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Com a passagem do Estado Constitucional Liberal, característico do século XVIII e metade do século XIX, para o Estado Constitucional social

230 B O N A V I D E S . P a u lo . C u r s o d e D i r e i t o C o n s t i t u c i o n a l , p. 361

"’7 B U E C H E L E . P a u l o A r m í n i o T a v a r es . O P r i n c í p i o d a P r o p o r c i o n a l i d a d e e a i n t e r p r e t a ç ã o d a C o n s t i t u i ç ã o , p. 139

",s B U E C H E L E . P a u l o A r m í n i o T a v a res . O P r i n c í p i o d a p r o p o r c i o n a l i d a d e e a i n t e r p r e t a ç ã o d a C o n s t i t u i ç ã o , p. 140

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moderno do século X X , tanto a razoabilidade quanto a proporcionalidade239 assumem, sem dúvida, papel relevante na proteção e garantia dos direitos fundam entais do cidadão.

N este sentido leciona C E LSO A N TÔ N IO BANDEIRA DE M ELLO que

o atual Estado Social e Dem ocrático de Direito não pode ser concebido à margem dos princípios da razoabilidade e da m oralidade, pois ambos são seus elem entos caracterizadores. Assumem primordial im portância quando da análise de um Estado em concreto e da efetivação do disposto em seu perfil constitucional, já que, sem o atendimento destes princípios não se realiza, efetivam ente, a concepção teórica inform adora deste tipo de Estado.” 240

Inúm eras são as funções e aplicabilidade da razoabilidade , atuando ora como elem ento aferidor de constitucionalidade, ora como term ôm etro da legitim idade dos atos do poder público, ou, ainda, como parâm etro para aplicação da norma ao caso concreto pelo judiciário.

N este sentido, mais um a vez é lúcido o ensinamento de CELSO A N TÔNIO B A N D EIR A D E M ELO, para quem a

“ ...doutrina, ao se pronunciar sobre o princípio da razoabilidade, ora enfoca a necessidade de sua observância pelo Poder Legislativo, como critério para reconhecim ento de eventual inconstitucionalidade da lei, ora o apresenta com o condição de legitim idade dos atos adm inistrativos, ora aponta sua im portância para o judiciário quando da aplicação da norm a ao caso concreto. Isto dem onstra de form a cristalina que a 2' ; A s o s c i l a ç õ e s s e m â n t i c a s s o b r e o a s s u n t o s ã o s u b s t a n c i a i s . V á r ia s s ã o as e x p r e s s õ e s e m p r e g a d a s pe la doutrina: “p r i n c íp io da p r o p o r c i o n a l i d a d e ” ou " m a n d a m e n t o da p r o i b i ç ã o d o e x c e s s o " ( m a i s u t iliz a d o na E u r o p a C o n t in e n t a l) : " p r i n c í p i o d a r a z o a b il i d a d e ’" ( p r e f e r id a n o s i s t e m a c o m m o n k n v). N o B r a s il, a l o c u ç ã o " p rin c íp io da p r o p o r c i o n a l i d a d e ” é d e u s o m a is c o r r e n t e . C o n t u d o , nesta d i s s e r t a ç ã o o s t e r m o s r a z o a b ilid a d e e p r o p o r c io n a lid a d e s ã o t o m a d o s c o m o s i n ô n i m o s .

razoabilidade é essencial ao sistem a jurídico como um todo e que sua utilização é essencial à concretização do

^41 direito posto.”'

Na abordagem do tema da proporcionalidade, é inevitável colocar a questão do princípio da razoabilidade, haja vista que existe um a discussão doutrinária acerca da existência de distinção entre esses dois princípios. Muitos doutrinadores defendem a diversidade entre razoabilidade e proporcionalidade, m as não conseguem apresentar uma diferença capaz de separar os dois conceitos.

Nestes termos, LUÍS RO BERTO BA RRO SO afirm a que “nada m ais dram ático para uma ciência do que situações iguais serem identificadas por nom enclatura diversa, e, sobretudo, situações (...) diversas serem identificadas por igual denom inação.” 242

Para SUZANA DE TO LEDO BA RROS, trata-se apenas de diversidades conceituais para designar identidades de conteúdos, pois, “...os

alem ães utilizam, indiscriminadamente, o termo proporcionalidade ou proibição

de excesso ( Ubermass) para designar o princípio que os am ericanos tratam p o r

razoabilidade”' Em outra passagem a autora afirma que “ ... o princípio da proporcionalidade (,..)como construção dogm ática dos alem ães, corresponde a nada mais do que o princípio da razoabilidade dos norte-am ericanos, d esenvolvido mais de meio século antes, sob o clim a de m aior liberdade dos juizes na criação do direito.”244 241 M E L L O , C e l s o A n l ô n i o B a n d eira de. D i r e i t o A d m i n i s t r a t i v o e C o n s t i t u c i o n a l .p. 6 2 I ~4~ B A R R O S O , L u í s R o b er t o . O D i r e i t o C o n s t i t u c i o n a l e a E f e t i v i d a d e d e s u a s N o r m a s , p. 1 0 0 B A R R O S , S u z a n a d e T o l e d o . O p r i n c í p i o d a p r o p o r c i o n a l i d a d e e o c o n t r o l e d a c o n s t i t u c i o n a l i d a d e d a s l e i s r e s t r i t i v a s d e d i r e i t o s f u n d a m e n t a i s , p. 7 0 "44 B A R R O S , S u z a n a d e T o l e d o . O p r i n c í p i o d a p r o p o r c i o n a l i d a d e e o c o n t r o l e d a c o n s t i t u c i o n a l i d a d e d a s l e i s r e s t r i t i v a s d e d i r e i t o s f u n d a m e n t a i s , p. 5 4

Certo é que os conceitos se não se confundem , em muito se assem elham , posto que am bos visam a resguardar os direitos individuais e coletivos contra os abusos e excessos do poder público.

O que se pode afirm ar é que o term o razoabilidade teve origem nos Estados Unidos e é am plam ente utilizado nos países que adotam o sistema do

Common Law para designar o princípio de ponderação meio-fim e o sistema de

controle das restrições legais

O portuna, pois a lição de SU ZA N A DE TO LED O BARROS, acerca do princípio da razoabilidade no D ireito norte-am ericano, ao afirmar que “O juízo da razoabilidade leva em conta uma pauta de valores da sociedade que os magistrados ocupam -se de traduzir e, na aferição da proporcionalidade da m edida restritiva a direitos, sem pre é ponderada a relação de custo/benefício social.” 245

M A RIA SY LV IA ZA N ELLA D l PIETR O , por sua vez, afirma que, embora a doutrina faça referência aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, separadam ente, na realidade, “o segundo constitui um dos aspectos contidos no prim eiro. Isto porque o princípio da razoabilidade, entre outras coisas, exige proporcionalidade entre os m eios de que se utiliza a Adm inistração e os fins que ela tem que alcançar.” 246

Ainda sobre o assunto, um outro autor que faz uma análise profunda sobre o princípio da razoabilidade à luz da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é CA RLO S R O B ER TO SIQUEIRA DE CASTRO,

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B A R R O S , S u z a n a d e T o l e d o . O p r i n c í p i o d a p r o p o r c i o n a l i d a d e e o c o n t r o l e d e c o n s t i t n c i o n a l i d a c l e d a s l e i s r e s t r i t i v a s d e d i r e i t o s f u n d a m e n t a i s , p. 6 3

devido processo legal (diie process o f law). Assim , manifesta SIQ U EIR A DE CA STRO : “N essa visão limitadora do arbítrio legislativo, a cláusula do devido processo legal erige-se em escudo contra normas jurídicas e as decisões adm inistrativas irrazoáveis ou irracionais. Afasta-se, assim, o totalitarism o na tom ada de decisões capazes de interferir com a esfera de liberdade ou com os bens

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individuais dotados de utilidade social.”-

A seu turno, JUAN FRAN CISCO LINARES, publicista argentino, colaciona as várias acepções assumidas pelo termo razoabilidade. Assim: “

I) Na técnica se fala de meios razoáveis para o b ter certo fim. Quer dizer, se vislum bra um a certa racional adequação de meios e fins. Trata-se, pois, de um a razoabilidade técnica;

II) Em axiologia jurídica se fala de razoabilidade quando se busca o fundam ento dos valores específicos do plexo axiológico: solidariedade, cooperação, poder, paz, segurança, ordem e se o acha no valor de totalidade chamado justiça. A justiça é assim racionalizadora dos outros valores. Estes são razoáveis enquanto se fundam na justiça;

141 C A S T R O . C a r l o s R o b e r t o S iq u e ir a de. O d e v i d o p r o c e s s o l e g a l e a r a z o a b i l i d a d e d a s l e i s n a n o v a C o n s t i t u i ç ã o d o B r a s il , p. 157

II) Em ciência do direito a razoabilidade se apresenta quando se busca a razão suficiente de um a conduta com partida. Essa razão pode ser de essência, quando a conduta se funda em uma norm a jurídica; de existência quando o fundam ento é m ero fato de que o com portam ento jurídico se dá; e, de verdade quando tem fundam ento de justiça.” " 1

Conclui-se que tanto o termo razoabilidade quanto proporcionalidade, nada mais são que duas faces da m esm a m oeda. Neste sentido, o Supremo Tribunal Federal, em inúm eros pronunciam entos, tem tomado os termos com o sinônim os, ora em pregando razoabilidade, ora p ro p o rcio n alid ad e.249

3.6

ILUSTRAÇÃO

JURISPRUDENCIAL

SOBRE

A

RAZOABILIDADE

O exame da casuística, sobre ser capaz de enriquecer a abordagem sem pretensões de ordem estatística ou exauriente, destina-se apenas ao desiderato

ilustrativo. Aliás, os exem plos a seguir expostos, deveriam , ser analisados juntam ente com princípio da proporcionalidade no final desta dissertação, porém,

por motivos didáticos, houve por bem deixá-los aqui neste tópico.

24S L I N A R E S , Juan F r a n c is c o . R a z o n a b i l i d a d d e l a s l e y e s . p. 108 "a) E n la t é c n i c a se hab la d e m é d i o s r a z o n a b l e s para o b t e n e r c ie rio fin. E s d e c ir . s e m i e n t a un a c ie rta ra ci onal a d e c u a c i ó n d e m e d i o s a fines. S e trata, pu es. d e una r a z o n a b ili d a d té c n ic a , b) E n a x i o l o g i a jur ídica se ha b la d e r a z o n a b i li d a d c u a n d o s e busc a el f u n d a m e n t o d e l o s valore s e s p e c í f i c o s d e i p l e x o a x i o l ó g i c o : s o l i d a r id a d . c o o p e r a c i ó n , p o d er, paz. s e g u r id a d . or d en y s e lo halla en el v a lo r d e to ta lid a d l la m a d o justicia; c ) En c i ê n c i a dei d e r e c h o la r a z o n a b ilid a d s e p r e s e n t a c u a n d o se b u s c a la r a z ó n s u f i c i e n t e d e una c o n d u t a c o m p a r ti d a . E s a r azón pu ed e se r d e e s e n c ia , c u a n d o la c o n d u c ta se fu n d a e n u n a n o r m a jurídica; d e e x i s t e n c i a c u a n d o el f u n d a m e n t o e s el m e r o h e c h o d e q u e el c o m p o r t a m i c n t o j u r í d i c o s e da ; e d e v e r d a d c u a n d o t i e n e f u n d a m e n t o d e j u s t i c i a . ” 249 E m e n t á r io d o S T F , n° 19 5 2 -1 . p. 136. E m e n t á r i o n° 1 9 5 0 - 3 , p. 4 6 3

postergados pelo legislador infraconstitucional, nem pode este desnaturá-los editando leis que com eles conflitem , quer frontalmente, quer por via oblíqua, sob pena de afronta ao princípio da razoabilidade e, conseqüentemente, ao princípio da le g a lid a d e .2:10

R E C A SÉ N S SICH ES, com propriedade, aponta a necessidade da observância do princípio da razoabilidade pelo Poder Judiciário. O s ensinam entos do m estre estão sintetizados de form a lapidar no seguinte trecho de sua m onum ental obra intitulada Nueva Filosofia de la Interpretación dei

Derecho:

“O juiz, para averiguar qual a norma aplicável ao caso particular submetido à sua jurisdição, não deve deixar-se levar por meros nom es, por etiquetas ou conceitos classificatórios, mas, pelo contrário, tem que ver quais são as normas, pertencentes ao ordenam ento jurídico positivo a ser aplicado no caso concreto, que ao dirim ir o conflito estejam em consonância com os valores albergados e priorizados por este m esm o ordenam ento.”251

E m face do exposto, pode-se concluir que o princípio da razoabilidade determ ina a coerência do sistema e que a falta de coerência, de racionalidade de qualquer lei, ato adm inistrativo ou decisão jurisdicional gera vício de legalidade, pois o D ireito é feito por seres e para seres racionais, para ser aplicado em um determ inado espaço e em uma determ inada época.-' -

2:iU M E L L O . C e l s o A n t ô n i o B a n d e i r a d e . D i r e i t o A d m i n i s t r a t i v o e C o n s t i t u c i o n a l , p. 6 2 2

2:11 S I C H E S , R e e a s é n s . N u e v a F i l o s o f i a d e i Inter pr eta ción d ei D e r e c h o . A p u d M E L L O , C e l s o A n t ô n i o B a n d e i r a de. D i r e i l o A d m i n i s t r a t i v o e C o n s t i t u c io n a l . p. 6 2 3

113

Através da análise da razoabilidade, tam bém se verifica se os vetores que inform am um determ inado sistem a jurídico foram ou não obedecidos. A desobediência a esses vetores macula de ilegalidade o ato expendido, quer em sede administrativa, legislativa ou jurisdicional.2:i?

Averbe-se, pois, que o exercício da função norm ativa costuma importar em toda sorte de classificações legislativas. Para CA R LO S ROBERTO SIQUEIRA DE CA STRO “ Pode-se m esm o afirm ar que legislar significa classificar.”254. Neste contexto, a m oderna teoria constitucional tende a exigir que as diferenciações normativas sejam razoáveis e racionais. Isto quer dizer que a norma classificatória não deve ser arbitrária, im plausível ou caprichosa, devendo, ao revés, operar com o meio idôneo, hábil e necessário ao atingim ento de finalidades constitucionalm ente válidas. Para tanto, há de existir uma indispensável relação de congruência entre a classificação em si e o fim a que ela se destina.255 Do contrário, os legisladores e adm inistradores estatais poderiam , de form a ilim itada e arbitrária, estabelecer toda sorte de discrim inações, por m ais despropositadas ou destituídas de fundam ento que pudessem ser. Registre-se que a Constituição Federal de 1988, de acordo com a redação do postulado isonôm ico de que “todos são iguais perante a

lei, sem distinção de qualquer natureza”, veda quaisquer discrim inações sem um

fundam ento plausível e razoável.256

Cf. M E L L O . C e l s o A n t ô n i o B a n d eira de. D i r e i t o A d m i n i s t r a t i v o e C o n s t i t u c i o n a l , p . 6 2 4

C A S T R O . C a r lo s R o b e r t o Si q ueir a de. O d e v i d o p r o c e s s o l e g a l e a r a z o a b i l i d a d e d a s l e i s n a n o v a C o n s t i t u i ç ã o d o B ra s il , p. 155

C A S T R O . C a r l o s R o b e r t o Si q ueir a de. O d e v i d o p r o c e s s o l e g a l e a r a z o a b i l i d a d e d a s l e i s n a n o v a C o n s t i t u i ç ã o d o B r a s i l . p. 157

Exem plos de classificações legislativas extravagantes e injustificadas são im aginadas por CA RLO S ROBERTO SIQUEIRA DE CASTRO

“ ...se se conduzir de modo diferente, poder-se-ia estabelecer, por exemplo, e por absurdo que pareça, tratam ento legislativo distinto entre proprietário de autom óveis verdes e proprietários de automóveis am arelos, ou entre o tipo de penteado das pessoas, ou entre canhotos e destros, isto para fins de habilitação em concurso para provimento de cargos burocráticos no serviço público ou para fins de obtenção de financiam ento imobiliário junto ao sistema financeiro de habitação, o que, a toda evidência, não guarda a mínima

9 “S7

correlação com tais critérios classificatórios.”"'

Outro exem plo não menos bizarro seria aquele que proibisse em pregados portadores de diabetes de serem eleitos para cargos de direção nos sindicatos respectivos, já que tal doença não guarda nenhum a correlação com a atividade proibida. Todos esses exem plos revelam a ruptura do vínculo de congruência entre os fins visados pela regra classificatória e os meios a que ela pretensam ente serve e que ela própria edita para o seu pleno atingim ento. O preceito norm ativo, nesse caso, soa irrazóavel, irracional, e por certo injusto, eis que nada auxilia para a consecução de finalidade constitucionalm ente válidas. Ao revés, a diferenciação jurídica carece de m otivação idônea, restando sem alicerce de

9^S fundam entação, capaz de autorizar o descrim e le g islativ o ."c

C onsiderou-se ainda discrim inatório, portanto, carente de razoabilidade, a exigência da prova de esforço físico no concurso para ingresso na carreira de delegado de polícia federal, por entendê-la desnecessária para o

2:17 C A S T R O , C a r l o s R o b e r t o S i q u e ir a de. O d e v i d o p r o c e s s o l e g a l e a r a z o a b i l i d a d e d a s l e i s . d a s l e is na n o v a C o n s t i t u i ç ã o d o B ra s il, p. 16 3

C A S T R O , C a r l o s R o b e r t o S i q u e ir a d e . O d e v i d o p r o c e s s o l e g a l e a r a z o a b i l i d a d e d a s leis n a n o v a C o n s t i t u i ç ã o d o B r a s i l . p. 16 4

exercício da função policial de nível superior. Na em enta do acórdão, da lavra do M inistro W ashington Bolivar, restou com provada a ofensa ao princípio da razoabilidade, nestes termos: “Adm inistrativo: C oncurso público - delegado de

polícia federal - prova de esforço físico - teste de C ooper - 1) C andidato que comprovou gozar de boa saúde f ísica e psíquica, nos term os do art. 9, inciso V, da L ei n 4.878/65. A prova do esforço físico deve ser aferida nos term os legais e de fo rm a razoável, p o is Delegado manda e os agentes, em regra, é que executam as ordens; trabalha, usualmente, em gabinete e dificilm ente, mesmo em diligência, teria ele próprio de sair correndo atrás de delinqüentes. Procedentes do TRF.

959 2 )Remessa de ofício denegada "

Igualmente, em uma outra oportunidade, o Tribunal Regional Federal qualificou de irrazoável a exigência da entrevista como requisito de habilitação para o cargo de diplomatas. Foi questionada a Portaria n° 474/78 do M inistério das Relações Exteriores, que estabeleceu normas para adm issão na carreira de diplom atas. O ato ministerial exigia, dentre outras disposições, que os candidatos, após aprovação das provas intelectuais, fossem subm etidos a entrevistas para verificar características pessoais que devem ser adequadas à carreira de diplom atas. Eis o acórdão de lavra do M inistro Leitão Krieger:

“Adm inistrativo - Concurso público - aptidão p a ra o ingresso na carreira diplomática - aferição através de entrevista de natureza subjetiva, determ inada em portaria m inisterial sem respaldo em norma legal, e realizada após aprovação do candidato nos exames intelectuais a que se submeteu. Entrevista a que não se pode

2y) C A S T R O . C a r lo s R o b e r t o S iq u e ir a d e . O d e v i d o p r o c e s s o l e g a l e a r a z o a b i l i d a d e d a s l e i s n a n o v a 115

em prestar validade como fa to de elim inação de candidatos ao prosseguim ento no concurso, sobretu do quando, ao seu término, aqueles que a realizaram se limitaram a afirmar, sem qualquer justificativa, de maneira dogmática, não considerar o candidato com o po ssuid or de aptidão necessária ao exercício da carreira diplom ática (fls., 77-78). A afirm ação assim, fe ita torna insuscetíveis de exame, quer pelos p ró p rio s candidatos, com o pelo Judiciário, os reais motivos que determ inaram , tanto podendo p o ssib ilita r a prática de arbítrio ou de odiosa discrim inação, a ensejar se torne letra m orta o disposto na Lei Maior. M andado de segurança que se c o n c e d e 260

É digno de m enção, neste sentido, que, modernam ente, se tem exigido em sede tanto doutrinária quanto jurisprudencial, sobretudo, alhures, que a classificação legislativa não adote, em primeiro lugar, diferenças constitucionalm ente vedadas (com o raça, sexo, religião etc) e que, além disso, seja a distinção n o rm ativ a “ razoável” , o que significa dizer, revestida de racionalidade e plausibilidade. Em outras palavras, a classificação não deve ser arbitrária, sob pena de desm erecer o respeito dos súditos da lei, o que no mais das vezes conduz à instabilidade da ordem jurídica.261

A dverte, contudo, C A R LO S RO BERTO SIQUEIRA DE CA STRO que,

“a ofensa a Lei M aior da nação pode ocorrer tanto frontalm ente quanto por via oblíqua, sendo esta última, aliás, a m aneira mais freqüente de contrariedade à C o n s t i t u i ç ã o d o B r a s i l . p . 192

260 C A S T R O , C a r l o s R o b e r l o S iq u e ir a d e . O d e v i d o p r o c e s s o l e g a l e a r a z o a b i l i d a d e d a s l e i s n a n o v a C o n s t i t u i ç ã o d o B r a s i l , p. 1 9 4 - 1 9 4

21,1 C f. C A S T R O , C a r l o s R o b e r to S iq u e ir a d e . O d e v i d o p r o c e s s o l e g a l e a r a z o a b i l i d a d e d a s n a n o v a C o n s t i t u i ç ã o d o B r a s i l , p. 166

Constituição. Por essa razão, os órgãos do Poder Judiciário devem estar conscientes de que as leis e os atos em geral do Poder Público não raro discrepam do estatuto supremo e lesionam direitos fundam entais de modo apenas indireto e até m esm o disfarçado. Haverão os intérpretes e aplicadores da Constituição de extrair do docum ento supralegal o m áxim o de utilidade social e de diretrizes para a pacificação dos conflitos de interesses que assolam a com unidade política, isto segundo os superiores princípios da ju stiça e da igualdade, dentre outros mais entronizados na C onstituição.” 262

Portanto, a razoabilidade não se restringe apenas à m era análise para conferir se um ato, uma lei ou uma sentença foram editados, ou não, de form a coerente com as normas que os presidiram. O princípio da razoabilidade com preende, além da análise da coerência dos atos ju ríd ico s, a verificação de que esses atos foram ou não editados com reverência a todos os princípios e normas com ponentes do sistema jurídico a que pertencem, isto é, se esses atos obedecem ao esquem a de prioridades adotados pelo próprio sistem a.263

O princípio da razoabilidade propicia, portanto, a fiscalização da obediência a todos os dem ais princípios e regras albergados pelo sistem a. Assim ,

quando o aplicador da norm a elege prioridades sem atentar para os vetores indicativos do sistema, está incorrendo em com portam ento ilícito por desobediência ao princípio da razoabilidade.264

À guisa de ilustração, veja-se exem plos de situações concretas colacionadas do sistema constitucional brasileiro. N ão poderia ser considerada

262 C A S T R O , C a r l o s R o b e r to S iq u e ir a d e . O d e v i d o p r o c e s s o l e g a l e a r a z o a b i l i d a d e d a s l e i s n a n o v a C o n s t i t u i ç ã o d o B r a s il , p. 185

~6’ M E L L O , C e l s o A n t ô n i o B and eir a de. D i r e i t o A d m i n i s t r a t i v o e C o n s t i t u c i o n a l , p . 6 2 4 2(>J M E L L O . C e l s o A n t ô n i o B a n d e ir a de. D i r e i t o A d m i n i s t r a t i v o e C o n s t i t u c i o n a l , p. 6 2 5

Art. 3o. C onstituem objetivos fundam entais da República Federativa do Brasil: I - construir um a sociedade livre, ju sta e solidária;

II- erradicar a pobreza e a m arginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais.

Se isso não baste, dispõe o art. 170, incisos VII e VIII:

Art. 170. A ordem econôm ica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conform e os ditam es da ju stiça social, observados os seguintes princípios:

I - redução das desigualdades regionais e sociais; II - busca do pleno em prego.

Ora, qualquer adm inistrador que tivesse alguma noção da im portância dos princípios fundam entais de direito público, ou algum acatamento aos ditam es constitucionais, por certo detectaria, de imediato, a invalidade manifesta, que eivaria de form a insanável política e econôm ica que prestigiasse as desigualdades sociais e regionais, ou que reduzisse a possibilidade de emprego, lançando a população na pobreza e aviltando a dignidade do ser hum ano. Aliás, o princípio da razoabilidade basta para dem onstrar que políticas recessivas não podem ser validadas pelo nosso sistem a juríd ico positivo.265

119

3.7

INTERPRETAÇÃO

CONSTITUCIONAL:

ESPECIFICIDADES

Urgem, neste momento, breves comentários sobre a interpretação da C onstituição como, “ ...síntese da organização política e juríd ica do Estado e repositório suprem o das normas fundam entais.”266 Cumpre esclarecer, desde logo, que se furtará, este item, das discussões teóricas e das “querelas m etodológicas” da interpretação constitucional, em face das limitações deste trabalho. Tratar-se-á-se, tão som ente, de apontam entos e algumas especificidades da herm enêutica constitucional.

Em bora a interpretação constitucional não seja, em rigor, diferente da interpretação das normas jurídicas em geral, guardam, todavia, algumas particularidades dignas de registro. Esse é o entendim ento de A N N A CÂ NDIDA DA C U N H A FERRAZ, para quem

“ ...a interpretação constitucional é espécie do gênero

interpretação jurídica, porém revestida de

características e critérios peculiares, derivados especialm ente, da natureza e das notas distintivas das disposições constitucionais: suprem acia e rigidez constitucional, deferentes conteúdos das normas constitucionais, caráter sintético, esquem ático e genérico da Constituição.”267

Sem elhante entendim ento é professado p o r SÍLVIO D O B R O W O L SK I, ao afirm ar que “...dois aspectos sobrelevam do texto constitucional quando alguém se debruça sobre ele, para com preender os preceitos

ali fixados: a grande cópia de valores am bíguos, im precisos e a natureza política das muitas opções valorativas para o preenchim ento do seu significado.”268

Com efeito, com pulsando a C onstituição da República Federativa do Brasil de 1988, vê-se, de início, insculpido nos prim eiros artigos termos não unívocos, tais como, soberania, cidadania, dignidade da pessoa hum ana, sociedade livre, justa e solidária, desenvolvim ento nacional, prevalência dos direitos humanos, dentre outros tantos perm eados por todo o texto constitucional.

Para JO R G E M IR A N D A , a interpretação constitucional não é de natureza diferente das que se opera em outras áreas, adotando, contudo algumas especialidades. Para o m estre lusitano

“ ...a interpretação constitucional tem de ter em conta condicionalism os e fins políticos inelutáveis e irredutíveis, mas não pode visar outra coisa que não sejam os preceitos e princípios jurídicos que lhes correspondem . Tem de olhar para a realidade