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CAPÍTULO 4 – AS ENTREVISTAS COMO CONTRIBUTOS PARA UMA

4.4 Síntese da análise às entrevistas

4.4.1 Ao nível da opinião individual

Relativamente à questão que se prende com a eventualidade da Web 2.0 ter contribuído para diminuir as desigualdades ou, por outro lado, não ter incrementado os valores democráticos em favor das pessoas, regista-se das respostas dos entrevistados, com o necessário distanciamento ideológico, uma aproximação para a igualdade de oportunidades no sentido da participação, embora encontremos menções nos depoimentos que se afastam desse status, nomeadamente em situações de infoexclusão ou sempre que as relações sociais o condicionam, a que corresponderá, nesses casos, apenas um processo de massificação das ferramentas da Web e não uma democratização das mesmas. É, sem dúvida enaltecido o potencial das TIC, que não substituirão o contacto direto ou o diálogo, mas que se assumem como um património comum da humanidade.

No que se refere ao facto da participação eletrónica, enquanto processo social colaborativo, suportado em plataformas Web 2.0, poder dar um contributo efetivo para ajudar a minorar as desigualdades entre as pessoas e entre os Estados, decorre da questão que a luta de classe é transposta para esse patamar tendo sido referido de forma explícita que “Os Estados, como nação politicamente organizada, e os governos, como executivos inscritos na organização do Estado, aproveitarão esse potencial ao serviço dos estratos (melhor diria, classes sociais) dominantes, condicionados, no entanto, pela correlação de forças sociais, isto é, pela parte do poder conquistado ou preservado pelos estratos/classes não-dominantes (escravizados, explorados, controlados ou dominados)(Sérgio Ribeiro). Por outro lado, foi colocada a tónica na facilidade do uso e nos reduzidos custos de uma ferramenta tão importante entre promotores e potenciais utilizadores, assim como nas virtudes reveladas pelos meios informáticos no sentido do cumprimento das obrigações cívicas.

À questão relacionada com os processos de cooperação, colaboração, interatividade e diálogo suportados pela Redes e se são passíveis de permitir uma aproximação, no sentido da participação entre os cidadãos e o poder político, encontramos muitas reservas no que se refere à eventual abertura do poder governativo à sociedade civil, salvo se imposto por uma correlação de

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forças que a tal obrigue. Por outro lado, são suscitadas questões que se prendem com as liberdades individuais dos cidadãos, recolhendo-se opiniões como a que “temos de ter consciência que a nossa vida é sistematicamente controlada, seja através da via verde, ou dos levantamentos no multibanco, factos que determinam onde e quando estivemos presentes. Agora isso também pode jogar em nossa defesa, ou seja, caso eu desapareça a probabilidade de me encontrarem será muito maior” (Pe. Américo Aguiar).

No mesmo contexto, as entrevistas revelam pontos de vista muito objetivos e que se poderão revestir de alguma crueza como decorre das expressões “quem

domina as redes tem o poder para dominar - poder de facto, entenda-se - de aceder à informação e de a utilizar para os mais diversos fins. Ora, informação é poder”. “São necessárias regras claras e transparentes para disciplinar estas matérias, regras que definam em que casos e com que condições o acesso e controlo da informação é permitido. Provavelmente, serão necessárias regras internacionais sobre esta matéria, porque a internet é um fenómeno global e só regulável eficazmente a nível global, concertadamente” (Luís Marques Mendes).

À questão se as redes sociais assumiram uma nova forma de contrapoder, registam-se opiniões muito coincidentes na sua essência partindo da afirmação “se não existissem as redes sociais a capacidade de intervenção dos movimentos cívicos tornar-se-ia impraticável” (José Carlos Mota), sendo

reconhecidas como uma maioria-anónima muito ativa e mobilizadora, fazedora de opinião e veiculadora de opinião feita. As redes sociais são consideradas ainda como uma logística cívica que amplia o impacto dos movimentos populares, tendo o mérito de alertar, por meio diverso, a classe política para a opinião, comentário ou decisões dos eleitos. Esta ideia é reforçada com a afirmação de que “as redes socias são complementares aos media tradicionais e permitem alguma individualização do coletivo, aproximando-se de anteriores ideais libertários, do comunitário em rede” (Adelino Maltez).

Quanto a uma eventual mais-valia para a democracia trazida pela presença dos movimentos populares baseados na Internet e nas redes sociais, não apenas pela capacidade de mobilização que evidenciam, como pelos desafios que colocam aos media tradicionais, neste aspeto encontramos respostas como a que defende que “o formato digital será o futuro na comunicação e as redes

sociais serão um bom exemplo, mas continuará a haver espaço para os media tradicionais e não fosse assim a rádio já teria sido extinta o que não aconteceu nem se prevê que venha a acontecer” (Maria Barbas).

Por outro lado, decorre das respostas que o que está em causa é a postura do promotor, que pontualmente pode enganar ao nível da manipulação e da mistificação da participação, assim como é considerado que o quarto poder ganhou concorrencialidade e melhorou com o surgimento das redes sociais, adaptando-se a estas, sendo também reconhecido que as TIC são um quinto

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poder temido pelo status quo da política, muito pelo volume de informação, verdadeira ou falsa e potencialmente prejudicial à cultura tradicional.

À questão “se é crível e sensato acreditar que os recursos da Internet servem os caminhos do diálogo e de aproximação entre os povos, culturas e ideologias, religiões e políticas, ou, por outro lado, se os poderes tendem a recorrer a essa capacidade instalada visando objetivos de controlo e dominação, verificamos existir alguma preocupação, sustentada, por exemplo em que “existe uma racionalidade própria de quem decide que não quer ser posta em causa e assim não há palco para qualquer discussão” (José Carlos Mota), reservas que se

estendem à escala dos valores pois é transmitida a ideia que “a rede pode ter necessidade de ter princípios e valores, sendo um lugar onde podem estar todos, mas é como na vida real - não pode valer tudo. Às vezes somos traídos pela grandeza da rede e pela ridicularidade dos seus promotores, existindo tentativas de apropriação dos movimentos sociais por meia dúzia de espertalhões, partidariamente definidos ou encapuçados que os tentam controlar” (Pe. Américo Aguiar).Mas a bondade deste meio também é reconhecida na sua essência ao ser afirmado que “desde que os valores democráticos de um povo ou de um país

não sejam colocados em causa não escandaliza que os estados retirem proveito dos recursos instalados, que ainda assim, deveriam servir o povo em primeira instância” (Maria Barbas).

Preocupações de outra ordem, quiçá não menos relevantes são as expressas por alguns entrevistados que defendem que “somos o que conhecemos e o que conhecemos é o que nos é dado a conhecer mais o que descobrimos ao informarmo-nos” O domínio do mundo não é e nunca será, absoluto e eterno.

(Sérgio Ribeiro). “A Internet foi obra de uma das superpotências como arma da

guerra fria. E nesse espaço continuam a realizar-se operações de guerra. Que, por enquanto, matam menos” (Adelino Maltez).