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AUTOR(ES) DIFICULDADES IDENTIFICADAS COM DOCENTES

3. APRENDER A ENSINAR NA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES DE QUÍMICA

3.1 Aprender a ensinar Química

Nas últimas décadas, a linha de investigação conhecida como Conhecimento Profissional do Professor ou Saberes Profissionais do Professor (PÓRLAN, 2003) tem merecido destaque nas produções em âmbito educacional, alçando uma série de questionamentos sobre o que deveria saber o professor em termos de conhecimentos científicos, filosóficos e educativos e, principalmente, o modo como deveria ensinar, ou seja,

as estratégias didáticas que o professor deve adotar para uma melhoria na aprendizagem de seus alunos (LIMA, 2007).

Segundo Bolívar Botía e Bolívar Ruano (2012), o ato de ensinar não é uma tarefa simples, principalmente quando se considera que está em jogo o futuro da educação de nossos jovens.O ensino não é uma tarefa que pode ser praticada, como por vezes alguns tentam crer, naturalmente. A familiaridade cotidiana com a educação dá origem a entender, erroneamente, que uma vez que todos ensinam qualquer um também pode ensinar. Porém, os autores reforçam que esta não é uma atividade simples. Ensinar é uma atividade que requer um trabalho especializado e alta qualificação para saber como conduzi-la com qualidade para atingir seus objetivos. É, portanto, necessário ao professor em formação inicial aprender a ensinar.

Melhorar radicalmente a formação profissional dos professores partindo do que já conhecemos sobre a prática do ensino e suas demandas substanciais é, de acordo com Ball e Forzani (2010), uma necessidade imediata. Para que isso possa acontecer, as autoras destacam dois pontos:

a) O ensino requer um conjunto de habilidades que os futuros professores devem aprender e demonstrar antes de assumir o comando de uma sala de aula. É necessário identificar um conjunto de competências educacionais, fundamentais para garantir um bom ensino.Em vez de generalidades, essas habilidades devem referir-se a práticas específicas de gestão de ensino ou ensinar o conteúdo.

b) Promover a prática dos licenciandos sobre a base destas competências e habilidades, não permitindo que possam exercer a docência em uma sala de aula sem que antes demonstrem que têm um bom nível de domínio dessas competências.

Para Marcelo (2012), são indispensáveis boas políticas de formação inicial de professores que lhes assegurem as competências a serem requeridas ao longo de sua trajetória profissional, uma vez que a aprendizagem dos alunos depende em grande parte do que os professores conhecem sobre o que ensinam e o que podem fazer com esse conhecimento.

Os pesquisadores Korthagen, Loughran e Russell (2006) publicaram, em seu artigo

“Developing fundamental principles for teacher education programs and practices”, o

resultado de uma pesquisa que fizeram em três universidades sobre a importância de se aprender a ensinar nos cursos de formação de professores. Desse estudo, os autores propuseram sete princípios que consideram fundamentais incluir nos programas de formação inicial de docentes:

2. Aprender a ensinar envolve demandas continuamente conflitantes e concorrentes: a formação inicial de professores deve focar em como aprender com a experiência e como construir seu conhecimento profissional;

3. Aprender a ensinar requer uma visão de conhecimento como algo a ser criado em vez de entendê-lo como já adquirido;

4. Aprender a ensinar exige uma mudança de enfoque do currículo para o aluno; 5. Aprender a ensinar demanda do professor em formação o hábito de pesquisar sua

própria prática;

6. Aprender a ensinar requer a prática de se trabalhar em colaboração com seus pares; 7. Aprender a ensinar demanda relações significativas entre escolas, universidades e

professores em formação;

8. O processo de aprender a ensinar é reforçado quando os enfoques no ensino e na aprendizagem são abordados pelos professores formadores em sua própria prática docente.

Segundo esses autores, a articulação desses princípios propõe uma forma de

construção do “aprender a ensinar”, abordagem habitualmente tratada como importante pelos

pesquisadores em educação e que faz a diferença na formação inicial de professores.

Com uma visão análoga a esses autores em alguns pontos, Imbernón (2012) afirma que o processo de aprender a ensinar no professor em formação vai além de conhecer as teorias psicopedagógicas ou técnicas metodológicas, estimular e favorecer a colaboração com outros profissionais. É preciso interagir e aprender com seus pares, ampliar a comunicação entre os especialistas, desenvolver a consciência de que ensinar e aprender são atividades complexas e que o ensino está imbuído de muita diversidade. Para tanto, conhecer as necessidades dos alunos e do contexto é essencial para um bom desenvolvimento da aprendizagem.

O ensino das Ciências Naturais no ensino médio tem sido indicado como o espaço em que estudantes e docentes vivenciam processos de construção de sentidos e de significados, a partir do diálogo das ciências e destas com os espaços culturais e com o ambiente. A reflexão

– derivada de práticas próprias ao contexto científico como a descrição, a ordenação, a leitura,

a interpretação, entre outras, combinadas com as práticas culturais – contribui para a melhor compreensão do sentido de estudar, de ensinar e de aprender pelos professores em formação (SILVA; CICILLINI, 2012).

Para Núñez (2012, p.49):

Aprender a ensinar ciências significa a apropriação de conhecimentos, habilidades, competências nas bases teóricas em que se fundamenta a Didática das Ciências. Os futuros professores devem aprender a tomar decisões de natureza didático pedagógica, a questionar o pensamento didático tradicional, a inovar e desenvolver uma prática de ensino ética,

pautada pela responsabilidade social de garantir aos estudantes o direito constitucional de aprender e desenvolverem-se como cidadãos críticos. O professor que ensina ciências, entre eles os professores de Química do ensino médio, é um profissional que desenvolve sua atividade num contexto escolar complexo e dinâmico, na base de saberes e competências específicas para ensinar (NÚÑEZ, 2012). O aprender a ensinar é fundamental durante a formação inicial dos professores. É este o ambiente que deve preparar o futuro docente para sua vida profissional, garantindo-lhe uma formação que o permita crescer profissionalmente e possibilite, consequentemente, um ensino de qualidade para seus futuros estudantes.

Aprender a ensinar em ciências vai muito além de aprender os conteúdos específicos a ensinar. Segundo Carrascosa et al. (2008), os futuros professores de ciências necessitam de outros conhecimentos básicos, tais como:

a) Saber orientar o trabalho dos alunos e como manter um clima adequado para o desenvolvimento da aula;

b) Saber como avaliar, não só os alunos, mas também sua prática a fim de melhorar o processo de ensino e aprendizagem;

c) Saber selecionar os conteúdos mais adequados e dominar os critérios para justificá-los e sequenciá-los;

d) Saber o que fazer para motivar os alunos para que tenham interesse em aprender ciências.

Para Galagovsky (2007), as disciplinas científicas, entre elas a Química, usam linguagens complexas e, segundo abordagens recentes, aprender ciência é aprender a falar ciência. As linguagens da Química são, especialmente, difíceis de processar pelas mentes dos estudantes, ou seja, uma mesma representação (verbal, gráfica, de fórmulas, entre outra outras) pode remeter a significados diferentes quando é interpretada por um professor ou por um aluno. A interpretação de gráficos cartesianos como conteúdo específico do conhecimento profissional do professor de Química deve ser aprendida por estes para que possam ensinar adequadamente a seus alunos.

A formação inicial docente deve extrapolar os limites de um ensino que pretende uma simples atualização de conhecimentos específicos e pedagógicos, pois deve permitir espaços de participação, reflexão e formação de modo que esses futuros professores aprendam e adaptem-se tendo elementos que os permitam conviver com a mudança e a incerteza do cotidiano da sala de aula (IMBERNÓN, 2000).

Maldaner (2000) afirma ser imperativo considerar que formar um químico é diferente de formar um professor de Química. Para o autor, o licenciando deve aprender os conteúdos de Química, pois estes são essenciais para o seu conhecimento profissional, mas não pode deixar de receber os instrumentos necessários para auxiliá-lo na adequação desse conhecimento ao ensino médio.

Quanto ao processo de aprender a ensinar na formação inicial do professor de Química nos cursos de licenciatura, Neves et al. (2001) determinam que, entre outros fatores, é necessário considerar que:

a) os futuros professores têm ideias sobre como ensinar, normalmente fundamentadas em suas experiências de muito tempo nas escolas. Essas ideias precisam ser fonte de questionamento e reconstrução;

b) não é possível aprender a ensinar estudando apenas teoricamente como fazer essa tarefa profissional. A prática, vinculada à teoria, à reflexão, à pesquisa, numa perspectiva crítica, é um elemento essencial da formação profissional. A formação do Licenciado em Química é decorrente da conexão teoria/prática durante todo o processo formativo, e não apenas em estágios ou práticas profissionais de caráter terminal no curso;

c) desenvolver atitudes positivas frente à ciência, abranger os processos de construção do conhecimento científico, as relações da ciência com a tecnologia e a sociedade;

d) ter uma densa formação científica (domínio dos conteúdos da Química) e

pedagógica (a educação integral dos alunos, no contexto escolar, sob as condições da Educação para o Século XXI, expresso no que tem-se caracterizado como o Novo Ensino Médio no Brasil).

A formação do licenciado em Química sugere o trabalho sob uma ótica dialética das relações existentes entre os diversos saberes. É comum os saberes disciplinares serem estudados à margem do saber pedagógico dos conteúdos, uma vez que a formação desse licenciado ocorre num contexto desprofissionalizante. O aprender a ensinar Química normalmente é desenvolvido apenas nas disciplinas de Estágio ou Prática de Ensino, como uma das últimas atividades da formação.

A Didática das Ciências tem indicado que ensinar Ciências é uma tarefa complexa, uma atividade profissional. A formação dos licenciados em Química, no contexto dos cursos de licenciatura atuais, quase não tributa com elementos para uma base de conhecimento que vise à profissionalização da docência. Com isso, o aprender a ensinar Química torna-se algo

que os professores, quando começam o exercício da profissão, precisam resolver a partir de suas experiências anteriores com o ensino.