3. Dos recursos ambientais aos princípios de sustentabilidade
3.3 Princípios para a habitação sustentável
3.3.8 Apropriação e participação dos habitantes
3.3.8
3.3.8
3.3.8 ApropriaçãApropriaçãApropriaçãApropriação e participação dos habitanteso e participação dos habitanteso e participação dos habitanteso e participação dos habitantes
Um dos principais parâmetros da satisfação residencial é o da apropriação pelos habitantes da área
residencial e do edificado que habitam. Esta apropriação é favorecida pela identificação dos
moradores com a habitação, mas também pela possibilidade de participação. A participação dos
133
habitantes na construção, manutenção e gestão do empreendimento habitacional constitui, por isso,
uma via para conseguir maior satisfação residencial
134.
Apropriação
Apropriação
Apropriação
Apropriação
As exigências de segurança, conforto e de adequação aos modos de vida decorrem das
necessidades físicas dos utentes, mas é de necessidades de estima e de identificação que resultam
as exigências de apropriação.
A apropriação consiste na capacidade dos espaços motivarem o uso, promovendo a identificação
individual e colectiva e permitindo a realização de intervenções que satisfaçam os modos de uso e os
desejos de afirmação dos moradores
135.
A apropriação é favorecida pela adaptabilidade, que consiste na capacidade de os espaços
suportarem diversos modos de uso ou permitirem a alteração das suas características, com vista a
responderem à alteração das necessidades dos utentes decorrentes da sua evolução ou substituição.
A apropriação está ainda fortemente relacionada com exigências estéticas, isto é, exigências que
visam assegurar que todos os elementos dos espaços habitacionais contribuam para uma imagem de
conjunto que seja culturalmente enriquecedora. Nesse sentido, a atractividade e a domesticidade
contribuem para uma imagem habitacional a que os utentes aderem naturalmente, favorecendo a
apropriação. Contudo, perante as funções emergentes da habitação, a apropriação já não está apenas
relacionada com questões estéticas, mas também com questões funcionais e de equipamento.
Participação
Participação
Participação
Participação
A participação pode conduzir a um maior sucesso dos conjuntos habitacionais e a um maior controlo
dos seus impactes, pois o envolvimento dos moradores e outros actores permite prever
comportamentos e promover a responsabilização e capacitação dos moradores
136. O recurso a
processos de participação de habitantes nas decisões ao longo da concepção da habitação e da área
residencial favorece a apropriação e é uma via para conseguir uma maior sustentabilidade social nos
bairros de habitação de renda controlada, bem como na reabilitação dos bairros de génese ilegal.
Em Portugal, desde há mais de trinta anos que a participação dos futuros moradores é uma prática
corrente nos empreendimentos de habitação cooperativa. Na Alemanha existem vários exemplos de
134
Freitas – Habitação e cidadania, 2000.
A satisfação residencial é um parâmetro difícil de prever pois depende não só da natureza e qualidades intrínsecas
dos espaços residenciais, mas também das características dos indivíduos e da relação entre os edifícios e os seus
contextos residenciais.
135
Coelho – Qualidade arquitectónica residencial. Rumos e factores de análise, 2000.
Pedro – Definição e avaliação da qualidade arquitectónica habitacional, 2000.
136
Entre 1974 e 1976 o SAAL desenvolveu projectos habitacionais onde a participação organizada do cidadão foi motor
fundamental do processo de edificação. Estes bairros deram resposta a uma muito pequena parte das necessidades
de habitação de então mas constituem um exemplo histórico de um sistema dinâmico de envolvimento da população,
onde utentes e arquitectos discutiam nas ruas o futuro dos bairros.
empreendimentos sustentáveis, alguns dos quais baseados em Agendas 21 Locais, que incentivaram
a participação activa dos cidadãos durante a concepção
137(Figura 38).
No Brasil, a experiência do orçamento participativo de Porto Alegre foi marcante como exemplo do
sucesso da participação dos habitantes na decisão e no planeamento orçamental da urbanização e na
distribuição colectiva dos seus custos e benefícios
138.
Figura 38 – Espaços públicos definidos com a
participação dos residentes.
Bairro Vauban (Freiburg).
Boa
Boa
Boa
Boa governânciagovernânciagovernância governância
A boa governância é um conceito abrangente que alia hipóteses de participação de utentes à
responsabilidade dos projectistas, técnicos e governantes. Dito de forma muito simples, a governância
é a ciência da tomada de decisão. O conceito de governância refere-se a um conjunto complexo de
valores, normas, processos e instituições através dos quais a sociedade gere o seu desenvolvimento e
resolve conflitos (Tabela 4).
A governância urbana envolve o Estado mas também a sociedade civil ao nível local, regional, nacional
e global. A boa governância implica um elevado nível de eficiência organizacional visando o
desenvolvimento, a estabilidade e o bem-estar da população. A boa governância aceita a participação
como um instrumento fundamental, podendo contribuir para áreas residenciais mais próximas da
identidade dos seus moradores.
A governância tornou-se num mecanismo útil, não só para aumentar o potencial criativo das políticas e
flexibilizar as regras do jogo, inspirando esforços para mover a sociedade na direcção de novos modos
de organização mais produtivos, como também para alcançar a legitimação das políticas pelo domínio
público, especialmente desejada no domínio da habitação.
137
Sustelo – A participação do cidadão na Reabilitação dos centros históricos: Estudo comparativo Alemanha-Portugal,
2003.
Stuttgart 21 e Freiburg- Vauban são os exemplos mais citados, intervenções urbanas que foram avaliadas e discutidas
por vários grupos de cerca de 50 habitantes cada.
138
Sousa Santos – Democracia e participação: O caso do orçamento participativo de Porto Alegre, 2002.
O orçamento participativo começou em 1997 e foi institucionalizado em 2002.
Tabela 4 – Principais objectivos e instrumentos da boa governância.
(adaptado de www.urbangovernace.com)
Objectivos Instrumentos
Maior envolvimento e participação
local
Promoção da identidade urbana e do sentido de cidadania
Planeamento e orçamento participativos
Envolvimento de grupos marginalizados
Gestão urbana eficiente
Investimento eficiente em infra-estruturas
Formação adequada dos técnicos locais
Utilização das tecnologias da informação
Planeamento ambiental desenvolvido em cooperação com os cidadãos
Responsabilidade e Transparência
Monitorização das actividades governamentais por organizações exteriores
Linhas de orientação claras para líderes e técnicos
Sistemas abertos de procura e contratação
Transparência financeira
Processos de reclamação acessíveis e independentes
Acessibilidade
Consulta regular dos representantes de todos os sectores da sociedade
Inclusão de indivíduos no processo de decisão
Protecção dos direitos de todos os grupos
Abordagem
Abordagem
Abordagem
Abordagem de baixo para cima e envolvimentode baixo para cima e envolvimentode baixo para cima e envolvimento dos utentesde baixo para cima e envolvimentodos utentesdos utentesdos utentes
O processo de decisão de baixo para cima (bottom up) desafia a hierarquia convencional da gestão do
ambiente urbano, aplica ideais de boa governância e de participação, e permite aproximar utentes do
processo de produção da sua futura habitação. No processo convencional de gestão de cima para
baixo(top down) o ambiente urbano é determinado por uma infra-estruturação e um espaço público
que os cidadãos não podem adquirir nem alterar. Mas no processo inverso, de baixo para cima, é
possível para os futuros habitantes, ou seus representantes directos, planear as vias e os espaços
públicos, a partir dos seus próprios objectivos e necessidades.
Este processo beneficia particularmente da generalização do uso da simulação informática, pois esta
permite visualizar os resultados das opções individuais dos vários participantes
139. A simulação
informática pode ter um papel decisivo nos processos de participação activa sustentável pois permite
relacionar, com auxílio da programação multi-critério, aspectos individuais com compromissos
colectivos, nomeadamente ambientais.
139
Lawrence – Housing, dwellings and homes: Design theory, research and practice, 1987.
Os obstáculos de comunicação que conduziram na década de 80 ao investimento em modelos à escala 1:1 e ao
desenvolvimento de "jogos de simulação" hoje ultrapassados pela modelação e animação e simulação 3D.
No documento
SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL DA HABITAÇÃO
(páginas 95-99)