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O desenvolvimento da experiência formativa teve duração de aproximadamente quarenta dias. Nesse período, foram realizados quinze encontros não estando todos os licenciandos ao mesmo tempo, em todos os instantes, em função da disponibilidade de tempo para participarem consecutivamente. Cada um deles participou em torno de oito encontros (normalmente apenas um por semana), sendo que os destinados ao Diagnóstico Inicial e à

elaboração da B.O.A. desenvolveram-se com a presença de todos os licenciandos. Neste capítulo, apresentaremos os resultados encontrados no processo de formação da

habilidade de interpretar gráficos cartesianos a partir da teoria de Galperin. Primeiramente, abordaremos o desdobramento do Diagnóstico Inicial da referida habilidade em meio aos licenciandos em Química da UFRN selecionados para este estudo. Em seguida, exporemos como se desenvolveu a experiência formativa com os referidos licenciandos, culminando na análise dos resultados da etapa de Controle Final e com o resultado da avaliação do processo de formação da habilidade na concepção dos licenciandos participantes do estudo.

7.1 Processo de diagnóstico inicial da habilidade de interpretar gráficos cartesianos

O diagnóstico inicial buscou responder ao primeiro objetivo específico desta investigação: “diagnosticar o nível de desenvolvimento da habilidade de interpretar gráficos

cartesianos, em licenciandos da área de Química”.

No início do processo, este pesquisador informou aos licenciandos que seu trabalho possuía como objeto a formação da habilidade de interpretar gráficos cartesianos. Nesse momento, os estudantes manifestaram-se e quatro, especificamente, alegaram ter muitas dificuldades para trabalhar com esses tipos de gráficos.

Aos estudantes, foi dito que o trabalho embasava-se na Teoria Histórico-Cultural, mais especificamente na Teoria da Formação por Etapas das Ações Mentais e dos Conceitos de Galperin. Perguntados se conheciam essa teoria, todos os licenciandos afirmaram que nunca haviam tido contato com o mencionado referencial teórico.

Explicou-se também que, por essa habilidade fazer parte de seu vindouro contexto profissional como futuros professores, a participação neste trabalho, além de poder contribuir com a produção de conhecimento sobre a habilidade de interpretar gráficos cartesianos e a teoria de Galperin, seria também um contributo à formação de seus saberes profissionais. Adicionalmente, foi explanado que a formação a partir da referida teoria possibilita a

organização do conteúdo de uma forma diferente em que se trabalha do geral ao particular, em que o sistema de operações é aprendido de forma consciente, independente e com possibilidades de transferência a outros contextos, possibilitando aos licenciandos familiarizar-se com outra forma de ensinar.

Para identificar o grau de desenvolvimento da habilidade nos licenciandos, foi aplicada uma tarefa para a qual se requeria que interpretassem um gráfico cartesiano da área de Química. Para tanto, a tarefa trazia a seguinte solicitação: “Interprete o gráfico. Para isso

escreva o máximo de informações que podem ser obtidas do mesmo”. A tarefa utilizada no diagnóstico inicial é identificada no Sistema Didático como Tarefa I – DI. Essa forma de interpretar um gráfico corresponde com a qualidade da atividade que se deseja formar, cuja diferença com o ensino tradicional reside no aspecto de que neste são fornecidos aos estudantes os detalhes do que devem responder enquanto, na atividade objeto do diagnóstico, a interpretação do gráfico é demandada de modo global, orientada à busca e interpretação de toda a informação possível nesse tipo de representação.

Os licenciandos deveriam observar os dados da situação apresentada e escrever na folha em branco todas as informações que conseguissem extrair do gráfico, conforme solicitado no enunciado. Enquanto eles resolviam a tarefa, este pesquisador acompanhou-os realizando anotações sobre o que cada um fazia.

Durante a aplicação, apenas o licenciando L4 fez comentários sobre a resolução da tarefa, informando que nunca havia resolvido um gráfico de maneira tão “aberta”, sem haver- lhe sido disponibilizado o que deveria ser encontrado.

Na resolução da tarefa, esperava-se que os estudantes conseguissem identificar, explicar e fazer predições de todos os aspectos principais que se encontram no gráfico: as variáveis envolvidas e suas diversas características, o fenômeno envolvido e seu comportamento e as características dos pontos assinalados (origem, A e B), conforme as 14 (quatorze) operações previstas no modelo da atividade estruturado por meio do Método Teórico e que constitui a B.O.A. tipo III, no Anexo I desta Tese.

Tomado como referência o modelo da atividade, analisamos o percentual de informações que os licenciandos conseguiram interpretar do gráfico nessa tarefa inicial. Para o calculo do percentual de informações corretas (ICDI), utilizou-se a fórmula:

Aonde: ICDI = Informações Corretas no Diagnóstico Inicial (%) e,

Total de informações possíveis de se interpretar = 14 Os resultados obtidos podem ser observados na Tabela 2.

Licenciando Acertos (%) L1 71,0 L2 57,0 L3 64,0 L4 71,0 L5 57,0 L6 64,0

Analisando os dados da Tabela 2, observa-se que todos os licenciandos interpretaram corretamente mais de 50% das informações previstas. Porém, quatro deles interpretaram menos de 65% das informações (L2, L3, L5, L6). Destacaram-se dos demais os licenciandos L1 e L4, que obtiveram mais de 70% das informações esperadas. Esses dados demandaram a necessidade de analisar de modo mais aprofundado o diagnóstico aplicado a fim de identificar quais informações os licenciandos tiveram mais dificuldades para interpretar. Essa informação é primordial para o desenvolvimento do processo formativo, uma vez que é necessário considerar as dificuldades existentes para que se atinja o objetivo de formar a habilidade de interpretar gráficos cartesianos.

Para permitir uma visão global do desenvolvimento dos licenciandos ao resolverem a tarefa, foi organizado um resumo no Quadro 17, no qual estão marcados com um “X” as operações realizadas corretamente por cada um deles, considerando o modelo da atividade que se pretende formar.

Operações realizadas pelos licenciandos

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 L ice nc iand o s L1 X X X X - X X - X - - - X - L2 X X X - - X X - X - - - - - L3 X X X X - X X - X - - X - - L4 X X X X - X X X X - - - X - L5 X X X - - X X - X - - - - - L6 X X X - - X X - - - - - - X

Observa-se neste quadro que, das quatorze operações do modelo da atividade, apenas cinco (1, 2, 3, 6 e 7) foram interpretadas corretamente por todos os licenciandos. Analisando

Fonte: Próprio autor

Tabela 2 – Informações interpretadas corretamente na tarefa de Diagnóstico Inicial

essas cinco operações, a primeira referia-se à identificação da existência de um plano cartesiano. A segunda demandava a interpretação das variáveis ou grandezas existentes no gráfico. Na operação três, esperava-se que o estudante representasse as grandezas utilizando as unidades de medida corretas. A operação seis estava associada à identificação dos valores relacionados às variáveis e, na sétima operação, o estudante deveria representar corretamente os pontos existentes, indicando os valores de abscissa e ordenada. Observe-se que, apesar de não estar explícito o que se deve interpretar do gráfico – como ocorre normalmente nas questões escolares – as operações realizadas corretamente por todos os licenciandos são aquelas que aparecem com mais frequência em atividades envolvendo gráficos cartesianos. Tais resultados remetem-nos a vários estudos que consideraram em suas pesquisas que os estudantes conseguem interpretar gráficos cartesianos apenas em um nível elementar, ou seja, interpretar apenas suas características mais básicas (MARKOVITS, BAT-SHEVA, BRUCKHEIMER, 1986; LEINHARDT, ZALAVSKY, STEIN 1990; ROTH, MCGUINN, 1997; ROTH, BOWEN, 1999; CUESTA, 2007).

Merece destaque nesta análise as seis operações que, no máximo, um licenciando conseguiu resolver, a saber: 5 – classificar o tipo das variáveis como discretas ou contínuas; 8

– discriminar as variáveis independente e dependente; 10 – determinar a(s) relação(ões) entre

as variáveis; 11 – identificar características atípicas no gráfico; 12 – identificar a possibilidade de interpolações e 14 – atribuir um título ao gráfico, se necessário. Se comparados com a literatura sobre dificuldades de estudantes e docentes na interpretação de gráficos, observamos que resultados semelhantes, quanto às operações 5, 10 e 11 são relatados, entre outros, por Cuesta (2007), García e Palacios (2007a), Dolores (2004), Pró (2003), Bell e Janvier (1981).

Concernente às operações 8 e 11, outros estudos, como os de Leinhardt, Zalavsky e Stein (1990), Deulofeu (1993, 1995), Astudillo e Hernández (2004) e Pereira, Uehara e Núñez (2009) identificaram em suas pesquisas resultados semelhantes.

Quanto à primeira operação, “identificar se existe um plano cartesiano”, resolvida corretamente por todos os estudantes, a análise não se restringiu a verificar se o licenciando relatou explicitamente a existência deste plano. Entendeu-se que, se o licenciando trabalhava com o plano de alguma forma, estava identificando-o. Nesse caso, se todos foram capazes de identificar pontos informando suas coordenadas – abscissa e ordenada – entende-se que os licenciandos consideraram a existência do plano cartesiano.

O participante L5 interpretou o gráfico de modo muito simples, sem detalhamentos e sem explorar as várias possibilidades de informação, não deixando totalmente claras as

Figura 21 – Exemplo de resolução do Diagnóstico Inicial – Licenciando L5 Fonte: Caderno de registro de atividades

informações interpretadas. Porém, durante a análise das respostas dos licenciandos, buscou-se encontrar nas resoluções tudo o que fosse entendido como pertinente às operações previstas no modelo da atividade. Segue um exemplo dessa situação na Figura 21, referente à interpretação do licenciando L5.

Observou-se, na resolução, que o licenciando que executou corretamente o menor número de operações foi muito sucinto em sua interpretação, não explicitando as demais operações que se esperava que fossem realizadas. Utiliza-se o verbo “esperar” porque os licenciandos não tiveram acesso ao modelo da atividade elaborado pelo pesquisador previamente.

Considerando esse panorama, a natureza qualitativa desta pesquisa leva-nos a identificar e caracterizar os erros ou dificuldades dos licenciandos na solução da tarefa. Na perspectiva da teoria histórico-cultural, de L. S. Vygotsky, da teoria da atividade de A. N. Leontiev e da teoria da assimilação das etapas, de P. Ya. Galperin, segundo Núñez (2009), os erros são parte do processo de apropriação do conteúdo escolar e são uma expressão da relação entre aquilo que se sabe e aquilo que se procura saber (definido como referência numa disciplina), no contexto da Zona de Desenvolvimento Proximal, definida por Vygotsky (1998). Para referenciar essa discussão, verificamos no Quadro 18 os erros cometidos pelos licenciandos durante o diagnóstico.