Estado de Justiça de Direitos Humanos e Cidadania, tendo sido recentemente criada uma sub-secretaria de Medidas Socioeducativas. A partir da criação desta nova secretaria todo o trabalho de execução das medidas socioeducativas passa por um momento de reordenamento institucional que deverá abranger tanto as medidas de meio aberto como as de internação de internação.

A primeira modalidade de proteção, a básica, priorizava o atendimento da população em situação de vulnerabilidade social ocasionada pela pobreza, privação e/ou precariedade de vínculos afetivos. O segundo tipo de proteção, a especial, atendia famílias ou pessoas cujos direitos tinham sido violados embora mantivessem os vínculos familiares e comunitários.

Dentre os serviços oferecidos pela Proteção Social Básica, por intermédio do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), estavam os seguintes programas: Programa de Atenção Integral à Família, Programa de Inclusão Produtiva, Centro de Vivência do Idoso, Serviços Socioeducativos por Ciclo de Vida, Educação para o Trabalho e Projeto Ação Jovem.

A Proteção Social Especial era um programa subordinado ao Centro de Referência Especial da Assistência Social (CREAS). Neste serviço estava inserida a Medida Socioeducativa e a Liberdade Assistida, da qual faziam parte, na ocasião da pesquisa, 189 adolescentes, dos quais 11 são sujeitos da presente pesquisa.

Além dessa modalidade de proteção, existia o Programa de Orientação e Apoio Sociofamiliar e o Plantão Social (1º atendimento de violação de direitos, fornecimento da documentação básica, passagens interestaduais, atendimento emergencial da população de rua, auxílio funeral).

Figura 1. Organograma do antigo CDS na ocasião da pesquisa

SEAS

CRAS CREAS

Proteção social básica Proteção social especial

Atenção integral à família Inclusão Produtiva Centro de Vivência do Idoso

Serviços Socioeducativos Educação para o Trabalho

Projeto Ação Jovem

Medida Socioeducativa Liberdade Assistida Apoio Sóciofamiliar Plantão Social CDS 2 níveis de proteção